Usuário Final escrita por Ishida Kun


Capítulo 13
A Rede 3:3


Notas iniciais do capítulo

Olá novamente caros leitores! Já disse o quanto adoro vocês por continuarem acompanhando essa história? Não? Bom... adoro vocês por continuarem acompanhando essa história! He he he! Desculpem a demora na postagem... muita coisa acontecendo ao mesmo tempo, minha vida virando uma bagunça só! Mas não se preocupem, mesmo que eu demore um pouquinho, Usuário Final vai até o fim, não irei decepcioná-los, prometo. Prontos para mais?



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— O Martinez está bem perto hoje, não? — perguntou Valéria, se sentando de frente para Adam, cruzando as pernas de forma que pudesse apoiar os cotovelos nos joelhos.

— O navio? Ele não fica sempre assim? — questionou Adam em resposta, o cargueiro acima de sua cabeça se inclinou para o lado, fazendo com que uma montanha de contêineres escorregasse para fora do convés, porém, em vez de caírem, subiram até desaparecer no meio das nuvens turbulentas. — Isso é incrível! Como ele veio parar aqui? Eu me lembro de ter visto uma matéria na TV sobre o naufrágio…

— Geralmente ele fica mais longe. Ninguém sabe como, só sabemos que ele está aqui desde o começo. Ah como eu adoro mistérios! — respondeu Valéria com um sorrisinho infantil, enquanto apoiava as mãos no rosto.

— A cronologia dos fatos não bate, mas não acho que exista uma resposta para isso, certo?

— Ah que fofo, você aprende tão rápido! Aqui há muitos mistérios, no começo a gente fica se perguntando “o que é isso?” ou “o que é aquilo” e coisas como “tem uma poltrona rosa voando ali?”, mas depois de um tempo, a gente começa a deixar pra lá. É tipo a entrada bizarra do 673.

— O que tem de errado com aquele portão? Senti algo estranho por lá.

— Mistérios Adam querido, mistérios. São eles que tornam nossa vida aqui mais interessante! — e sorriu, novamente apoiando as mãos no rosto. Era como conversar com uma personagem de um desenho japonês. Ele até poderia ter se irritado com aquele comportamento exagerado, mas o jeito de Valéria era tão meigo, que ele se sentia incapaz disso — Temos trabalho a fazer, afinal, tem um garotinho aqui que precisa ser sincronizado! — Ela estendeu a mão direita na direção de Adam e uma dezena de linhas azuladas se desprenderam dela, atravessando seu corpo. Da outra mão, num rápido movimento, ela fez surgir uma tela translúcida que ficou flutuando a alguns centímetros de seu rosto, era uma espécie de holograma onde uma infinidade de códigos e dados se atropelavam, rápidos demais para que Adam compreendesse o que eram.

— Algumas pessoas usam apenas a mente e tudo mais — continuou, ela — já eu sou mais antiquada, ou retrô se você preferir, mas a verdade é que também sempre gostei daqueles computadores dos filmes. — E moveu a tela levemente, num gesto indicativo — Assim também tenho mais controle com o que faço, além de que isso é muito legal!

Adam balançou a cabeça de leve, ainda perplexo, olhando dos fios que saim de seu corpo para a tela flutuante e para a sorridente garota ruiva à sua frente.

— Só isso já parece um filme. O que você está fazendo comigo?

— Sincronizando você com o sistema Horus e o seu corpo adormecido numa cama confortável e gostosa. Já te disse o quanto eu amo dormir?

— Eu me lembraria se tivesse dito – respondeu Adam, sorrindo. Era difícil conversar com Valéria sem sorrir. - Já eu não gosto tanto assim. Deve ser por causa dos sonhos. A propósito, que história é essa de sincronização?

— Acho que um certo garotinho não prestou atenção ao manual! — respondeu Valéria, sonoramente — Seu corpo no mundo real está conectado ao sistema Horus, que é o sistema que gerencia nossas habilidades como Usuários Finais, que por sua vez está ligado à sua mente, ou seja, você agora. O que acontece é que sua mente está funcionando de uma maneira diferente do seu corpo e o sistema Horus está levando um tempinho para acompanhar tudo. Neste exato momento, você está mais no seu corpo dorminhoco do mundo real do que na Rede.

