Foi em uma bela manhã de domingo, algumas semanas mais tarde, que a bomba explodiu.

— Bom dia Darcy. – Hannah entrava na cozinha vestida para correr.

— Bom dia Hannah. Dormiu bem? – Darcy era sempre muito educado.

— Muito bem, obrigada! – dirigiu-lhe um sorriso cativante.

— Darcy querido, você viu onde coloquei o meu... – era Anne que entrava na cozinha vestida apenas com uma camiseta cinza de Darcy. Aquela camiseta.

— Oh... Eu não vi que você estava aqui... Você deve ser a Hannah, certo? – Anne ofereceu um sorriso simpático a Hannah. – Willian fala muito de você.

— Anne, por favor, já pedi para não me chamar de Willian. Eu não gosto. Me chame de Darcy como todos, tudo bem? - disse de maneira suave.

— Ora, não seja ranzinza Darcy. Prefiro você como estava noite passada... – sorriu-lhe maliciosamente.

— Anne! – Darcy repreendeu-a e buscou rapidamente por Hannah. Sua amiga era ainda uma jovem inocente e não queria que ela tivesse de ouvir as besteiras de Anne.

Por um minuto ficou confuso. Hannah não se encontrava mais a vista. Tinha saído sem nada dizer. Darcy sabia que ela ficaria chateada com ele. Na verdade foi essa sua intenção ao levar Anne para passar a noite no apartamento. Precisava afastar-se de Hannah definitivamente. Mas esperava que ela brigasse, discutisse ou mesmo fingisse que não se importava, jamais poderia supor que ela ia simplesmente sair em silêncio.

Enquanto isso Hannah andava desnorteada pela rua, levando Boruto na coleira. Não conseguia entender o porquê das atitudes de Darcy. Primeiro ele a ignorava como mulher. Apesar de machucar, ela entendia. Ela e as mulheres de sua época eram muito diferentes do que Darcy estava acostumado. Mas tinha esperança de que com o tempo poderia conquistá-lo e até pensou que estava alcançando seu intento. Afinal, Darcy não conseguia mais disfarçar que a achava atraente. Mas se envolver com aquela mulher... E que mulher linda, pensava. Loira, olhos azuis e corpo de modelo, jamais poderia competir com ela. Mas não satisfeito, Darcy levara aquela... aquela... “aquela” para sua casa. Seu apartamento. Ele maculara seu refúgio. E ela ainda teve o disparate de chamá-lo de Willian... Não... Era muito para Hannah suportar.

Após algum tempo, Hannah decidiu voltar para o apartamento. Imaginava que a mulher já tivesse partido.

Entrou em casa silenciosamente, procurava evitar que Darcy percebesse sua volta, mas Boruto não compartilhava os pensamentos de sua dona e seus latidos animados o alertaram.

— Hannah... – ele precisava conversar com ela, mas não sabia nem como começar.

—Não.

Darcy olhou assustado para Hannah. Ela não o deixara nem começar a falar e o que viu no rosto da jovem despertou sua compaixão. A moça estava pálida e os olhos normalmente brilhantes estavam completamente sem vida.

— Hannah, eu...

— Eu já disse que não Sr. Darcy. – a garota foi incisiva – Eu não quero saber... – respirou fundo antes de continuar – Não. Não quero escutar. Só quero que me deixe em paz.

— Mas Hannah, eu... – Darcy queria afastar Hannah e sabia que trazendo Anne ao apartamento ele conseguiria, mas não estava preparado para ver a agonia da jovem de quem gostava tanto.

— Darcy, essa é a primeira e a última vez que você vai escutar essas palavras. – a palidez de Hannah aumentava a cada palavra.

— Por favor Hannah, eu...

— Eu te amo Darcy. – os olhos sem vida fitavam agora a parede a sua frente. – Eu o amo com todo o meu coração, acredito que o amo mesmo antes de conhecê-lo pessoalmente. Mas você já sabia disso. – deu uma risada sem graça.

— Hannah, eu acho que você está se confundindo e que...

— Chega! – gritou de repente sem controle – Calado Darcy. – sua voz estava quebrada. Ela se sentia quebrada. – O mínimo que você pode fazer agora é ouvir.

Darcy assentiu calado e ela continuou:

— Eu não esperava que você retribuísse meus sentimentos Darcy, ou melhor... Droga! Esperava sim. No fundo do meu coração eu acreditava que um dia você seria capaz de me corresponder. Eu só precisava dar-lhe tempo e todo apoio que eu pudesse, para que você superasse sua nova condição e um dia estivesse pronto para assumir sua nova vida, libertar-se do passado.

Cada palavra era uma bofetada no rosto de Darcy.

— Mas ao ver Anne eu compreendi. Eu entendi que independente de estar pronto ou não eu jamais teria uma chance com o ilustre Sr. Darcy. Afinal como eu, uma garota completamente comum poderia competir com aquela beldade loira? Esta constatação foi como um punhal cravado em meu coração. Mas eu poderia superar isso um dia, afinal esperanças a parte, eu sempre soube que não era o suficiente para o grande Darcy. Que poderia ter qualquer mulher que quisesse.

— Hannah, não é assim. Eu é que não sou... Eu não posso...

Depois de alguns segundos em silêncio, tomando fôlego, Hannah continuou como se não tivesse escutado Darcy.

— Mas eu jamais poderei perdoá-lo pelo que me fez passar hoje de manhã. Na minha casa Darcy. Na minha própria casa, meu refúgio... Você trouxe aquela... – um brilho de raiva passou pelos olhos de Hannah. – Você a trouxe. Para cá. Ela estava andando pela minha casa como se fosse a senhora, vestida apenas com a sua camiseta. Aquela camiseta, você lembra?

Darcy se lembrava. Como queria esquecer... Mas ainda se lembrava daquela manhã em que Hannah apareceu vestida com a mesma camiseta que Anne usara hoje. E ele foi frio e grosso com ela, tudo para disfarçar o imenso desejo que sentiu. Foi naquela mesma manhã que ele decidiu se aproximar de Anne. Em sua ânsia de afastar Hannah ele trocou os pés pelas mãos e a magoou além do limite. Se é que havia um limite para magoar alguém.

— E ela o chamou de Willian... – continuou ainda mais arrasada.

— Hannah, eu pedi a ela que não me chamasse de Willian...

— Você pediu Darcy? – os olhos de Hannah voltaram-se para ele e por um segundo ele teve esperança de que nem tudo estava perdido.

— Pedi.  – confirmou.

— O que eu significo para você Darcy? – Hannah ainda olhava em seus olhos.

— Você é a pessoa mais importante para mim neste mundo, Hannah. - respondeu sem titubear.

Hannah suspirou profundamente.

— E você se lembra como reagiu quando lhe chamei de Willian?

Foi mais uma bofetada, dessa vez com luvas de pelica. O coração de Darcy parou de bater por um segundo. Acabou. Havia colocado tudo a perder. Tudo o que não queria era perder a amizade de Hannah, nem magoá-la, mas foi apenas o que conseguiu fazer.

Hannah foi para seu quarto, fechando a porta silenciosamente ao passar e para Darcy foi como se mil agulhas lhe perfurassem o coração. Ele preferia que ela tivesse gritado e batido a porta.