Nem Todo Mundo Odeia o Chris - 3ª Temporada escrita por LivyBennet


Capítulo 20
Todo Mundo Odeia o Dia da Terra


Notas iniciais do capítulo

Cara de pau... ♪ Uma autora cara de pau... ♪ (Quem tem mãe que curte sertanejo sofrência das antigas sabe que música é essa)
Mas apesar de a autora ser cara de pau, ela escreveu esse cap com todo o carinho do mundo para você, leitor, que passou esse tempo todo xingando ela ^^
Já está tudo aqui e, sinto muito trazer tensão para a história de novo, mas é muito necessário.
Eles precisam se ajeitar, eu concordo com vocês...
Enjoy o/

Próximo cap: O Coração de um Nerd - Cap. 6



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POV. CHRIS (Brooklyn - 1986)

“Bom, gente, como devem lembrar, 22 de abril, segunda-feira, é o Dia da Terra. E como todo ano, vocês terão o dia para se dedicar a um trabalho ecológico. Para isso, vocês terão que me trazer o projeto no qual irão trabalhar até amanhã, sexta. Escolham suas duplas, mas sem confusão, ou eu escolherei por vocês”, ela terminou, em tom de ameaça, e nos deixou por nossa conta. Mas ela pareceu lembrar de algo: “Ah, sim. Teremos uma novidade esse ano. Um dos pais da dupla terá que participar, e vocês vão me trazer esse formulário preenchido e assinado” ela disse, erguenfo uma folha para que todos vissem.

Rolei os olhos e decidi pensar naquilo depois. Virei para a Lizzy e sorrimos um para o outro; nossa dupla já estava gravada em pedra. Olhamos para o Greg nos desculpando, mas, para a nossa surpresa, ele nem notou, tão concentrado estava em uma conversa com a garota que sentava à direita dele. Lizzy e eu demos de ombros e começamos a pensar em qual projeto iríamos fazer.

O Dia da Terra era quase um feriado para a gente. Sempre tínhamos folga; não gastávamos nem meio dia fazendo o projeto escolhido e passávamos o resto do dia zoando. Mas agora Lizzy também trabalhava, e nosso tempo estava apertado; resumo: não teríamos folga nenhuma. Na verdade, nós dois teríamos que ou faltar trabalho, ou sair mais cedo para fazer o bendito projeto. Acabamos optando por sair mais cedo, dependendo do que iríamos fazer. O problema era escolher o projeto. Tinha que ser algo simples - já que não tínhamos tanto tempo disponível -, mas também tinha que ser legal. Passamos os últimos minutos da aula pensando e também o caminho todo até em casa. Nada. Me despedi dela na esquina da lanchonete e comecei descer a rua na direção do Doc’s.

Desde que ela havia começado a trabalhar, nós almoçávamos no colégio, o que nos dava o tempo exato para chegar na hora ao trabalho. Eu estava até gostando da ideia, assim eu passava menos tempo em casa; menos chance de ser feito de empregado. No Doc’s eu era empregado, mas pelo menos eu tinha meu pagamento.

O assunto do emprego dela virou terreno proibido. Não falávamos nele desde a noite que eu discuti com o miserável. Pela frequência que eu via o carro dele na rua, ele vinha muitas vezes - o que me irritava -, mas pelo menos eu não cruzava com ele. Via também o Porsche da Meggie algumas vezes e ficava mais tranquilo. Apesar do irmão, eu gostava dela. Por vezes eu me perguntava como dois irmãos podiam ser tão diferentes, mas aí me lembrava que eu tinha saído da mesma barriga que a Tonya, então compreendia.

Ainda com esses pensamentos e descendo a rua, chutei uma latinha de refrigerante que encontrei na calçada. Parei dois passos depois, com um sorriso de gênio no rosto. Olhei ao redor e percebi várias outras latinhas, algumas nas lixeiras e outras no chão mesmo. Voltei a andar, satisfeito com a ideia que tinha me ocorrido.

 

Depois do trabalho, fui correndo até a casa da Lizzy contar a ideia que tive.

