A Dança das Lâminas Rubras escrita por João Emanuel Santos


Capítulo 3
Princípio - Parte Três.


Notas iniciais do capítulo

Agradeço a todos que leram, acompanham e favoritaram a história. Vocês são incríveis, e estão me dando uma força que nem imaginam.

Espero que gostem do capítulo.



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Nós já seguíamos pela estrada de terra por várias horas. Gregório me carregava em suas costas, pois eu já não tinha mais forças para correr. Sabrina ia logo à frente, sem dar sinais de exaustão.

Eu guiava os dois mercenários até uma torre de vigília antiga. Pois apesar de nunca ter ido à torre, eu sabia qual estrada nos levaria até lá.

E lá estaria Senhor Brandon, o filho de Conde Alwyn.

Lá estaria o homem que destruiu meu povoado, o homem que matou minha mãe.

Enquanto Gregório corria, eu sentia o impacto de cada passo, sacudindo meu pequeno corpo. Meu olhar estava preso ao céu, que tinha sua noite enfeitada por várias estrelas. A luz da lua iluminava os campos em nossa volta.

Eu pensava em minha mãe, e sobre o quão estúpido fora nosso ultimo encontro. Decidi desperdiçar minhas ultimas palavras com ela numa discussão imatura. Culpei-me pela morte dela, imaginei que se eu tivesse permanecido na estalagem, tudo teria sido diferente. Esses pensamentos estavam errados, sem dúvida, mas eu era apenas uma criança de treze anos, e estava vivenciando um pesadelo.

Gregório parou de correr, arrastando seus pés de forma brusca pela estrada de terra e levantando uma pequena nuvem de poeira.

–Por que paramos? – disse Gregório, com o rosto virado para Sabrina.

–Posso ver as luzes da torre, estamos próximos – ela respondeu.

Abaixei minha cabeça para olhar o horizonte.

Sabrina estava certa.

O terreno em que estávamos andando era plano, em volta da estrada havia uma vastidão de campos cobertos por grama rasteira. Ao olhar para frente, vi um pequeno conjunto de carvalhos, distribuídos pelo campo. As árvores eram grandes, expandindo seus galhos para cima e para os lados, criando sombras que escureciam ainda mais o terreno abaixo delas.

E próxima dos carvalhos, estava a torre.

A torre ficava ao sul do povoado, e em tempos antigos serviria para ajudar na patrulha daquelas terras. Mas a construção da torre foi abandonada pela metade, e nenhum dos governantes teve o interesse de terminá-la. Ela se erguia num quadrado de dois andares feito de pedra lisa e cinzenta. A torre não possuía muralhas ou fossos, e o segundo andar não possuía teto, apenas uma pequena janela, no lado em que estávamos. A entrada da torre era uma porta dupla de madeira grossa, presa a uma das quatro paredes da estrutura. Em cada lado da porta havia uma tocha acesa. As tochas estavam presas à parede por pequenos suportes de metal.

Nós três nos escondemos em um dos carvalhos mais próximos da torre, tirando proveito de suas sombras para nos ocultar na escuridão da noite. Gregório me pôs no chão e removeu de seu ombro esquerdo uma alça que estava presa a uma larga caixa preta revestida de couro.

Você está bem? – perguntou Gregório, me olhando com uma expressão séria.

–Estou – eu disse, enquanto limpava meus olhos com as costas das mãos – Vocês vão matar eles, não vão? Eu quero ir junto.

Enquanto eu conversava com Gregório, Sabrina observava a torre, em silêncio.

–Preste atenção, Drystan. Tudo o que aconteceu com seu povoado foi por conta de um capricho nosso. Se não tivéssemos arrumado uma briga com esses homens, tudo estaria bem. Não quero que você faça parte do que vamos fazer, só vai te trazer mais problemas.

–Então por que me trouxe junto? – perguntei, deixando Gregório sem palavras.

Após alguns instantes, Gregório sorriu.

–Tem razão, eu te trouxe até aqui, você tem o direito de nos acompanhar até o final – disse Gregório.

Souverain, tem dois homens guarnecendo a entrada. E um soldado vigiando a janela do segundo andar – disse Sabrina.

–A torre possui seteiras? – perguntou Gregório.

–Não, as paredes do primeiro andar são completamente retas – respondeu Sabrina.

– O que são seteiras? – perguntei.

