Odisséia Cosmopolitana escrita por Lucas Raphael


Capítulo 5
Nascimento


Notas iniciais do capítulo

Quero que todos saibam o seguinte: TO BEM FELIZ!



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A criança ficou imóvel olhando as estrelas, a lua e alguns cometas. Também imóveis, no teto do quarto. Seus olhos estavam pesados e estava com muito frio, puxou o cobertor até o pescoço, cobrindo todo seu corpo. Estava quase dormindo, quando ouviu (novamente) um barulho alto que vinha de algum outro cômodo da casa, então se lembrou do motivo de ter despertado. Decidiu que valeria a pena dar uma olhada.

Sentou-se na cama e esfregou os olhos. A fraca luz de um abajur infantil em formato de um soldadinho ajudou-o a localizar seu chinelo na beira da cama, e após os calçar caminhou preguiçosamente até a porta do cômodo.

O menino não tinha medo do barulho ter sido causado por um ladrão, assassino ou algo do tipo. Sabia que noites como aquela aconteceriam, assim que seu pai lhe explicou sobre a situação atual da família. E no último mês a frequência aumentara muito.

Bocejou.

Virou a maçaneta e viu que seu pai estava procurando alguma coisa, e nas suas costas havia uma mochila. Apenas ficou observando. Percebeu que algo diferente havia acontecido, queria saber o que era, então foi perguntar.

— Pai, o que está acontecendo? – Perguntou o garoto em sua voz, tímida, um tanto assustado com o comportamento atípico do pai.

O homem não se assustou, mas ficou apreensivo quando notou que ele havia despertado.

— Filho, fique tranquilo. Estou indo no hospital ver sua mãe. A Batista vai te levar pra lá assim que vocês se arrumarem. – Explicou. – Sabe onde estão as chaves?

Assim que descobriu o que seu pai estava procurando, o menino ficou envergonhado. Com certeza iria ficar de castigo.

— Está dentro da minha Ferrari. – Confessou. Talvez, em outra ocasião dito que não sabia sobre isso, e posteriormente,  quando ninguém estivesse olhando, colocaria a chave á vista. Mas tinha medo de que algo ruim acontecesse caso omitisse a verdade, com a sua mãe no hospital.

O homem ficou aliviado. Passou apressado pelo menino e foi direto no armário no quarto do filho. As chaves estavam dentro da Ferrari de plástico, que de Ferrari só tinha a cor.

Batista apareceu na sala.

— Eduardo, as chaves estão na moto. – Falou. Batista era uma babá temporária da família.

— Tudo bem, a do carro está aqui. Não se apressem. – Após entregar a chave para a mulher, Eduardo, o pai do menino, o ergueu e deu um beijo em sua bochecha. – Se arrume pra ir pro hospital com a Batista. O doutor me ligou, e disse que a sua irmãzinha provavelmente vai nascer essa noite! – Contou. Deixou-o no chão e saiu da casa. Quando olhou pela janela, viu as luzes da velha moto da Batista se movendo, até sumir completamente.

— Vai pro banheiro tomar um banho, e deixa a porta aberta que eu vou levar algumas roupas para você. – Ordenou ela. Não gostava muito da empregada, mas a respeitava mesmo assim. Quando sua irmã nascesse, sua mãe vai voltar pra casa e Batista será mandada embora, era o que pensava.

Demorou quase meia hora até que suas coisas estivessem arrumadas. O que tinha pra levar? Não pretendia ficar muito tempo por lá, queria voltar para casa logo. Será que deixariam ele, uma pequena criança, assistir o nascimento? Talvez só adultos pudessem ir lá. Não tinha medo de ir ver o parto, não tinha medo de sangue e não achava nojentas essas coisas. Sua mãe certa vez lhe elogiara por isso.

Olhou no rádio do carro e viu que já era quase duas horas da manhã. De repente, lembrou-se que era seu aniversário. Ficou empolgado e ao mesmo triste por não terem dado os parabéns. Não ligava para Batista, mas seu pai, já era outra história. Iria lhe dar mais uma chance, mas apenas por que provavelmente havia esquecido disso, no meio de toda a correria.

Batista entrou no carro e deu partida. “A doida não colocou o cinto de segurança”, notou. Ele estava sentado no banco do carona e usava o cinto. Não havia oportunidades para isso, já que normalmente ele ficava no banco de trás.

Saíram da garagem, e após o portão fechar, rodaram pelas silenciosas e desertas ruas da cidade.

Era a primeira vez que seu pai ia com a moto da empregada para o hospital, e não com o carro. Conseguia entender o motivo.

Depois de cinco minutos chegaram na parte das árvores. A casa onde o menino morava ficava em um bairro novo e bem afastado da cidade, e entre as duas áreas havia uma grande área florestal. Não era realmente grande, mas aquela reserva era melhor do que nada. Adorava aquele trecho. Mas naquela ocasião, não iria até seu fim.

