Traiçoeiro escrita por Roses


Capítulo 26
Capítulo 26


Notas iniciais do capítulo

Olá meus amores, como estão? Passaram bem a semana? Mais um capítulo e espero que gostem.

Boa leitura.



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Capítulo 26

–Meu Deus... Meu Deus. – sussurrei freneticamente de encontro ao seu peito, e cada vez que repetia Jones me apertava mais forte.

–Shh, fique calma... Vamos mudar a rota, tudo bem?- sugeriu.

Levantei a cabeça para ver seus olhos, meu nariz batendo de leve em seu queixo ao encontrá-lo me olhando com apreensão.

–É inútil. – murmurei. – Se mudarmos a rota, no fim vamos acabar chegando nesse mesmo lugar.

Jones assentiu, acariciando minhas costas, pousando o queixo em minha cabeça.

–Você está certa. – soltou um suspiro pesado. – Vamos fazer o seguinte: eu a deixo no lugar de onde saímos e vou procurar Landon e Bae, desse jeito...

Me afastei dele, o encarando irritada.

–De jeito nenhum, Jones. Nós dois vamos ficar juntos. – declarei. – Não irei deixar que saía sozinho nesta.

Prendi a respiração, arrumando coragem de algum lugar bem escondido dentro de mim, e me virei para observar o ambiente.

Meu estômago se contorceu e meu primeiro instinto foi fechar os olhos para não ver a carnificina que se encontrava bem a minha frente.

Dei três passos, parando repentinamente quando meu pé afundou em algo.

Pulei para trás ao me dar conta do que era.

–Isso se torna pior a cada segundo e nem chegamos ao submundo de fato... O que eu não entendo, é que... Como eles seriam o sangue inocente? – questionei para mim mesma, a boca seca ao observar meu sapato sujo de vermelho – “Com a travessia pela garganta do diabo, aquele que sobreviver diretamente ao inferno chegará”. – citei, me virando para Jones. – Jormungand foi a travessia... Mas essa ilha parece tanto com aquela que... – olhei ao redor, abrindo a boca em total perplexidade.

–O que foi Swan? – Killian olhou para os lados, tentando encontrar o que me deixara naquele estado.

–A Yaggdrasil... Ela sumiu. – constatei. – Digo, ela ainda está ali, mas de outra forma.

Jones olhou para a árvore que estava distante de onde nos encontrávamos.

–Parece a mesma árvore para mim, Emma. O tronco...

–Está contorcido. Aquilo que estamos vendo é uma das raízes, Killian... Não estamos mais em Midgard, a terra dos homens e animais. Já estamos em um dos domínios de Hel... Mas não faz sentido, a parte do “Um lugar onde a água do mar em sangue inocente se transformará, deverá se banhar para que a criatura das bestas o deixe passar”.

Observei Jones fechar os olhos, sendo atingido por algum tipo de compreensão que eu não conseguia enxergar. Ele se aproximou do rio de cadáveres e o encarou por longos minutos.

–Nenhum desses sete homens queria viver no mar. Eles... Apenas ficaram porque se acomodaram, já achavam que estavam amaldiçoados. – riu sem humor nenhum, me fitando. – Esses homens eram que estavam comigo desde o começo... Eles foram capturados para servir a marinha real para qual eu trabalhava. Eram homens que foram arrancados de suas famílias por caçadores de recompensa que ganhavam uma libra por homem. Não tiveram escolhas. – Jones virou de costas, passando a mão pelos cabelos em um gesto nervoso. – Existe um ditado que nós, homens do mar, sempre escutamos daqueles que se acham superiores, que diz “Aqueles que fossem para o mar por prazer, iriam para o inferno por passatempo”.

Os ombros de Killian estavam tensos e por algum motivo ele parecia se recusar a me olhar.

–Eu iria sobreviver de qualquer jeito, porque já está em meu destino vir parar nesse lugar.

–Mas você também não queria essa vida...

Jones negou com a cabeça, me olhando pesaroso.

–Eu lhe disse que era tenente, mas não cheguei tão alto sendo forçado a entrar... Me joguei ao mar de boa vontade, porque estava atrás de aventuras e queria desafiar minha mãe... Ser o desgosto da família... Eu sentia prazer quando entrei por isso me alistei para servir.

–Killian... Onde quer chegar? – questionei incerta, aturdida de ver como ele estava atormentado.

