Um mês de desespero escrita por Leon Yorunaki


Capítulo 19
XVIII: Nightmare


Notas iniciais do capítulo

Como diz o ditado, antes tarde do que mais tarde.
Dedico esse capítulo em especial aos supostos seis leitores que nunca passaram por aqui para comentar. Fiz esse capítulo pensando em vocês.
O quê? Não entendeu? Então pegue seus fones de ouvido e leia. Sim, recomendo os fones, esse capítulo tem uma trilha sonora! O link aparecerá quando for a hora, então fique atento: quando aparecer uma palavra em azul, por favor, clique nela.



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A tarde começava a cair, assim como a fome chegava, uma preocupação em muito aumentada pelas condições inusitadas daquele trecho de viagem. Himiko não estava acostumada a viajar com seus Pokémon fora das pokébolas. Poderia sem problemas ignorar seu próprio estômago reclamando; a situação era diferente quando o número de bocas para se alimentar quadruplicava, por mais estranho que fosse o motivo.

Uma das características mais intrigantes de uma pokébola era o seu método de armazenamento. O senso comum logo remete à ideia de miniaturização, reduzindo um Pokémon a dimensão e peso compatíveis com a denominação “monstros de bolso”. A tecnologia por trás do procedimento era muito mais elaborada, envolvendo a transformação de matéria em energia; o processo de conversão instantânea usado pelas pokébolas, altamente complexo, havia sido patenteado pela Devon Corporações, em contraponto ao antigo método de armazenamento através de Apricorns usado por diversas gerações antes; este último dependia de estruturas mecanizadas, cujo processo de uso era muito mais demorado.

Uma consequência em particular dessa transformação era a reduzida necessidade de alimento pelos espécimes armazenados. Um Pokémon, ao ser compactado em forma de energia, pode passar algumas semanas sem necessidade de se alimentar por conta das perdas mínimas que sofre no estado energizado.

O mesmo não podia ser dito quando eles se situavam ao ar livre, como era o caso de Futa, Ikazuchi e, em menor grau, Nagrev. O último se encontrava no momento em sua forma energizada, dentro de sua pokébola recém-adquirida; o que não o impedia de se sentir faminto, ao se considerar tudo o que passara naquele dia antes de ser capturado.

Dito isso, demoraram uns bons minutos para encontrarem um local conveniente para que pudessem se alimentar e descansar um pouco antes de seguirem viagem. De todos eles, Futa era quem mais precisava de repouso. Ele podia ser mais resistente do que a média para um Kirlia, contudo o uso contínuo de seus poderes psíquicos para que Himiko pudesse compreender a linguagem Pokémon começava a cobrar seu preço em forma de fadiga. Seria conveniente que ele pudesse seguir pelo resto do dia descansando, mesmo que fosse pedir demais ao se considerar as condições em que se encontravam.

Não foi nenhuma surpresa o fato de Ikazuchi não conseguir repousar. Não era apenas o fato de ser um Pokémon jovem, para não dizer completamente imaturo, o que justificaria tal comportamento e energia característica de um Pokémon elétrico.

Os problemas se deram no instante em que Nagrev, o Charmander que ela capturara menos de uma hora atrás, foi liberado de sua pokébola para que pudesse comer. O cansaço de Futa não impediu que ele voltasse a usar seus poderes, em resposta a um olhar de sua treinadora.

— Aí, lagartão, bem-vindo ao time. — provocou Ikazuchi.

— Eu mereço… — Nagrev resmungou alto, sem responder à provocação. — Essa louca tinha que nos colocar juntos?

— Não precisa reclamar, eu também não queria vir, mas sabe que eu estou melhor assim? Todo mundo tá morrendo, pelo menos com ela vamos estar a salvo.

— Eu preferia ter morrido. Melhor do que passar o resto da vida com um cabeça-oca como você — o Charmander quase se engasgou ao dizer isso enquanto engolia um punhado de ração. — Culpa dessa treinadora sem-noção!

O Electrike apenas riu em resposta, frente ao desconhecimento do colega. Não seria ele a dizer que Himiko estava ouvindo a conversa, por mais que a expressão dela já denunciasse.

— Vem cá, você comeu uma Persim podre ou essa sua cara tá sempre amarrada assim?

— Dá pra vocês aquietarem o facho? — Futa interviu, sem perder a calma. — Ninguém aqui é criança pra ficar com essas provocações gratuitas!

