Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 30
O chamado


Notas iniciais do capítulo

Anna precisa fazer um desvio



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/547201/chapter/30

O chamado

Anna precisa fazer um desvio

Apesar dos apelos de Beorn, Anna não arredou pé de manter em segredo o fato de estava viva. Até que ela fosse capaz de dar um rumo a sua vida, não pensava em voltar para Erebor. Ela sabia que, se voltasse à montanha, nada mudaria. Sua vida continuaria em perigo, e a de Darin também. Ela não via saída a não ser manter-se longe da montanha.

Mas isso não significava que ela gostava disso. Era uma decisão difícil. Anna tinha experiência com decisões difíceis. Só que essa, em particular, era muito dolorosa.

Como ela poderia viver sem Thorin?

Beorn era um anfitrião estranho, mas afável – ao menos com Anna. Ela viu a vida na estranha cabana e imaginava se a Companhia tinha visto isso também. Era uma maneira de se sentir mais próxima deles.

Pôneis brancos, cães grandes, carregando objetos na boca, em pé nas patas traseiras, montaram mesas. Ovelhas brancas, vacas, um grande carneiro negro e outros animais faziam a alegria de Darin.

A mesa era farta: pães, manteiga, creme azedo, mel, hidromel. Contudo, Anna insistia em beber apenas água ou leite, uma vez que estava amamentando. Sem a gentileza de seus khazâd para ajudá-la, Anna teve que aprender a lidar com um odre para beber água. Era mais difícil que aparentava. Mas ela preparou mais papinhas para diversificar a dieta do bebê, que crescia muito.

Num ambiente seguro, Anna aproveitava para treinar sua habilidade de trocar pele. Fora uma sugestão de Beorn, e Anna sabia que isso viria a ser útil.

O clima agradável fazia Anna e Darin brincarem nos jardins e pátios da casa de Beorn. Como o anfitrião pouco ficava em casa durante o dia, eles ficavam muito tempo sozinhos. Mas Anna observava os animais treinados por Beorn cuidando da casa, e ficava impressionada. Ela eventualmente tentava lavar louça ou roupa, mas dificilmente concluía a tarefa. Afinal, quando um carneiro negro, de pé em duas patas, balia nervosamente toda vez que ela ia ao poço pegar água, Anna achou que o recado estava dado: aparentemente, eles tinham recebido instruções de Beorn para cuidar das tarefas domésticas e ficar longe de Darin. Mas se o bebê chorasse por qualquer motivo, sempre havia um dos animais por perto, fosse para avisar Anna (se ela estivesse longe ou distraída) ou se fosse necessário alertar Beorn. Os animais também ajudavam Beorn a fazer roupas para Anna e o bebê.

Eventualmente, o Castanho chegou à casa do troca-peles. Radagast sempre parecia estar perdido, mas desta vez Anna achou que ele ainda estava mais confuso. A pedido de Anna, Beorn não tinha dito nada a Radagast. O mago indagou:

— Mas o que aconteceu? Eu ouvi dizer que você tinha morrido — você e o bebê. Achei estranho, já que não senti mudanças em Arda. Uma perda como a sua seria sentida por toda a terra.

Anna respondeu:

— Estou me escondendo e deixando que pensem que morri.

— Por quê?

— Tentaram me matar — respondeu ela. — Anões, que teoricamente deveriam ser meus súditos, tentaram me matar, a mim e meu filho. Mataram os guardas e minha amiga E não foi a primeira vez que tentaram contra a minha vida. Se eu voltar, tentarão de novo. Se pensarem que morri, vão parar de tentar me matar.

Radagast repetiu a pergunta:

— Por quê? Por que queriam matá-la?

— Preconceito, só isso. — Anna deu de ombros. — Imaginei que, com o tempo, isso poderia ser minimizado. Aparentemente, eu me enganei.

— E seu marido?

— Ele também deve pensar que eu morri. O lugar dele é com seu povo. Não quero deixar meu marido numa posição de ter que escolher entre a mulher dele e o reino. Ele lutou tanto para recuperar seu reino, seu lar. — Anna suspirou, já sentindo as lágrimas. — Muitas vezes me pego pensando que teria sido melhor eu ter voltado para meu mundo.

A voz grossa de Beorn soou, indagando:

— E em que isso teria ajudado, Esquilinho? Thorin Oakenshield teria ficado infeliz, você teria ficado infeliz, e o menino cresceria longe de seu pai. Em que isso seria melhor? E para quem?

Anna teve que concordar com ele. Beorn continuou:

— Seu marido deveria saber onde está. É apenas justo.

Novamente, Beorn tinha razão. Anna respondeu:

— Não até eu decidir o que fazer de minha vida e como proteger meu filho.

Radagast quis saber:

— Qual é o plano? Por que me chamaram?

— Beorn sugeriu que Darin e eu podemos ficar em sua casa até Gandalf nos apanhar e nos levar a Rivendell.

— Gandalf já sabe? Ele está vindo?

Beorn respondeu:

— Ele já está vindo, mas não sabe.