–Que eu causei isso! – gritou apontando para os homens. – Quando eu aceitei aquele... – Jones se interrompeu, respirando fundo. – Era para você estar ali. Você nunca quis isso, Emma. Viver no mar. O único motivo pelo qual está aqui é porque...

–Eu preciso encontrar minha mãe, ou respostas. – completei. – Killian isso não é culpa sua, eles poderia ter saído, tentado outra coisa quando tomou o navio e quanto a mim... Está certo, eu não gosto do mar. Nunca gostei, e como já me ouviu dizendo não é a vida que eu quero para mim, porém é a minha necessidade do momento.

–Emma você não entende... – Jones andou até mim, segurando meu rosto, os olhos cheios de culpa. – Eu quase a matei.

Apertei sua mão, sem ter certeza de onde ele queria chegar com aquilo, mas sabia que estava me dando dicas sobre alguma coisa, que não fazia sentido para mim ainda.

–Você me salvou Jones. Esqueça o ditado e vamos focar em achar sua resposta. Nada disso é culpa sua, querido. – o tranquilizei, depositando um beijo na palma de sua mão. – Agora temos que atravessar isso. Acredito que agora sejamos apenas nós dois, por que sinceramente? Não quero encontrar Landon e Bae aqui embaixo.

–Acho que eles estão melhor longe daqui. - concordou. - Eu gostaria que ficasse Emma, mesmo que eu saiba que é inútil lhe pedir isso.

Sorri para ele, apesar do medo, tentando transparecer calma.

–Fico feliz em ver que já me conhece tão bem em tão pouco tempo... Vamos manter o "primeiro as damas"?- sugeri soltando sua mão e indo em direção aos corpos. – Pensando bem, talvez eu queira que você vá primeiro, se não tiver problemas.

Jones aquiesceu, passando por mim e entrando sem hesitar por um momento e nem olhando para trás. O fitei andando lentamente, afastando com seu braço esquerdo as partes indefinidas que boiavam na água suja de sangue.

Engolindo a bile que estava querendo sair, fechei os olhos e fui me enfiando naquele terror, mordendo o interior de minha boca ao constatar que o liquido em que estava entrando era grosso. Trombei em alguma coisa e abri os olhos, apertando os lábios ao me deparar com a cabeça de Viorel, a boca escancarada de uma forma aterrorizante.

E então seus olhos piscaram.

Meu estômago se contraiu com aquilo. Cravei meus olhos nas costas de Killian que não estava muito distante de mim, pensando que deveria ter sido minha imaginação, querendo me pregar peças.

Um grito agudo saiu de mim ao sentir algo segurando meu braço.

–Isso foi culpa sua. – metade do que um dia foi o Cirurgião acusou, segurando meu braço com força.

–Eu... Eu... Não fiz nada. – sussurrei, sentindo as lágrimas de medo, escaparem dos meus olhos, alguma coisa começando a se enrolar em meu corpo, me imobilizando.

–Você nos fez vir até essa ilha. – a cabeça de Colm falou comigo à distância.

Mexi a boca querendo articular alguma coisa, porém não consegui.

–Foi por sua causa! – tive a impressão que mil vozes gritaram em minha cabeça, fazendo eu me encolher e petrificar no lugar, mal conseguindo respirar, como se por algum motivo elas estivessem certas,

Mas eu nunca quis ir para lá. Não foi minha idéia.

–O que eu posso fazer para ajudar? – balbuciei sem olhar para ninguém em particular, os olhos fixos em meu colar, enquanto eu sentia meu corpo sendo apertado, como se estivesse determinado em me cortar, como havia feito com homens.

Então as risadas começaram como algo apenas sussurrado, para se tornarem estrondosas e gritadas, como se estivessem zombando de mim.

Fechei os olhos respirando superficialmente tentando me controlar. Nada daquilo era verdade. Eles estavam mortos.

E o principal: a culpa não era minha.

–Vocês tinham uma escolha. – murmurei com rapidez, tropeçando nas palavras. – Não foi culpa minha. Vocês podiam ter saído do navio quando Killian o tomou. Vocês são os culpados.

–Não tivemos escolhas! – a cabeça de Viorel rebateu.