— Pode começar por você, seu pau-mandado! — Nagrev respondeu. — Eu não pedi pra estar aqui, não me interessa o que você ou essa pirralha que você chama de treinadora pensam.

— JÁ CHEGA! — Himiko gritou. — Não quero saber de brigas aqui! E aquele que não quiser seguir comigo é livre pra ir embora!

Ela encarava em especial o Charmander, que baixava a cabeça. Era como se ela o entendesse, por mais que estivesse enganada em sua afirmativa. Apesar de tudo o que falara, Nagrev sentia-se grato por poder sair em viagem sob proteção humana, em especial depois de ver alguns de seus amigos morrendo nos últimos tempos. Ele não tinha intenção de dar o rabo a torcer, contudo.

— Eu sei que vocês estão com fome, — continuou a jovem. — então o primeiro que der um pio volta pra pokébola sem comer! Estão entendidos?

— Sim, senhora! — O Electrike respondeu, também retraindo-se. Ele não iria se acostumar tão cedo a seguir ordens, apesar de gostar da ideia de ser treinado por uma humana. O principal motivo estava diante de seu focinho; estava cada vez mais difícil encontrar comida em bom estado, em especial frutas. As árvores continuavam imponentes, porém os frutos haviam rareado sem explicação durante as últimas semanas.

E por dez rápidos minutos, o silêncio se fez à sombra da grande árvore de Figy Berries, ainda que sem frutos; era uma das poucas cuja copa oferecia alguma proteção. Silêncio esse quebrado por uma tempestade elétrica, logo seguida pela água que passava por entre a não tão densa folhagem da planta que os protegia.

A chuva chegara sem aviso; uma análise rápida feita pela treinadora levou à conclusão de que seria uma longa tempestade, da qual deveriam procurar abrigo imediatamente.

Mais uma coisa pra me atrasar…

Ela logo chamou seus Pokémon para o abrigo que as pokébolas poderiam oferecer, ao mesmo tempo em que procurava um local seguro para se proteger da tempestade. A trilha bem demarcada era sinal de que o longo caminho a céu aberto que contornava o mangue era muito mais utilizado que o atalho; Himiko não tinha tanta esperança de encontrar algum local seguro, porém era o único local pelo qual ainda não passara e, por conseguinte, a única esperança de encontrar aonde se abrigar.

Para a sorte dela, logo avistou uma pequena construção de madeira ao fundo. Assim que o fez, começou a correr, chegando até o casebre antes de se molhar demais. Uma pequena inscrição à porta foi a única coisa que leu, o que considerou conveniente demais para o momento. “Entre sem bater.”

Ela pesou os riscos. Entre a chuva e o desconhecido, decidiu por arriscar, protegendo-se sob uma casa rústica, parcamente mobiliada. Apenas uma mesa se situava no centro da sala, com um jornal acima, um pufe verde-limão como acomodação destoando dos tons amadeirados da casa, além de dois armários em lados opostos na parede. Entre eles, ao centro, um longo pergaminho retratava um Pokémon no que possivelmente era seu tamanho natural; quase dois metros de altura e um corpo azulado, de garras desenvolvidas com membranas entre os dedos; uma pedra vermelha brilhava em sua cabeça, aparentando irradiar seu brilho até mesmo da pintura. Himiko reconheceu aquele Pokémon como um Golduck; a ilustração lhe pareceu mais deslocada da decoração até mesmo do que o pufe de coloração exótica que ela usou para sentar-se.

A água vinha com força dos céus; ela não teria escolha senão esperar até que a chuva passasse. O que estranhamente combinava com o mural na parede, aonde o Golduck se deliciava com a chuva; algumas pessoas diziam que ele tinha poderes capazes de controlar o clima de acordo com seu bel-prazer. A treinadora considerava ser apenas uma besteira, um folclore criado pelos antigos, incapazes de justificar o desconhecido.

Himiko estranhou a ausência de vida na casa, mesmo que não questionasse os motivos. Talvez o dono do casebre houvesse saído por algum motivo, sem poder retornar por conta da chuva. Talvez a pintura na parede escondesse uma passagem para o resto da casa, o que era plausível ao se considerar que não havia banheiro ou cozinha visível. Não que fizesse diferença para ela; apenas lhe interessava aguardar pelo término da tempestade para que pudesse seguir viagem.

