A Ordem de Drugstrein escrita por Kamui Black


Capítulo 94
Um Breve Momento de Paz - Parte Única


Notas iniciais do capítulo

Leiam as notas finais.



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Capítulo 093

Um Breve Momento de Paz (Parte Única)

Apesar da chuva intensa, os três mestres de elite avançavam em grande velocidade através das campinas que rodeavam o castelo de Drugstrein.

Katherine nunca imaginou que aquilo fosse possível, mas ela aceitou o desafio de avançar todos aqueles quase oitocentos quilômetros acelerando seus movimentos com sua aura e, após quase dois dias de intenso esforço, ela, Kayan e Thays aproximavam-se de seu destino final. Apesar disso, e de sua aura se comparar com a da Cyren em intensidade, ela não conseguiu acompanhar os dois mestres mais novos na investida final e acabou ficando mais de dois quilômetros na retaguarda enquanto eles ganham terreno a sua frente pouco a pouco.

Assim que avistaram o castelo mais nitidamente, o casal parou de correr apenas para recuperar o fôlego. Apesar da aura que envolvi-lhes o corpo, suas roupas estavam encharcadas e aquilo aumentava ainda mais o cansaço físico, então estavam ofegantes quando pararam.

— Acho que deixamos a Katherine bem para trás – comentou Kayan.

— Sim, mas já estamos em casa. Por um momento achei que o granmestre Radamanthys não concordaria que deixássemos o grupo para trás.

— Ele não tem motivo para se queixar disso. Ainda restaram os mestres de elite Joseph e Ashtar, então mesmo que a Ordem de Zeneth pense em reagrupar e atacar novamente, eles terão forças mais do que suficiente para vencer mais uma batalha.

O Atreius desviou seu olhar do castelo para a moça a sua frente e a observou de cima a baixo. As roupas encharcadas aderiam-se ao corpo de Thays e, embora fossem de tecidos grossos demais para tornarem-se transparentes, revelavam muito bem as curvas do corpo feminino.

Sem que ela esperasse, Kayan puxou-a para si, envolvendo-a em um abraço e, posteriormente em um intenso beijo. Quando seus lábios se separaram ele sussurrou em seu ouvido.

— Você ficou muito sensual com as roupas molhadas desta maneira.

Ela, então, sussurrou de volta enquanto colocava sua mão direita entre as pernas do namorado.

— Parece que sim pelo que estou sentindo aqui.

— Pelo menos esperem até entrarem no castelo, vocês dois.

Katherine aproximou-se quase exausta após o esforço para tentar alcançar os dois. Ela passou as mãos pelos próprios cabelos em uma tentativa de remover o excesso de água. Após isso eles caíram sobre suas costas em uma cascata dourada e ainda muito úmida.

— É que já faz quase quinze dias que estávamos separados, Katherine. Acho que você deve entender – justificou-se Thays.

— O pior é que entendo – disse ela em meio a um sorriso. – Quem sabe o Kattus não ganhe um irmãozinho esta noite.

O trio, então, entrou no castelo pela porta levadiça. Devido à chuva, ninguém transitava pelo pátio do castelo e eles tiveram passagem livre para seus destinos; Katherine para a torre dos granmestres; Kayan e Thays para torre dos mestres.

O casal realmente desejava chegar aos aposentos da Cyren, que ficava alguns andares abaixo do de Kayan, sem ser percebido por nenhum outro mestre, então utilizaram um encantamento de ilusão que os deixava invisíveis e torceram para que não cruzasse com ninguém que sentisse a aura dos dois.

Foi em meio a risadas por terem passado despercebidos que os dois entraram no amplo quarto da moça e rumaram diretamente para o banheiro onde poderiam tomar um longo e relaxante banho.

* * *

Três horas mais tarde, após terem um momento a sós e repousarem um pouco, Kayan e Thays subiram até o andar onde ficava os aposentos de Aghata.

Menos de um minuto após o Atreius bater na porta do quarto da mestre, uma senhora perto dos cinquenta anos, mais baixa que Thays e com cabelos cinzentos longos e cacheados apareceu.

— Sinto muito... – uma pausa após ela ver a bainha prateada nos sobretudos do casal. – Si-sinto muito, mas a me-mestre Aghata não deseja visitas.

Foi Thays quem a acalmou.

