Vida em Erebor escrita por Vindalf
Notas iniciais do capítulo
Do jeito que uma família deve ser
Momentos felizes
Do jeito que uma família deve ser
Nada poderia definir felicidade melhor do que o sentimento de Anna ao deitar-se na cama e ser abrigada nos braços de Thorin. Ele beijou o topo de sua cabeça, ciente de Darin, que dormia no bercinho bem ao lado.
— Nunca pensei em viver isso de novo — confessou Anna, baixinho, aninhada no peito do marido. — Ter você comigo, assim juntinho... Estou tão feliz, meu amor.
— Não mais do que eu.
Anna lamentou, penalizada:
— Mas Thorin, você deixou Erebor, seu reino, seu trono...! Eu não queria isso. Depois de tudo que fizemos para conquistar a montanha...
Thorin garantiu:
— Antes de conhecer você, meu sonho era reconquistar a nossa terra e a fortuna de meu povo. Meu pai queria isso, meu avô também. Era por eles que eu fazia isso, pelo meu povo. Então eu conheci você, e meu sonho era ter você a meu lado no trono de Erebor. Quando pensei que a tinha perdido, eu não soube mais como viver. Não conseguia dormir, a vida era cinza, nem a comida tinha gosto!... E aí você apareceu para mim como num sonho. Não tive dúvidas sobre o que deveria fazer. Em uma semana, Fíli já era rei.
Anna acariciou sua barba e garantiu:
— Não quero que me entenda mal: rei ou não, eu amo você. Sempre disse isso. Mas você sempre quis o trono, e você foi feito para governar. Tem certeza de que quer deixar isso para trás? Não quero que se sinta infeliz por minha causa.
— Eu nunca serei infeliz a seu lado, ghivashel. O trono não me trouxe felicidade; ele era meu dever para com meu povo. Sem você, esse dever ficou sem sentido.
— Seja honesto comigo, Thorin — pediu Anna. — Pode confessar: deixar de ser rei sob a montanha doeu, não foi?
Ele a encarou longamente, antes de indagar:
— Você quer saber com sinceridade?
— É claro.
— Com toda honestidade, doeu menos do que imaginei. Ao ver Fíli no trono, coroado, não senti dor. Eu tive a sensação do dever cumprido. Senti orgulho, não só de meu sobrinho, mas de mim mesmo. Fiz tudo o que podia por meu povo: dei-lhe um lar, paz, prosperidade. Não sou mais criança, ghivashel. Só Mahal conhece o futuro, mas digo sinceramente: eu seria um tolo se passasse o tempo que me resta nessa terra longe de vocês.
Anna tinha lágrimas nos olhos quando disse:
— Amo você, Thorin Oakenshield. E não posso pensar em vida mais perfeita do que ter você e nosso filho a meu lado.
Seus lábios se encontraram, num beijo apaixonado e emocionado, disposto a apagar todos os meses de dor, solidão e angústia. A emoção era tanta que Anna estremecia, seu corpo vibrando com a proximidade de Thorin, tão entusiasmado como ela.
— Ghivashel... — sussurrou ele, quando se separou dela para tomar fôlego. — Assim vamos acordar o bebê.
Anna sorriu, cochichando:
— Temos que aprender a ser silenciosos... Darin não acorda facilmente, mas as paredes são finas...
Thorin controlou-se para não rir alto, e Anna aconchegou-se a ele, notando uma parte de seu corpo extremamente interessada nos procedimentos. Ela ironizou:
— Oh, marido...! Está tão feliz assim em me ver?
Thorin rosnou, de maneira insinuante:
— Eu falei sério quando lhe disse que estava muito feliz de estar com você, ghivashel.
Anna estava insegura e encarou o marido:
— Você acha que er, podemos...? Sabe... — Ela mexeu as sobrancelhas.
Thorin sorriu e respondeu:
— Se quiser, é claro. Nunca direi não para você, ghivashel.
— Eu quero — garantiu ela, baixinho, chegando ainda mais perto dele. — Oh, Mahal, como quero. Deve haver um jeito de não fazermos barulho. Talvez se... formos rápidos. Quem sabe só um pouco. Rapidinho. Só para matar a saudade, está bem?
Thorin sorriu:
— Está bem. Só para matar saudade.
E foi assim, enquanto Darin dormia feito uma pedra, e com o máximo de silêncio posssível, que os dois se dedicaram a matar as saudades um do outro.