“Oi, Chris. Acabei de chegar.”

“Eu tive-- uma ideia-- para o nosso-- trabalho”, falei meio sem fôlego.

“Sério? O que é?”, perguntou, curiosa.

“Coletar latas para reciclagem. Tem um monte de latas para qualquer lugar que a gente olhe.”

“Verdade. Nunca tinha prestado atenção. Lá na Donna’s tem várias também. Posso pedir a ela e às meninas para guardarem para nós.”

“Também. É um trabalho simples, a gente resolve rápido e podemos ficar de folga o resto do dia.” Ela sorriu.

“Sim, senhor gênio. Amanhã falamos para a srta. Morello então.” Assenti. “Mas… e quanto a um dos nossos pais participar? Meu pai não pode porque está longe e trabalha em ambiente fechado. O mais viável seria o seu pai.” Fiz uma careta, mesmo sabendo que ela estava certa.

Meu pai não faltaria serviço para fazer um trabalho da escola comigo e com a Lizzy. O mais provável era que eu preenchesse o formulário e depois pedisse ao Fisher para falsificar a assinatura do meu pai. Mas como eu não tinha cara de falar isso para a Lizzy, preferi deixar quieto e resolver depois.

“Já resolvemos um problema. Vamos deixar o outro para amanhã?”

Ela concordou e logo eu me despedi dela com um beijo no rosto, indo para casa. Subindo até o quarto, deixei a mochila lá, lavei as mãos e desci para ir jantar. Obviamente eu lavei a louça depois, mas não reclamei. Não valia a pena mesmo. Depois fui direto para o banheiro. Quando saí de lá, de banho tomado e com o objetivo fixo de cair na cama e dormir, encontrei minha mãe, já vestida para dormir, me esperando no quarto com um papel na mão. O silêncio só era quebrado pelos leves roncos do Drew. Chegando mais perto, percebi que o papel era o formulário do trabalho da escola que eu tinha deixado no bolso lateral da mochila, que era quase transparente.

“Para que é esse formulário, Chris?” Resisti à vontade de rolar os olhos. Ela tinha lido o papel, mas queria que eu dissesse.

“É para o trabalho da escola sobre o Dia da Terra. Vou fazer com a Lizzy.”

“Seu pai precisa ir?”

“Não”, respondi imediatamente. Não que eu não quisesse passar tempo com o meu velho, mas se eu dissesse para ela que ele precisava ir, ela ia encher a paciência dele até o fim. Ele não merecia isso. “É só para preencher e assinar, confirmando que eu fiz o trabalho e não fiquei só zoando no feriado.”

Observei os olhos dela se estreitarem em desconfiança, mas ela se levantou para sair do quarto.

“Tudo bem. Direi a ele para vir preencher o formulário depois.”

Então me entregou o papel, indo para o quarto dela. Quando ouvi o barulho da porta do quarto do casal fechar, suspirei fundo. Por pouco, pai.

 

No dia seguinte, a srta. Morello pediu os temas dos trabalhos e lembrou para levarmos os formulários assinados na terça-feira. Felizmente, antes do que eu esperava eu estava saindo daquela sala e teria três dias sem pisar lá. Lizzy e Greg pareciam ter o mesmo pensamento, pois quando chegamos à calçada do colégio eles se espreguiçaram em sincronia. Ri internamente e guardei o comentário. Vez por outra eles se imitavam sem perceber; sempre era engraçado.

Ele se despediu da gente com um meio bocejo, e seguimos para lados opostos. Dei uma última olhada na direção dele e finalmente percebi o quanto ele parecia cansado, como eu quando estava começando a me adaptar no Doc’s. Parece que o emprego está exigindo muito dele...

 

O final de semana passou rápido demais para o meu gosto, mas felizmente minha mãe não perguntou mais nada sobre o formulário. Meu pai me procurou para assiná-lo logo no sábado pela manhã. Feito isso, o assunto morreu. Aproveitei para descansar e adiantar alguns outros trabalhos da escola (sob ameaça da Lizzy que disse que não me ajudaria se eu não fizesse logo).