–São pequenas aberturas feitas na parede de um forte, os soldados usam essas aberturas pra atirar flechas – Gregório se virou para Sabrina – Eu cuido daqueles dois que estão de guarda. Depois disso você caminha até a entrada e chama o resto do grupo, mas tome cuidado, aquele pescador disse que havia mais de vinte homens junto do filho do Conde.

–Eles devem estar despreparados, Souverain – disse Sabrina.

–Ainda assim, tome cuidado – disse Gregório.

Um pequeno sorriso se formou no canto da boca de Sabrina.

–Como você vai matar aqueles dois? – perguntei a ele.

–Com isto – ele respondeu, repousando a caixa preta sobre a grama.

Gregório abriu o lacre da caixa, revelando seu conteúdo.

–O que é isso? – perguntei.

–Uma arma de outro continente, não tem uma tradução para nossa linguagem, mas eu gosto de chamá-la de “Besta” – disse Gregório.

A besta era formada por um suporte longo feito de madeira, que servia para apoiar um arco de flechas no lado oposto da coronha. O arco ficava deitado no suporte, era feito de ferro, e era da largura do antebraço de Gregório. Em cima do arco ficava um compartimento de madeira, mais tarde descobri que ele servia para armazenar um jogo com dez dardos. Uma resistente corda de cânhamo atravessava a besta, indo de uma ponta a outra do arco. Havia uma alavanca presa pelos dois lados e deitada na direção da coronha. E por fim, perto da coronha da besta, havia um gatilho que servia para disparar os dardos.

Era uma arma completamente estranha a meu ver, pois como Gregório havia mencionado, não havia nada igual no continente.

–E o que ela faz? – perguntei.

–Você vai ver – Gregório apoiou o joelho direito no chão. Depois segurou a coronha da besta com a mão direita, recuando o braço. Sua mão esquerda segurava a parte de baixo do suporte da arma. Ele apontou a besta em direção aos homens que vigiavam a entrada da torre – Sabrina, assim que eu atirar o primeiro dardo, você corre. E não se preocupe, se alguém tiver um arco, eu mato antes que te atinja.

–Sim, Souverain – ela respondeu.

Aguardamos por alguns instantes, enquanto Gregório permanecia imóvel.

Observei os dois soldados, eles pareciam sonolentos e desinteressados em seus serviços.

E quando um deles olhou para baixo, por distração, Gregório atirou.

–Agora! – exclamou Gregório, disparando um dardo certeiro que viajou pelo ar até encontrar a cabeça do soldado distraído. O dardo atravessou o elmo de metal que o homem usava e se depositou no crânio, fazendo com que o soldado caísse morto.

Sabrina saltou das sombras, correndo em pressa pela grama.

Após o primeiro disparo, Gregório imediatamente empurrou a alavanca da besta para frente, depois a puxou para trás outra vez, recarregando a arma. E enquanto o segundo soldado percebia que seu companheiro havia caído, Gregório puxou o gatilho.

O dardo voou, acertando a garganta do homem antes que ele gritasse por ajuda. O soldado, confuso, levou as mãos até seu pescoço e tentou atravessar a porta. Mas despencou no chão, incapaz de suportar a dor.

O soldado que vigiava a janela viu a movimentação e avisou os demais homens de Senhor Brandon.

–Estamos sendo atacados!

Sabrina agora estava a uma curta distância da entrada. Ela se posicionou em direção a porta e gritou seu desafio.

–Eu vim buscar a cabeça do filho do Conde!

Durante algum tempo, não houve resposta. Mas logo, a porta dupla se abriu, e de dentro da torre saíram os vinte soldados de Senhor Brandon. Eles eram em sua maioria homens mal equipados, poucos deles usavam cota de malha. A maior parte deles apenas tinha um colete acolchoado como proteção do dorso. As armas variavam entre espadas, lanças e machados. Alguns deles possuíam escudos, mas assim que viram que o oponente era uma mulher, largaram a proteção na mesma hora. Os homens se reuniram numa grande fileira, e permaneceram em silêncio, encarando Sabrina.

–Ei Gregório! Não vamos ajudar ela? – eu disse, pois continuávamos escondidos nas sombras do carvalho.

–A melhor ajuda que eu posso dar a ela, é ficar fora do caminho – disse Gregório.

–Como assim? – perguntei.

–Ela precisa de espaço, Drystan.

–Ela precisa é de ajuda! Tem vinte homens ali! – exclamei.

–Onde está o filho do Conde? – gritou Sabrina.