Radagast disse:

— Então é melhor irmos ou vamos nos atrasar. Gandalf não aprova atrasos.

— Estamos muito longe?

— Menos de um dia de viagem.

Beorn alertou:

— Não é bom viajarem à noite. Melhor partirem de manhã. Se forem cedo, ainda haverá uma parte do dia a ser desfrutada.

E assim foi feito. Anna juntou as poucas roupas que Beorn lhe emprestara, a cadeirinha de madeira para Darin, água e alimentos para a curta viagem e alojou-se na traseira da carroça dirigida por Radagast.

O dia ameno tornava a viagem ainda mais agradável. O passarinho que morava no chapéu de Radagst atraía a atenção de Darin de vez em quando. Foi pouco depois que deixaram a casa de Beorn que Anna notou um passarinho diferente: parecia um lindo gaio-azul que “conversava” com Radagast. Algo que ele disse deixou o mago inquieto, mas o bicho voou, deixando Anna a imaginar o que teria sido. Mas Darin chamou a atenção dela, que perdeu a oportunidade e esqueceu-se de indagar a Radagast o que se passara.

A viagem continuava tranquila, silenciosa exceto pelos sons que Darin fazia de vez em quando, acomodado no moisés de madeira feito por Beorn. Sentada na parte de trás da carroça, Anna se ocupava da criança. Eventualmente os dois terminaram dormindo.

A tarde caía quando Anna acordou. Agora estavam numa floresta densa, o mago castanho ainda conduzindo a carroça. Anna indagou:

— Radagast, não deveríamos ter chegado?

Ele respondeu:

— Oh, sim… Bem… Na verdade, eu precisei fazer um desvio, espero que não se importe.

Anna se surpreendeu:

— Oh. Não, claro que não me importo. Agradeço novamente por nos acolher até que Gandalf possa nos apanhar.

— Isso pode demorar um pouco mais. Vamos para outro destino.

— Não estamos indo para Rhosgobel?

— Fui chamado pela Senhora de Lórien. Ela quer ver você.

— Lady Galadriel?

— Ela mesma.

— Mas por que ela quer me ver?

— Ela quer se assegurar que vocês estarão seguros — Ele se emendou. — Não que vocês não estivessem seguros em Rhosgobel, claro que não. Mas como alguém diz não à Senhora de Lórien?

— Eu já disse — confessou Anna. Radagast arregalou os olhos e Anna esclareceu: — Disse a ela que não me separaria de Thorin ou de meu filho. E serei obrigada a dizer não novamente, se ela sugerir que eu fique ali para ser treinada e deixe meu filho com outras pessoas.

Radagast disse:

— Não há perigo disso, minha cara. Mas a criança é mágica… Ela certamente sentiu a presença do menino.

Anna calou-se, pensativa. O mago recomendou:

— Procure descansar e fique tranquila. Já estamos entrando na Floresta de Lórien.

Era verdade. Rapidamente, a floresta tornou-se mais verde, notou Anna. As árvores eram mais viçosas, havia flores fragrantes e uma atmosfera fresca no ar.

Mágico.

Dois elfos de cabelo louro em magníficas montarias surgiram do meio das árvores, abordando a carruagem, e Radagast parou os cavalos, dizendo:

— [Viemos por ordem da Senhora de Lórien. Sou Radagast, e levo Lady Anna.]

Um dos elfos cumprimentou:

— [Bem-vindos, amigos. Meu nome é Haldir. Acompanhem-nos, por favor.]

Guiado pelos guardas, o grupo embrenhou-se pelas terras de Lórien. Perto de uma escada, Radagast ajudou Anna a descer da carroça, e ela pôs Darin em seus braços, subindo os degraus cobertos. A arquitetura de Lórien assemelhava-se muito à de Rivendell, notou Anna, registrando ainda mais as diferenças de Mirkwood. Certamente essas diferenças também ficavam evidentes em seus habitantes.

Uma moça de cabelo levemente alourado estava no topo das escadas, esperando para recebê-los.

— Bem-vindos. Eu sou Eliel. Preparei quartos para que se banhem antes do jantar. Lady Galadriel vai se juntar a vocês mais tarde.

Anna seguiu Eliel para um quarto onde havia não só uma cama mas também um bercinho e uma tina. Duas elfas trouxeram água quente e Anna se banhou, lavando Darin na mesma água. Como sempre, o bebê adorou o banho (por isso Anna normalmente tomava banho junto, pois ele molhava os dois). Depois ele mamou e logo dormiu.

Anna secava o cabelo enquanto a tarde caía, já antecipando a conversa difícil que teria após o jantar. Se pudesse, ela deitaria naquele exato momento para descansar. Mas era melhor enfrentar logo a Senhora de Lórien.

Eliel chegou, suave e respeitosa:

— Se quiser jantar, milady, eu lhe trarei a refeição agora mesmo. Lord Celeborn e a senhora Galadriell querem deixá-la descansar. Aparentemente, o pequenino já se adiantou.