Admito que passei boa parte do fim de semana com ela. Ainda que com a desculpa de fiscalizar para ver se eu estava fazendo mesmo os meus trabalhos, eu sabia que ela gostava de ficar comigo fazendo o que quer que seja. Isso fazia meu coração bater forte e me deixava com um sorriso muito idiota. Acabei me dando conta que eu sabia inúmeras manias que ela tinha, como morder a parte de dentro da bochecha e franzir as sobrancelhas quando estava concentrada; puxar levemente uma mecha de cabelo quando estava nervosa; escrever com a caneta entre o indicador e o dedo médio; sorrir de canto sem motivo aparente. Isso também me fez perceber a quantidade de tempo que eu devia ter passado observando-a para saber essas coisas.

Porém cedo demais chegou a segunda, e mesmo que não fôssemos para a aula, eu sabia que não me sentiria de folga até terminar o trabalho. Ambos trocamos os turnos da tarde pelos da manhã no trabalho para termos mais tempo livre; eu tinha combinado um horário com o Doc.

A parte ruim do dia começou quando eu percebi que tudo estava decidido para o trabalho, menos o horário. Eu não sabia que horas ela sairia da lanchonete. Tentei ir na casa dela, mas ela já havia saído para trabalhar. A solução era bem simples: eu iria na lanchonete e perguntaria a ela. Simples era, mas eu queria fazer? Não. Meu orgulho não deixava. Eu tinha dito a ela que nunca iria até lá. Nunca. Me ferrei…

Fiquei imóvel na calçada de casa, contemplando o nada e tentando achar uma solução. Uma breve luz me ocorreu quando vi o Drew sair de casa. Alcancei-o descendo as escadas.

“Me faz um favor?” Ele me olhou, suspeitando, mas fez sinal para que eu continuasse. “Vai na lanchonete e pergunta à Lizzy que horas ela vai sair.”

Os olhos dele se estreitaram mais, me informando que convencê-lo não seria fácil.

“Por que você não vai? Eu tenho que fazer meu trabalho do Dia da Terra.”

“E eu tenho que trabalhar. Dá para ir?” Ele me encarou, considerando a situação.

“Não sei. Isso é uma daquelas discussões que vocês têm?” Me entreguei ao desviar os olhos, e ele reagiu de imediato. “Então eu não vou.” O QUÊ?

“Por quê?”

“Porque eu não vou me meter nisso aí não. Já basta a mamãe e o papai naquela aposta de quem para de gritar e quem para de apostar.” Suspirei, me dando por vencido.

Eu sabia que ele tinha razão, mas não queria admitir. A verdade é que eu já não tinha mais nada contra a lanchonete. A Donna tinha aparecido lá no Doc’s para falar dos suprimentos da lanchonete, e eu até tinha simpatizado com ela. Realmente parecia uma boa pessoa e não merecia ser julgada como eu estava fazendo. Era apenas o meu orgulho que me impedia.

Lizzy não vai me zoar por ir até lá. Ela vai até ficar feliz, acho. Não tem nada de errado nisso… Nada de vergonhoso nisso…

E repetindo mentalmente esse mantra, me despedi do Drew e comecei a subir a rua. Parei em frente à lanchonete, respirei fundo, engolindo o resto do meu orgulho, e entrei de uma vez.

Para a minha surpresa, apesar de cedo, tinha várias pessoas lá dentro; a maioria tomando café da manhã. O ambiente era muito legal, tive que admitir. Não entendia absolutamente nada de decoração, mas as cores eram agradáveis. Vi algumas meninas servindo as mesas, uma no balcão e a Donna na cozinha semi-aberta, mas nem sinal da Lizzy. Antes que eu pudesse ir ao balcão e perguntar pela Lizzy, fui abordado por uma das garçonetes.

“Oi, gatinho. Vai querer uma mesa?” Olhei meio assustado para a garota negra, morena e de olhos levemente claros parada à minha frente. Gatinho?

“Ahn… não, obrigado. Eu estou procurando uma funcionária: Lizzy.” Ela sorriu.