— Acho que li rápido demais essa parte. — concluiu Adam, sorrindo sem jeito enquanto passava a mão pela nuca — Então é por isso que tenho a impressão de que meu corpo não responde aos comandos…

— Muito bem! Vai ganhar uma estrelinha na testa da titia Valéria depois!

Adam riu e Valéria o acompanhou, para logo em seguida se distrair com o computador flutuante à sua frente, deixando-o a sós com seus pensamentos. A distração o levou a perder o olhar em Beatriz novamente, porém foi Carla quem olhou de volta, com aquele sorriso que ele começara a odiar estampado no rosto.

— O que tem de errado com essa garota? — reclamou, voltando sua atenção para Valéria.

— Ah! É coisa da idade. Quando eu tinha doze anos também era assim. — respondeu ainda distraída com o computador.

— Como é que é?! — Adam quase se levantou com o susto e Valéria amargou uma expressão de arrependimento. — Quer dizer que estou sendo ameaçado por uma criança de doze anos?!

— Puta merda… — xingou, visivelmente arrependida pelo que havia dito — olha só Adam querido, isso fica só entre nós dois, ok? Ela odeia quando mencionam sobre a idade dela exatamente por isso. Ninguém leva uma “criança” de doze anos a sério.

— Eu tenho a maior sorte com esse tipo de coisa. — reclamou Adam, abaixando a cabeça e sorrindo de forma que ficasse claro que ele não estava se divertindo.

— Antes de fazer besteira, lembre-se que ela é a melhor amiga da Bia.

— E porque você está me dizendo isso?

— Por que ao contrário do que você pensa, eu não nasci ontem. Agora estamos quase prontos! Não é o máximo? — e sorriu fechando os olhos — Adam, eu sou uma especialista em USV, o uniforme que usamos, então qualquer dúvida ou problema, você deve falar comigo. O USV serve como um elo de conexão da nossa mente com o sistema Horus, que nos conecta no sistema de criação da Rede. Através dele, podemos criar nossos equipamentos do nada.— E fez um gesto com a mão como se desenhasse algo no ar — Tipo mágica, sacou? O USV monitora nossas funções corporais, além de possibilitar que realizemos tarefas sobre-humanas como força extrema, resistência, velocidade e essas coisas que a gente vê nos filmes de ação.

— Ok — concordou Adam, pensando em como Valéria gostava de ser evasiva dos assuntos que lhe eram inconvenientes — E essa parte acesa? —perguntou apontando para a linha luminescente que seguia da luva, até o ombro do uniforme de Valéria — Cada um de vocês tem uma cor diferente… por que eu não tenho?

— Além de identificação, serve também para mostrar com quem temos um link de ligação, então você nunca encontrará alguém com uma cor igual à sua a não ser que você tenha um link com essa pessoa. No seu caso, você ainda não encontrou seu par. Mas não se preocupe, o amor ainda vai bater a sua porta.

— Espera, então você não tem um link com o Hector? Como vocês são namorados, achei que…

— Digamos que como especialista em USV, eu saiba alguns truques e o Hector odeie a cor laranja. Ele tem um péssimo gosto, já disse para ele, mas ele se recusa a me ouvir. Se bem que ele também poderia não ser meu Link, mesmo sendo meu namorado. É como se apaixonar, você não escolhe a pessoa — disse Valéria, sem tirar os olhos da tela translúcida.

— E se eu estiver perto do meu Link, minha eficácia na Rede aumenta, não é? Isso parece…

— Videogame, eu sei. O cara que criou isso só pode ser um viciado… ou um escritor de Fanfics, vai saber! — interrompeu Valéria, desviando os olhos da tela e sorrindo para Adam — Mas nem tudo são flores, Adam querido. Link é como uma alma gêmea, então tecnicamente você só vai encontrar um único link par perfeito em toda a sua vida. Se o seu link morrer, as chances de que você consiga outro são quase nulas e mesmo que você encontre, suas cores nunca serão as mesmas e os benefícios causados pela ligação, também não. Então, quando você achar seu Link, proteja-o com sua vida, ok?