Considerando-se tudo isso, a treinadora fez o óbvio: jogou-se sobre o pufe, enquanto pegava o jornal para ler e passar o tempo, tentando ignorar a tempestade que rugia do lado de fora; o trovão que caiu no momento em que ela se sentou fez parecer que o barulho partira de dentro do cômodo.

Algumas das reportagens que lia lhe chamaram a atenção, inclusive. O corpo de Roxanne, antiga líder de ginásio de Rustboro, havia sido finalmente encontrado, já em estado de decomposição moderado. A treinadora não quis acreditar que fora por causa de um maldito sonho que tudo aquilo ocorrera. Não fosse por ele, teria provavelmente evitado todo tipo de transtorno que passara quando naquela cidade.

E falando em sonho…

Outra reportagem logo saltou aos olhos da garota. Intitulada “Sharpedo mata surfista na Ilha Maisie”, a matéria falava sobre um treinador que atravessara o continente para um campeonato de surfe, sendo atacado enquanto treinava para a competição que estava marcada para dois dias depois. E, considerando o quanto Himiko era um imã de problemas, ela não conseguiu se sentir chocada ao perceber que reconhecia a fisionomia do rapaz que fora atacado.

Outra vez…

Ela não evitou a sensação de dejà vú que veio acompanhada do incômodo ao ver a notícia; seus batimentos logo se aceleraram. Estava claro para a treinadora que o surfista que morrera naquele ataque era o mesmo de seu pesadelo.

Quer dizer que… eu matei ele?

Um clima sombrio aparentemente se formava enquanto Himiko pensava no acontecido. Eu era o Sharpedo.

Inquieta, começava a sentir dificuldade até mesmo para respirar. Era como se sua visão estivesse escurecendo, a culpa por um crime que jamais teria certeza se cometera.

Era muita coincidência para ser apenas o acaso. Aqueles sonhos eram reais. O que significava que Himiko tinha, sim, culpa no acontecido.

Mas a Ilha Maisie fica do outro lado do continente!

A realidade decidiu por lhe atingir, mostrando o quão absurdos eram seus pensamentos. Era impossível que ela estivesse em Dewford e na Ilha Maisie ao mesmo tempo, assim como era impossível que ela se transformasse em um Sharpedo.

O que não explicava como ela tivera aquele sonho.

Mas o fator mais surpreendente foi que Brawly Maxim fora atacado na última madrugada. Ou seja, um dia depois do pesadelo de Himiko.

Nada mais fazia sentido. Ela sentia-se fraca, sem conseguir sequer se levantar do pufe. A garota sentia como se algo a segurasse no assento, impedindo-a de se mover.

O que aconteceu de fato segundos depois, ao sentir um arrepio na espinha, literalmente paralisando seu corpo.

Que sensação estranha. Estou me sentindo tão leve…

Sem conseguir mover um único dedo, Himiko nem percebera que o pufe desaparecera embaixo dela. Assim como a pintura na parede não estava mais lá, revelando uma escadaria por onde a treinadora agora flutuava. Sem mais discernir o que era real, tentou fechar os olhos. Surpreendentemente, conseguiu.

Quando os abriu novamente, desejou não tê-lo feito.

Encontrava-se sobre uma grande caixa de madeira, assemelhando-se a uma cama sem colchão. Uma fraca iluminação em tons de púrpura permeava pelo ambiente, revelando o corredor sombrio no qual ela se encontrava. Não existia nenhuma janela no cômodo.

E como se o ambiente não fosse assustador o suficiente, os ruídos que acompanhavam tornavam a situação ainda pior. Uma música repetitiva parecia se propagar das paredes, ao mesmo tempo que ela escutava alguns rugidos estranhos.

Antes que ela começasse a se mover, uma voz grave ecoou pela cabeça da treinadora:

— Seja bem-vinda ao meu jogo…

Himiko abriu a boca, tentando responder. Em resposta a sua tentativa, contudo, a voz continuou, já respondendo à pergunta que ela faria:

— Não posso dizer quem sou eu, aonde estaria a graça? Posso lhe contar quando você conseguir sair… isso é, se você conseguir superar meu desafio…

Ela teve uma reação imediata a aquela frase, mas foi interrompida antes que pudesse alcançar suas pokébolas no cinto.

— Eu não faria isso se fosse você… Aliás, pode tentar se quiser, eu duvido muito que consiga…

A treinadora pegou a pokébola de Futa, tentando libertá-lo. Não houve resposta.

