Traiçoeiro escrita por Roses


Capítulo 25
Capítulo 25


Notas iniciais do capítulo

Olá meus amados, como estão? Tiveram uma boa semana?

Aqui está mais um capítulo e espero que goste dele, porque ai... É algo completamente diferente do que estou acostumada a escrever.

E quero muito,muito mesmo agradecer a Mar Lameira por ter recomendado a fic. Sempre é surpreendente abrir aqui e ver uma recomendação. Muito obrigada e espero que goste.



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Killian voltou a ficar sério, o ar brincalhão desaparecendo de seu rosto de vez. Ele se virou indo para a porta com rapidez.

–Vá descansar Jones. – sugeri calmamente pegando minhas anotações. – Eu pedi para Landon atrasar nossa chegada em no máximo um dia. Então sossegue aqui, pois não irei deixar você exaurir aqueles homens. – fui interrompida por um acesso de tosse, meu peito doendo com o ato. – Sem falar que você está com uma cara horrível.

Jones voltou a olhar para mim, a sobrancelha esquerda arqueada.

–E com o poder de quem você pediu tal coisa? – indagou com a voz controlada.

Dei de ombros.

–Meu poder. Não se preocupe, subirei daqui a pouco para ajudar no convés no que precisarem. Só quero dar uma olhada nas anotações que temos da ilha... Por que está sorrindo desse jeito?

Ele balançou a cabeça, olhando para o chão, parecendo perplexo.

–Estou aqui pensando que acabei de sofrer um motim.

–Bem... Já estava na hora de ter alguém que sabe comandar de verdade. – provoquei.

Killian se aproximou, parando atrás de minha cadeira observando minhas anotações.

–A tempestade não foi por acaso, Jones.

Ele suspirou, puxando a cadeira para se sentar ao meu lado.

–Imaginei que não.

–Sete... É considerado o número do azar pelo povo nórdico. Cada religião tem o significado para esse número, por exemplo, os cristãos como eu consideram o número sete como sendo o número da perfeição.

–Porque Deus criou o mundo em sete dias. Sendo que descansou, abençoou e santificou o sétimo dia. – completou levantando o rosto para me encarar.

Aquiesci.

–Como sabe?

–Pode parecer que não, mas já freqüentei a escola dominical, Swan, muito tempo atrás. Minha mãe é muito religiosa. E digamos que uma pessoa me fez voltar um pouco a prestar atenção nessas coisas. A recordar o que eu quis esquecer.

–É? – instiguei esquecendo por um momento que estávamos conversando sobre uma ilha que dá acesso ao submundo. Nunca pensei em Killian como tendo uma família. – Ela ainda está viva?

Jones ficou em silêncio por um momento, parecendo perdido em lembranças.

–Até a última vez em que fiquei sabendo dela, sim, ela está viva.

–E acredito que ela não saiba que você está vivo. – afirmei.

Ele deu de ombros.

–É melhor desse jeito. Quando sai de casa, eu disse coisas horríveis para ela... Minha mãe é uma boa mulher, que fez algumas escolhas erradas no passado e eu a julguei por isso. Eu era um rapazote, Emma, achava que sabia tudo.

–Acho que deveria procurá-la. Sua mãe vai ficar feliz em vê-lo novamente. Tenho certeza que ela irá perdoá-lo pelo o que disse e como agiu no passado.

–Imagino o quanto ela vai ficar feliz em descobrir que seu filho se tornou um pirata com um gancho no lugar da mão esquerda.

–Killian, você percebe que você mesmo se despreza? Você mesmo aponta coisas que acha ser defeito, quando não é. São qualidades. Você não se tornou pirata para conseguir fortunas, foi para ter uma vida justa, com suas regras do que acha certo. Você perdeu sua mão porque encontrou o amor ao lado de uma mulher que infelizmente já era casada e o marido enlouqueceu lhe amputando a mão sem motivo nenhum. Você não é uma pessoa ruim, Jones por ser um pirata com um gancho na mão esquerda. Não tem do que se envergonhar e tenho certeza que sua mãe irá amá-lo da mesma forma que o amava quando saiu de casa.

–Você não acha que sou uma pessoa ruim?

–Ruim não... Apenas age como um asno às vezes.

Jones balançou a cabeça, desgostoso encarando o gancho. Segurei em seu queixo e o fiz olhar para mim.

–Se quiser ir visitá-la quando sairmos daqui saiba que eu ficarei feliz em acompanhá-lo se caso estiver com medo de ir sozinho. – sorri para ele, dando um beijo em sua bochecha. – Apenas me diga quando decidir.