Adam confirmou com um aceno de cabeça, enquanto um arrepio pareceu se desgarrar de sua nuca e escorregar pela espinha. Seus olhos se voltaram para a conversa do restante do grupo. Beatriz falava algo, enquanto Carla, andava de um lado para o outro com a cabeça baixa. Hector apenas observava tudo de braços cruzados.

— Quem é o Link da Beatriz? E o da Carla? — Adam perguntou, sabendo que aquilo, com certeza, não seria respondido.

— Estão mortos. — respondeu Valéria, para o espanto de Adam. Sua expressão era séria e um tanto pesarosa, o que fez com que ele se arrependesse da pergunta — Adam, perder um Link pode ser realmente traumático para o Usuário, então por favor, não toque nesse assunto com elas ou com qualquer outro Usuário que você encontrar, ok? Não é educado.

Adam apenas confirmou com a cabeça, sabendo que o assunto dos Links estava encerrado de uma forma desconfortável. Seus olhos novamente se voltaram para a conversa ao longe e mesmo percebendo os olhares de Valéria, ele preferiu não olhá-la. Depois de alguns instantes, resolveu perguntar algo que já havia se questionado desde que a conhecera.

— Se não podemos nos ver no mundo real, como você e o Hector são namorados?

— Já ouviu falar em namoro virtual? Pense na Rede como o nível dois do namoro a distância. Um dia, quando tudo isso acabar, vamos nos encontrar de verdade. É por isso que eu luto na Rede.

— Vocês formam um casal bem fofo — E riu das próprias palavras, se sentindo bobo — Ficarei torcendo por vocês.

— Ah Adam querido, você é um amorzinho mesmo, viu?

Novamente trocaram sorrisos e Valéria se distraiu com o computador. O fios que ligavam a tela ao seu corpo oscilavam e se contorciam de leve, fazendo com que Adam se sentisse tentado a tocá-los. Olhou para a conversa ao longe e dessa vez, Beatriz gesticulava em sua direção, parecendo irritada. Carla, amargava uma expressão de desconforto e Hector agora parecia gesticular, como se estivesse contrário ao que quer que Beatriz insistisse. Qual seria o maldito problema? O que ele tinha feito de tão errado para ocasionar aquela situação?

— Ah sim! Antes que esqueça, o USV vai ligar você também a nossa interface visual — explicou Valéria, quebrando o silêncio momentâneo. Ela parecia ter percebido a distração de Adam e tentando tirar sua atenção da conversa, continuou — É tipo um HUD* de videogame, sabe? Eles criaram dessa forma para ficar mais fácil do pessoal novo pegar. E ainda tem o mais importante, o auxílio de combate, cara o auxílio de combate é muito legal!

— Interessante. — e sua resposta demonstrou o mesmo interesse que sua expressão, sua mente não parecia estar tão presente ali quanto deveria.

— Acabo de te contar uma coisa muito foda e isso é tudo o que você tem a dizer? Alguns Nerds teriam um orgasmo só de ouvir isso.

— Valéria, eu não sou um Nerd. — disse, ainda olhando para o lado, onde agora Carla discutia algo com Beatriz, gesticulando e apontando em sua direção. Hector voltara a cruzar os braços e parecia apenas observar a cena. Adam começou a desconfiar de que talvez escondessem algo dele.

— Rede para Adam, Rede para Adam, responda Adam! — brincou Valéria — O auxílio de combate vai ajudar você a lutar contra os devoradores de igual para igual. Você não precisa ser um “expert” em nada, o USV vai basicamente fazer tudo por você e a medida que você vai aprendendo, ele vai te ajudando menos, até chegar uma hora em que você vai fazer tudo sozinho! Não seria o máximo se na escola fosse assim também?

— Acho que sim… — respondeu, ainda mais distraído do que antes.

— Acha é? Vamos ver o que você acha disso… religando a conexão!