“Ah, a ruivinha. Ela está lá nos fundos. Espera um pouco que eu vou chamar.” Ela piscou sugestivamente para mim e saiu patinando.

Fiquei estático por alguns segundos, ainda incrédulo. Primeiro “gatinho” e agora isso? Desde quando garotas me notam? Ri levemente. Ela é bem bonita, mas… não… Prefiro minha ruiva…

Quebrando minha linha de pensamento, comecei a ouvir uma conversa de dois caras na mesa mais próxima. Uma palavra tinha chamado a minha atenção: “ruiva”.

“Cara, você viu a ruiva?” O outro assentiu.

“Vi sim. Muito gostosa.”

Senti meu sangue ferver imediatamente, a raiva fazendo minha cabeça latejar. Filho da p***...

“Com uma garota daquela eu me ocupava a noite toda.” Eles riram, e instintivamente fechei os punhos com força, chegando mais perto.

“Viu quando ela abaixou para pegar aquele guardanapo?” O outro assentiu de novo. “Não deu para ver nada. Ela é esperta; colocou um short por baixo.” P****. Já chega!

Acabei com a distância que me separava deles e soquei a mesa, olhando com ódio para os dois. Eles me encararam como se eu fosse louco.

“Qual foi, cara?”

Minha voz saiu do jeito que eu queria: baixa e ameaçadora.

“Espero que escutem bem porque eu não vou repetir: a ruiva é minha. Se eu pelo menos sonhar que vocês falaram, olharam ou sequer pensaram nela, não vai sobrar um fio de cabelo para provar que um dia vocês existiram. Entenderam?” Eles assentiram; à medida que eu falava, seus rostos tinham ficado tão pálidos quanto qualquer negro tinha a capacidade de ficar.

Interrompendo meu momento ameaça, a voz da Lizzy surgiu de trás de mim.

“Algum problema aqui?” Virei para ela, mortalmente sério.

“Lá fora. Agora.” E saí, antes que cedesse ao impulso de socar aqueles dois. Ainda ouvi-a dizer:

“Desculpem. Eu volto em um minuto.”

Do lado de fora, fechei os olhos e respirei fundo, me acalmando um pouco. Eu sabia que não devia ter vindo aqui. Eu sabia! Ouvi os passos da Lizzy atrás de mim e me virei. O fato de que ela ficava linda naquele maldito uniforme fez os insultos dos dois babacas soarem ainda piores. Minha raiva voltou mais forte que antes e, como resultado, não segurei minha língua.

“Chris, o que foi aqu--?”

“Aquilo?! É exatamente por causa daquilo que eu não queria que você viesse trabalhar aqui!” Ela estreitou os olhos e cruzou os braços na frente do corpo; começaríamos outra briga.

“Pode explicar o motivo do seu showzinho ridículo?”

“Você diz que é ridículo porque não sabe o que eles estavam falando de você!”

“Chris, se eu fosse desistir de um emprego por causa do que falam de mim, eu não ficaria em emprego algum! Você me conhece muito bem para saber que não vou desistir por uma besteira!” Minha cabeça latejou ainda mais de raiva.

“Besteira?! Chama aquilo que eu ouvi de besteira?!” Ela suspirou exasperada.

“E o que foi de tão horrível que eles falaram de mim que te deixou assim?”

“Eu não vou repetir! Só de lembrar eu sinto ódio! Você sabe como fico quando falam mal de você e sabe muito bem o porquê!” A mesma lembrança veio a nós dois: quando ela ficou mal falada por causa de uma mentira minha; eu ainda me detestava por aquilo. Vi sua postura vacilar um pouco ao lembrar. “As outras garotas não moram por aqui, então não importa o que falem delas, mas você mora!” Fiquei em silêncio por alguns segundos e suspirei, cansado daquilo. “Eu odeio quando falam mal de você porque sei que você não é daquele jeito. É uma mentira.”

“Então por que você se estressa? Os errados são eles. Você não deveria se importar.” Droga! Será que ela não entende?!