Killian assentiu, prendendo a mão em minha nuca. Inspirei profundamente percebendo sua intenção, me endireitando na cadeira e voltando a olhar minhas anotações.

–Bem, mas para os nórdicos significa o número da morte... Contatos com os outros mundos. Que é o que estamos tentando fazer. – retomei a explicação, segurando a folha com as mãos, minha barriga dando pulos com a tensão que havia ali e tentava ignorar. – “O cheiro podre da morte irá anunciar que haverá mortos demais” – citei para ele. – Perdemos sete homens.

–Logo esse é o cheiro da morte.

–Sim... – engoli em seco e olhei para ele. – E quer dizer que haverá mais. Sem dizer que esses setes que perdemos podem ter sido um dos sacrifícios. Eles morreram e logo já encontramos a ilha.

Killian olhava fixamente para a mesa, o semblante sem qualquer emoção.

–Era para você ser uma desses setes. – comentou.

Assenti, abaixando a folha e apertando sua mão.

–Ainda não acabou, Jones. É bem provável que eu ainda seja. – observei, reprimindo a tosse, um calafrio percorrendo meu corpo.

–Eu não vou deixar. - prometeu. - Sabe que eu ia pedir exatamente o que você pediu para Landon.

–Sério? Achei que já gostaria de estar lá.

Jones piscou, me olhando fixamente.

–Eu estou cansado da noite que tive. – deu de ombros se levantando e indo para a cama. – Se importa em ler a profecia em voz alta, por favor? – pediu.

“O cheiro podre da morte irá anunciar que haverá mortos demais.

Com a travessia pela garganta do diabo, aquele que sobreviver, diretamente ao inferno chegará.

Um lugar onde a água do mar em sangue inocente se transformará, deverá se banhar, para que as criaturas das bestas os deixem passar.

Ao seguir pelo rio de cadáveres, na ilha maldita atracará. Apenas aquele com o coração cheio de culpa terá a coragem de nela adentrar.

Se vencer o monstro do reflexo, o grande prêmio ganhará”.

Terminei a leitura abaixando a folha e o observando de olhos fechados, apertando a ponte do nariz. Me aproximei da cama, me ajoelhando ao seu lado.

–Vai dar tudo certo, Killian. Você vai conseguir. – o encorajei.

–À custa da vida de quem? – rosnou fechando a mão em punho. A segurei, tentando relaxá-la.

–Você já tinha consciência disso, Jones. Foi uma das muitas perguntas que já lhe fiz. Porém perdemos sete homens, estamos aqui e tudo o que nos resta é sermos otimistas. O que podemos fazer é perguntar quem quer ir até a ilha conosco. Deixamos bem claro todos os perigos que podem encontrar e o que imaginamos que irá acontecer. Não esconderemos mais nada deles, assim, dando a eles o poder da escolha, você não irá se sentir culpado pelas mortes que poderão ocorrer, porque saberá que não forçou ninguém a segui-lo até lá.

–Eles vão me odiar, Swan. Quando souberem da verdade.

–Deixe que eu fale com eles. Tenho certeza que não irão odiar a mim.

Killian se sentou me estudando.

–Você tem jeito para isso.

–Fui criada para governar minha casa um dia, tenho que saber como organizar essas coisas. Agora descanse querido. – empurrei seus ombros até que ele se deitasse.

–Swan. – me chamou e eu me virei para ele. – Sem beijo de “durma bem”? – indagou.

Reprimi o sorriso que quis surgir e revirei os olhos, voltando.

–Quer que eu lhe cubra também, filho? – questionei fingindo estar irritada.

Jones abriu um sorriso preguiçoso para mim.

–Lhe garanto que nunca quis beijar minha mãe na boca.

Fechei os olhos, fazendo uma careta de nojo e dando meia volta em direção à porta.

–Eu disse para não se acostumar. – o lembrei. – Agora durma bem, Jones. – bati a porta subindo para o tombadilho.

Encontrei todos os homens espalhados pelo convés parecendo perdidos. Limpei a garganta, apertando as mãos. Eu estava tão cansada quanto eles, mas naquele momento eu tinha que ser forte e assumir o comando.