–Está errado. Vocês não morreram por terem sido forçados a entrarem para essa vida. Morreram pela inocência de acharem que não poderiam mudar o fato, se chamaram de amaldiçoados e se contentaram com isso. São inocentes por causa da ignorância. – conclui em um sussurro, levantando a cabeça e endireitando a coluna. – “Aceite aquilo que não pode ser mudado, empenhe-se para mudar aquilo que é possível e saiba distinguir a diferença entre essas duas coisas”. – citei a frase dita tantas vezes por Granny. Eu nunca havia entendido, sempre balançava a cabeça, com ar de quem havia compreendido, mas ficava me perguntando o que ela quis dizer.

Agora eu entendia.

E não poderia ter um significado mais simples.

A pressão do meu braço sumiu, assim como a de meu corpo e vi os pedaços mutilado dos homens se transformarem em criaturas rastejantes, que soltavam sons agonizantes, com aparência grotesca.

Logo elas voltaram para o fundo, e a água do rio se tornou límpida.

Olhei para Killian que me encarava, ainda no mesmo lugar, e naquele momento fui invadida por uma calma, que não poderia ser explicada.

–Você não foi o culpado. Eles foram. Às vezes é bom ficar na ignorância, mas ela também pode lhe destruir. Ficar na ignorância significa ficar na inocência, assim não tem como mudar e crescer, se conhecer internamente. Eu teria morrido se tivesse aceitado que eu era a culpada, mesmo sabendo que não sou.O crescimento é uma coisa possível, temos que nos empenhar sempre nisso. O impossível é aceitar ficar na ignorância e achar que isso é tudo. – expliquei andando até ele.

–Como Swan? – indagou após longos minutos.

–O mundo de Hel tem um significado para algumas pessoas como um lugar para conhecer a si mesmo, para adquirir conhecimento. Uma visita ao inconsciente para conhecer suas fobias e assim tentar vencê-las. Cada etapa da profecia, é um medo nosso a ser vencido para que assim conheçamos mais de nós mesmos... Poderíamos sair agora da água? Apesar de ter vencido aquelas coisas, eu não quero ficar aqui para caso eles decidam voltar.

Jones me ofereceu a mão, e eu a peguei, deixando que ele me guiasse. Ao invés de atravessarmos como a ideia inicial, seguimos contra a correnteza, para dentro da floresta, até que se tornou ainda mais escura.

Como se fosse possível.

Killian me ajudou a sair do rio e jogou seu casaco de couro sobre meus ombros. Era estranho o seu silêncio e como me olhava o tempo todo, como se quisesse me contar alguma coisa.

Mas ali não era lugar para questionar. Eu teria que esperar até voltarmos ao navio.

–Você está se sentindo bem, Swan?

Desviei meus olhos do pingente de meu colar que estava emitindo uma luz brilhante e avermelhada, focando em Jones.

–Claro. Só estou cansada e com o corpo dolorido. Gostaria de poder me sentar um pouco para descansar. – confessei sem graça. – Mas sei que não podemos...

–Podemos sim. – me interrompeu. – Eu faço a vigia agora enquanto você descansa. Está doente e precisa repor as energias, sem contar que já fez mais do que uma dama aguenta para uma vida toda.

Sorri agradecida, procurando em volta um lugar que desse para descansar.

–Gostaria que parasse de ficar me definindo como uma dama. – comentei, me sentando no chão, perto de uma rocha. – Eu não sou mais uma dama, apenas uma mulher que gosta de ser respeitada. Enquanto estou com vocês gostaria de ser apenas, Emma Swan.

Killian aquiesceu, sentando perto de mim.

–Como quiser, senhorita. Seu colar... – apontou. Ajeitei um amontoado de folhas secas e me deitei, usando o casaco de Jones como coberta.

–Eu sei. Ele nunca fez isso antes... Sem falar que está quente.

A testa de Jones se enrugou e ele pousou as pontas dos dedos em meu rosto.

–Isso porque você está queimando em febre, Emma.

Neguei com a cabeça, fazendo-o tocar a pedra vermelha de meu colar.

–Está sentindo?

Ele fez que sim com a cabeça e recolheu a mão.

–Não deve ser nada importante. Minha preocupação é sua febre.

–Eu estou bem. – garanti. – Ainda não comecei a delirar, nem nada. – bocejei. – Tudo bem mesmo se eu dormir um pouco antes de continuarmos?