— Você está nessa sozinha e vai ter que sair daí sozinha… boa sorte…

Tenha calma… pesou ela, tentando se controlar. Eu devo ter dormido, esse é apenas mais um pesadelo…

Ela começou a ouvir um barulho de passos, deixando-a mais confusa. Se aquilo fosse apenas um sonho, ela deveria ser a única pessoa naquele lugar. Por outro lado, se fosse real, as pokébolas funcionariam. Ficar pensando nas possibilidades não a levava a lugar algum, apenas lhe dava um pouco de dor de cabeça.

Eu vou sair daqui. Não tem outra opção.

O corredor em que ela se encontrava se estendia por alguns metros, dividindo-se em outros dois corredores laterais. Himiko tomou o caminho da direita, arbitrariamente. Este outro corredor logo terminou em outra bifurcação, dando a impressão de que todo o local era um grande labirinto.

Se eu pegar sempre a mesma direção, uma hora encontro a saída, pensou ela, tomando novamente o caminho pela direita.

Levou cerca de cinco minutos andando daquela maneira, até que encontrou uma escada. Ela sabia não se tratar da saída; se o fosse, o tal desafio haveria sido fácil demais.

Ela subiu os degraus, imaginando o que encontraria no andar de cima. Ainda assim, não pôde deixar de se surpreender quando chegou ao topo.

O labirinto se revelava à treinadora, muito maior do que poderia caber em uma casa.

A escada terminara em um pequeno cubículo, de três metros de largura, cujas paredes transparentes acabaram de lhe revelar o tamanho do problema.

Do local aonde ela estava era possível ver boa parte do recinto, apesar da fraca iluminação. Uma única luz avermelhada se destacava do resto, localizada em uma parede a, no mínimo, uns quatrocentos metros do mirante aonde Himiko se encontrava.

A visão, mesmo com o choque que lhe causara, ao menos lhe permitia planejar uma rota em direção à saída. Á sua esquerda, um longo corredor terminava em outro mirante como aquele, após ela cobrir cerca de metade da distância até a luz avermelhada. Seguir o caminho até o novo mirante lhe parecia um bom plano, de modo que ela desceu as escadas um pouco mais esperançosa.

As coisas aparentavam se encaminhar quando Himiko foi atingida por um objeto que traçou uma curvatura perfeita em direção a sua cabeça.

Era uma pokébola. Seu topo era cinzento, sinalizando que o Pokémon nela contido já morrera.

A treinadora teve uma sensação estranhamente familiar ao segurar aquela pokébola; sentia uma energia acolhedora, ao mesmo tempo mórbida. O que a chocou de fato foi perceber que seu dispositivo de liberação continuava funcionando. Algo que seria impossível em condições normais.

Ela não se atreveu a tentar ativá-la; apenas deixou-a de lado e tornou a andar. As coisas já estavam estranhas demais sem que ela tomasse atitudes questionáveis.

Mas nem mesmo isso lhe adiantou, pois o desafio que lhe fora proposto começou a se revelar quando Himiko pisou em falso a certo ponto do corredor.

Uma armadilha!

Ela percebeu estar certa no momento em que uma grande pedra começou a rolar pelo corredor por trás dela. A rocha ganhava velocidade aos poucos, fazendo com que a jovem fosse obrigada a correr para não ser esmagada, devido justamente à ausência de desvios no trajeto que ela acreditou ter sido uma vantagem ao escolher por aquele caminho.

Os rugidos que ela ouvia se acentuavam, como se os donos deles se animassem com a situação. Himiko corria o mais rápido que podia, mesmo sentindo que não seria o suficiente. A grande pedra que rolava pelo corredor se aproximava no momento em que a jovem encontrou um caminho alternativo, conseguindo se proteger do impacto. A rocha continuou a rolar pelo corredor até atingir a escada que levava ao mirante, bloqueando seu acesso.

Eu devia ter imaginado que não seria tão fácil…

A treinadora teria de confiar novamente apenas em seu senso de direção. Supunha que a luz avermelhada estava em algum lugar ao oeste; tratou de rumar para lá, por mais dificuldades que encontrasse. O ar começava a ficar mais pesado, dificultando sua respiração. O aroma etéreo do ambiente começava a lhe incomodar, o barulho de passos estava mais alto, lhe parecendo mais próximo do que nunca.