–Sei que sofremos perdas na tempestade dessa noite. – comecei, me apoiando na amurada do tombadilho, os marujos se viraram prestando atenção em mim. – Acredito que muito mais do que teríamos perdido em uma tempestade normal e sei que estão desgastados da noite que tiveram. Perdemos membros da família que aceitamos quando entramos aqui. – mordi o lábio inferior. – E por sermos uma família agora não quero esconder mais nada de vocês. Quando senhor Jones decidiu procurar a Ilha do pesadelo, não foi em busca de um tesouro. Existe uma lenda, e nosso capitão está em busca da cabeça de Falada, que dizem possuir a resposta para a pergunta que mais lhe atormenta... Infelizmente o caminho para chegar até ela não é fácil.

–O que quer dizer com isso, Emma? – um dos marujos, Dante, questionou.

–Será preciso sacrifícios. E eles começaram na noite anterior levando sete dos nossos homens. Estou falado isso para vocês porque senhor Jones decidiu que não quer mais deixá-los no escuro. Ele está lhes dando a chance de escolher se querem ir conosco até a ilha, ou ficarem na segurança do navio.

–Do que estamos falando exatamente, senhorita? – Smee perguntou torcendo o gorro vermelho nas mãos.

–Existe uma profecia, e chegamos à conclusão que para encontrar a cabeça precisamos entrar no mundo de Hel.

–O mundo dos mortos! – Ian exclamou fazendo o sinal da cruz.

Assenti.

–E haverá mais perigos. Mais sacrifícios. Senhor Jones e eu não queremos mais mortes... Eu irei com ele, mas quero saber quem de vocês nos seguirá até lá.

Um silêncio se instalou. Tampei a boca tossindo e sentindo o gosto de ferrugem. Meu corpo estava mole e eu queria me sentar. Sem falar do frio que eu sentia.

Bae e Landon deram um passo à frente, estudando o rosto de cada marujo, que desviavam o olhar.

–Não existe nenhuma recompensa para nós lá. Não vale a pena sacrificarmos nossas vidas para o capitão ter uma resposta estúpida. – Dante falou por todos.

Vi os homens concordarem com eles, sem me encarar.

–Vocês são uns ingratos. – Landon se manifestou com raiva. – Depois de tudo o que Killian fez por cada um aqui, vocês tem coragem de virar as costas para ele?

–Acontece que ele está brincando com nossas vidas. Omitiu o que queria de verdade e é covarde o suficiente para mandar essa garota falar com a gente. – Dante rebateu. – Ele é um bosta, que fica se escondendo quando a coisa fica feia para o lado dele. Um covarde de merda que não merece o nosso apoio e nem o titulo que tem.

–Já chega! – gritei enraivecida. – Não admito que se refira ao senhor Jones dessa forma. Se está tão insatisfeito com a forma que ele comanda por que não abandonou a tripulação quando estávamos em Nassau? Por que não é homem o suficiente para dizer essas palavras na cara dele? – indaguei. O vi se encolher engolindo em seco. Abri um sorriso enviesado. – Vejo que o único covarde está bem aqui na minha frente. Irei retirar o que disse se falar essas mesmas palavras para o seu capitão.

–Ele irá me matar se eu fizer isso.

–Mais alguém? – indaguei, correndo os olhos por todos. –Ótimo. Irei a avisá-lo que não existe interesse em se juntar a nós. E comecem a limpar o convés, já que terão tempo suficiente para descansarem depois. Landon e Bae vão dormir um pouco. Smee assuma o leme. Alguma dúvida? – esperei alguns minutos, mantendo o rosto impassível.

–Por que deveríamos acatar ordens suas? – Dante se atreveu a falar novamente.

–Porque senhor Jones permitiu que eu decidisse o que fazer enquanto ele está descansando.

Ian puxou o braço de Dante, o fazendo sentar novamente.

Respirei fundo, indo para a cabine.

–Não irei aceitar ordens da vadia do capitão. – o escutei resmungando.

–Cara, fica quieto ou está afim de ver aquele gancho nas suas entranhas? – Bae perguntou com rispidez.

Sei que Dante retrucou alguma coisa, porém fechei a porta para não ouvir. Peguei um cobertor no armário e me enrolei indo deitar no sofá, minha cabeça pesada e meu peito doendo. Sem falar na chiadeira sempre que eu respirava.

Apaguei em questão de minutos, ouvindo a respiração de Jones abafada pelo travesseiro.

[...]

–Meu Deus, Swan. – abri os olhos mesmo contra a vontade, vendo Killian me segurando. – Queimando é pouco para definir sua febre. Solte esse cobertor.

–Para Killian. Eu estou com frio. – reclamei segurando a coberta.