Eu esperava um sorriso, mínimo que fosse, porém Jones continuava a me fitar sério, seu rosto preso em uma expressão de profundo tormento e melancolia que não faziam o menor sentido para mim.

Algo estava muito errado.

Fechei os olhos, usando as mãos como travesseiro e fiz uma pequena prece ao mesmo tempo, que era embalada pela exaustão.

[...]

Acordei sendo sacudida por Killian.

Pisquei atordoada olhando ao redor, antes de voltar a olhá-lo.

–O que aconteceu? – instiguei com a voz mole, como se não pertencesse a mim.

–Você estava se debatendo, então começou a conversar com uma tal de Branca e David... Sua febre aumentou. – constatou.

Passei a mão pelo meu rosto, me sentindo quente e suada.

–Você fique aqui. Vou jogar um pouco de água no rosto e pescoço, então você pode descansar um pouco. – falei, tentando me colocar de pé com muita dificuldade. – Eu estou com sede.

–Imagino que sim, amor. Mas perdemos tudo na luta com a serpente. – informou. – E não acho que essa água seja adequada.

Aquiesci, saindo cambaleando em direção ao rio. Me coloquei de joelhos, mergulhando as mãos e aproveitando a sensação de frescor. Passei- as no rosto, descendo para o pescoço, repetindo o trajeto várias vezes.

Observei meu reflexo fantasmagórico na água turva. Os cabelos desgrenhados e com folhas preso a ele, os olhos caídos, meus lábios com um doentio tom de azul, contrastando com o vermelho do sangue seco, causado pelos cortes devido ao ressecamento e a tosse. Minhas bochechas estavam coradas, porém fundas.

“Se as mulheres da sociedade me vissem agora, sentiriam inveja” pensei com sarcasmo, sentando na beira do rio.

Virei a cabeça para trás, porém Killian não estava mais lá. Quis sair em sua procura, mas achei melhor esperar uns minutos, talvez ele estivesse precisando de um tempo de homem para suas necessidades.

–A pedra perdida do colar de Freyja. – ouvi uma voz anasalada e a procurei, até me deparar com um homenzinho atacarracado, orelhas e nariz desproporcional para o rosto pequeno. – Quem é você? – questionou com rispidez.

O encarei, tentando entender o que estava dizendo.

–Me desculpe, o que?

–Como conseguiu roubar a pedra do colar de Freyja? – apontou e eu segui seu dedo.

Instantaneamente levei minha mão ao meu colar.

–É um presente de minha mãe. – expliquei.

O homenzinho me encarou com uma expressão severa.

–Um ourives nunca esquece uma de suas peças. Ainda a mais bela, dada de presente a uma deusa. Essa é a pedra perdida do colar Brisingamen, trabalhei muito nele, junto com meus irmãos.

–Eu realmente não sei...

–Por Odin! – outro homenzinho seguido por mais dois, exclamou. – Eu reconheceria o calor dessa pedra mesmo se estivesse morto.

–É a pedra roubada do colar de Freyja. – o terceiro se aproximou, admirando meu pescoço.

–Ela ficará tão contente quando devolvermos que é bem capaz de querer nos retribuir novamente. – o quarto se juntou ao grupo, sorrindo largamente.

Fiquei em pé com dificuldade, os encarando com receio.

–O que são vocês? - perguntei, dando passadas cautelosas para trás.

–Acho que nós deveríamos perguntar a você. - o primeiro atalhou.

–E como conseguiu a pedra do colar de Freyja?- o terceiro indagou.

–Meu nome é Emma e estou tentando entrar no mundo de Hel... Quanto ao colar, ele é um presente de minha mãe, não sei do que estão falando. - respondi, olhando ao redor e procurando Killian.

O quarto homenzinho inclinou a cabeça para um lado e então para o outro, me estudando atentamente.

–O que quer no mundo de Hella?

–Isso é apenas assunto meu. Quem são vocês?

–Anões. - o segundo respondeu dando de ombros. - Você está no nosso reino. Hel fica um pouco mais abaixo... Precisará passar por ali. - apontou para as árvores. - Até que a floresta se transforme em ferro, tão cortante que desejará nunca ter entrado nela.

–Vai ser fácil. - o quarto continuou. - É apenas desviar dos galhos e folhas... Se não fosse os lobos guardiões da floresta e o fato dela ser tão escura que não se consegue enxergar um palmo diante do nariz.

