Destinados escrita por Tsuki Dias


Capítulo 10
9 - Cântico de Sangue Pt.2


Notas iniciais do capítulo

Só um recadinho: Os capítulos podem demorar um pouquinho mais para sair, por motivo de escola. Mas não se desespere porque o Mikki não vai te abandonar. JAMAIS!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/582684/chapter/10

Me diga. – a voz de Mikhil ecoava na escuridão gelada de sua mente, enquanto uma pressão calorosa e desesperada comprimia o ponto onde seria sua mão.

– Ah, Mikhil... Mesmo que eu quisesse, não poderia te dizer. lamentou-se no escuro, desfrutando da sensação gostosa que aquele aperto lhe causava.

Por favor, Kira... Me ajude... – o desespero na voz dele era comovente e queria poder responder, queria poder apertar a mão dele de volta e contar que tipo de feitiço a colocara nos braços da morte. Queria contar, de verdade...

Mas quanto mais tentava se comunicar, mais rápido morria.

Por favor...

– Sinto muito... – murmurou com tristeza, tentando conter as lágrimas que ameaçavam cair.

Não acha que está cedo demais para desistir, Kira? – uma voz feminina soou em sua cabeça, oculta na escuridão. – Com certeza, é muito cedo.

– Infelizmente, não há o que eu possa fazer. Queria não ter chegado a esse ponto.

Se chegou a isso, é porque tinha que chegar. – a voz respondeu seriamente. – Mas você ainda tem muito trabalho pela frente.

– Elas poderão continuá-los.

Não poderão, não. Elas não são você.

– Eu não sou eu.

É mais do que as outras.­­ – a voz a alertou, deixando-se ecoar. – Não pode morrer agora.

– Meu destino é morrer.

Como o de todos, mas não hoje.

Vá comer algo, Mikki. Ficarei com ela. – a voz de Lissa ecoou em sua cabeça.

Eles precisam de você, Kira. Os três. Deixe que Mikhil a ajude.

– Estou acabada. – suspirou cansada, observando os pontos onde seus membros deveriam estar. – Realmente acabada.

Ainda há tempo.

– Não mais... – e ela chorou amarga, constatando que seus sonhos não passavam de desejos infantis e impossíveis. Seu avô sempre tivera razão. – Não mais...

O que vou fazer agora, Kira, vai ter um preço muito grande. Espero que esteja preparada para pagá-lo.

– O quê? – perguntou aos soluços, sentindo a falta dos braços que a maldição levara.

E então, um braço pálido surgiu da escuridão e se enterrou no tronco de Kira, alcançando algo mais além que o coração em seu peito. Algo de que sentiria falta eternamente.

Você vai viver, Kira. – a voz falou.

E Kira gritou de dor.

–-**--

– Você não parou um minuto desde que a trouxe. – Rany acusou preocupada. – Precisamos de você bem para cuidar dela.

– Não posso perder um segundo sequer... – Mikhil respondeu com firmeza, ainda segurando a mão de Kira. – Tenho que curá-la.

– Se tem algo que aprendi com minhas dissertações para a faculdade, é que as coisas vêm mais rápido quando não nos forçamos a pensar nelas. – ela sorriu, pousando a mão no ombro dele. – Vá comer. Kira ainda estará aqui quando voltar.

– Meu medo é que não esteja. – murmurou desolado, se levantando pesadamente. – Pegarei algo na cozinha. Fique com ela um momento, sim?

– Sempre.

Mikhil olhou uma última vez para Kira e suspirou cansado, antes de soltar-lhe a mão com delicadeza. Com a visão periférica, viu seu braço cair devagar enquanto se virava para sair do cômodo. Mas algo o impediu. Com um movimento rápido, Kira agarrou a manga de sua blusa negra e puxou-o com força para perto da cama novamente.

O que viu naquele rosto, não era a Kira. Os olhos dourados deram lugar a dois poços negros de terror e agonia. Olhar para eles era ser sugado para algum lugar do submundo, onde somente as piores almas seriam jogadas. Que Hades o ajudasse, mas algo o puxava para aquele buraco negro e precisava desesperadamente saber o que haveria naquele espaço. Não só por ser literalmente o fundo dos olhos de Kira, mas por saber que encontraria uma resposta ali.

E sem mais delongas, deixou-se puxar para a escuridão.

Imagens disformes passaram por seus olhos e teve a sensação de queda, como se estivesse caindo pelo buraco do coelho. Memórias e momentos gravados na mente de Kira se distorciam num vórtice de informações irrelevantes para o momento, girando para baixo e sendo sugados por um ponto de vácuo, como num grande redemoinho.