Ele bufou e me levantou, tirando o cobertor de mim.

–Você precisa se refrescar, caso contrário terá uma convulsão.

–O que pensa que está fazendo? – guinchei molenga ao sentir sua mão puxando a camisa que eu estava vestida.

–Tirando essa roupa molhada de suor.

Dei uma fungada, me segurando a Killian.

–Está sentindo esse cheiro levemente pútrido? – perguntei, ajudando-o a passar a camisa pela minha cabeça.

–Sim. Está vindo de você. – informou, me colocando sentada.

–Jesus... Esqueça o que eu disse mais cedo, eu sou o cheiro podre da morte. – constatei, deixando que puxasse minha calça.

–Swan, se não tem nada de bom para falar, fique quietinha.

–Eu estou deixando que tire minha roupa... Sabe o quanto isso é humilhante? Me deixe falar pelo menos. – reclamei me recostando a mesa, meu corpo tremendo. Fechei os olhos, ainda cansada demais. – Por que me acordou? Eu preciso estar descansada para amanhã.

–Emma... Não acho...

–Não quero saber o que acha. Eu vou. – decretei, voltando a ficar reta. – Eu quero deitar, Jones. Me deixa dormir. – supliquei.

Jones assentiu, me ajudando a ficar de pé e me guiando até a cama dele. Me deixei cair nela, me encolhendo de frio.

Grunhi, pedindo o cobertor, porém ele me ignorou continuando a procurar alguma coisa. Até que se sentou ao meu lado, fazendo com que eu bebesse de uma ampola.

–Usei isso da última vez que fiquei doente. Talvez ajude. – explicou, jogando o lençol em mim. – Landon e Bae me contaram que conversou com os homens. Obrigado, amor. E sinto muito se a ofenderam.

Balbuciei qualquer coisa, virando de costas para ele, voltando a dormir imediatamente.

Abri os olhos, depois de algum tempo já não me sentindo tão cansada. Me remexi desconfortável, puxando o lençol até o queixo encontrando Jones sentado na cadeira me olhando ansioso.

–Que horas são? – murmurei com os olhos cerrados.

–Está amanhecendo. Landon e Bae já estão arrumando as coisas para que possamos partir. Ancoramos em águas profundas durante a madrugada. Está se sentindo melhor?

Fiz que sim, me sentando e coçando um olho, deixando o corpete exposto.

–Ainda sinto dor quando eu respiro, e o gosto de ferrugem está sempre em minha boca por causa do sangue, porém a febre parece ter dado uma amenizada.

Killian se colocou de pé.

–Eu vou sair para que possa se trocar. Pegue as roupas de Milah, a tempestade levou as suas.

Me senti incomodada, contudo aquiesci o vendo se retirar da cabine. Não gostava de usar as roupas de Milah, era como se eu estivesse trazendo memórias dolorosas para Jones, e não gostava de lhe causar dor.

Saí da cama, cambaleando um pouco e peguei as roupas no baú.

Prendi meu cabelo em um rabo de cavalo bem firme no topo da minha cabeça, pegando minha espada e arma.

Não seria besta de ir até lá desarmada, por mais que achava meio impossível aquilo me proteger, dependendo do perigo que encontrássemos pelo caminho.

O céu ainda estava escuro, embora fosse possível ver uma pequena linha clara ao leste. Os homens estavam de pé ao lado do parapeito, em silêncio, encarando seus próprios pés. Me aproximei, encontrando o bote já içado e pronto para ser abaixado.

–Senhorita. – escutei um sussurro e me virei, encontrando Dante. – Quero pedir desculpas pela forma como falei ontem. E lhe desejar boa sorte.

Aquiesci.

–Não é a mim que deve um pedido de desculpas. Mas obrigada. – agradeci indo para o lado de Landon.

Jones apareceu uns minutos depois, a luneta em mão.

–Vamos? – indagou para mim.

Limitei a acenar positivamente, aceitando a mão de Bae para entrar no bote suspenso, sentindo meu coração dar um pulo quando ele balançou e se abaixou um pouco por causa do meu peso.

Bae entrou depois, seguido de Landon e Killian, que se sentou ao meu lado. Lhe dei um sorriso encorajador, apertando sua mão discretamente, enquanto os homens baixavam o bote com cuidado até tocar a água.

Peguei um dos remos, determinada a ajudar para que chegássemos o mais rápido possível à ilha.

Apenas não tinha certeza se estaríamos mais seguros na água ou em terra.

