Havia sido um dia realmente gostoso de se viver, contudo tínhamos que voltar para a realidade, e encarar aquela cidade que, apesar de pequena era problemática. Mas agora eu tinha um motivo a mais para não desistir de tudo e voltar para Nova Iorque. Eu realmente não sei o que deu em mim para ter falado aquilo, talvez tenha ficado sensível com o que ele havia dito mais cedo, mas o fato é que era verdade, eu havia me apaixonado sem ao menos perceber, sem ao menos querer, e tenho certeza que com ele não era diferente.

Na manhã seguinte meu humor estava ótimo, nem mesmo o canto do galo conseguiu fazer com que eu me irritasse. Não havia um motivo especifico para estar daquele jeito, eu simplesmente estava feliz.

Cheguei no trabalho faltando ainda quinze minutos para começar o expediente. Mary, a senhora baixinha e robusta, já se encontrava na recepção. Desde que eu comecei a trabalhar com meu pai, o Prefeito da cidade, que nós nos entendemos. Ela passou a tratar-me educadamente, com carinho até, depois que nos desentendemos pela primeira vez.

Próximo a hora do almoço, Carlla apareceu por lá. Disse que queria reunir a turma no Taylor's, já que não o fazíamos há bastante tempo. Era uma ideia realmente boa, contudo ver Mike e fingir que ele era nada mais que um ogro caipira seria bem mais difícil que antes.

– Não aceito não como resposta. Te espero às sete! - Foi tudo o que ela disse antes de virar-me as costas e ir embora.

Fiquei tão concentrada, mergulhada em planilhas e cálculos que mal vi o tempo passar. Quando dei por mim, já era final de tarde, e a noite já começava a cair. Mary já havia ido embora quando passei novamente pela recepção. Desliguei tudo, fechei a Prefeitura e fui para casa.

Quando saí do banho e olhei o relógio vi que já estava atrasada. Na certa teria que ouvir algum tipo de sermão de Carlla por não estar lá na hora marcada. Coloquei uma roupa qualquer que combinasse e saí.

O Taylor's estava bem cheio. Havia umas TVS ligadas transmitindo um jogo de Baseball, e praticamente todos prestavam atenção. Assim que entrei, avistei Carlla em pé no meio do bar-restaurante. Na mesa com ela estavam Mike, Jason, Dennys e Isa. Um meio sorriso surgiu nos lábios de Mike quando me viu, contudo um sorriso ainda maior veio de Jason, e Isa foi a única a perceber. Quando Carlla notou que Jason iria insistir que eu me sentasse ao seu lado, ela veio até mim, me abraçou e cochichou no meu ouvido que eu estava atrasada e que se os dois brigassem por minha culpa ela não separaria ninguém.

– Relaxa, ninguém vai brigar, ainda mais por minha causa.

– Não teria tanta certeza, Muchacha. Mike é estourado às vezes, e Jason não sabe que vocês estão juntos. - Ela tinha razão. Somente três pessoas sabiam que havíamos nos entendido, e Jason não era uma delas.

Mike pareceu frustrado quando não me sentei ao seu lado, e sim ao lado de Carlla. Em vários momentos cruzávamos olhares, porém eu sempre tentava desviar para não dar pistas.

– Como vai na Prefeitura Hay? - Jason perguntou, encurtando meu nome e transformando-o em apelido.

– Vai indo bem, penso até em entrar pra faculdade. - Os olhares de todos pousaram em mim.

– Então pretende sair de Ellsworth? - Dennys parecia confuso. - Mas e....

Isa deu-lhe um cutucão de leve e ele calou-se. Ainda não havia pensado naquela possibilidade. Entrar pra faculdade implicaria em sair de Ellsworth, já que ali não tinha nenhuma.

– Eu poderia lhe visitar nos finais de semana. - Disse Jason animado.

Mike arrastou a cadeira em que estava sentado para trás e se levantou dizendo que ia no balcão falar com um dos garçons. Senti que aquilo não era verdade, era apenas uma maneira que ele achou de não perder a paciência. Olhei disfarçadamente para Carlla e ela concordou com a cabeça.

– Com licença.

– Onde vai? - Jason perguntou.

– Ao banheiro. Sabe, problemas femininos. - Menti. Caminhei até Mike. Ele estava encostado no balcão, de costas para o lado onde ficava a mesa. Olhei pra trás apenas para ter certeza que Jason não olhava, porém mesmo que quisesse ele não conseguiria ver muita coisa, já que o bar enchia a cada minuto.

– Vai me contar o motivo dessa cara, ou posso tirar minhas próprias conclusões? - Perguntei. Mike olhou-me de soslaio e bebeu um grande gole da cerveja que estava em sua mão. - Tudo bem, não quer falar, não fale, mas você sabe que não rola mais nenhum interesse...

– Não me preocupo com o Garoto de Ouro.

– Então por que está assim?

– Quando você pretendia contar que estava pensando em ir embora?

– Eu não estava, é só uma hipótese.

