Things we lost in the ice escrita por FAR


Capítulo 17
Capítulo 16




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Tomei o meu último gole de café, quando Peggy se sentou ao meu lado.

–Vejo que já não trabalha mais aqui.

–Não... –eu disse olhando para minha xicara vazia, mas logo olhei de novo para ela –Pensei bem e decidi aceitar o emprego na União Soviética.

–Emma, isso é ótimo! –ela disse sorrindo - Quando irá partir?

–Hoje à noite. –quando disse isso, Angie logo apareceu recolhendo minha xícara de café.

–Isso não é justo, quem vai me substituir durante minhas audições? –reclamou ela em tom de brincadeira, ela viera a Nova Iorque com intenção de conseguir um papel importante no teatro ou algum comercial e ser uma grande atriz. A parte de ser uma grande atriz já estava feita, o problema era até hoje não ter conseguido nenhum papel importante.

–Tenho certeza que logo acharão alguém para me substituir. –eu disse segurando a mão de Angie, ela a apertou e foi anotar o pedido de uma mesa.

Poderia ser um trabalho um tanto quanto chato, mas sentiria falta, ver Peggy e Angie todos os dias e falar com Lisa sempre que ela não estivesse ocupada, ela anda bastante ocupada desde que seus primos voltaram da guerra.

–O que você já sabe sobre o hospital na qual vai trabalhar? –perguntou Peggy assoprando seu café ainda quente e tomando um gole pequeno.

–Não muito, tudo o que sei é que os pacientes não são civis, bem... são, mas basicamente irei atender todos os soldados soviéticos que perderam algo na guerra.

–Perderam algo? –perguntou ela confusa.

–É, como uma perna. –eu disse e ela fez uma careta engraçada como se imaginasse alguém ferido sem uma perna, como se ela nunca tivesse visto um. –De alguma forma, eles ouviram sobre minha rapidez com feridas como essas e usaram Stark como uma grande influência, mal sabem eles que não fiz nada naquela viagem.

–Bom, pelo menos vai fazer algo que vale a pena. –ela disse, pude ouvir uma pontada de tristeza na fala dela.

–E como vai seu trabalho? –perguntei para ela, que suspirou cansada.

–Eles ainda me tratam como uma secretária, sou praticamente invisível. –disse ela.

–Não é verdade, talvez eles achem que depois do que aconteceu você esteja de alguma forma comprometida emocionalmente. Logo eles vão enxergar o talento que estão desperdiçando. –ela sorriu com minhas palavras, estava sendo difícil na SSR para ela, ser uma única agente no meio de tantos homens não era fácil, ainda mais quando todos achavam que ela não era capaz de fazer o que eles faziam, quando na verdade ela podia, pode, fazer muito melhor.

–Você deveria me dar o número do escritório, assim posso falar com você quando você estiver cansada de arrumar tantos papéis. –ela riu, abriu a bolsa e de lá tirou um pequeno cartão com o símbolo da SSR, mas sem número. –Onde está o número?

–Coloque perto do fogo, o número aparece no calor. –levantei a sobrancelha impressionada - Ajuda em manter o número o mais secreto possível.

Já estava na hora de ir para casa, terminar de arrumar minhas coisas. Obviamente, não poderia levar tudo comigo, mas levaria o máximo de fotos possível, elas eram um porto seguro.

Já se fazia quatro dias desde que havia chegado na União Soviética, os soldados estavam ruins, mas não tanto como eu imaginava, eram coisas na qual eu poderia lidar facilmente. Meu único problema era com o idioma, além de ser extremamente complicado aprender os nomes de todas as coisas na qual eu usaria em russo, o sotaque deles ao falarem inglês não ajudavam em nada.

Mas o geral era fácil. Acordar cedo, ir ao hospital, fazer meu trabalho, voltar para casa, dormi e recomeçar tudo no dia seguinte. Amanhã seria noite de ano novo, muitas enfermeiras e médicos iriam para casa durante a noite e voltariam logo na manhã seguinte, isso não seria um problema sendo que os únicos pacientes que ficavam acordados eram os que já estavam bem o suficiente para voltar para casa.

Por eu ser nova ali, não poderia ir para casa durante a noite de ano novo, não que eu fosse fazer algo, sozinha num país na qual eu não sei falar a língua, não havia muitas opções para uma garota americana.

Já era noite, umas 10 horas, e já não havia muitas pessoas no hospital, apenas alguns médicos andando de uns corredores para outro enquanto tomavam seu café. Eu estava trocando os curativos de um dos pacientes, era triste vê-lo na situação na qual estava, sua perna fora comprometida de um modo na qual teve de ser amputada e diferente dos outros soldados que estavam ali, era alemão e sua família não tinha dinheiro para vir até ele, então nunca recebia visitas.