Não nos atrevemos a dizer nada, apenas ouvindo nossas respirações e os sons ao redor. Não sabíamos mais o que esperar. Não que soubéssemos antes, mas o fato de nossas suposições sobre o significado da profecia já terem começado se mostrando completamente diferente do que havíamos imaginado, não era nada animador.

Eu me encolhia cada vez que o vento cortante vindo da ilha nos atingia, a névoa foi ficando cada vez mais espessa, dificultando nossa visão. Assim como ar ficou diferente, mais denso e com um cheiro forte de enxofre misturado com... Morte.

Um silvo baixo fez um calafrio percorrer meu corpo todo e olhei para os rostos dos homens, esperando algum sinal de eles haviam ouvido também, porém eles continuaram alheios ao terror que me atingiu ao ouvir aquele barulho.

Apertei as mãos com mais força ainda no remo, cerrando os dentes e tentando não sentir medo. Eu havia insistido em ir, não havia? Agora teria que me acalmar, ignorando minha mente que criava imagens assustadoras.

Ouvi novamente, mas agora mais como um sibilo abafado e distante. Me inclinei temerosa um pouco no bote, tentando enxergar a água.

Como não vi nada, tomei um pouco de coragem e me inclinei mais um pouco, esticando a mão com cautela, na intenção de tocar as pontas dos dedos no mar.

Soltei um grito quando senti algo segurando meu braço, meu coração batendo tão rápido que eu tinha certeza que iria parar naquele momento. Olhei de cara feia para Killian, arfando com o susto.

–Você quase me matou. – acusei voltando a pegar o remo.

–Muito pelo contrario. Achei que estava salvando a sua vida. O que estava fazendo?

Balancei a cabeça, olhando para Bae e Landon que estavam na minha frente me encarando com curiosidade.

–Eu ouvi um sibilo abafado. Como um de uma cobra.

–E então decidiu colocar sua mão na água? Tinha a intenção de brincar com ela Swan? – questionou com sarcasmo.

O ignorei, voltando a remar, me perguntando se já estaríamos chegando.

Definitivamente estaríamos mais seguro em terra.

Quando o som bem claro do sibilo me fez congelar, olhei para os meus companheiros que ouviram dessa vez também, franzindo a testa.

E no meio do pânico que meu cérebro se encontrava, ele ainda assim conseguiu me mandar uma informação importante, embora fosse pouco útil.

–Merda. – xinguei, soltando o remo e me encolhendo quase colada a Jones, que me olhou confuso. – A serpente irmã de Hel, que foi banida para o oceano, se lembram? Na lenda diz que ela cresceu tanto que conseguia dar a volta no mundo e morder o próprio rabo, assim mantendo o equilíbrio, o mundo unido. A serpente de Midgard. – dei uma explicação rápida.

Ficamos imóveis por uns minutos. Senti o braço esquerdo de Jones me rodeando e segurei seu gancho com força, quando avistei a grande cabeça saindo da água atrás de Landon e Bae, a língua sendo colocada para fora, exibindo suas presas monstruosas.

Bae percebendo o terror em meu rosto e meu olhar fixo se virou para trás vagarosamente, soltando um praguejamento.

–Killian. – chamei com a voz pouco mais alta que um sussurro. – O que vamos fazer?

Ele deu um beijo em minha têmpora.

–Eu não sei amor, mas vamos dar um jeito. Talvez ela não nos ataque.

Jones estava tentando ser otimista, o que era bom, uma pena que ele não passasse nem um pouco de convicção naquele “talvez”.

Não quando a serpente parecia sorrir e seus olhos relampejavam com a expectativa da destruição, se divertindo com o horror estampado em nossos rostos.

Ela sibilou mais uma vez e atacou o bote. Não tivemos tempo se fazer nada a não ser pular para fora, tentando escapar de sua bocarra.

A água amarga entrou pelo meu nariz, me fazendo tossir. Olhei ao redor procurando alguém, contudo não enxerguei nada além da névoa. Dei umas braçadas, chamando Bae, Landon e Killian em voz baixa, não querendo ser notada pela serpente.

Senti uma coisa fria tocando minha perna e eu parei imediatamente, segurando até a respiração.

Fechei os olhos com força ao sentir algo pegajoso se enrolando em meu tornozelo e apertando com toda força.

–Emma. – Landon me chamou.

–Fique quieto. – choraminguei, rezando para que seja lá o que estava enrolado em minha perna me soltasse.