– Se há uma chance é porque pensa nisso. Você achou o que? Me usaria da maneira que quisesse e bem entendesse e depois descartaria?

– Não é bem assim...

– Como não?

– Foi só uma ideia momentânea.

– Ah claro, e preferiu falar primeiro ao Garoto de Ouro do que a mim. - Mike bufou e tomou mais uma grande golada na cerveja.

Era nítido que ele estava com raiva, contudo, estava também com ciúmes, e definitivamente ele ficaria de bico pelo restante da noite. Não falei mais nada, apenas o deixei ali e voltei a mesa. Carlla notou o clima estranho que ficou e perguntou o que havia acontecido.

– Acho que não foi uma boa ideia tentar reunir todo mundo. - Dei de ombros e disse que depois me entendia com ele.

– Vocês brigaram? - Isa perguntou sem que os outros ouvissem.

– Sim, mas me entendo com ele depois. - Ela sorriu fraco, e ficamos as três conversando, enquanto Dennys e Jason prestavam atenção no jogo.

Eram por volta de onze da noite quando resolvi ir embora. Mike não havia voltado para a mesa e acredito que estivesse ainda no balcão bebendo sem parar. Me despedi apenas de quem estava na mesa e saí. Ele estava do lado de fora, olhando pro céu com os braços cruzados.

– Vai a algum lugar? - Ele perguntou seco.

– Sim, vou para casa.

– E não ia se despedir de mim? - Ele foi chegando perto com os braços da mesma maneira. Parou a poucos centímetros e esperou que eu respondesse.

– Sim. - Respondi simplesmente. - Não tenho paciência para criancices.

– Não sou criança, o que acontece é que não gosto que me façam de brinquedo.

– Espera um pouco, deixa eu ver se entendi direito. Você está dizendo que tudo o que rolou não passou de uma brincadeira pra mim? - Ele não respondeu, porém seus olhos não negavam que realmente era aquilo que passava em sua cabeça naquele momento.

Me sentei em um dos degraus da escada de entrada do Taylor's e ele me acompanhou.

– Sabe... Precisa entender que nem sempre as minhas decisões envolvem você. Pensei na faculdade sim, mas acabei não contando porque não surgiu oportunidade, só isso. Não tem nada a ver com ninguém, apenas uma vontade que me surgiu.

– Tem razão, desculpe. É que ultimamente minha cabeça tem estado confusa e acabo pensando besteira. - Ele foi sincero, e eu sabia o motivo de sua insegurança, era a tal Nathalie. Ela havia voltado para aquela cidade e com ela trouxe todo o passado que para ele foi doloroso.

Eu o abracei, da forma mais carinhosa que pude. Não me importava mais se alguém nos visse, afinal, eu não devia satisfações a ninguém, e além do mais, não fazia nada errado.

Mike insistiu em me acompanhar até em casa, contudo eu não o deixei dirigir, já que havia bebido demais e poderia facilmente perder o controle. Fomos caminhando e vez ou outra ele soltava uma gracinha.

Assim que chegamos, antes de ir embora, Mike me agarrou e me roubou um beijo que me fez perder o ar.

– Não vejo a hora de poder esfregar na cara do Garoto de Ouro que você é minha - Ele disse ao colar nossas testas, com seus braços envoltos em minha cintura.

– Quem é esse? No momento não conheço nenhum outro cara além de Michael Matson.

– Eu já expliquei milhões de vezes que é Mike!

– E eu que é Haley. Estamos quites! - Fiz uma careta e ele retribuiu semicerrando os olhos.

– Tudo bem, passarei a lhe chamar pelo nome, senhorita Sullivan!

– Assim é formal demais. É só Haley.

– Está bem "só" Haley. Agora preciso ir. Tenho que curar a ressaca e estar cedo no Taylor's amanhã. - Concordei e nos despedimos.

Estava pegando as chaves da porta quando ouvi um barulho vindo de uma das laterais da casa.

– Pensei que ele não fosse embora nunca! - Era Audrey que havia surgido na minha frente. Ela não parecia surpresa com a presença dele.

Desisti de abrir a porta e virei-me para ela, com os braços cruzados, exatamente como Mike estava comigo.

– O que quer aqui?

– Olá minha querida irmã, como vai? - Ela falou cinicamente.

– Audrey não estou com humor para suas gracinhas. Quer, por favor, me dizer o que veio fazer aqui, porque tenho certeza que não é para fazer uma festa do pijama.

– Tem razão, não perderia meu precioso sono fazendo uma festa do pijama com você. Eu só vim te dizer uma coisa.

– Pode falar.

– Sei que está tendo um caso com o Mike Matson.

– E daí?

– E daí que, eu só vim lhe dizer para tomar cuidado com uma tal de Nathalie. Não me pergunte o motivo, pois eu não vou dizer. - Foi tudo o que ela disse antes de me virar às costas e ir embora.

Eu não sabia se ficava surpresa por ela ter vindo me alertar, ou se me preocupava no que aquela mulher poderia fazer.