— Calma, senhora, não precisa ficar nervosa – percebeu que ela suspirou aliviada com aquelas palavras. – Diga para a Aghata que Thays e Kayan voltaram de suas missões e desejam vê-la. Se ela estiver indisposta, podemos voltar outra hora.

— Pode deixá-los entrar, Olivia.

O casal ouviu a familiar voz das Willis vindo de dentro dos aposentos e entrou na pequena sala que continha alguns livros e confortáveis sofás. Enquanto Olivia fechava e trancava a porta novamente, passaram para o próximo cômodo, onde havia um grande guarda roupas, um baú de madeira e uma grande cama em frente a uma janela de vidro onde a chuva se chocava sonoramente.

Sentada sobre uma poltrona e segurando um bebê delicadamente, estava Ayla Gunver, seus cabelos ruivos trançados impecavelmente caindo sobre o sobretudo branco com detalhes prateados.

— Olá Aghata, boa tarde Ayla – cumprimentou-as Kayan.

— Bebê! Bebê!

Thays exclamou enquanto corria e se abaixava próximo a Ayla para brincar com a menina. Kayan aproximou-se atrás da namorada para ver a pequena garotinha ainda com olhinhos fechados e uma pequena mecha de cabelos vermelhos cor de fogo.

— O Spaak deve estar extremamente orgulhoso – comentou ele. – Uma Firyn.

— Acho que isso já era esperado. Nossas duas famílias têm o mesmo prestigio, mas parece que o sangue dos Firyn fala mais alto – respondeu-lhe Aghata, que parecia bastante cansada.

— Ela nasceu ontem? – indagou-lhes Thays enquanto tentava brincar com a menininha.

— Antes de ontem na verdade.

— Mas foi um parto bem complicado – complementou Ayla. – Por sorte era eu quem estava executando-o.

Aghata sorriu com o comentário.

— Ayla tem me ajudado muito. Também pedi exclusividade nos serviços da Olivia, que tem estado em nossa ordem há muitos anos e cuidou de mim quando eu era apenas um bebê.

— E espero viver para cuidar da filha da jovem Sarah também – disse a velha senhora enquanto trazia xícaras de chá para todos os recém chegados e para Ayla e Aghata.

Ao ouvir o nome da filha da Willis, Kayan olhou para a moça com uma expressão surpresa.

— Foi ideia do Spaak. Ele e Sarah não eram realmente muito próximos, mas como ele foi o mestre de vocês quando vocês começaram, ele também sentiu muito quando ela se foi.

— Sarah Firyn. Soa bem para ela – concluiu Kayan.

— Digam-me, por favor, como foi a missão de vocês? – interrompeu-lhes Ayla, não suportando mais a curiosidade. – Todos já retornaram?

— Ainda não. Katherine, Kayan e eu voltamos na frente enquanto o restante tem voltado a cavalo ou em carruagens.

— Nós vencemos completamente o inimigo. Perdemos alguns dos nossos, infelizmente, mas derrotei o granmestre Zilan Marcaw em um duelo e ele não sobreviveu ao nosso confronto. Meu tio enfrentou um grande número de seus mestres e um dos mestres de elite deles também pereceu neste confronto, além de um grande número de prisioneiros.

— Você enfrentou o granmestre de Zeneth, mestre Kayan? – indagou Ayla, surpresa.

— Sim, o número de inimigos era maior que o esperado e acabamos mudando alguns detalhes no último momento.

Ayla permaneceu olhando para baixo por um instante, como se hesitasse em fazer algo. Por fim, engoliu seu orgulho e encarou o Atreius novamente.

— Devo-lhe um pedido de desculpas, mestre Kayan. Sei que no passado já me opus a você mais de uma vez, mas agora percebo o quanto é leal e importante para nossa ordem.

— Não se preocupe com isso, mestre Ayla. Também devo admitir que lhe tratei mal em alguns momentos, além de desafiá-la diversas vezes.

— Isso é verdade. Por mais poderoso que você seja, não deveria ficar desafiando uma mestre de elite.

— Mas todos sabemos que você não é a pessoa mais fácil de lidar em Drugstrein, Ayla – acrescentou Aghata. – E o Kayan também pode ser bem teimoso quando quer.