“Mas eu me importo! Sempre me importei! Eu sempre quis cuidar de você; retribuir tudo o que você já fez por mim! E agora que eu posso cuidar de você, sou empurrado para longe, como se você não precisasse de mim!” Ela respondeu aparentemente angustiada.

“Sim, eu tenho te afastado, porque desde que eu arranjei esse emprego você tem sido superprotetor! Eu sei me cuidar, Chris! Não sou indefesa! Você não precisa agir como se eu fosse sua irmã!”

Recuei dois passos, como se ela tivesse me dado um tapa no rosto. Eu tentei absorver o que ela tinha me dito, mas não conseguia acreditar. Irmã? É assim que ela acha que eu a vejo? Será que eu já não demonstrei o suficiente o que eu sinto para ela ter uma ideia tão errada assim? Eu praticamente a beijei quando ela foi dormir no meu quarto. Tive que me segurar todas as noites, vendo ela vestida com aquela roupa minúscula. Tenho raiva de todos os garotos que olham para ela de um jeito diferente e demonstro claramente. Isso não basta para ela entender?

Senti uma tristeza repentina torcer meu estômago. Abaixei os olhos e fiquei encarando meus pés, tentando encontrar alguma coisa para falar. Quando minha voz saiu, estava baixa e fraca.

“Tudo bem. Como você quiser. Eu… vou sair do Doc’s ao meio dia para fazer o trabalho. Era só isso.” Sem olhar para ela, me virei e fui para o Doc’s.

POV. LIZZY

Vê-lo virar as costas para mim e ir embora sem nem olhar para trás me deu um assomo de culpa que embrulhou meu estômago. Senti-me fraca, e minha voz também saiu assim.

“Chris… desculpa…” Sussurrei para o vento enquanto observava ele ir ainda mais longe. Fiquei parada lá fora até ver ele entrar no Doc’s, então voltei ao trabalho.

Passei o resto do expediente no piloto automático, constantemente me xingando por ter deixado ele ir daquele jeito. Idiota… Olhava frequentemente para o relógio, pedindo, desejando que logo fossem 12h. Rápido, relógio maldito…

Naquele dia, assim que deu meu horário, corri para o vestiário, tirando e chutando os patins. Troquei de roupa feito uma louca, peguei minha bolsa e literalmente corri porta a fora, quase esquecendo de dizer “tchau” para as meninas. Ainda consegui ver a cara de espanto da Rachel. Sabia que depois ela me faria um interrogatório.

Alcancei o Doc’s no momento em que o Chris ia saindo, distraído e com o olhar triste de mais cedo. Ainda correndo, me joguei em cima dele, abraçando-o. Ouvi-o ofegar com o impacto, mas não me importei, jogando os braços ao redor do seu pescoço enquanto murmurava inúmeras desculpas ao seu ouvido. Ele ficou paralisado a princípio, e eu pensei que ele estivesse com raiva, mas então senti seus braços envolvendo minha cintura e relaxei. Depois de alguns instantes, ele me afastou um pouco e me olhou, fazendo menção de falar, mas eu o interrompi antes disso.

“Chris, desculpa… Eu quero manter meu emprego, mas não quero ficar mal com você por causa disso. Eu sei, eu fui incompreensiva com o seu ponto de vista. Por favor, me desculpa.” Ele me encarou por alguns segundos - os olhos ainda tristes - e acariciou meu rosto.

“Tudo bem. Eu também fui incompreensivo. Esse foi o melhor e mais conveniente emprego que você conseguiu arranjar, e eu sei que, de certa forma, você precisa dele. Desculpe também.” Assenti, mesmo sentindo que minha falta havia sido pior que a dele, e o abracei novamente, com um leve sorriso de alívio.

Mas quando me afastei, observei seus olhos; ainda estavam tristes.

“Isso não é tudo, é? Você ainda está triste.”

Ele desviou os olhos dos meus, fixando-os no chão. Esperei pacientemente que ele falasse, mesmo meu coração estando apertando. Por fim, ele começou lentamente.