Nada disso se comparava à preocupação que ela sentia. Incomodava-se cada vez mais com o ambiente, com os minutos e horas de caminhada pelos corredores escuros, o mesmo cenário repetitivo a sua frente. Sentia que a música circense já impregnava sua mente, os rugidos e barulhos persistiam a acompanhá-la naquele clima sombrio que se eternizava. A ausência de novas armadilhas não a acalmava; pelo contrário, gerava uma tensão angustiante.

O incômodo se tornou desespero de fato no instante em que os corpos apareceram no caminho da treinadora.

O cheiro pútrido imediatamente tomou conta; um garoto de no máximo quatorze ou quinze anos jazia no chão de mais um corredor; sua cabeça presa ao corpo por apenas um fino tendão, revelando a imperícia da lâmina que tentara separá-lo do corpo. Himiko tentou ignorá-lo, atenta a possíveis armadilhas, seguindo por aquele caminho até encontrar um segundo corpo, preso à parede do corredor pela lâmina que possivelmente lhe ceifara a vida.

Himiko sentia-se nauseada, porém ao mesmo tempo motivada a continuar. Ela compreendia que, se aqueles corpos estavam ali, era um sinal de que o caminho estaria mais perigoso, o que era também um sinal que interpretava de estar mais próxima da saída.

Ao contrário dos dois primeiros, o próximo corpo foi reconhecido pela treinadora.

Os cabelos castanhos cobriam-lhe parte da face pálida. As roupas igualmente brancas estavam maculadas na altura do peito, em uma mancha avermelhada. Uma adaga se encontrava no chão ao seu lado, igualmente manchada.

Isso não pode ser real. Isso não é real.

Mesmo após todos os esclarecimentos que havia tido a respeito, a morte de Roxanne voltava a lhe assombrar. O coração de Himiko batia cada vez mais forte, os pelos se eriçavam, as pernas tremiam. Mesmo assim, ela sentia que devia continuar.

Ao dobrar para o próximo corredor, entretanto, ela desabou.

O longo caminho dava a ela a visão da luz avermelhada, além da constatação de que era a saída daquele macabro lugar. Talvez estivesse distante uns setenta metros em linha reta, apesar de a passagem terminar abruptamente antes da metade da distância.

Mas Himiko não olhava para a saída. Da outra extremidade do corredor, uma jovem figura corria em direção a ela. A fraca iluminação não lhe permitia ver maiores detalhes além dos cabelos castanho-escuros, do rosto redondo e da camiseta branca que usava.

Em todo aquele tempo presa, era a primeira vez que encontrava algum sinal de vida no labirinto. Vindo em sua direção. Os braços se abriam, adiantando-se a um abraço que estava a caminho.

E que nunca chegou.

Himiko assistia embasbacada à armadilha que era disparada no instante em que a jovem chegava à metade do corredor. Uma lança partia do chão, atingindo o peito da jovem em um ângulo, fazendo com que fosse lançada para trás silenciosamente.

Ambas tentaram gritar; nenhuma delas conseguiu.

Himiko perdeu o pouco controle que tinha da situação; correu até a outra, ignorando qualquer outra armadilha que pudesse existir no corredor. Tomando consciência do que aquilo significava, percebeu finalmente o que acontecia naquele labirinto. O desafio não era chegar até o final do percurso, mas sim sobreviver a ele.

E ela percebeu, ao tentar tocar a garota que morrera diante de seus olhos, que era a única jogadora. Não era possível tocá-la, apenas observá-la; o rosto redondo da jovem desfalecida mantinha um sorriso, agora estático.

Não…

Himiko apenas desatou a correr. Desesperou-se em alcançar a saída.

Isso não é real.

Não lhe importava saber se existia alguma outra armadilha. Os rugidos que ouvia não lhe faziam nenhuma diferença.

Não pode ser verdade.

Um feixe de luz avermelhado surgiu da parede a sua frente, se movendo em direção ao peito da treinadora.

É só uma ilusão.

Ela se aproximava da parede, ignorando a passagem à sua direita. O feixe de luz alinhou-se com seu coração.

Cinco metros a separavam da parede. Três. Dois…

O jogo acabou.

Himiko atravessou a parede como se ela não existisse. Outros corredores surgiram a sua frente; ela ignorou todos. Ela conseguia visualizar como havia sido enganada por todo aquele tempo, seguindo em linha reta e ignorando a noção de espaço que se construía a sua frente.

A fonte de luz se aproximava. Himiko visualizava uma escada a sua frente por trás das paredes que agora lhe pareciam translúcidas.