Com sorte, ele falava inglês, com um sotaque horrível, mas falava, então sempre conversava com ele quando possível, ouvia suas histórias sobre seus dias no campo de batalha. Isso era tão estranho, ver homens contando suas histórias de quando lutaram ao lado dos nazistas, quando eu estava do outro lado ajudando os soldados americanos se levantarem novamente.

–Nos fizeram acreditar que estávamos lutando por algo bom. Que isso faria do mundo um lugar melhor, quem diria que estaríamos errados. –ele disse pra mim naquela noite.

–Você se arrepende, de ter lutado? –eu perguntei.

–Eu lutei ao lado do meu país, não há do que se arrepender quando se acredita estar fazendo o certo. –ele respondeu com orgulho. Isso me lembrou Steve, destinado a ser um herói americano mesmo quando não conseguia ser seu próprio herói. Ele lutaria por aquilo que acreditava ser certo.

–Você se arrepende? –perguntou ele me acordando dos meus pensamentos. –Se arrepende de ter lutado ao lado de seu país?

–Eu não lutei. –ri de leve –Apenas ajudei aqueles que precisavam.

–Se arrepende de ter ajudado os americanos que precisavam de você? –ele insistiu. Suspirei ao perceber que se não fosse pela guerra, eu estaria em casa, com Bucky ao meu lado, tentando convencer o pequeno Steve a ir em um encontro com alguma garota que conhecíamos, eles estariam bem.

–Perdi coisas durante a guerra, mas... não, não me arrependo de ter entrado na guerra. –eu disse colocando cobertores em cima dele.

–O que você perdeu? –perguntou ele com um tom triste. Assim que eu abri a boca, ele segurou meu pulso rápido e fez sinal com o dedo da outra mão para que eu mantivesse silêncio, então pude ouvir o que ele provavelmente ouviu. Passos, quase que correndo, pude ouvir alguém dando ordens em russo, esse alguém parecia estressado.

–O que estão dizendo? –eu sussurrei para o homem, ele apenas me olhou com uma expressão que dizia que ele não ouvia tal voz, apenas os passos rápidos. Tinha alguma coisa errada.

As salas de emergência ficavam no prédio do outro lado do hospital, não havia motivo para tamanha correria deste lado do prédio. Me afastei da cama do homem e coloquei a cabeça para o lado de fora da porta, não havia ninguém.

–Vou ver o que está acontecendo. –ele soltou meu pulso devagar e disse baixo.

–Eu sei o que está acontecendo. Chegou mais um. –ele provavelmente se referia à mais um soldado que precisava de cuidados, mas nenhum chegava com tanta pressa. Fui para o corredor à fim de tentar ajudar quem quer havia chegado, os passos ficaram mais altos e notei que eles estavam no corredor seguinte.

Mas eu não consegui andar, meu peito congelou e um nome veio a minha cabeça, como se ele estivesse ali presente, não muito longe de mim. Bucky. Era aquela mesma sensação de quando ainda estava na base da Inglaterra, como se ele estivesse perto, vivo, apenas esperando para ser salvo. E a volta dessa sensação acabou comigo.

Voltei a andar, tentando não fazer com que o barulho de meus saltos ficassem altos o suficiente para que eles ouvissem. Antes de entrar no outro corredor, pude ouvir que os passos haviam parado e ouvi alguns botões sendo apertados, logo o barulho de uma porta se abrindo, como de um elevador.

Mas não havia elevador naquele corredor. Olhei colocando apenas a cabeça no corredor e da parede uma porta de abria, como um esconderijo, haviam homens na qual nunca tinha visto levanto a maca, havia um outro homem alto mais à frente, parecia liderar o que estava acontecendo, olhei para o homem na cama, mas apenas pude ver o cabelo escuros, engoli seco ao me lembrar dos cabelos de Bucky.

Notei que o homem alto se viraria na minha direção, então voltei a me esconder no corredor na qual eu estava. Ouvi que eles haviam voltado a andar e a porta de fechou. Voltei a olhar no corredor e vi apenas a parede branca. Era como se não tivesse nada do outro lado.

O silêncio tomou o hospital e andei até onde seria tal elevador. Toquei a parede branca e como se fosse uma memória, pude ouvir uma voz com sotaque suíço dizendo as palavras na qual eu já ouvira da boca de outros.

Você corta uma cabeça. E duas crescem no lugar.


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