“O que você disse… sobre eu ser superprotetor. Eu concordo. Você sempre soube se cuidar sozinha, e se a lei reconhece isso agora, por quê eu não? Eu vou te dar o espaço que você quer e--”

“Não! Por favor, não. Eu estava com raiva, falei da boca para fora; você sabe disso. Não se afasta de mim, Chris. Eu preciso de você”, falei, abraçando-o como se jamais fosse soltá-lo.

Fiz meu melhor para segurar o nó na minha garganta, que só sumiu quando o senti me abraçar em retorno, beijando o alto da minha cabeça. Suspirei, mais aliviada, embora ainda insegura. Quando ele falou - sussurrou, quase -, sua voz não parecia mais triste.

“Tudo bem… calma… eu não vou me afastar; vou estar sempre aqui.” Ergui a cabeça e foi com alegria que vi um pequeno sorriso em seu rosto; seus olhos não estavam mais tristes. “É melhor irmos, ou vamos começar a chamar atenção nos abraçando no meio da rua”, ele disse, já olhando para os lados para verificar se alguém tinha visto.

Assenti em retorno e começamos a subir a rua em silêncio. Me sentia mais aliviada, mas ainda me remoía de culpa por dentro. Fui interrompida pela sua voz.

“Para.”

Virei para ele com uma expressão confusa.

“O quê?”

“De pensar besteira”, ele disse, sorrindo de canto. “Está escrito na sua testa.” Sorri meio sem graça.

“Desculpa. Não consigo evitar.”

Sua mão pegou a minha, tentando me confortar.

“Estamos bem. Para com isso.”

Respirei fundo uma vez e assenti.

“Sim. É melhor nos preocuparmos com o trabalho. Já tem ideia por onde começamos?”

“Não. Queria muito almoçar primeiro.” Eu ri e concordei.

“Ok. Eu faço alguma coisa rápida para nós lá em casa.” Ele assentiu e fomos direto para a minha casa.

Acabei fazendo uma macarronada, que ele olhou como se fosse a melhor coisa do mundo. Comemos com um pouco de pressa, ansiosos para terminar logo o bendito trabalho. Depois lavamos a louça e descemos as escadas para sair de casa.

Saímos conversando, mas a atenção dele logo se desviou para a nossa frente.

“Pai?”, ele chamou, um pouco confuso.

Ele se adiantou ao ver o sr. Julius encostado no caminhão em que ele entregava jornais, aparentemente o esperando. Segui logo atrás dele, me aproximando também.

“Boa tarde, sr. Julius.” Ele me cumprimentou com um aceno de cabeça e um leve sorriso, e desviou os olhos para o filho.

“Por que a surpresa? O formulário dizia que eu tinha que ajudar.”

Observei o Chris ficar meio sem graça, e me adiantei para tirá-lo da saia justa.

“É que não achamos que pudesse vir. O senhor é sempre tão ocupado.”

“Arranjei um tempo. Mas tenho que voltar antes das 16h. Então acho que não vai dar para trazer vocês de volta.” Assentimos e eu acrescentei:

“Tudo bem. Eu vou com meu carro seguindo.”

No arranjo dos carros, Chris acabou indo com o sr. Julius. Sorri com a alegria que eu podia identificar em seu rosto. Ele gostava de passar tempo com o pai; o problema era que quase nunca o sr. Julius tinha tempo.

É bom vê-los juntos assim de novo, pensei enquanto dava partida no carro e seguia o caminhão.

 

POV. CHRIS

Admito, fiquei muito feliz por meu pai ter feito o sacrifício de atrasar o trabalho para me ajudar em um trabalho da escola. Não conseguia me lembrar da última vez que isso tinha acontecido.

Fui com ele no caminhão e me senti um pouco mal por deixar a Lizzy só seguindo a gente, mas eu sabia que ela entenderia. Paramos em vários bairros diferentes. Por andar muito pela cidade, meu pai sabia exatamente onde encontrar muitas latas de refrigerante. Ainda não sei porque ele mantinha aquela informação na cabeça, mas foi bem útil para nós.