— O Kayan pode ser um pouco teimoso e agressivo às vezes, mas no caso da mestre Ayla, sempre foi ela quem o provocou.

— Thays, Thays, não deixe as coisas mais complicadas aqui – apesar da reprimenda, o tom de voz de Aghata era o de quem se divertia com a situação.

— Tudo bem, encerremos o assunto por hora – concluiu o mago negro. – Não precisamos ser todos amigos, mas se formos aliados de Drugstrein tudo ficará bem.

Tudo o que Ayla fez para responder àquela afirmação foi acenar afirmativamente com a cabeça e aquilo colocou um ponto final ao assunto.

— Mais tarde a Olivia irá chamar alguns dos servos da ordem para trazer alguma refeição das cozinhas do castelo. Spaak também virá jantar aqui e ficará muito feliz em revê-los e receber notícias de como foi a batalha. Vocês irão esperar, não é?

— Nós tínhamos alguns planos para hoje, mas não fará mal ficarmos algumas horas aqui, não é, Kayan?

— Sim, ficaremos para o jantar.

A expressão que Ayla fez não foi das melhores, mas não havia nada que ela pudesse fazer para impedir que os amigos de Aghata ficassem por ali algumas horas, então teria que ser o mais cordial possível e aceitar a companhia dos mesmos.

* * *

Os dias se passaram tranquilamente em Drugstrein. Os magos e mestres que participaram da batalha retornaram e pouco a pouco as equipes foram reintegradas e novas delas surgiram com diferentes integrantes. As missões voltaram a ser realizadas com cautela, mas raramente havia algum ataque por parte da Ordem de Zeneth.

Naquele momento, Kayan, Thays, Spaak e Arthuro desciam as longas escadarias que conduziam aos pavimentos inferiores do castelo da ordem.

— Aqui é onde fizemos nosso teste para entrarmos na nossa ordem, não? – indagou-lhes a Cyren.

— Exatamente – respondeu-lhe o Magnum. – Mas como lhes expliquei, além do labirinto usado no teste também temos uma área para treinamento reservada.

Conforme conversavam, caminharam contornando as paredes externas do grande labirinto até chegarem a um gigantesco salão subterrâneo. Era totalmente feito de pedras retangulares e sustentado por grandes pilares quadrados de dois metros de largura cada. O comprimento para cada lado devia ser de umas cinco ou seis dezenas de metros e a altura passava dos seis metros. A cada pilar havia lâmpadas mágicas que iluminavam o ambiente.

— Então é aqui que vocês vêm para treinar – afirmou Kayan. – Por isso nunca vemos nenhum granmestre praticando magia.

— Exatamente, mas agora vocês dois também podem vir treinar aqui – disse-lhes Spaak. – Mas acredito que, assim como eu, vocês vão preferir continuar praticando com os amigos.

Apesar de espaçoso, o salão não era um local para se praticar os feitiços mais destrutivos, então os presentes limitavam-se a treinar habilidades que favoreciam o controle de sua aura. Também faziam alguns exercícios que visavam fortalecer a mesma e aumentar a quantidade total de energia disponível para utilizarem em um combate real.

Durante aquele meio tempo, Radamanthys entrou no recinto e foi impossível que sua atenção não se voltasse para o granmestre. O mesmo, entretanto, passou por eles apenas com um simples cumprimento e passou a praticar alguns exercícios a vários metros de distância.

— Então é aqui que meu tio vem para treinar – constatou Kayan, em um tom de voz baixo.

— Sim, e às vezes vamos para as montanhas ao norte daqui para podermos treinar alguns feitiços um tanto quanto mais devastadores – afirmou Arthuro. – Falando nesses feitiços, acho que você poderia me mostrar seu novo feitiço agora.

— Sabia que iria me pedir isso. Só estava esperando – respondeu o jovem mago negro, um sorriso curvando-lhe os lábios. – Pois bem, como já deve saber, é a variação do giudecca sobre a qual teorizávamos há mais de um ano.

Kayan, então, estendeu sua mão direita e uma luz negra começou a se materializar no punho de uma espada, quando ele movimentou a esquerda em uma trajetória horizontal partindo da direita, a lâmina repleta de inscrições surgiu.

Afastando-se um pouco dos presentes, o mago negro girou a espada em sua mão e fincou-a no chão de pedra do subsolo do castelo onde estavam.