–Agora que já sabe como chegar... Queremos a pedra do colar Brisingamen. - primeiro deu um passo em minha direção, esticando a mão gorducha e calejada para mim.

Apertei meus dedos ao redor do pingente com força e me virei, os encarando de soslaio.

–Não. Isso é meu, vocês devem estar confundindo com outra pedra.

Os quatro anões se entreolharam, como se estivessem conversando entre si, até pareceram chegar a um acordo.

–A pedra é nossa, nós a conhecemos, pois a moldamos durante dias para que ficasse nesse formato. É nosso trabalho... Mas já que parece gostar tanto assim dele, talvez esteja disposta a pagar por ele como Freyja fez pelo colar todo. – o primeiro tomou a frente.

Me endireitei, os fitando desconfiada.

–E qual é o preço? Quanto Freyja pagou por ele? Vocês devem saber que eu não tenho nada de valor tirando esse colar... – avisei. – O que vocês podem querer?

–Então você nunca ouviu a história de como Freyja conseguiu o Brisingamen? – segundo instigou com as sobrancelhas grossas arqueadas.

Balancei a cabeça em uma negativa, me afastando discretamente.

–Nós estávamos em nossa caverna, terminando o colar. – o terceiro anão começou de uma forma bem teatral. – Quando Freyja apareceu, depois de sua visita pela terra dos homens para se divertir... Ela decidiu vir ao nosso mundo, Svartalfheim, por mera curiosidade...

–E nos encontrou na caverna. – prosseguiu o quarto. – Freyja é a deusa do amor, da sensualidade, fertilidade e ama jóias, logo assim que colocou os olhos no colar que terminávamos, se sentiu enfeitiçada e o queria para si. Porém como já dissemos, era a jóia mais linda que já havíamos fabricado, não poderíamos simplesmente dá-la sem ter algo em troca.

–E o que raios vocês pediram? – indaguei irritada, por mais que algo dentro de mim já parecia saber a resposta.

–Bem... Olhe só para nós, somos horrendos e pequenos... Tivemos que aproveitar quando a oportunidade surgiu. Em troca do colar, Freyja teria que passar uma noite de amor com nós quatro. – explicou o primeiro.

–Não os quatro de uma vez. Uma noite com cada um. – esclareceu o segundo. – Não somos pervertidos.

–Claro que não. – murmurei com cinismo.

–Você não chega nem aos pés da deusa, mas é bonita o suficiente, mesmo estando moribunda. – terceiro me olhou da cabeça aos pés.

–E tem o corpo quente. Adoramos o calor do corpo de uma mulher. – quarto me abriu um sorriso.

Me senti enojada com tudo aquilo.

– Isso não vai acontecer. Não irei passar a noite com vocês pela droga do colar que é meu! – ri de descrença, não achando possível aquela conversa ser real.

A febre deveria estar muito alta.

O segundo anão ame encarou, uma expressão de desdém no rosto.

–Então teremos que tomar o que é nosso. – concluiu.

Puxei a espada que estava presa em minha cintura e apontei direto para o nariz dele, que ousou chegar perto de mim. Minha mão tremia e eu mal conseguia respirar. Naquele mesmo instante os outros três me cercaram, os rostos transformados em caretas horríveis.

–Péssima idéia, queridinha. – uma voz alegre soou do meu lado direito e virei a cabeça, dando de cara com um homem de estatura mediana, a pele estranha. – Essa raça se sente ofendida quando lhes é apontado uma espada para eles.

Relanceei o olhar para os anões a minha frente e voltei para o homem que se aproximava de nós.

–Quem é você? – questionei.

Ele fez um sinal de descaso com as mãos.

–O meu nome não importa... O que importa é que eu conheço você, Emma Swan. Tenho um jeito para que fique com seu colar, passe por aquela floresta e isso daqui que talvez possa lhe interessar. – tirou um frasco do bolso do casaco que usava.

Franzi a testa.

–E o que é isso?

–Algo para que sua doença a deixe prosseguir nessa aventura. Ela irá lhe dar um tempo a mais, até que termine. Como se estivesse curada.

–Como me fará ficar com o colar e passar por ali? – apontei com o queixo para a floresta.

–Uma troca, é claro.

–Não irei passar a noite com você e nem com ninguém.