Estava entretido olhando as estrelas (desta vez as reais) com a cabeça encostada na janela quando subitamente o carro perde a direção. O susto não deixou-o ver o que havia acontecido, somente que havia acabado com o carro batido em uma árvore na beira da estrada, com Batista desmaiada ao volante.

O garoto ficou sem reação, ofegando, com o coração quase explodindo. Ficou alguns minutos ali no carro batido, até que sua atenção se voltou para uma luz logo a frente, na densa mata. Se tinha luz, também tem gente, que pode ajudar.

Tirou o cinto e desceu do carro. Foi mais difícil do que pensou que seria, com muitos tropeços e insetos no caminho.

A luz que havia visto vinha de um quintal de uma casa, de onde estava havendo alguma festa. Um churrasco familiar, para ser mais preciso. O menino continuou e viu que no quintal só havia uma pessoa: uma garotinha.

Ela tinha longos cabelos ruivos, e olhos excepcionalmente verdes.

— Ei, pode me ajudar? – Chamou ele, forçando uma voz estranha. Queria parecer maduro, e não assustado. Não deu muito certo.

A menina tomou um susto, não esperava encontrar alguém ali, naquela hora.

— Quem é você? – A menina, que estava sentada, ficou de pé.

— Eu sofri um acidente. Será que posso ligar para o meu pai? – O garoto insistiu.

Ela avaliou a situação por um minuto. Não sabia o que fazer. Se aproximou da cerca e abriu o portãozinho de madeira. Ele entrou.

— Você tá bem? – Ela começou a examiná-lo da cabeça aos pés.

— Eu acho que sim. Mas eu preciso falar com meu pai.

— Como você se acidentou dentro da floresta?

— Ei, o acidente não foi dentro da floresta, foi na rua. Mas eu atravessei ela pra pedir ajuda.

— Não sei se acredito em você, moleque. – Ela o cutucou, como se estivesse confirmando se ele era real ou não.

— Não me chame assim! – Não gostara da forma como estava sendo tratado.

Assim que percebeu que ele não era uma ameaça, sentou no chão e fechou os olhos. O menino só a observou, perplexo com tal atitude.

— O que você tava fazendo uma hora dessas na rua? – Ela perguntou, sem abrir os olhos.

— Eu não estava na rua! Eu tava indo pro hospital. Minha mãe tá grávida e minha irmã deve estar nascendo.

Ela suspirou. O menino sentou ao lado dela.

— Pode me emprestar seu celular? – Insistiu.

— Meus pais tem celular, eu não tenho. Mas hoje a família toda está aqui, então eles não estão de bom humor. Eu ouvi meu psicólogo dizer que não é bom se estressar com esse tipo de coisa.

— Você é louca? – Ele ficou impressionado pelo fato dela ter seu próprio psicólogo.

— O que? Não!

— Pra que você tem um psicólogo então?

— Ah. Não sei bem. Eu gosto de quem eu sou, mas parece que não sou como as outras crianças. Isso não parece ser bom. Eu gosto de ser eu mesma.

— Quantos anos você tem?

— Quase sete.

— Hoje é meu aniversário, sabia? Seis anos. Eu não queria que minha irmã nascesse no mesmo dia do meu aniversário. Eu vou ganhar menos presentes e vamos ter que dividir o bolo. – Revelou.

Ela olhou para ele e fez algo que não tinha feito ainda: sorriu e lhe abraçou.

— Parabéns então, guri! - O menino não se sentia muito confortável com abraços, mas não tinha como resistir a esse. Se entregou. – Meu nome é Carolina.

Não foi preciso dizer mais nada. Depois disso, eles foram até a casa, onde ele se sentiu como um alienígena: Todos ali se assustaram e olharam para ele. Carolina tentou explicar o que havia acontecido, mas estava sendo ignorada. O estranho menino na casa demorou para ser ouvido, mas logo estava a caminho do hospital, onde seus pais estavam. A mãe dela e o resto da família é que foram verificar o local do acidente e chamar o socorro. O pai de Carolina é que lhe deu a carona depois de ligar para o celular de Eduardo (era o único número que o garoto sabia de cor). Eduardo teve uma amalgama de emoções. Estava angustiado por seu filho estar com estranhos, mas aliviado que apesar do acidente, ele passava bem.

Dois dias depois, Eduardo levou seu filho até a casa de Carolina agradecer a todos pela ajuda.

Ele contou para os pais da Carolina tudo o que havia acontecido, naquela noite. A empregada teve um infarto enquanto dirigia para o hospital junto do garoto. Infelizmente ela havia se machucado muito e se mantinha internada, mas nada irrecuperável.

Ficaram pouco tempo lá, mas pelo menos as duas crianças se conheceram melhor. Sempre falando como fora corajoso ao enfrentar tudo sozinho, o menino tentava impressionar a garota.

— Vou ir na sua casa algum dia. – Carolina falou quando ele estava prestes e ir. E ela foi. Muitas outras vezes depois, ela foi.

 


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Notas finais do capítulo

Obrigado, fieis leitores!



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