E depois que todas as outras foram sugadas, a imagem que se fixou a sua frente mostrara o momento que precisava conhecer para desvendar o caso: Kira sendo amaldiçoada. Quando a salvou naquela hora, tinha interrompido o processo e criado uma chance ínfima de ajudá-la, mesmo que tivesse causado momentos intermináveis de dor e agonia.

Mas de todos os que existiam... Por que justo aquele cântico infernal?

– Mikhil? – a voz de Rany ecoou em seus ouvidos e o trouxe de volta à realidade. – O que foi?

– Eu sei. – ele balbuciou, olhando a imagem de Kira inalterada, como ela estava momentos antes de ter aquela revelação, como se nem ao menos tivesse se movido. – Eu sei como curá-la...

– Como? – a moça perguntou confusa, vendo suas mãos brilharem quando as flutuou sobre o corpo da prima, deixando-a levemente luminosa. – Mikhil!

– Isso a manterá por um tempinho. Venha, Rany. – ele pediu, agarrando a mão dela e arrastando-a para o andar debaixo. – Não temos tempo, precisamos acabar com isso hoje.

– Onde é o incêndio? – Dgrov perguntou confuso, encontrando-os na sala.

– Vou curar Kira. Hoje.

– Mas como vai fazer isso? – Rany perguntou aflita.

– Já sabe o que ela tem? – D. perguntou enquanto os acompanhava para o escritório.

Agora eu sei. – Mikhil revelou, soltando a mão de Rany e se pondo a garimpar os volumes mais velhos de sua coleção. – É um feitiço parasita. Essa maldição que a consome é rara, poderosa, terrível e proibida. Até hoje nunca tinha visto essa forma primitiva e agressiva, só vislumbrei sua versão mais branda e medicinal. Como mães mantendo bebês prematuros, irmãos e irmãs, casais... Pensem nisso como um transplante de órgãos ou transfusão de sangue, mas ao invés de doar um rim, você doa parte da alma, literalmente.

– Quer dizer que Kira está doando para alguém?

– Doando não, sendo roubada. Parasitada, na verdade. – explicou preocupado, puxando um livro colossal de uma pilha alta. – O mago que está fazendo isso, fez o feitiço para sugar a vida dela para ele mesmo, preciso cortar o laço antes de fazer qualquer outra coisa. Posso machucá-la se machucá-lo.

– E o que acontece com a vida dela? A parte que foi tirada?

– Ficará tudo bem se... – ele parou de falar quando seus olhos encontraram a página que estava procurando. – Não...

– O quê? – Rany se aproximou do livro e leu-o quando Mikhil se afastou abalado. – Você pode fazer isso?

– Fazer o quê? – Dgrov perguntou. – Droga! Pode salvar a Kira ou não?

– Eu posso... Mas estaria quebrando todos os códigos e juramentos que fiz quando me tornei Curador. – a angústia transparecia em sua voz.

– Você já quebrou o juramento que fez a ela. Jurou protegê-la! Não percebe sua hipocrisia?

– Eu... Eu teria que fazer mais que apenas matar esse homem e teria que fazer mais que curar a Kira. São práticas proibidas!

– Você deve isso a ela, não se esqueça disso.

Silêncio. Mikhil encarava o jovem com desalento. Havia abandonado a vida de assassino há tanto tempo e definitivamente não pretendia voltar a ela. Quando fizera os votos da Ordem da Cura, nunca ficara mais feliz por se redimir e limpar o sangue que tinha nas mãos. E durante todo aquele tempo, seguiu as regras à risca: foi bom (a maior parte do tempo) e obteve respeito; estudou e criou; tratou dos feridos e cuidou dos doentes; se aperfeiçoou e não se deixou abater pela morte; e principalmente não mentiu nem traiu ninguém, assim como jurara à ceifeira naquela noite de fuga e libertação.

Até Kira entrar em sua vida.

– Mikhil, – Rany chamou apreensiva. – O que vai fazer?

– Vou salvá-la.

–-**--

O mago observou sua sombra pelo vidro do espelho. Ele estava sentado numa cadeira perto da entrada da tenda, com o olhar vazio o observando enquanto montava guarda e se mantinha vigilante, ouvindo a barulheira que as tropas faziam em volta da fogueira, feita com os restos dos mortos da fuga do dia anterior.