Ele riu. Uma risada estranha

–Por favor, você me ofende assim queridinha. – revirou os olhos. – Eu tenho ambições maiores que ter um corpo quente de uma mulher virgem embaixo de mim. – ele se virou para os anões. – Voltem para a mina de onde vieram, peguem suas pedras e façam outras bijuterias.

–São jóias e essa pedra é do colar de Freyja. – primeiro atalhou enraivecido.

O homem estranho se aproximou deles.

–Quem se importa com Freyja? Agora vão se não quiserem conhecer a linda e encantadora luz do dia.

Os anões se encolheram, olhando temerosos para o outro, como se sentissem ameaçados e então se retiraram sem dizer mais nada.

–Obrigada. – me virei para ele, abaixando minha espada. – Sabe que você não é estranho? Tenho a sensação de que já o vi antes.

– Lhe garanto que nunca nos encontramos. Tenho um rosto inesquecível. – ele virou de perfil, me dando um sorriso. – E não me agradeça ainda que...

–Swan!

–Killian. Onde você estava?

Ele se aproximou, olhando torto para o homem que fez uma careta ao vê-lo.

– Fui ver se achava alguma coisa que desse para você comer... Mas não encontrei nada. O que está acontecendo?

–Você não faz ideia. – expliquei rapidamente para ele, corando violentamente quando falei qual era a troca que os anões queriam, vendo Jones lutar contra o sorriso que quis surgir. – Então ele me salvou. – apontei para o homem. – Falando nisso, por que eles ficaram com medo?

Killian se virou para o homem, o estudando de olhos cerrados. Como que para provocar, ele deu uma voltinha, fazendo um floreio exagerado com as mãos.

–E quem é ele?

Dei de ombros.

–Não sei. Ele não quis me dizer o nome...

–Você não me é estranho...

–E nem você para mim, senhor Jones. Posso oferecer minha troca agora? – instigou impaciente.

– O que você quer?

–Nada de você. Eu quero dela. – o homem apontou para mim. – Salvei sua vida, seu colar e tenho essa poção que pode lhe ajudar, além de permitir que entre na floresta... Como não está sozinha, irei precisar de algo um pouco mais... Substancial.

–Emma... Não dê ouvidos a ele. – Jones me aconselhou, segurando em meu braço. – Sinto muito que a deixei sozinha e não a protegi, não achei que se meteria em problemas e nem que se arriscaria por causa de seu colar... Porém não acho que devamos confiar nele. Nem sabemos o que ele é, mas aparentemente ele sabe quem somos.

O homem bufou, entediado.

–Acho que deveriam ao menos ouvir minha proposta. – sugeriu. – Garanto que não é nada absurdo. E já que quer uma definição para mim, eu sou um duende.

–Jones, ouvir não vai fazer mal algum... Deixe que ele fale. – pedi em um sussurro, olhando em seus olhos.

Killian suspirou e assentiu.

–Muito bem. – o duende recomeçou. – Quero apenas um de seus dedinhos. – ele balançou a mão em direção a minha, rindo alegremente.

Arregalei os olhos.

–O que?

–Isso está fora de cogitação. Daremos outro jeito. Obrigado pela proposta. – Killian pegou meu braço, me puxando.

–Não existe outro jeito. Se eu não autorizar, vocês não entram. – gritou a nossas costas.

Derrapei ao ouvir suas palavras.

–Sua resposta, Killian. Não a conseguiremos.

–Não importa Emma. É um absurdo esse pedido.

Me livrei de sua mão e me virei para o duende.

–Se eu lhe der o que quer, nos deixará passar?

–Swan, nem pense em considerar essa loucura. – Jones grunhiu e eu optei por ignorá-lo.

–É um trato. – respondeu dando de ombros.

–Achei que duendes eram seres bonzinhos. – Killian comentou com sarcasmos.

O duende fez uma cara estranha, negando com a cabeça.

–Esses moram em outro reino. Junto com as fadas, se eram esses que estavam procurando, devo informar que vieram parar no lugar errado. Aqui apenas se encontram os anões, gnomos e duendes da escuridão. Sabe? Os seres ardilosos e traiçoeiros, que precisam sempre de algo em troca... Certamente você entende o que eu quero dizer sobre ser traiçoeiro, não é mesmo?

–Fique quieto. – ordenou com a voz dura.

–O pagamento foi ótimo, não? O suficiente para não ter que pilhar pelo resto de sua vida. – ele continuou com a voz provocativa, encarando Jones.