— Dá para sentir uma aura bem forte vindo dela – observou Spaak. – Qual o nome do feitiço?

— A aura é forte porque uso aproximadamente um décimo de minha energia total para conjurar esse feitiço. Também consome um bom tanto para mantê-la. Acho que só consigo continuar usando ele por no máximo uma hora com meu poder atual. E ainda não tenho um nome para ele.

— Bem menos que uma hora na verdade, pois você estará lutando e conjurando outros feitiços – complementou Thays.

— Isso é verdade, bem observado – disse ele.

— E como você envia aura para o feitiço agora? – indagou Arthuro ao se aproximar para analisar mais de perto a espada.

— Não envio. Quando separado de mim ela fica em um estado dormente. Apesar disso, mantém a capacidade de causar danos igual a um giudecca durante uns cinco minutos, mas pode ser neutralizado facilmente se algum mago com um mínimo de experiência tentar desfazer o feitiço.

— Imagino que alguém tentando empunhar esta arma em seu lugar também saíra ferido – concluiu Spaak.

— Sim. Fizemos alguns testes com a ajuda dos draconianos. O efeito de segura-la é semelhante ao de receber uma mistura de um durhan crisis com um durhan tangrea. Apesar disso, se o mago em questão conseguir suportar a força da agressão, poderá utiliza-a normalmente. No entanto, ela passará a usar a aura inicial empregada pra conjurá-la e se esvairá em menos de um minuto.

— Ou seja, torna-se inviável – acrescentou Arthuro.

Kayan concordou através de um aceno afirmativo com a cabeça.

Sem quem nenhum dos quatro esperasse, Radamanthys aproximou-se do grupo e passou a analisar o feitiço de Kayan por alguns segundos. Quando deu-se por satisfeito, levou sua mão direita até o cabo da espada giudecca e empunhou-a sem hesitar.

Um esgar de dor transpareceu no rosto do granmestre, mas ele esforçou-se para ignorá-lo e avançou contra Kayan, que, instintivamente, afastou-se e conjurou um giudecca para amparar o golpe vertical que seu tio desferiu com a lâmina negra.

— Radamanthys!

O jovem Atreius exclamou enquanto esforçava-se para se defender dos devastadores ataques intensificados pela poderosa aura de seu tio. Apesar da força empregada, Kayan logo percebeu que seu adversário não possuía muita habilidade com armas e defender-se com seu giudecca não era algo muito difícil. Além disso, por serem lâminas conjuradas pelo mesmo mago, ele sabia que nenhuma possuía a capacidade de destruir a outra.

— Granmestre Radamanthys!

Daquela vez foi Thays quem tentou chamar a atenção do granmestre. Sem entender muito bem o que estava acontecendo, ela chegou a avançar para ajudar o namorado, mas foi impedida por Arthuro.

— Acalme-se. Radamanthys está apenas testando o novo feitiço de Kayan. Não pretende realmente fazer nenhum mal a ele.

O granmestre, então, ainda desferiu mais alguns golpes que foram facilmente amparados pelo giudecca de Kayan. Quando deu-se por satisfeito, fincou novamente a espada no chão de pedra e segurou seu braço direito com a mão esquerda.

— É um belo feitiço o que você tem aqui, mestre Kayan. Ele chegou a ferir até mesmo a mim quando o empunhei, então acho que será praticamente impossível que alguém consiga utilizá-lo efetivamente contra nossos próprios magos.

— Obrigado, granmestre. Levei mais de um ano para aperfeiçoá-lo e acredito que ainda existam pontos onde posso deixá-lo melhor.

Radamanthys concordou com que Kayan dizia através de um aceno com a cabeça. Apesar disso, ele percebeu que o granmestre parecia realmente satisfeito.

— Agora irei procurar a mestre Katherine ou Ayla para que elas curem meu braço.

Ainda segurando o membro ferido, Radamanthys começou a caminhar em direção as escadas que conduziam à superfície. Antes de se afastar demais, porém, virou-se para os presentes e disse algumas últimas palavras.

— Porque não o chama de lammus giudecca? Acho que seria um nome perfeito para seu feitiço.