O efeito do feitiço que lançara naquela menina ainda vigorava e em poucas horas estaria finalizado. A força que o preenchia era imensa e inteiriça e percebera que logo nos momentos iniciais, o vigor que corria nas veias daquela menina o tomara por completo. Ah! Que inebriante fonte de energia ela era! Tão jovem e forte que nem mesmo seu melhor homem pudera subjugá-la. Foi realmente uma sorte tê-la achado em um estado tão debilitado, caso contrário, suas sombras não teriam sido páreas para ela.

– É incrível. Nunca pensei que existiria alguém forte o bastante para me alimentar... – comentou maravilhado, observando-se no espelho. – Mais algumas horas e serei imortal novamente. Nunca mais precisarei desses vermes fracos que o Tirano me manda.

– De fato.

– As tropas estão prontas para partirmos amanhã?

– Sim.

– Ótimo! – ele parou um momento, prestando atenção nos sons da noite. – Está quieto demais. Não acha, servo? Servo?

A Sombra não respondeu, continuou parado no lugar em que estava observando-o estático. O mago se aproximou lentamente, chamando o servo com preocupação crescente. Não pela integridade do soldado, longe disso, precisava saber o que havia antes de gastar energia conjurando feitiços.

– Diga algo, servo!

Um fio de sangue circundou a cabeça da sombra, dando continuidade pelo resto do corpo dele, jorrando sangue aos pés do mago, antes das partes se separarem do corpo e desmontarem ao chão, como um horrendo quebra-cabeça tridimensional.

– Acredito que isso seja obra sua, meu caro assassino. – o mago falou alto, movendo as mãos para conjurar alguma magia de ataque. – Foi admirável, com certeza. Mas o que quer aqui? Pela sua técnica, creio que seja um aliado.

Uma sombra negra entrou devagar pela porta, envolta em uma trama de fios prateados que se moviam suavemente ao redor de seu corpo. O capuz mal permitia ver seu rosto, mas o brilho de seus olhos se distinguia na escuridão, abrigando uma sombra escura que se projetava em sua sede de matança. Um era verde intenso e o outro vermelho. Mais vermelho que o sangue que escorria do corpo mutilado da sombra que o servira.

– Eu me lembro de você... O jovem recruta! – o mago exclamou surpreso. – Pensei que tivesse morrido depois do fiasco na capital. Por que fez isso? Por que aniquilou todos aqui?

– Você tem algo que não lhe pertence. Vim pegar para devolver a ela. – Mikhil anunciou sombrio, movendo as mãos enluvadas com suavidade, fazendo seus fios prateados dançarem no ar, refletindo a luz das lâmpadas acesas no cômodo.

– Vejo que veio reparar o erro que cometeu. – uma energia poderosa circundava o corpo do mago, apresentando-se com aparência de chamas. – Mas não vai ter sucesso.

– Já tive sucesso. – Mikhil se aproximou perigosamente, fazendo o outro recuar temeroso. – Eu só queria ouvir uma coisa.

– O quê?

– Seus gritos de agonia. – ele falou antes de enterrar a mão no peito do mago. – Mais altos e mais aflitos do que os que eu ouvi dos lábios dela.

– Ela... Ah! Ela deve ter gritado muito! – o riso que estampou a boca sangrenta do mago reverberou nos ouvidos de Mikhil com descaso.

– Não. Ela não gritou nem uma vez sequer. – Mikhil apertou a mão em torno do osso externo daquele corpo e quebrou-o, arrancando gritos do mago aos seus pés. – É por isso que quero ouvir você gritar.

E foi assim que a sinfonia perturbadora começou. Os gritos do mago reverberavam pela noite que caía vermelha, refletindo o sangue derramado mais cedo. As carcaças ainda frescas atraíam carniceiros selvagens e o banquete foi bem aproveitado, afinal, nenhuma parte cristalizou para proporcionar à alma uma passagem rápida e indolor. Mikhil garantira isso, garantira que o sofrimento daqueles patifes prolongasse nas refeições dos animais.

Mas o sofrimento maior estava dentro da tenda.

A tortura não se dava apenas no corpo do mago – que infelizmente parou de gritar –, Mikhil trabalhava devagar e eficazmente no espírito daquele infeliz, retirando cada filamento roubado da alma de Kira com um sorriso no rosto. Nem todos os curadores podiam fazer coisas assim, podia-se dizer que aquele dom fora descoberto graças à maldição que carregava. Mas graças a ela, também, que seu tormento seria maior quando tudo acabasse.

– Kira... – sussurrou para si mesmo quando retirou o último filamento luminoso daquela alma escura e imunda.

Observou aquele ponto de luz entre seus dedos com admiração, reparando em cada nuance em seu brilho forte e multicolorido, que se movia tão suavemente que parecia estático aos olhos destreinados. Era tão lindo... Tão frágil...