Valéria contraiu o rosto numa expressão de irritação e num rápido movimento lateral que desapareceu com a tela flutuante, fez com que os fios que se ligavam ao corpo de Adam mudassem de azul para um vermelho vivo. Adam pensou em gritar, mas uma dor excruciante pareceu percorrer todo o seu corpo, os músculos se contraíram e ele sentiu como se agulhas em brasa estivessem sendo atravessadas pela sua coluna vertebral, sua cabeça latejou de dor e ele cedeu para o lado, a visão indo e voltando como se o mundo fosse iluminado pela luz de uma vela tremulando ao vento.

Porém tão repentino quanto a dor veio, ela se foi, deixando Adam com as sensações fantasmas das agulhas nas costas. Levantou-se bruscamente, prestes a reclamar com Valéria, pois ele havia tido a leve impressão de que talvez aquilo havia sido proposital, porém, a expressão de espanto em seu rosto o fez mudar de ideia. Ele ficou parado por um instante, apenas observando-a com a mão levada a boca. Agora Adam percebia que em seu campo de visão, estavam uma série de informações e taxas em azul ciano. Acima e a direita estava escrito “SINC” e logo abaixo, um contador oscilava entre 80 e 90%, abaixo desta taxa, outro indicador mostrava as iniciais “AC”, este estagnado em 45% e por fim, um cronômetro marcava velozmente “27:40:21”. No lado esquerdo de seu campo de visão, uma pequena guia com o nome “EQUIP” repousava estática. Adam arriscou um olhar para os lados e para seu espanto, percebeu que os números o acompanhavam, porém novas informações das quais ele ainda não compreendia surgiam pelo canto de seus olhos. Era como se aquilo tudo estivesse passando em uma tela curva grudada em seu rosto. Lembrou-se imediatamente dos jogos em primeira pessoa, os quais por diversas vezes tentara sem sorte ganhar ao menos uma partida, e não se deu conta de quanto tempo ficou parado observando a interface visual, só que foi tempo o bastante para que todos já estivessem ao seu redor.

— Valéria — chamou, ele — Você tinha razão… isso é mesmo incrível! Sinto quase como se pudesse tocar… — e estendeu a mão na direção do indicador SINC. Foi só então que percebeu a cor vermelho vivo que seguia os contornos de sua luva, subindo pelo antebraço em direção ao ombro. Olhou ao redor já temendo o que fosse encontrar. Hector estava com os olhos arregalados, a boca levemente aberta, seu corpo grande e robusto parecia estático, petrificado. Carla mantinha sua expressão dura, mas deixava transparecer hesitação, surpresa e o que quer que a frieza ou falsidade de suas atitudes conseguissem esconder. Mas foi exatamente em Beatriz que novamente, seus olhos pararam. Seu rosto era um emaranhado de emoções indecifráveis, raiva, tristeza, angústia? O que quer que fosse, era ruim o bastante para que ela o olhasse daquele jeito, de uma forma que o cortava por dentro, era invasivo e doloroso ao mesmo tempo. Adam trouxe a mão próxima ao rosto, observando de perto aqueles traços avermelhados que se esticavam simetricamente por seus dedos como veias, em seguida olhou para Beatriz, onde o mesmo tom de vermelho corria feito sangue pelo uniforme.

— Não… se consegue o link de uma pessoa morta… jamais… — Ela disse por fim e o peito de Adam gelou, como se aquelas palavras o atravessassem feito uma navalha congelada. Havia algo terrivelmente errado com ele.

Notas adicionais

*HUD, do inglês, Heads Up Display, é um instrumento inicialmente desenvolvido para utilização em aeronaves visando a fornecer informações visuais ao piloto sem que este tenha que desviar os olhos do alvo à frente da aeronave. Também é muito utilizado em videogames, onde aparece como informações uteis ao jogador (barra de energia, munição, mapa, etc).


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Notas finais do capítulo

Minha nossa... quem diria? Fiquei pasmo com essas revelações. E agora? O que vai acontecer daqui para frente? Só lendo o próximo capítulo para saber! He he he! E o que você acharam da Valéria? Acho ela muito "menina mangá", completamente Kawaii! He he he! Espero que estejam ansiosos pelo próximo capítulo, porque eu mal posso esperar...