* * *

A taverna da ordem de Drugstrein estava praticamente vazia naquela noite, apesar disso, alguns dos poucos presentes ainda prestavam muita atenção na pequena mesa de canto onde duas belas magas sentavam-se para apreciar um dos melhores vinhos que o local tinha a oferecer.

— Você conseguiu resolver aquele problema com o seu feitiço, Thays?

— Não é bem um problema, Nathie, e acho que não tem muito como resolver aquilo. As esferas de meu crisis sapris explodem com tudo o que tem e não consigo imaginar um meio de fazê-las serem mais cuidadosos com magos mais fracos.

— Entendo. Foi realmente uma pena o que aconteceu na batalha. Se fosse comigo eu nem sei bem como eu iria reagir.

— Nem me fale. Às vezes ainda tenho alguns pesadelos com aquele garoto e principalmente com a garota que chorava quando ele morreu.

— Muitas coisas tristes aconteceram aquele dia. Ao menos você tem o Kayan para te apoiar.

— Fala isso como se você também não tivesse seu próprio mago negro – devolveu Thays logo após sorver um pouco do líquido carmesim que preenchia sua caneca.

— O meu não é assim tão compreensível – suspirou ela antes de tomar um grande gole de sua própria bebida.

— Não vai me dizer que ele está com ciúmes do Yuren?

— Não sei direito, Thays. O Yuren e eu não éramos realmente próximos, mas ver a morte dele... ele disse o que sentia por mim... eu sempre soube que ele me via com esses olhos, mas nunca me importei. Mas você sabe como sou uma chorona e eu fiquei muito triste com aquilo.

— E o Gorgar ficou com ciúmes de um rapaz pelo qual você nunca sentiu nada e havia acabado de perder a vida – concluiu Thays. – Faz sentido pelo que conheço dele, mas já faz quase duas luas desde então e isso deve ter passado, não?

— Eu não sei. Acho que sim. Nós não conversamos mais sobre o assunto, mas ele esta um pouco diferente. Quer dizer, continuamos fazendo as mesmas coisas de casal e ele continua bastante carinhoso comigo, mas alguma coisa mudou.

Após desabafar com sua amiga, Nathie cruzou os braços sobre a mesa e apoiou a testa nos mesmos, escondendo seu rosto. Ela sentia-se angustiada e fazia um grande esforço para impedir que as lágrimas fossem liberadas.

— Calma, Nathie. Não fique assim.

Thays tentou animar a amiga, levou sua mão direita até os cabelos escuros e encaracolados da amiga e fez-lhe um carinho na cabeça.

— Já sei o que podemos fazer. Vou pedir para o Kayan conversar com ele. Tenho quase certeza de que ele vai explicar o que esta acontecendo para o Kayan e tudo ira se acertar.

— Sério? Obrigada de verdade, amiga!

Nathie, então, quase saltou sobre a mesa para abraçar Thays. Ela fez uma grande confusão derrubando canecas e pratos e a atenção da taverna finalmente se voltou totalmente para a mesa onde as duas estavam.

* * *

O verão havia chegado com força total e o calor fazia com que os dois magos negros suassem enquanto praticavam sua magia nos campos centenas de metros afastados do castelo de Drugstrein.

Já havia se passado mais de uma hora que eles praticavam o feitiço giudecca e aquilo havia os cansado ao ponto dos dois se sentarem em lados opostos de uma mesma árvore e se recostassem na mesma.

— Isso é incrível, Kayan. Tanto você quanto Thays evoluíram muito nesse tempo que vocês ficaram fora.

— Você também evoluiu bastante. O Arthuro também. Vocês têm treinado juntos com frequência, não é mesmo?

— Sim, alguns dizem que meu tio não esta a altura dos demais granmestres e talvez isso seja verdade, então ele tem se esforçado para ficar mais forte.

— A Nathie também evoluiu bastante. Faltou pouco para ela se tornar mestre. A propósito, soube que vocês dois estão tento alguns problemas.

— Hum. Direto ao ponto, você. Aposto que conversou com Thays e ela falou algumas coisas para você.

— Exatamente. Aparentemente você está com ciúmes de um rapaz que já está morto.

— Não estou com ciúmes.

A resposta de Gorgar foi tão abrupta e seca que por um momento Kayan imaginou que ele não iria mais seguir com o assunto. Alguns segundos mais tarde, porém, ele prosseguiu.