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— Bom dia! — Bilbo sorria. — Que bom que dormiram até tarde e descansaram bem. Venham, o segundo café da manhã não demora.
Anna, Thorin e Darin apareceram na copa com fisionomias descansadas e satisfeitas. Anna respondeu:
— Desculpe a hora, Bilbo, mas achei que Thorin podia descansar um pouco mais depois da longa viagem. E Kíli e Dwalin?
Bilbo respondeu, trazendo broas ainda quentes à mesa:
— Já estão de pé e ativos. Kíli quis ver seu jardim, Anna, e Dwalin ofereceu-se para cortar aquela tora grande de lenha. Sabe, aquela que está lá desde a nevasca.
— Oh — fez Anna, lembrando-se das toras que cortou quando tomou a forma de um grande urso. — Já estava na hora de cortar a tora. Darin, você quer um leitinho?
O menino estava animado e virou-se para Anna:
— Ma-madad! Bibi, adad!
Anna sorriu:
— Vamos todos fazer o desjejum juntos, Darin.
Bilbo disse:
— Fiz um mingauzinho para ele comer com framboesas. Está bom?
Anna comentou:
— Oh, Bilbo, ele adora framboesas. Obrigada.
Thorin indagou:
— Do que mais ele gosta?
Anna respondeu:
— Ele adora morangos e cerejas, e outras frutas vermelhas, como amoras e até tomates na salada. Bebe leite como se fosse um bezerro. Agora que o verão está chegando, vamos experimentar outras frutas e verduras.
Bilbo comentou:
— Ele come muito bem. Não tem problemas quanto a isso.
Darin chamou:
— Adad!
Thorin se virou:
— Sim, filho.
Darin tinha os braços esticados para o pai, pedindo colo. Anna o entregou a Thorin, dizendo:
— Parece que você virou a pessoa favorita dele. Quer comer no seu colo.
O sorriso de Thorin derreteu o coração de Anna. A refeição transcorria alegremente e Kíli entrou em casa:
— Oh, bom dia. Anna, Mestre Gamgee quer lhe falar sobre o jardim. Que plantas são aquelas?
— São mudas e sementes que eu trouxe de Rivendell — explicou Anna. — A maioria é formada de ervas medicinais, e uso para as artes da cura.
Kíli a encarou:
— Você é mesmo uma curadora?
— Lord Elrond e sua filha me treinaram — explicou Anna. — Foi um grande privilégio. Lady Arwen é considerada uma luz de seu povo.
Bilbo comentou:
— Anna ajudou muito durante uma epidemia de gripe. Poderíamos ter perdido algumas pessoas, se não fosse por ela.
— Improvisamos uma grande enfermaria aqui mesmo — lembrou Anna. — Darin é que gostou da farra. Havia crianças em casa, gente dormindo no chão, uma grande bagunça... Ele adorou!
Thorin indagou:
— Ele não correu risco de adoecer?
— Bem, sempre há risco — admitiu Anna. — Mas ele favorece seu povo, Thorin. É forte como um bezerro.
O menino comia seu mingau, eventualmente olhando para o pai. Thorin sorria e voltava a alimentar o filho, uma cena doméstica que derretia o coração de Anna.
Bilbo quis saber:
— Quais são os planos para hoje?
— Pensei em cuidar do jardim, enquanto isso você poderia levar Thorin, Kíli e Darin ao mercado. À tarde, preciso avisar às crianças que não poderei ficar com elas por alguns dias.
Thorin indagou:
— Como assim não vai, por quê?
Ela falou seriamente:
— Thorin, precisamos conversar, saber o que faremos da vida. Temos que conversar, e muito. Vamos precisar de tempo juntos.
Kíli observava tudo com a carinha de cachorrinho perdido. Bilbo timidamente ofereceu:
— Er... Não que eu queira me meter, mas por mim, podem demorar o tempo que for necessário. Ter todos vocês aqui é motivo de grande alegria para mim.
Thorin assentiu, dizendo:
— Não ficamos menos felizes, Mestre Baggins. Estar aqui é uma grande alegria. Mas minha mulher tem razão: precisamos decidir o futuro, e para isso devemos conversar bastante.
— E que opções estão examinando? — quis saber o hobbit.