Um silêncio agonizante se instalou. Eu não sabia onde estavam Bae e Jones, se estavam bem ou não. Tentei imaginar que eles ouviram minha súplica para que Landon ficasse quieto, entendendo assim o recado.

A coisa pegajosa se desenrolou do meu tornozelo, me fazendo soltar um suspiro de alivio, para então me arrepender ao sentir a respiração gelada em minha nuca. Me virei lentamente me deparando com a cabeça gigante, a boca aberta, as presas que pareciam maiores que eu tinha um liquido escuro formando uma grande gota que pendeu por uns segundos e pingou na água com um cheiro forte, poucos centímetros do meu rosto.

Seu veneno.

Naquele instante meu corpo relaxou. De alguma forma meu cérebro aceitou de bom grado a morte iminente, apenas esperando que a monstruosa serpente desse seu bote.

Contudo um estampido alto me fez desviar os olhos da criatura a minha frente, assim como ela fez o mesmo, encontrando Jones com a pistola apontada na direção da cabeça da cobra.

–Saia daí, Swan!- Jones berrou nadando para longe, tentando escapar do ataque da cobra, que havia decidido que ele seria seu novo alvo. – Vão para a costa! – ordenou atirando mais uma vez, parecendo deixar a serpente ainda mais irritada.

Contrariando o que ele estava me pedindo, nadei em sua direção. Eu não iria deixá-lo sozinho, enfrentando aquela besta, mesmo que estivesse com tanto medo que meu coração batia dolorosamente contra as minhas costelas.

Tirei o punhal de meu bolso e atirei em direção ao pescoço da serpente, que bateu pateticamente, sem causar dano nenhum e caiu na água. Mas foi o suficiente para voltar sua atenção para mim, sibilando alto e exibindo suas presas.

Fiquei um minuto sem reação, quando a vi vindo em minha direção. Prendi a respiração, mergulhando, escapando por um centímetro de virar aperitivo de serpente.

Meu cabelo foi puxado pra cima com força e me peguei encarando Bae.

–Para a ilha. Agora! – decretou e saiu me puxando pelo cabelo ignorando meus protestos e resmungos de que estava doendo, além dos meus praguejamentos destinados a ele, por estar agindo como um animal.

Foi inevitável engolir água e percebi que seria impossível me livrar de Bae, por isso comecei a ajudá-lo, nadando para areia, ao mesmo tempo em que tentava encontrar Killian e Landon, angustiada por não saber onde estavam.

Me coloquei de pé, Baelfire soltando meu cabelo e segurando meu braço com força, para que eu não escapasse.

–Onde eles estão? – questionei apavorada por não encontrá-los ali.

Bae desviou os olhos para o mar, eu era capaz de identificar a forma gigantesca da serpente se debatendo, porém não ia além disso por conta da névoa espessa que bloqueava a visão.

–Nós precisamos ajudá-los, Bae. – falei tentando me livrar de seu aperto.

–Killian está cuidando disso, Emma. Ele conseguirá melhor se você estiver aqui, comigo.

–O que quer dizer...?

–Ela capturou Landon. – informou. Tampei a boca com a mão, reprimindo o grito que quis sair. Eu não queria que nada acontecesse com Landon, não ele, meu amigo. – Killian não era deixá-lo para trás, Emma. Logo os dois estarão aqui. – tentou me tranquilizar, enquanto de minha boca saia vários “não, não, não”.

–O veneno, Bae. – sussurrei por entre meus dedos. – Se o veneno dela foi capaz de matar Thor no Ragnarok, quem dirá um homem normal como Landon?

Baelfire engoliu em seco, comprimindo os lábios e olhando para o mar indeciso.

–Me promete que irá ficar aqui? – indagou olhando em meus olhos. – Se você me prometer que ficará aqui, eu irei ajudá-los.

–Mas...

–Emma... Eu sei que sua intenção é ajudar, mas com você ali, irá tirar nossa concentração. Nós três nos preocupamos com sua segurança. Me prometa que irá ficar aqui. – implorou sacudindo meus ombros.

Soltei o ar, vencida. Como sempre eu estaria atrapalhando ao invés de ajudar.

Assenti para Baelfire, indicando que fosse soltando um lamento de agonia e medo.

O observei entrando no mar, até que sumiu no meio a névoa.

Um tremor atingiu a terra, me fazendo cair e fincar meus dedos na areia negra da ilha, tentando me segurar e protegendo o rosto quando vi pedras caindo em minha direção. Tentei me levantar, porém o solo começou a sacudir com mais força, derrubando as árvores que haviam ali perto, levantando a poeira.