— Vê-la chorar por outra pessoa. Por outro homem. Aquilo realmente me incomodou muito. Eu tento esquecer que aquilo aconteceu porque não quero afastar a Nathie de mim, mas toda vez que a veja aquela cena aparece em minha cabeça.

— Você me decepciona, Gorgar – apesar das palavras duras de Kayan, seu tom de voz era mais de divertimento que de repreensão. – Após todo esse tempo com ela e você ainda não conseguiu realmente entender como a Nathie é.

Por um tempo Gorgar limitou-se a suspirar, sentindo-se derrotado. Depois disso, voltou a falar.

— Nunca fui muito bom em entender as pessoas. E as pessoas também nunca foram muito boas em me entender. Isso é diferente com a Nathie, pois ela me compreende e me aceita e eu a amo muito.

— Então vou lhe dizer algo sobre a Nathie que a maioria das pessoas não sabe. Ela é forte, tanto quanto maga quanto como mulher, mas também é uma das pessoas mais sensíveis que eu conheço. Ela te entende porque ela é tem muito empatia com as pessoas em geral. E ela não chorou por causa da morte do mago que foi aprendiz com ela. Nathie chorou porque achou toda a história dele muito triste, o fato dele amar alguém e nunca ter sido correspondido.

— Nunca ter sido correspondido...

— Ele nunca teria a menor chance com ela, com ou sem você, Gorgar. Nathie não gosta desse tipo de rapaz. Ela gosta de tipos como você.

— Você me ofende ao me colocar em um grupo generalizado. Não existem homens como eu.

Kayan não podia ver, pois estava do lado oposto ao de Gorgar, mas o mago negro sorria.

— A Nathie te ama, Gorgar. E se você realmente a ama, deveria se abrir mais com ela. Pare de evitar o assunto e se acerte com ela.

— Não é fácil para mim falar sobre o que estou sentindo para outras pessoas, nem mesmo para ela, mas irei fazer isso.

— Ninguém disse que manter um relacionamento seria fácil.

* * *

Kayan estava em seu escritório na torre dos granmestres. Havia alguns papeis espalhados sobre dois terços de sua mesa e o mago negro analisava alguns deles.

Na terça parte restante da mesa sentava-se Thays. A moça trajava o uniforme de mestre de elite, mas estava descalça e, enquanto apoiava um pé sobre uma parte da cadeira onde Kayan sentava-se, mantinha a perna direita cruzada sobre a esquerda. Ela também analisava algumas folhas de pergaminho.

— O granmestre Aikos me paga. Esse problema é impossível de se resolver.

— Realmente foi bastante esperto da ordem de Zeneth interceptar as moedas de ouro que os reinos de seu território pagam a Drugstrein todos os anos.

— E não vejo nenhuma maneira de resolver isso. Por isso pedi sua ajuda. Não podemos exigir que esses reinos tirem mais do dinheiro usado para se manterem apenas porque a ordem de Zeneth pegou nossa parte.

— Acho que podemos fazer o mesmo com os reinos que estão em nosso território – sugeriu Thays.

— Já foi feito. O granmestre Radamanthys tomou essa providência assim que soube o que eles haviam feito. Alguns reinos já haviam enviado o dinheiro, mas a maioria foi interceptada.

— Então acho que estamos na vantagem. Nosso território é muito maior.

— Realmente acabamos com uma arrecadação maior esse ano. Mas o granmestre Aikos ainda quer que eu encontre alguma maneira de reaver o que nos foi tirado. E se isso não for possível, impedir que isso volte a acontecer no futuro. Mas não consigo pensar em nenhuma solução viável.

Alguns minutos de silêncio se passaram enquanto o casal analisava os documentos e tentava imaginar alguma solução. Nesse meio tempo, ouviram rápidas pancadas na porta e uma voz conhecida.

— Kayan... – chamou, timidamente, a pessoa atrás da porta. – Podemos conversar por alguns minutos, ou você está muito ocupado?

— Entre, Karzus.

Enquanto a porta se abria, o Atreius organizou os papeis sobre sua mesa e Thays virou-se, para poder ficar de frente para o rapaz que entrava na sala. Apesar disso, manteve-se sentada sobre o móvel de maneira bem descontraída.

— Boa tarde mestre Kayan, mestre Thays – disse ele, sem jeito. – Estou atrapalhando alguma coisa? Se quiserem posso voltar mais tarde.

