Smother escrita por stardust


Capítulo 12
Jealousy and nothing more




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Ela tirou a cabeça do meu ombro, colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e pegou um cigarro. Me ofereceu uma tragada, e então aceitei.
“Podemos estudar amanhã? Eu realmente preciso”, ela propôs. Coloquei o cigarro na boca e assenti.
“Claro”, respondi. Ela suspirou e olhou para o céu. A lua estava cheia, com várias estrelas a sua volta. “E aquele livro?”, perguntei, lembrando do que tínhamos achado naquela casa abandonada e cheia de poeira.
“Podemos aproveitar pra ler um pouco dele... e de outros, se você quiser.”
“É... parece bom.”
“Que tal um assunto mais descontraído?”, ela sugeriu. “Tinha uma menina na minha escola que era bastante estranha... Ela tinha um sapo de estimação, só escrevia em letras maiúsculas e usava duas trancinhas.” Eu ri, imaginando a cena. “Ah, e ela comia os chicletes velhos que achava grudados embaixo de carteiras.”
“Eca”, exclamei. Emma riu também. Seu sorriso de verdade parecia capaz de melhorar o mundo, e era pena que não fosse muito frequente. “Você se lembra do Thomas Palmer?”
“Meu Deus, lembro”, ela disse entre uma risada.
“Então... Numa das provas do final do ano passado, ele estava bem nervoso. Tipo, realmente nervoso... Tanto que ele começou a passar mal e vomitou no meio da classe”, contei, me lembrando de cada detalhe do dia. Talvez fosse meio cruel rir disso, mas não tenho culpa, não é? “Mas o pior é que ele vomitou na professora Ruby.”
“Olha, se é aquela que dava aula para nós... Ela mereceu! Parecia uma bruxa, sempre encarando a gente como se quisesse arrancar nossas cabeças.” Depois de Emma falar isso, rimos até nossas barrigas doerem. Começamos a relembrar mais fatos engraçados, até o sol começar a aparecer. Aproveitamos para tomar um café, já que a cafeteria acabara de abrir.
“Viramos a noite aqui”, ela disse, dando um gole no café.
“Minha mãe vai me matar... ou não”, respondi, jogando o meu copo vazio no lixo.
“A minha nem vai ligar. É um alívio pra ela.”
“Claro que não”, eu disse, franzindo a testa. Emma ergueu as sobrancelhas e umedeceu os lábios.
“Ela me disse tanta coisa, você nem faz ideia. Não só hoje.” Ela jogou o copo no lixo também, e começamos a andar.
“Por exemplo?”, perguntei.
“Só pra exemplificar...” Ela limpou a garganta e imitou a mãe. “Por que você anda tão insuportável? Eu não sou obrigada a te aguentar. Não tenho culpa de tudo, sabe, Emma? Na verdade, a culpa é sua. Você que me enche tanto. Deveria sair logo daqui... Ah, seria ótimo? Então vai, some e não volta!” Ela me olhou como quem diz “Viu? É desse jeito”.
“Ok, eu não sabia. Mas ela está errada.”
“Na verdade, não está”, ela respondeu, com um suspiro profundo. Ela se levantou, indo até o corrimão da ponte. Fui atrás dela.
“Claro que sim! O que tem de certo nisso?”, perguntei. Emma pegou uma pedrinha do chão e jogou na água, fazendo-a pular algumas vezes até afundar.
“Quer em ordem alfabética?”, ironizou, pegando outra pedrinha. Ri de modo sarcástico.
“Ah, claro que é sua culpa. Óbvio. Claro que você é insuportável, nossa, demais”, desdenhei. Ela revirou os olhos.
“É, é sim, e sou. Não discuta.” Ela jogou mais uma pedra e sentou-se no chão, com as pernas balançando no ar. Ficamos em um silêncio um pouco desconfortável. Ela respirou fundo. “Desculpe.”
“Tudo bem, você só está... chateada.”
“Chateada é um jeito suave de chamar... Mas vamos manter assim. Chateada.”