– Swan, nós vamos embora. Agora! – falou com altivez, e eu sabia que ele não estava mais falando como Killian e sim como meu capitão. Aquilo era uma ordem.

Mas não chegamos tão longe para nada.

Assenti me ajoelhando, pousando minha mão esquerda no chão. O duende sorriu com aprovação enquanto me observava levantar minha espada com toda força e firmeza que ainda me restava.

–Swan, não. Pare. - soou agoniado.- Deixe isso para lá, vamos embora. Não vale tudo isso.

–Nós chegamos até aqui, Jones. Viemos longe demais para você ter sua resposta.

–Swan... Isso realmente não importa mais. Não o tanto que eu achei. Levante-se e vamos voltar. Procurar Landon e Bae, sim? Eles devem estar preocupados. - sua voz era persuasiva.

Respirei fundo o ignorando. Eu não iria voltar atrás. Jones iria ter sua resposta. Não havíamos perdido tantos homens para fraquejar diante de um dedo a menos em minha mão esquerda.

Desci a espada de uma vez, fechando os olhos, tentando não pensar na dor que viria quando a lâmina o atingisse.

Meu corpo se contraiu e a dor se apossou. Não consegui gritar. A dor era tanta que não tinha forças para imitir som nenhum. Observei meu dedo caído e ensanguentado através das lágrimas que invadiam meus olhos e transbordavam para fora, manchando meu rosto.

Apertei minha mão esquerda, vendo o sangue rubro escorrendo e manchando tudo. Meu corpo estava pesado, como se não pertencesse mais a mim.

–Emma! - finalmente era capaz de ouvir alguma coisa mesmo que distante, além do ensurdecedor barulho de meu sangue correndo nas veias e meu coração batendo tão devagar e alto. - Ah Emma, por que fez isso?

Respirei fundo, deixando Killian me amparar. O duende riu, dando um passo a frente e pegando meu dedo do chão, o examinando.

–Tem uma fonte de poder em apenas esse dedo. Você irá se arrepender de tê-lo cortado fora. Como irá.

–Cale a boca e nos deixe entrar.- consegui sibilar entre dentes, vendo pontos escuros em minha frente.

Dor. Muita, muita dor.

–Muito bem. O caminho está livre para vocês. – indicou as árvores negras atrás de si com desinteresse. – Apenas tomem cuidado para quando a floresta mudar segura, para... A pior dor que sentirão em suas vidas. Foi bom lhe ver novamente, Emma. E não posso dizer o mesmo para você. – olhou com desprezo para Jones. – Faça bom proveito. - ele jogou o vidrinho para Killian, que o pegou no ar.

Eu o vi desaparecer, assim como surgiu.

–Swan? Amor, fique de olhos abertos, sim?

–Dói muito. – sussurrei mordendo meu lábio inferior. – Precisamos... Precisamos estancar o sangramento. – falei.

Killian me apertou mais contra seu corpo.

–Eu não posso...

–Você precisa... – respirei fundo algumas vezes, para conter a vontade de gritar. – Você trouxe munição para a pistola? – indaguei os dentes cerrados, me contorcendo de dor.

–Sim... Eu trouxe, Swan.

–Ótimo. Pegue, abra e derrube a pólvora sobre... O lugar amputado. – instruí. – Então... No chão abra umas cápsulas, e... E atire. Irá levantar o fogo... Você irá colocar minha mão no fogo para que cauterize.

–Emma...

–Você precisa fazer isso. – Branca surgiu ao meu lado.

–Branca! – exclamei.

–Branca? Amor, não tem mais ninguém aqui.

–Diga que ele precisa fazer isso. Agora.

–Você precisa fazer isso. Agora. – repeti.

Killian me soltou parecendo torturado, me ajeitando encostada em uma pedra e depositando um beijo em minha testa. O vi correr e se agachar ao lado do casaco que eu havia usado como coberta, procurando nos bolsos internos.

Me permiti fechar os olhos, tentando me concentrar no ar entrando e saindo de meus pulmões, tentando imaginar como seria o caminho que ele percorria, tudo para tentar ignorar a dor que me atingia a cada segundo.

Senti mãos acariciando meu rosto e abri os olhos, encontrando Branca e David.

–Vocês vieram. – comentei tentando sorrir.