–Gregório! Por que vocês estão esperando que todos eles saiam da torre? Isso é estupidez! – eu disse, em voz baixa.

–Drystan, Apenas observe – disse Gregório, posicionando a besta em direção aos homens de Senhor Brandon.

–Eu perguntei onde está o filho do Conde! – Sabrina gritou novamente.

Por fim, Senhor Brandon atravessou a porta dupla, em passos lentos. Ele vestia uma cota de malha brilhante, coberta por um tabardo de guerra branco. Botas de couro com placas de metal protegiam suas pernas. Seus braços estavam desprotegidos, pois a cota de malha só ia até os cotovelos. Senhor Brandon estava sem seu elmo, nos permitindo ver seu rosto. Ele tinha longos e lisos cabelos negros, a barba estava feita, e seus olhos eram pequenos e vigilantes. Sua única arma era uma espada embainhada em seu lado esquerdo.

–Estou aqui. E você pode me chamar por “Senhor Brandon” – o filho do conde caminhou até seus homens – Você vai se arrepender por ter atacado um nobre, sua puta!

–Isso é tudo o que você tem a dizer antes da morte? Se esses soldados forem tão bons quanto os da estalagem, é melhor pensar em palavras melhores – disse Sabrina, com seu sotaque inconfundível.

–Sabe, alguma explicação terá que ser dada a meu pai sobre aquelas cabanas em chamas. Por sorte eu estou com a responsável pelo crime bem aqui na minha frente. Vou arrastar você até minha fortaleza, e lá você vai desejar ter morrido junto daqueles pescadores imundos – disse Senhor Brandon.

Sabrina desembainhou uma de suas espadas e a apontou para os homens.

–Saiam da minha frente – ela disse, olhando com frieza para os soldados.

–Chega! Tragam-me essa puta! – gritou Senhor Brandon.

Os vinte soldados avançaram para cima de Sabrina, desorganizados.

Ela permaneceu imóvel, com a lâmina apontada para os homens.

–Ei! Ela vai ser morta! – exclamei para Gregório.

O primeiro soldado a se aproximar levantou sua espada com as duas mãos e desceu a arma, tentando um golpe em arco para acertar Sabrina. Mas a mercenária pulou para trás, se desviando enquanto segurava sua lâmina com a mão direita. Antes que o soldado reagisse, Sabrina cortou o ar, girando o braço direto e abrindo a garganta do homem. Mas não havia tempo para descanso, pois outros três soldados avançavam em sua direção.

Gregório disparou sua besta, acertando um dos três soldados, entre os olhos. O homem despencou para frente, e Sabrina usou o corpo imóvel do soldado para absorver o ataque dos outros dois homens.

As espadas dos dois ficaram presas ao corpo do companheiro, e Sabrina aproveitou a oportunidade para cortar a garganta dos soldados, em apenas um giro.

Enquanto os três atacavam Sabrina, os demais soldados a cercavam. Mas ao ver a facilidade com que a mercenária matara quatro dos homens de Senhor Brandon, os soldados hesitaram por um breve momento. Foi tempo suficiente para Sabrina pular em cima do homem que estava na sua frente, pisando com força em seu rosto e o usando como apoio para saltar uma segunda vez.

O forte chute de Sabrina fez com que o homem caísse imediatamente, sem consciência. E enquanto estava no ar, a mercenária enterrou sua lâmina no soldado seguinte, que observara a cena boquiaberto.

Enquanto o soldado caía, Sabrina removeu sua lâmina do peito do homem, e usou o corpo dele para tomar impulso. A mercenária usou o impulso para avançar, rolando pelo chão e se afastando dos soldados. Ela agora estava frente a frente com Senhor Brandon, e ergueu sua lâmina em direção à garganta do filho do Conde.

–Isso é impossível! – exclamei. Pois em segundos, Sabrina havia aberto um caminho até seu alvo.

Gregório sorriu.

Os soldados hesitaram novamente, mas logo começaram a se mover em direção a Sabrina.

–Parem! Seus merdas! Não estão vendo que ela tem uma espada na minha garganta? – gritou Senhor Brandon.

Sabrina olhava para ele, como se estivesse prestes a cortar sua cabeça.

–Mande seus homens largarem as armas – disse Sabrina.

Senhor Brandon riu.

–Agora! – gritou o filho do Conde.