Cada vez que chegávamos a um ponto onde tinha várias latas, estacionávamos onde dava e descíamos para pegar as latas. Nunca imaginei que uma tarde fazendo trabalho da escola com o meu pai seria tão divertido. Jogamos basquete com as latas, quem fazia mais pontos; Lizzy ficou completamente perdida, mas pude ver que ela também se divertiu. Imagino que deva ter sido meio estranho ver meu pai agindo como alguém da nossa idade; eu mesmo estava chocado, embora não reclamasse. Sentia falta de passar um tempo com o meu pai; quase nunca tínhamos esse luxo, considerando que ele também não era a pessoa mais sociável do mundo.

Mas infelizmente tudo isso passou rápido, e logo ele estava se despedindo da gente depois de termos entregue todas as latas na reciclagem e pego o dinheiro. Era bem perto das 16h e ele realmente tinha que ir.  Depois que o caminhão dobrou a esquina, senti a Lizzy me cutucar levemente as costelas.

“Foi bem divertido hoje, não foi?”

Olhei para ela e assenti, lembrando de repente do que tinha prometido para mim mesmo mais cedo, depois da nossa discussão. Eu contaria a ela. Contaria o que sentia. Eu não podia deixá-la pensar que eu a via como uma irmã. Não estava nem perto da verdade. O problema é que a coragem faltava. As palavras voltavam sempre que eu abria a boca para dizer alguma coisa. Parecia algo impossível de se fazer.

Sua expressão mudou gradualmente de divertida para confusa enquanto continuava me encarando; as sobrancelhas franzidas.

“Chris? Tudo bem?”

Abri levemente a boca para responder, mas minha garganta parecia estar fechada. Meu coração estava acelerado como louco, e respirar tinha virado algo muito difícil. Tentei por mais alguns segundos responder, mas a voz não saiu. Droga… Eu disse que ia falar então eu vou falar!

Juntando o pouco de coragem e determinação que me sobrava, fiz o máximo para me acalmar e conseguir falar.

“L-Liz… Eu… tenho uma coisa para te dizer.”

Ela sorriu, demonstrando curiosidade.

“O que é?”

O brilho dos seus olhos e seu sorriso me deixaram ainda mais nervoso, mas eu já havia decidido que diria a ela, então, falei em um só fôlego:

“E-eu gosto de você.”

Os segundos se arrastaram lentamente, fazendo meu corpo ficar mais tenso a cada instante sem resposta. Ela me encarava estática e com a maior expressão de surpresa que eu já havia visto em seu rosto. Gradualmente ela abaixou os olhos para o chão e suas bochechas ficaram coradas. Ao ver isso, uma ponta de esperança apareceu em meu peito. Ela podia estar gostando de mim também…

Porém minha esperança morreu quando ela ergueu o rosto, sorrindo, e falou com uma voz alegre:

“Eu também gosto de você, Chris”, e beijou meu rosto logo em seguida.

Fiquei sem reação por algum tempo, tentando processar o que ela queria dizer com aquilo. Eu tinha certeza que ela tinha entendido o que eu queria dizer. O olhar para os pés, o rosto corado, a falta de palavras; depois de ler suas reações por tantos anos, não tinha erro. Ela sabia dos meus sentimentos... E, por consideração à nossa amizade, tinha escolhido a forma menos dolorosa de me rejeitar: fingindo que não havia entendido.

Ela foi na direção do carro, mudando de assunto.

“Vamos? Ainda temos que passar na casa de repouso para idosos para entregar a nossa contribuição pelo trabalho.”

Assenti, ainda mudo, e a segui, entrando no banco do passageiro do carro. Evitei ao máximo olhar para ela durante todo o percurso, ouvindo-a falar sobre coisas aleatórias, como fazia quando estava nervosa. Por sua consideração eu gostaria de ter estômago para dizer que estava tudo bem, mas não conseguia, porque na verdade não estava tudo bem. Estava tudo, menos bem. Por isso preferi olhar os prédios passando pela janela do carro, tentando ignorar o porquê de o meu peito doer tanto.

 

***


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Notas finais do capítulo

Então? Já virou foi novela isso aqui, né?
Reviews ^^



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