— Não estávamos fazendo nada do que você possa estar imaginando, Karzus – disse-lhe Thays, rindo. – Apenas tentávamos encontrar uma solução para um problema. A propósito, parabéns pelo título de mestre. Você ficou bem com esse sobretudo.

— E também não precisa ficar nos chamando de mestre o tempo todo. Pelo menos não em ocasiões não formais. Vamos, sente-se – disse Kayan, apontando para uma cadeira na frente de sua mesa.

— Hum... vou pegar mais uma cadeira ali porque quero que você conheça uma pessoa.

O casal entreolhou-se curioso, mas aguardou que o rapaz preparasse a sala e voltasse para dentro dela com uma garota baixa, magra e com longos e lisos cabelos tão escuros quanto a noite.

— Olá me-mestre Kayan, me-mestre Thays – cumprimentou-os timidamente.

— Esta é Alys. Ela tem quinze anos e tornou-se maga de Drugstrein ano passado. Foi a terceira de sua turma de aprendizes e recebeu tutoria do mestre Luan Gastler. Com três luas sua equipe foi aprovada e ela liderou-a até pouco tempo atrás. Agora ela e mais uma maga branca fazem parte da minha equipe.

Antes de continuarem, os dois sentaram-se da maneira mais confortável que o nervosismo lhes permitia. A garota olhou para Karzus e este assentiu para que ela continuasse. Antes de falar, porém, a mão direita de Alys deslizou sobre a esquerda do Mirl e ele a segurou com delicadeza.

— Meu sobrenome... o nome de minha família é Kirrel.

Ela fez uma pausa para analisar a reação de Kayan. O mestre, por sua vez, colocou ambos os cotovelos sobre a mesa, uniu as mãos e apoio o queixo sobre as mesas. Passou a olhar a garota de maneira intrigada que sugeriu que ela deveria prosseguir.

— Minha família tem como esfera primordial o crisis e já fomos muito influentes em Drugstrein. Durante a rebelião negra, alguns dos nossos pereceram, inclusive os país de Dougan Kirrel, que era muito pequeno na época.

— Minha mãe, adotou-o após isso e passou a criá-lo junto com meu irmão alguns anos antes de eu nascer. Tanto ela quanto meu pai sofreram muito quando Dougan traiu a Ordem de Drugstrein e tornou-se um renegado. Eu também fiquei bem triste, pois o via como um irmão mesmo ele sempre me tratando meio mal.

Alguns segundos de constrangedor silêncio tomaram conta da sala antes de Kayan quebrá-lo.

— Mostre-me seu durhan crisis.

Karzus demonstrou alguma surpresa pelo fato de Kayan ter unido os pontos tão rapidamente. Alys, porém, parecia já esperar por isso.

— Tentei esconder minha esfera primordial por muito tempo por medo de que achassem que eu iria me tornar uma traidora assim como meu primo. O único para quem contei foi Karzus. E gora vocês dois.

O olhar da garota passou de Kayan para Thays em meio a uma suplica silenciosa.

— Seu segredo estará seguro conosco pelo tempo que você desejar. Guardei o segredo de Kayan por alguns anos e farei o mesmo por você – afirmou Thays em meio a um sorriso.

Alys voltou a olhar para Kayan, que não disse nenhuma palavra. O mago negro apenas continuou a observá-la com um meio sorriso nos lábios. A Kirrel, então, respirou fundo e levantou-se da cadeira.

— Eu não sou muito boa nisso.

Apesar das palavras, Alys estendeu a mão direita a frente do corpo e chamas negras de quase meio metro de altura surgiram, mudando totalmente a tonalidade de cor da sala.

— Falta refinamento, mas você mostra muito potencial. Consegue formar uma esfera?

A garota assentiu com a cabeça e passou a se esforçar para cumprir o pedido. As chamas começaram a se tornar mais compacta e, embora um tanto quanto instável e de forma pouco definida, uma esfera de chamas negras se formou flutuando sobre sua mão.

— Está melhor do que eu – afirmou Thays.

— Você já é boa demais na esfera da luz, se também fosse boa na esfera da destruição acho que você poderia se tornar um objeto de estudo.