E da janela do segundo andar, surgiu um homem, empunhando um arco de caça. A arma já estava com sua corda completamente esticada, pronta para liberar uma flecha mortal.

–Não! – gritou Gregório, apontando sua besta para o arqueiro.

O dardo de Gregório voou primeiro, acertando o ombro direito do arqueiro e fazendo com que ele soltasse a flecha na direção errada. A flecha viajou pelo ar até ser enterrada no peito de um dos soldados de Senhor Brandon.

Sabrina se distraiu por um instante, olhando para o arqueiro no segundo andar. Enquanto isso, o filho do Conde se aproveitou para tomar distância, e começou a correr em direção à torre.

Mas os olhos de Gregório eram bem treinados, e seus reflexos com a besta eram imbatíveis. Ele empurrou a alavanca da arma, depois a puxou para trás, e com a besta recarregada, atirou um dardo certeiro na dobra da perna esquerda de Senhor Brandon.

O nobre caiu na mesma hora, gritando em agonia.

Os homens de Senhor Brandon avançaram imediatamente para cima de Sabrina, para impedir que ela matasse o filho do Conde. Dois dos soldados restantes finalmente perceberam a presença de Gregório, e agora corriam em nossa direção.

Eu dei um passo para trás, com medo.

Gregório recarregou a besta, acertando o peito de um dos soldados. Depois empurrou a alavanca, e enquanto a puxava para trás, o segundo soldado já brandia um machado em sua direção.

Eu gritei.

E um segundo dardo voou, acertando o olho do homem. O soldado caiu ao lado esquerdo de Gregório, ainda vivo, mas o mercenário puxou uma adaga presa em sua bota, e a enterrou nas costas do homem, com violência.

Gregório respirava forte, e gastou alguns segundos observando o soldado morto.

–Sabrina! – exclamou Gregório, retomando o foco e recarregando a besta.

Quando voltei minha atenção para a mercenária novamente, não pude acreditar no que estava vendo.

Ela agora empunhava duas espadas, e apesar de estar cercada por vários inimigos, movia as duas lâminas com naturalidade. Um homem tentou perfurá-la com uma lança, mas Sabrina desviou do golpe e cruzou suas espadas, empurrando-as até a garganta do lanceiro e depois as girando com força, decepando a cabeça fora.

Sabrina então segurou a espada da mão esquerda ao contrário, como se fosse uma adaga, e girou seu corpo para a direita entre a multidão, acertando dois cortes precisos em dois soldados, rompendo suas cotas de malha e fazendo com que grandes jorros de sangue se espalhassem pelo ar.

Um homem tentou golpear Sabrina, brandindo uma espada de cima para baixo. Ela se esquivou para a esquerda e enquanto o homem permanecia abaixado por conta do golpe, acertou uma joelhada em seu nariz, deixando-o inconsciente.

Dois lanceiros correram até Sabrina, direcionando suas armas para as costas da mercenária. Ela olhou de relance, e percebendo os soldados, jogou seu corpo para trás, acertando um chute no joelho de um dos lanceiros. O homem caiu, usando a lança para se apoiar no chão, mas a arma entrou com força na terra, se prendendo. O segundo lanceiro teve sua nuca atingida por um dos dardos de Gregório e caiu agonizante. O soldado que prendera a lança no chão tentou recuperar sua arma, mas Sabrina chutou seu rosto, fazendo com que ele caísse para o lado, imóvel.

Apenas seis soldados continuavam erguidos, e quatro deles tentaram atacar Sabrina ao mesmo tempo.

A mercenária se jogou na direção de um deles, acertando os olhos do homem com as coronhas de suas espadas, cegando-o. O soldado gritava de dor, enquanto Sabrina escapava dos outros três golpes.

Uma lâmina girou, cortando um dos soldados do ombro até o quadril. Outra lâmina girou, fazendo com que mais uma cabeça voasse até a grama.

Os três soldados largaram suas armas e correram, apavorados. Mas Gregório não os deixou escapar, acertando um dardo na cabeça de um dos homens.

Os outros dois ficaram paralisados de medo, sem ter para onde fugir.

Sabrina pulou nas costas de um deles, e com as lâminas cruzadas, cortou fora sua cabeça.

O ultimo soldado caiu de costas no chão, chorando.

–Você vai ficar onde está! – Sabrina gritou ao sobrevivente, com um tom de voz furioso.

A mercenária parou de se mover, arfando, com as duas espadas banhadas em sangue.

Aquela foi a primeira vez que vi Sabrina lutar de verdade.