Um sibilo ensurdecedor ecoou por toda a ilha me fazendo tampar os ouvidos, não vendo a onda gigantesca que se formou e invadiu com violência a praia, me jogando para longe e só parando quando atingi um tronco caído de uma árvore, antes de me sugar de volta, com tudo que tinha ao redor, para o mar.

Tentei me segurar novamente, embora fosse inútil. A areia sumia por entre meus dedos e não havia nada que pudesse chamar de porto seguro. Uma árvore me atingiu na cabeça com força e imediatamente, senti algo quente descendo pelo meu rosto.

Lutei para ficar de pé, porém outro sibilo, que mais parecia um grito de dor, se fez presente, me impulsionando para frente quando outra onda, ainda maior que anterior se formou, dessa vez me jogando para o meio da floresta pedregosa, me deixando presa ali.

Quando a água recuou, voltei a levantar, me apoiando em uma árvore, agora sentindo pontos quentes por todo meu corpo, vários pedaços de minha roupa rasgada.

A névoa se dissipou um pouco, me dando uma visão da luta que se seguia. Jones de alguma maneira havia ido parar na cabeça da serpente e havia fincado sua espada no olho do monstro. Landon estava pendendo da boca da besta e Bae era jogado para longe pelo rabo da cobra.

Foi então que me senti impelida a ir até lá. Killian se balançou e saltou para dentro da boca da serpente, desenroscando Landon de suas presas, fazendo com que ele caísse no mar.

Jones parecia tão pequeno e frágil ali dentro da bocarra, que eu tive vontade puxá-lo pelos cabelos do mesmo modo que Bae havia feito comigo, contudo o pavor que ele não conseguisse sair a tempo e acabasse morrendo tomou conta de mim.

Um brilho branco me chamou a atenção por uns segundos e encontrei uma lança caída no meio das pedras, com desenhos de aves e asas nela. Algo dentro de mim fez pegá-la e sair correndo para o mar escuro e pouco acolhedor. Nadei com a maior rapidez que pude, ignorando os machucados que estavam por todo meu corpo ardendo.

Quando consegui chegar perto, o monstro se contorcia demais formando ondas que me jogava para longe, comecei a tentar escalá-la. Fiquei surpresa ao constatar que ela tinha escamas, o que facilitava a escalada, mesmo que estivesse escorregadia e não parasse quieta.

–Emma!- Jones gritou se distraindo e caindo na língua do animal. O ignorei concentrada em alcançar o meu objetivo.

Sua boca.

De alguma forma eu sabia que tinha que ir para ali e fincar aquela lança em seu céu da boca.

Me segurei como se minha vida dependesse daquilo, em suas escamas, quando meu pé escorregou e eu quase me vi de volta a água, todo meu esforço jogado aos ares.

Depois de longos minutos que pareceram horas, enrosquei a lança em uma de suas presas, me esticando até estar com metade do corpo do lado de dentro.

–Uma ajudinha aqui não seria nem um pouco ruim. – grunhi para Jones que me olhava com repreensão e medo.

–O que diabos você está fazendo aqui, Swan? – indagou bravo, apertando meu braço com força.

Lhe dei um sorriso incerto.

–Te salvando? – perguntei quando a serpente abaixou a cabeça, fazendo nós dois escorregar.

Jones me lançou um olhar muito parecido com os de Graham quando estava prestes a me dar uma bronca.

A língua da cobra se mexeu, vibrando e me deixou momentaneamente surda por conta do sibilo que soltou e percebi sua boa se fechando.

–Killian,no “três” quero que enfie seu gancho no céu da boca dela. – gritei. Ele abriu a boca. – não pergunte, apenas faça. – pedi, olhando em seus olhos e pedindo que me desse aquele voto de confiança. Jones assentiu e retirou o gancho. – Um... – comecei. – Dois... – esperei um pouco, vendo a parte esbranquiçada descendo em nossa direção. – Três!

Jones ficou o gancho no mesmo momento que eu colocava a lança com toda minha força. A serpente se tornou imóvel, então urrou de forma horrível, no instante que algo explodia, nos lançando para fora de sua boca, direto para o mar.

Senti dor com o impacto e me debati subindo para a superfície, cuspindo água e procurando Killian.

–Emma! – ele me chamou aliviado, me puxando para si.