–Não a deixariamos sozinha, Emma. – David falou se sentando ao meu lado e me embalando como se eu fosse um bebê. – Nunca a deixamos e agora não seria diferente.

–O que você fez foi muito corajoso e estúpido. – Branca se pronunciou, mas sem parecer estar brava. – Estou orgulhosa de você, filha.

Aquiesci, escondendo o rosto no peito de David, apenas porque não parecia errado fazer aquilo com ele. Eu o conhecia há tanto tempo.

–A palavra dor não é suficiente para expressar o que eu estou sentindo. – balbuciei sem forças, meus olhos revirando.

–Tudo bem, minha menina. – David sussurrou em meu ouvido. – Pode fechar os olhos que você ainda será capaz de abri-los. – garantiu.

–Me contem uma história. – pedi. – Para que eu possa descansar.

–Já lhe contaram a história da princesa donzela- cisne? – Branca indagou e eu neguei brevemente com a cabeça. Ela beijou minha bochecha a afagando com carinho. – Era uma vez uma rainha e um rei muito guerreiro, que depois de várias dificuldades conseguiriam ficar juntos. E como presente as donzelas -cisnes lhes deram uma linda menininha, que tinha um grande poder e que seria uma futura donzela -cisne, como fora a mãe dela, a rainha.

–Mas então... – David começou a contar. – Em seu aniversário de um ano, o monstro do caos invadiu o castelo decidido a ter o poder de luz que é concedido a uma donzela- cisne. Houve destruição, e muitas mortes. O rei e a rainha não tiveram forças o suficiente para deter o monstro do caos, por mais que tentaram com toda sua determinação. – sua voz estava embargada e senti algo molhado caindo em meu rosto. – O monstro roubou sua pequena menininha, e o rei e a rainha foram obrigados a ver seu maior presente ser levado embora, e viver para sempre com a sensação de terem falhado.

–E eles nunca mais ouviram sobre sua pequena princesa donzela- cisne. Mas sempre pensam nela em cada momento na esperança de assim estarem por perto quando ela precisar. – Branca terminou com sua voz falhando.

Aquela era uma história triste. Estava cansada de histórias tristes.

Após alguns minutos em silêncio, sendo aquecida pelo abraço protetor de David, me deixei ser envolta pela escuridão, que estava lutando tanto para afastar.

–Ah Emma. Abra os olhos... Olhe para mim amor. – senti alguém me cutucando, com o tom de voz assustado.

Forcei minhas pálpebras a abrirem, vendo Killian parado a minha frente, o fogo já crepitava no chão, e ele segurava uma cápsula aberta.

–Killian.

–Eu não consigo, amor. Eu... Não consigo lhe causar dor.

–Vai ser pior se você não fizer. – David falou ainda me segurando.

–Vai ser pior se não fizer. – transmiti as palavras de David.

Jones contraiu o rosto e jogou a pólvora da cápsula sobre o toco do meu dedo, causando uma ardência, para então conduzir minha mão até o fogo.

Nesse momento senti algo rasgando minha garganta. Era um grito. Tinha certeza que eu o havia soltado. Me debati nos braços de David, me inclinando para frente sem conseguir parar de gritar por um minuto, até que a voz sumiu e eu continuei a soltar gritos mudos, sentindo a saliva cair de minha boca que se recusava a fechar enquanto eu chorava de agonia. Meu corpo ficou mole nos braços de David e Branca acariciava minha testa, sussurrando palavras de apoio que eu não conseguia entender.

Killian olhou desesperado para mim, os olhos vermelhos, apagando o fogo do toco de onde um dia ficara meu dedo, que agora estava queimado, cheio de bolhas e doía como se o fogo ainda estivesse ali, queimando incessantemente.

David me soltou, deixando que Jones me segurasse, ficando sentado ao meu lado junto com Branca. Ambos me olhando com preocupação.

–Ah meu amor. Desculpe, me perdoe.- sussurrou em meu ouvido, me apertando.- Vou fazer o possível para que pare de doer quando acabar.

Assenti antes de minha cabeça ficar pesada e minha visão enegrecer.


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Notas finais do capítulo

Então o que acharam?

Já irei deixar avisado que na próxima semana não haverá capítulo, por motivo pessoais não conseguirei postar, eu poderia deixar agendado, mas nem sei se para isso terei tempo. Espero que tudo bem para vocês.

Beijos.