Aquela foi a primeira vez que vi a dança das lâminas rubras.

Mas ainda não estava acabado.

Sabrina caminhou até Senhor Brandon, que permanecia sentado próximo da entrada da torre, sem crer no que acabara de acontecer.

Assim que se deu conta de que a mercenária andava em sua direção, o filho do conde desembainhou sua espada, e a usou como apoio para se erguer. Ele teve de fazer esforço para ficar em pé, por conta da dor na perna esquerda.

Sabrina fixou suas duas espadas no chão, e caminhou até um pequeno machado que estava caído entre os corpos.

–Você não sabe o que fez! Tem ideia do que fez? Meu pai vai descobrir! – Senhor Brandon gritava.

–Sim, eu espero que ele descubra – disse Sabrina, segurando o machado.

Senhor Brandon gritou, avançando com suas ultimas forças para matar Sabrina, enquanto erguia sua espada com as duas mãos.

Antes que Brandon descesse sua espada, um dardo voou, acertando o filho do Conde no peito e fazendo com que ele parasse de se mover. Ele permaneceu parado, com os olhos esbugalhados encarando Sabrina.

A mercenária soltou um grito de cólera, girando o machado da direita para a esquerda e acertando as mãos erguidas de Senhor Brandon.

O nobre se atirou ao chão imediatamente, berrando de agonia e chorando como um recém-nascido. Sua mão esquerda havia sido decepada, mas continuava presa a espada. A mão direita fora cortada pela metade, mas com o peso da arma, se virou para o lado, provocando mais dor em Senhor Brandon.

–Essas mãos. Você as usou para queimar aquele povoado – disse Sabrina, chutando o rosto do nobre e se pondo sobre seu corpo agonizante – Espero que tenha valido a pena.

Sabrina tomou a espada do nobre, e a enterrou no estômago do homem, atravessando o metal e a carne, até se prender no solo.

Senhor Brandon cuspiu sangue e se debateu até perder a consciência.

E eu observei.

Tudo que eu sentia naquele momento era um misto de admiração e medo por Sabrina. Ela era implacável, cruel com seus inimigos, um verdadeiro monstro em batalha. Mas havia vingado a morte de minha mãe, havia vingado meu povoado.

A mercenária se levantou, recolheu suas espadas, e caminhou em nossa direção.

–Incrível – eu disse em voz baixa, me sentando.

Souverain, o que vamos fazer agora? – ela perguntou a Gregório, exausta.

–Nós vamos deixar aquele pobre sujeito correr até o Senhor dessas terras e dizer o que aconteceu. Assim a culpa não vai cair sobre os moradores do povoado – disse Gregório, apontando para o soldado sobrevivente.

Sabrina se sentou, e Gregório ofereceu a ela um pequeno pano para que limpasse o rosto.

–Drystan – disse Gregório, me tirando de meu transe – Você tem parentes em algum lugar?

–Não. Eu não tenho ninguém – eu disse.

–Venha conosco – disse Sabrina, olhando para mim enquanto limpava o sangue de seu rosto.

Fiquei mudo.

–Vocês tem certeza? Eu sou só um garoto, não sei fazer nada, vou ser só um peso morto – eu disse.

–Você sabe cozinhar e carregar peso? – disse Gregório.

–Sei.

–Então sabe fazer alguma coisa – disse Gregório, sorrindo.

–Não tire proveito da situação! – exclamei, fazendo com que ele risse.

–Mas sabe Drystan, tudo o que aconteceu com você é responsabilidade nossa. Não poderíamos virar as costas para você agora. Você é livre para nos acompanhar por quanto tempo quiser, e se decidir ir para outro lugar, nós o ajudaremos – disse Gregório.

Eu sorri, desmaiando em seguida por conta da exaustão.

Ao conversar com os dois na praia, antes do incêndio, eu me perguntei se eles não me aceitariam como companheiro.

Nunca imaginei que o custo para essa jornada fosse tão alto, mas como aprendi mais tarde, é dessa forma que nossos desejos movem o mundo.

Apesar da tragédia que me ocorreu, entrar na vida de Gregório e Sabrina me trouxe muitas alegrias.

Pois nos dias seguintes, minha jornada ao lado dos dois começou.


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Notas finais do capítulo

Obrigado por ler, toda crítica será mais que bem vinda o/

Próximo Capítulo: O Caminho do Mar Parco - Parte Um.