Ela continuou a correr até atingir os degraus, galgando-os rapidamente. O brilho avermelhado que lhe acompanhara durante todo o tempo no labirinto lhe parecia ínfimo, partindo da parede, centímetros acima de seu rosto.

Himiko atingiu a última parede, atravessando-a. Sentiu pela primeira vez algo sólido em seu caminho, sendo levada ao chão após tropeçar. Viu-se enrolada em um pergaminho; reconheceu-o como a pintura do Golduck que estava pendurada na parede da casa no momento em que ela chegara.

Tirando esse detalhe, o local se encontrava nas mesmas condições. Os armários perfeitamente arrumados, o jornal dobrado sobre a mesa. O pufe esverdeado. E um senhor sentado nele, para a surpresa da treinadora.

Ele a encarava, aplaudindo-a.

— Meus parabéns, jovem Himiko.

Ela pensou em perguntar como ele poderia saber o seu nome, mas logo tornou-se claro. O velho sentado ao pufe era provavelmente quem a colocara dentro daquele labirinto. O que a levou a outra pergunta; assim como antes, foi respondida antes mesmo de pronunciar algum som.

— Não me pergunte como. Não tente destruir a magia que são os meus desafios.

Ela tornou a fechar os lábios, consciente de que ele podia ler seus pensamentos.

— Você se tornou mais forte que seus medos. Esse era o desafio. Há tempos eu não encontrava alguém com tamanha astúcia. Talvez seja a convivência com seu Kirlia, eu não sei…

Himiko tinha muitas dúvidas; não ousava formalizá-la em perguntas. Talvez não estivesse preparada para ouvir as prováveis respostas.

Medos…

Mas como ele consegue ver…

— Sou mais forte que um mero Kirlia, posso ver até mesmo o que você esconde dele. — continuou o senhor, agora comunicando-se telepaticamente. Não precisava mexer os lábios para fingir que conversava como um ser humano comum.

A treinadora chegava a uma conclusão semelhante. Em um movimento rápido, pegou uma pokébola de seu bolso, atirando-a em direção ao velho. A esfera atravessou seu corpo como se ele não estivesse lá, caindo ao chão no canto da sala.

— Não seja tola. Posso ver tudo o que você pensa. Não irei me sujeitar a ser capturado por uma menina tão inocente. O que não significa que você não será recompensada.

— O que quer dizer com isso?

O armário do lado direito se abriu, revelando uma pequena bolsa marrom.

— Pegue-a. Recolhi isso de um treinador fraco que morreu pelos seus próprios medos. Não é um prêmio tão bom quanto seu aprendizado, mas para mim não tem a menor utilidade.

O pesado pacote caiu aos pés de Himiko com um tilintar característico. Talvez não fosse o único conteúdo da bolsa, mas certamente havia um valor considerável em dinheiro dentro dela.

— Não me agradeça. Você fez por merecer.

Himiko desenrolava-se do pergaminho; ele magicamente voltava ao seu lugar na parede. Ela tornou a olhar para o idoso, imóvel em seu pufe; ambos agora levemente transparentes.

— Saiba usar seus poderes. E eu pensarei no seu caso quando nos reencontrarmos.

Não apenas ele desapareceu em questão de segundos, como também toda a casa. A pokébola que ela atirara nele jazia ao pé de uma árvore, assim como diversas outras a cercavam. Também restava a bolsa marrom que o velho lhe dera.

A jovem olhou para cima, vendo apenas a escuridão.

E não teve escolha senão, segurando a pokébola de Futa, sentar-se sob uma das árvores, adormecendo quase instantaneamente.

 


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Notas finais do capítulo

Posso deixar essa parte em branco?
Na verdade eu sei que não devo. Trate esse capítulo como um filler. Ou melhor, como um teaser do que irá acontecer nos próximos.

Notas do in-game:
Nenhuma. Não entrei na Trick House no jogo, visto que não queria excluir algum ataque útil para ensinar Cut para um dos membros da equipe (sem contar que não sou adepto de HM Slaves)

Status do time:
Pokémon: 5
Futa (Kirlia) Lv. 25; Bold, Synchronize.
Monk (Bellsprout) Lv. 24; Bold, Chlorophyll
Nuri (Swellow), Lv.25; Mild, Guts
Ikazuchi (Electrike), Lv.16, Serious, Lightning Rod
Nagrev (Charmander), Lv.14, Naive, Blaze

Mortes: 4 +0 = 4



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