Esmague-a, Mikki. Esmague essa menina que tirou sua paz. – aquela maldita voz ecoou em sua cabeça, como vinha fazendo desde sempre. – Aperte as mãos e acabe com o sofrimento que você causou a vocês dois.

Mikhil não deu ouvidos àquele eco de sua cabeça. Simplesmente se levantou e, aconchegando a esfera brilhante contra o peito de forma protetora, deu as costas à carcaça destroçada do mago e se afastou, indo para a saída daquele lugar profano.

– Você... Perdeu... – a voz do mago soou fraca num último suspiro antes da alma perder de vez o controle do corpo destroçado.

Ah, não! – pensou alarmado, abandonando rapidamente aquele acampamento dos infernos e se pondo a correr o mais rápido que podia pelas árvores. Tinha que chegar antes que Kira morresse, tinha pouco tempo.

Muito pouco.

–-**--

– Rápido Leo! Traga mais água! – Lissa gritou alterada, enquanto encobria o corpo da prima com os unguentos que Mikhil deixara antes de sair. – Ai, meus físicos! Não vamos conseguir!

– Rápido! Rápido! – ele gritou ao irromper o quarto trazendo mais água. – Oh, meus deuses!

Os esforços dos dois estavam se mostrando infrutíferos. Tinha dez minutos que os cristais estavam tomando o corpo de Kira e já haviam perdido os braços e pernas. A marcha cristalizadora prosseguia rápida e antes que eles pudessem fazer algo, parte do tronco e da cabeça já estava tomada. Não sabiam mais o que fazer, não tinha mais o que fazer, a prima estava morrendo rápido demais e temiam que Mikhil não chegasse a tempo de salvá-la.

O que parecia ser o caso.

– Leo... Ela está... – Lissa balbuciou com a voz embargada, olhando o rosto de Kira com os olhos marejados. – Ela vai...?

– Continue tentando, Lys! Continue! Continue... – ele murmurava derrotado, mesmo que continuasse fazendo massagem cardíaca no corpo quase todo cristalizado da prima. – Céus...!

– Kira! Não morra, não morra, não... – Lissa pedia aflita, vendo a camada de cristal quase encobrir o rosto e o coração da prima. – KIRA!

No momento em que Kira fora quase toda tomada, Mikhil irrompeu pela porta, sem se despir da roupa cheia de sangue muito menos de suas luvas negras que produziam os fios de prata. Sem perder tempo, ele abriu espaço entre os jovens desesperados e cobriu Kira com seu corpo, capturando seus lábios frios, antes que a necrose a dragasse.

O silêncio reinava no quarto enquanto eles ficavam ali, parados na posição em que estavam. Lissa estava sentada no chão, no mesmo lugar onde caíra quando saiu do caminho do médico, Leo estava parado do outro lado da cama, vendo a cena mais próximo do que gostaria. Não era um beijo que Mikhil dera em Kira, pelo menos não com segundas intenções. A expressão dele, embora os olhos fechados, não delatava nada, além do desejo de salvá-la. E o mesmo que revelasse, o que viu a seguir tirou qualquer dúvida de sua mente. Uma pequena luz brilhou dentro da boca dele e desceu à dela, preenchendo aquele corpo de cristal com aquele brilho intenso, projetando pontos coloridos nas paredes, como num grande caleidoscópio.

Mas, nada mais aconteceu.

Mikhil se separou de Kira logo após o brilho ter cessado, observando aquela face vítrea com expectativa. O silêncio reinava e os minutos corriam enquanto esperavam que algo acontecesse. Que ela revivesse milagrosamente, que abrisse os olhos dourados e começasse a distribuir sermões para os primos e golpes para o médico. Esperavam que aquelas pedras caíssem de sua pele e revelasse outra por baixo mais bonita e luminosa como se tivesse renascido. Que seu cabelo ressurgisse mais bonito que antes e que seus olhos amarelos voltassem mais brilhantes. Mas se dissessem isso em voz alta, estariam mentindo. Esperavam apenas que ela sobrevivesse, que não demorasse a acordar e que aquela camada vítrea desaparecesse logo de sua pele.

Era só isso que esperavam.

– Mikhil... Ela...? – Rany perguntou aflita, vendo-o se afastar com os olhos marejados. – Não...

– Ah, Kira... – Dgrov lamentou, enterrando a cabeça nas mãos, tentando controlar a vontade de chorar. – Kira...