— Durante muitas décadas meu povo se estabeleceu em Ered Luin — lembrou Thorin. — Mesmo após a retomada de Erebor, muitos optaram por permanecer lá. Também podemos tentar fazer uma casa perto da montanha.
Kíli contribuiu:
— Eu praticamente fui criado em Ered Luin. É um bom lugar.
Darin ficou prestando atenção à conversa dos adultos, e Thorin teve que lembrá-lo da comida. Bilbo comentou:
— É bom morar perto de outras pessoas. Dá mais proteção.
Anna indagou:
— Thorin, você pretende liderar seu povo nas Montanhas Azuis?
Ele a encarou:
— Por que pergunta?
— Você sempre foi um líder, meu querido — lembrou Anna. — E você é um bom líder. Imagino se ficará feliz em ser um mero cidadão comum.
— Sei que serei feliz a seu lado, ghivashel — garantiu ele, para corrigir em seguida: — Nós seremos felizes.
— Você voltaria a ser um mineiro e ferreiro em Ered Luin? — indagou Kíli ao tio. — Ou lideraria nosso povo?
Thorin deu de ombros:
— O trono, tenha o nome que tiver, não me atrai mais. Certamente terei trabalho honesto, um que me permita sustentar minha família.
Bilbo pareceu decepcionado:
— Mas já pensam em ir embora? Vocês mal chegaram!
— Bilbo, ninguém falou coisa alguma sobre ir embora — disse Anna. — Tenho certeza que Thorin e os demais não pretendem ir embora tão cedo. Só estamos examinando nossas possibilidades.
Se Bilbo ia responder alguma coisa, o sino à porta o interrompeu, e ele se ergueu da mesa para ir atender. Anna olhou o prato de Darin e observou, ao vê-lo quase limpo:
— Mas que fome, hein, filhinho? Comeu o mingau todinho!
Darin respondeu, sorrindo:
— Ba!
Kíli pôs-se a brincar com ele, e então um grito feminino muito agudo ouviu-se no outro cômodo:
— AAAAIII!!
Anna pegou Darin, e Thorin correu a protegê-los. Kíli gritou:
— Bilbo...!
Mas a cena que viram na porta principal chegava a ser hilária. Uma volumosa e conhecida hobbit se apoiava em Bilbo, reclamando:
— Oh, por Eru!... O que é isso?!
De olhos fixos num Dwalin confuso e portando um machado, Lobélia Sackville-Baggins era sustentada por um Bilbo que não continha sua contrariedade:
— Lobélia, por favor!
A hobbit parecia esfogueada, dizendo:
— Homessa!... Vim aqui na maior inocência fazer uma gentileza, não esperava ver um anão feroz e armado com um machado!
Bilbo indagou, pondo-a de pé sobre as próprias pernas:
— E o que veio fazer aqui?
Ela se empertigou toda, ofendida, e respondeu, mostrando uma cestinha trançada em palha:
— Vim dar as boas-vindas a seus hóspedes e trazer bolinhos para o lanche das 11h! Mas eu sei reconhecer quando não sou bem-vinda! Humpf! Passar bem!
Ela deixou a cestinha na mesa e saiu, empertigada. Bilbo saiu correndo atrás dela.
— Lobélia! Espere, prima!
Dwalin ficou intrigado:
— Essa não é aquela criatura desagradável de quem Bilbo vive reclamando?
— Essa mesma — confirmou Anna.
— E por que, em nome de Durin, ele iria atrás dela?
— O motivo é muito simples. — Com Darin no colo, Anna foi até a cestinha e de lá tirou um bolinho, o qual pôs na boca de Dwalin. — Este é o motivo.
O anão feroz, suado e ainda com o machado na mão, mastigou o bolinho. Arregalou os olhos ainda com o bolinho na boca e encarou Anna, que assentiu sorrindo, sem dizer uma palavra. A expressão de Dwalin mudou totalmente, espantado. De boca cheia, sem nem respirar, ele gritou, correndo atrás de Bilbo:
— Madame, "efpere"! Por favor!
Anna se riu. Curioso, Thorin pegou um bolinho e provou. Depois ficou igualmente admirado:
— Por Mahal...!
Anna deu um dos bolinhos a Darin, dizendo:
— Viu como Bilbo tem razão de correr atrás dela?
Darin respondeu, parecendo concordar:
— Ba!
Palavras em Khuzdul
adad = pai, papai
amad = mãe, mamãe
ghivashel = tesouro de todos os tesouros
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