O retribui passando meus braços pelo seu pescoço, feliz de vê-lo vivo e procurei seus lábios com desespero, mesmo sabendo que aquele não era o momento. Eu não havia percebido que estava com tanto medo de perdê-lo até me ver ali, em seus braços, sendo apertada com o mesmo alivio que eu o apertava.

Me separei dele, e observamos a serpente se debatendo em agonia, enquanto de sua boca saia uma luz estranhamente branca, que parecia estar lhe causando dor.

–Vamos sair daqui, amor.

Aquiesci, começando a dar braçadas em direção à costa, lutando contra as ondas que me atrapalhavam.

Jones me ajudou a terminar o percurso, vendo que eu estava exausta e sendo jogada para trás por conta das ondas.

Quando senti a areia, fiquei de pé me apoiando em Killian.

–Me desculpe por ter ido até lá. – pedi batendo os dentes de frio. – Mas eu fiquei com medo de perdê-lo. – confessei com um fiapo de voz.

Ele sorriu afagando minha bochecha e descendo para o meu pescoço.

–Foi muito idiota o que fez. Poderia ter morrido... Mas obrigado por ter ido me ajudar, e mais uma vez mostrar que é mais do que uma dama mimada. – brincou, me fazendo soltar uma risada nervosa. – Como sabia o que fazer?

Dei de ombros, olhando para a serpente que continuava com seu lamento.

–Eu não sei. Achei aquela lança e simplesmente sabia que eu deveria fazer isso. Então lembrei que no mito, Thor quase a matou uma vez, com um gancho de pesca com a cabeça de um boi nele. Achei que não faria mal, nenhum tentar com o seu... Landon e Bae! – exclamei olhando ao redor, procurando os dois.

Killian me abraçou.

–Vamos procurá-los. – sugeriu, começando a me puxar para a esquerda.

–Apenas vamos fazer isso bem longe da água. Dependendo do movimento que a serpente faz, causa um tremor horrível aqui. – expliquei, passando meu braço por suas costas.

Olhei pela primeira vez ao meu redor. De onde estávamos eu conseguia ver o tronco largo e distante da Yggadrasil, mas para chegar até ela seria necessário passar pela floresta que não parecia tão acolhedora quanto as que eu estava acostumada a ver quando ia viajar de carruagem. Olhei para cima, tentando ver o topo da árvore, porém ela se perdia no céu, acima das nuvens cinza chumbo, quase puxado para o preto.

Ao longo da ilha encontrávamos carcaças de animais e rochas enormes, totalmente desprovidas de cores. Tudo ali parecia deprimente, pintado por um pintor triste que apenas sabia usar cinza e preto.

A ilha se encontrava em Midgard, que para os nórdicos era considerado o meio, a terra pertencente aos homens e animais... Talvez o aspecto sem cor daquela ilha fosse um reflexo do que o futuro reservaria para as pessoas... Uma vida sem cor, destinados a verem apenas destruição e tristeza por onde olhassem.

Ou fosse o presente...

–Ficou muito quieta de repente. Algum problema? – Killian instigou me olhando preocupado.

Neguei, encostando minha cabeça em seu braço.

–Estava apenas pensando.

–No que?

–Em como tivemos sorte de o veneno da serpente não ter nos atingidos. Caso contrário, estaríamos mortos agora sem nem tentar.

Jones me apertou, fazendo com que eu soltasse um gemido de dor por conta dos meus vários cortes, dando um beijo em minha testa.

–Vai dar tudo certo, amor. Vamos encontrar Landon e Bae, e eles estarão bem e... – Killian não terminou de falar, escondendo meu rosto em seu peito.

Porém não rápido o suficiente para que eu não visse.

Os corpos mutilados e estraçalhados dos sete homens que perdemos na tempestade, espalhados pela areia, com suas tripas misturadas e areia negra manchada com o sangue rubro.


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Notas finais do capítulo

E então o que acharam? Consegui ir razoavelmente bem neste primeiro capítulo envolvendo a ilha? Estou com medo, quase nem postei e rescrevi ele um milhão de vezes.

Hoje as notas finais serão breves, mas quero desejar um bom Enem se eu tiver leitores que irão prestar(tenho certeza que tenho), com a graça de Deus já passei dessa fase, mas desejo muita sorte para vocês.

Aqui está a música (se caso se interessarem, é bem legal de ouvir ela na parte que eles estão lutando contra a serpente): https://www.youtube.com/watch?v=-UNT3poCd6U

Isso é tudo, obrigada por lerem e até mais!

Beijos.