Após o comentário de Kayan, Thays mostrou-lhe a língua em meio a um sorriso, como se ainda fossem duas crianças.

— Ela é talentosa, Kayan, acredite em mim. É muito boa com a esfera do gelo e da terra e também consegue manipular muito bem as demais delas.

— Muito bem, Alys, a partir de hoje você pode me considerar como seu mestre. Darei um jeito de arranjar um tempo para lhe ensinar a cada uns três ou quatro dias. Enviarei uma mensagem lhe chamando e pode ficar despreocupada que isso ficará apenas entre nós até você se sentir preparada para contar a todos sua verdadeira esfera.

Um largo sorriso se abriu no rosto de Alys e isso deixou a garota ainda mais bonita. Ela saltitou de alegria enquanto agradecia.

— Obrigada, mestre Kayan! Ah, também fiquei muito feliz em conhecer o casal mais comentado de Drugstrein.

Dizer aquilo de maneira tão espontânea deixou-a encabulada, então seu rosto enrubesceu e a garota saiu rapidamente da sala.

— Casal mais comentado de Drugstrein... – repetiu Thays, um tanto quanto incrédula.

— Obrigado, Kayan. E nem precisamos pedir isso para você descobrir minhas intenções. Até mais tarde.

— Espere, Karzus.

O rapaz parou a meio caminho até a porta e virou-se para Kayan, mas foi Thays quem lhe fez a pergunta.

— Alys não é apenas sua companheira de equipe, não é mesmo?

O rapaz não respondeu imediatamente e limitou-se a coçar o queixo meio encabulado.

— Ainda não temos nada oficial, mas estamos nos conhecendo melhor.

— Parabéns aos dois – disse-lhe Kayan. – Vocês formam um belo casal.

— Obrigado.

— Alias, Alys já sabe preparar a poção da lua? Eu posso ensiná-la se ela não souber.

Assim que ouviu a proposta de Thays o rosto de Karzus assumiu um tom quase totalmente rubro. Sem jeito ele tentou responder.

— Vo-vou falar isso para ela.

E apressou-se em sair da sala antes que a Cyren conseguisse deixá-lo ainda mais constrangido.

— E agora? Voltamos ao trabalho?

Kayan pensou por alguns segundos antes de lhe responder.

— Não. Coloque seus sapatos. Vamos saltar por aquela janela e fugirmos do trabalho por hoje. Temos que nos mantermos como o casal mais comentado do castelo.

Rindo, ela fez como ele sugeriu e saltou da mesa. Haveria muito o que fazer pela frente, mas o restante daquele dia seria apenas diversão para Kayan e Thays.


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Notas finais do capítulo

Antes de mais nada, devo agradecer imensamente os que têm me acompanhado até aqui e pedir um milhão de desculpas.

Como podem ver, a história se encaminha para seu final, casais estão se fechando e inimigos sendo derrotados. O grande problema é que não consegui escrever sequer um capítulo de A Ordem de Drugstrein este ano, e fiquei muitos meses sem escrever nada, apenas retomando um outro projeto recentemente.

Ter alguns bloqueios - eu não diria bloqueios, seria mais como não ter vontade de escrever e caso eu force, tudo sai ruim - é comum para mim, e é por isso que posto um capítulo por mês, deixando vários deles engatilhados na reserva. Mas agora que estamos chegando no final, aquilo que eu tinha imaginado lá no inicio não me parece mais interessante agora.

O que quero dizer é que prefiro deixar a história em hiatus do que dar um final bosta (serie Game of Thrones, estou olhando para você, e ansioso para os últimos livros redimirem a história).

Por isso peço desculpas, já que não sei quando conseguirei voltar a escrever e finalizar A Ordem de Drugstrein de uma maneira satisfatória. Apesar disso, aos que chegaram até aqui, se desejarem, posso dar-lhes um spoiler da finalização da história. No caso, o finalzinho mesmo. O epilogo, no caso, não o caminho deste ponto até lá (o que não me parece bom é a resolução dos principais vilões: Hantred Eisen e Sellene Rovkraz, como os personagens terminam me parece o ideal com o que imaginei lá no inicio - não tão no inicio, já que Thays e Kayan não foi exatamente planejado, apenas aconteceu).

Enfim, caso queiram, basta mandar um PM para mim que responderei o que quiser saber sobre o final.



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