“Quer falar sobre isso?”, perguntei. Ela deu de ombros e encarou um ponto aleatório ao longe.
“É sempre a mesma coisa. Eu me culpo por culpar ela, ela me culpa por culpar ela. Mas ela está certa.” Emma pegou outro cigarro, acendendo-o rapidamente e colocando-o na boca. “Eu falhei, mas tentei.”
“Bem, não foi culpa dela, e com certeza não é sua. Você também não tem culpa de achá-la culpada... Okay, isto está confuso”, eu disse. Ela riu pelo nariz, dando outra tragada. “Resumindo: as duas estão erradas.”
“Eu estou. Ela realmente não é a culpada por ele ter morrido, mas eu simplesmente não pareço querer crer nisso. Não entra na minha cabeça. É quase como se... como se ela tivesse matado ele, porque foi tudo tão inútil. Uma briga inútil, um motivo bobo. Um final trágico e desnecessário. Não é culpa dela. Ela não estava lá pra empurrá-lo na frente de um carro. Ele não morreu de acidente, ele morreu de decepção. Decepção por a mulher que ele tanto amava fazer coisas desse tipo, sem necessidade. Decepção que o cegou, decepção que o matou. Mas pra mim ela é a decepção, ela é a razão pela qual tudo isso aconteceu... misturado com o que tinha que ser. De um jeito ou de outro, ia acontecer...” Ela parecia estar lutando contra suas próprias lágrimas.
“Então pense nisso, apenas. Era o que tinha que ser, não foi culpa de nenhum de vocês. Foi uma briga boba e um motivo bobo, sim, mas de todo o jeito acabaria assim se era o... destino.” Ela assoprou a fumaça, apagou o cigarro pela metade e jogou-o em uma das lixeiras perto de nós.
“Eu acredito levemente no destino, então vou tentar aceitar isso. De qualquer forma, não tem como mudar. Aconteceu. Fim.”
“É, tipo isso. Encurtando isso tudo... Não se culpe também.”
“Por quê? Eu sou a culpada da história, o motivo da briga deles. O motivo pra minha mãe ter começado a ficar insuportável e deixado meu pai chateado e decepcionado, o motivo de ela estar tão estressada ultimamente, o motivo de tudo.”
“Não fale essas coisas, você não é tola. Sabe bem que não tem culpa de nada. Você era o orgulho do seu pai, Emma. Eles brigavam por causa disso: ciúmes. Nada mais. Você era tipo o tesouro dele, e isso talvez tenha feito seu pai dar menos atenção do que costumava dar normalmente para sua mãe.” Emma ficou um pouco perplexa.
“Nunca pensei por esse lado... Charlie, vtocê é um gênio!” ela pulou do corrimão da ponte e me abraçou com força, sorrindo.
“Ãh, eu sou?”, perguntei, brincando.
“Se eu tivesse pensado nisso... Talvez não fosse tão complicada a minha relação com ela. Eu nunca percebi, que imbecil!”, ela exclamou, dando um leve soco no aço com uma pintura verde descascada pelo tempo.
“Não chega a isso, você só foi lenta”, eu disse com uma risada. Ela revirou os olhos.
“Lenta também é um jeito suave de chamar, mas tudo bem. Ah, me desculpe a chatice. Estou... Estressada. Isso. Estressada”, ela repetiu como se tentasse mais convencer a si mesma do que eu.
“Tudo bem, eu entendo”, respondi. Na verdade não importava chatice nenhuma. Não tinha me incomodado.
Eu percebi o quanto a personalidade da Emma mudava rápido. Uma hora ela estava irritada, mal conseguia conter palavras impacientes, outra estava feliz, sorrindo. Mas era uma felicidade instável, logo um semblante desanimado e frágil parecia tomar conta dela.
É como se uma hora ela aparentasse precisar de cuidado, e outra de distância. Era difícil lidar com isso, mas eu sempre faria um esforço por ela.


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