— Obrigada, Eliel. Acho que farei isso mesmo. E por gentileza seria possível trazer um mingauzinho ou papinha para dar a Darin mais tarde se acordar com fome?

— Claro, senhora. Volto em seguida.

Silenciosamente, Anna agradeceu pela noite tranquila. Quando a refeição foi trazida, ela comeu um pouco e dormiu. Demorou até Darin acordá-la para mamar, e depois disso ela manteve seu filho junto de si. Ambos dormiram até o amanhecer.

Na manhã seguinte, descansada, Anna foi escoltada por Eliel a uma sala embaixo da copa das árvores, um local muito peculiar que parecia ser dentro da floresta. Eliel disse que Radagast já tinha voltado para o seu lar em Rhosgobel. Anna quis imaginar o que o Castanho tinha ido fazer, mas seus pensamentos foram interrompidos na chegada a um aposento quase entre as copas cerradas das árvores. Lá ela foi recebida por Lady Galadriel e Lord Celebron.

Com Darin em seus braços, usando as roupas rústicas que Beorn lhe arrumara, Anna curvou-se diante dos dois senhores de Lórien, tensa.

— Milords, eu os cumprimento.

Fo Celeborn o primeiro a falar, severo:

— Por que a Rainha de Erebor, esposa de Thorin II, Rei Sob a Montanha, está curvada perante seus iguais e parentes?

Anna ainda estava curvada quando respondeu, tentando conter as lágrimas:

— Não sou rainha, sequer consorte sob a montanha. Eu sou apenas um fantasma.

Galadriel ordenou:

— Levante-se, criança. Eu ouvi sua alegria e sua angústia.

Penosamente, Anna obedeceu, sentindo-se cansada e deprimida.

— Perdoe-me, senhora — pediu, com sinceridade. — Pois retribuo sua hospitalidade e gentileza com tristeza e desânimo, mas sou apenas uma mulher triste e sozinha.

Galadriel se ergueu e abraçou-a ternamente:

— Minha pobre criança, não deve pensar assim. Ao invés disso, peço-lhe que me fale mais sobre a fonte de seu orgulho, a criança que ostenta em seus braços.

Celeborn acompanhou sua mulher e aproximou-se de Anna, olhos grudados em Darin.

— Extraordinário… Não é algo que se vê sempre…

O bebê o encarou de maneira séria, voltando-se para Galadriel quando ela comentou:

— Posso ver a mágica de nosso povo nele. Qual é o nome?

— Darin — respondeu Anna. — Na língua dos khazâd, tem a ver com milagre, segundo meu marido.

— Ele é um milagre, certamente — concordou Lord Celeborn. — De muitas maneiras.

Anna acrescentou:

— Gandalf disse que ele é uma criança de Rivendell, graças à água de Gil-Estel.

Galadriel observou, maravilhada:

— Vocês são duas dádivas dos Valar...

Celeborn parecia contrariado:

— Nossos parentes Greenleaf temiam que os anões não percebessem a preciosidade que tinham. Foi esse o caso?

A dor de Anna deve ter aparecido, porque Galadriel interveio:

— Certamente podemos falar disso após a refeição. Anna não teve chance de quebrar o jejum, e o pequeno Darin pode querer comer alguma fruta. Vamos, meus filhos. Vamos nos juntar ao resto da família.

Anna não entendeu do que ela falava, mas seguiu-a até um outro aposento na construção em meio às árvores. Ela tirou um momento para apreciar o ambiente.

Era uma floresta linda, viva e mágica. A própria mágica de Anna respondia à energia daquele lugar: ela se sentia mais calma, mais segura e em paz.

Só o que faltava era Thorin...

Eles chegaram a um outro ambiente em que uma mesa farta estava posta para mais de seis pessoas. E foi quando mais gente se juntou a eles.

Eliel foi a única pessoa que Anna reconheceu. À sua frente, estavam dois elfos de longos cabelos escuros e vestes elegantes, quase idênticos. Eles cumprimentaram os senhores do reino, antes de se virarem para Anna. Um deles comentou, de maneira amistosa:

— Então, esta é a pequena criatura que tanto fascinou Lady Galadriel?

O outro comentou:

— Ela parece mesmo ser encantadora.

Instintivamente, Anna apertou Darin contra seu corpo, mas a Senhora de Lothlórien garantiu:

— Sejam gentis, meninos. Anna é mãe há pouco tempo. Anna, deixe-me apresentar Elladan e Elrohir, os filhos mais velhos de Lord Elrond. Esta é Anna, Consorte de Thorin Oakenshield, Senhor de Erebor, Rei Sob a Montanha.

Os dois se curvaram gentilmente, mão sobre o coração - o tradicional cumprimento élfico. Emocionada, Anna fez uma mesura, surpresa com a presença dos dois filhos de Lord Elrond que ficaram fora dos filmes de Peter Jackson. Droga, PJ!, pensou ela. Se tivesse mantido esses dois nos filmes, teria me ajudado a ficar psicologicamente preparada.

Palavras em Khuzdul

khazâd = anões, o povo anão


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Vida em Erebor" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.