Mikhil não disse nada, afastou-se e sentou-se na cama, de costas para aquele corpo. Rany havia dado a volta para chorar nos braços de Dgrov, então não teria testemunhas diretas para a tristeza que sentia. Pousou as mãos sobre os joelhos e baixou a cabeça, deixando rolar as lágrimas que brotavam, apesar de seus esforços para parecer profissional.

Sofra, Mikki, sofra. Abrace sua culpa. – a voz ecoou em sua cabeça, numa gargalhada assustadoramente satisfeita. – Você sempre arranja novos jeitos de me divertir, companheiro.

Calado. – pediu desolado, apoiando a testa em uma das mãos. – Fiz o que pude...

Vamos, Mikki! Ainda tem mais dois para você usar. Quem vai ser primeiro? O rapaz ou a menina? Já sei! Faça-o ver! Bem sabemos que faz muito tempo desde a última vez...

Já disse para calar a boca! – gritou em pensamento, deixando-se tomar pela tristeza.

– Mikhil...? – a voz de Dgrov soou estranha ao chamá-lo.

Deu-se um momento antes de responder e sobressaltou-se quando algo puxou sua camisa. Virou-se para a cama, ao som intrigante de rachaduras, e se surpreendeu com o que viu: o braço de Kira, esticado em sua direção, com os dedos cristalizados agarrados fortemente à sua camisa. Pegou aqueles dedos e analisou-os rapidamente, distinguindo a pele dela sob aquela camada de cristais. A cada movimento de seu corpo, as pedras se desprendiam e caíam como água da chuva sobre as flores. O som dela se mexendo ecoava pela casa, revelando a Mikhil uma esperança que nunca se permitira sentir em casos como aquele.

– Ela...? – Rany balbuciou, tomando a outra mão da prima, fazendo mais cristais se desprender de seu braço. – Mikhil ela vai...?

A ansiedade do médico o impedia de responder. Levou as mãos ao rosto de Kira e afagou-o com cuidado, retirando cada centímetro daquela camada de cristal. O suspiro veio ruidoso e ávido, mandando ar para dentro dos pulmões e revivendo de vez. Observar Kira voltar a respirar fez o homem quase chorar na frente dos primos dela. Com uma prece de agradecimento nos lábios, baixou a cabeça e agradeceu a todos os deuses por terem poupado aquela vida tão preciosa.

– Mikhil? – Dgrov chamou. – O que podemos fazer agora?

– Esperem. – pediu, pegando Kira nos braços e levantando-a da cama, provocando uma espetacular chuva de pedras coloridas sobre a cama e o chão.

– Você não perde a oportunidade de tê-la nos braços. – ele comentou com um sorriso.

– Não é só por isso. – sorriu de volta, se preparando.

Uma onda de energia varreu o quarto, enquanto Mikhil liberava mais e mais. Aquelas ondas o enredaram e em um piscar de olhos, ele e Kira estavam totalmente imersos em uma aura azulada que fluía como chama. Os olhos de Mikhil estavam fixos no rosto da moça em seus braços, enquanto seus lábios se moviam delicadamente em uma prece. A pressão energética dentro do quarto aumentava a cada palavra que ele dizia e quanto mais perto ele chegava dela, mais brilhantes ambos ficavam.

– Volte. – foi o que ele falou antes de tocar os lábios dela com os seus novamente.

O brilho cegou os jovens por alguns momentos antes de se dissipar e toda a energia que havia no quarto sumir tão repentinamente quanto aparecera. Leo e Lissa demoraram um momento antes de distinguir o que acontecia, quando puderam ver claramente, Mikhil havia devolvido Kira para a cama e, depois de afagar os cabelos curtos, se afastou com pesar, olhando-a com um misto de alívio, alegria e dor.

– Devolvi-lhe o sopro da vida. – revelou um tanto cansado, sem conseguir evitar se apoiar na cômoda ao lado. – Ela vai ficar bem daqui por diante. É só esperá-la acordar.

– O que podemos fazer agora? – Lissa perguntou aliviada.

– Cuide dela como ensinei. E, evitem danificar esses cristais, ainda podem estar ligados a ela. Juntem e guardem até que acorde. Não vai demorar muito.

– E você? – D. indagou preocupado. – Você está pálido.

– Vou seguir meu próprio conselho e descansar um pouco. Foi uma noite e tanto. – ele riu cansado, rumando para a porta. – Se precisarem de mim, estarei lá embaixo.

– Ei. – Dgrov chamou. – Obrigado. Você a salvou.

– Eu devia isso. – e ele saiu, fechando a porta atrás de si.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Edição feita em 25/04



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Destinados" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.