Traiçoeiro escrita por Roses


Capítulo 21
Capítulo 21


Notas iniciais do capítulo

Oie, oie, oie minha gente linda. Como estão?

Pois bem, capítulo novo para vocês e espero que gostem.

Boa leitura.



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Bae ofereceu a mão para me ajudar a descer do bote, já que havíamos ancorado em águas profundas. Killian e Landon insistiram para que eu ficasse no bote até que estivéssemos na areia seca, recusando assim minha ajuda para puxar o bote.

–Teria sido mais fácil se tivessem me deixado ajudar. Eu fui um peso morto aqui. – resmunguei para Baelfire enquanto aceitava sua mão.

–Neste caso você teria se cansado e não aguentaria. – replicou.

–Não aguentaria o que? – indaguei sem paciência observando os paredões escuros, esperando que meus olhos se adaptassem a falta de iluminação.

–Me pegar é claro... Se bem que nem assim você aguenta. – provocou saindo correndo.

Fiquei uns segundos parada o observando correr.

–Muito homem de sua parte desafiar uma mulher e sair correndo para ganhar vantagem! – berrei, começando a correr atrás dele.

–Emma tome cuidado. – ouvi Killian gritando, mas não dei muito importância.

Era questão de honra conseguir alcançar Baelfire.

A lua iluminava um pouco o caminho, deixando o ambiente com um aspecto pálido e doentio. Eu tinha a sensação que mesmo que estivesse correndo o mais rápido que eu podia tudo ao meu redor estava lento demais.

Baelfire parou a uma longa distância de mim, como se estivesse me esperando. Eu puxava o ar com dificuldade, sentindo as laterais de minha barriga doendo e minha garganta estava seca. A areia era diferente também. Não era fina, como as que eu estava acostumada a encontrar nas praias. Essa era grossa e me fazia afundar a cada passada que eu dava, me obrigando a fazer mais esforço para conseguir correr em um ritmo aceitável.

–Vamos lá, Emma. Você pode fazer melhor que isso. – Bae deu uns passos em minha direção.

Parei um pouco, colocando as mãos no quadril, esperando acalmar meu coração que batia rápido demais, quase como se fosse parar a qualquer momento. Ergui um dedo, pedindo tempo para Bae, tentando me recuperar.

Eu era péssima naquilo.

–Essa... essa... – comecei com dificuldade. – Areia é diferente. É ruim de andar e de correr. Minhas pernas estão queimando!

Bae riu se aproximando.

–Pare de arrumar desculpas. Assuma que não aguenta.

Assenti com a cabeça, soltando um suspiro pesaroso.

–Aparentemente... você esta errado. – o empurrei com força para que caísse e sai correndo. – Peguei você! – exclamei olhando rapidamente para trás o encontrando caído, me olhando perplexo.

–Isso não vai ficar assim, Emma. – ameaçou e pude ouvir seus passos logo atrás de mim.

Me forcei a correr mais rápido, mesmo que parecesse impossível de se fazer isso naquela areia, eu demorava mais que o tempo normal para movimentar meus pés.

Meus ossos pareciam estar queimando, eu não conseguia segurar a risada o que me fazia perder o fôlego com facilidade. “Sempre mantenha a boca fechada para salvar ar em seus pulmões” dizia Bae quando estávamos treinando. Mas fazer aquilo poder correr sem ninguém me falando que uma dama não deveria se portar daquela maneira, era uma sensação boa demais para não deixar escapar pelos meus lábios. Eu não podia guardar dentro de mim, tinha que compartilhá-la junto com o barulho das ondas.

Segurei no braço de Killian, me escondendo atrás dele quando me aproximei de onde havíamos descido.

–Não o deixe me pegar. – pedi com minha última reserva de ar.

–Já acabaram de brincar? – Killian instigou áspero.

–Killian! Deixe-a se divertir. – Landon o censurou.

–Isso foi golpe sujo. – Bae acusou ofegante parando em frente de Killian. – E ainda o usa como escudo.

–Aprendi com a convivência. – rebati dando de ombros.

Jones se virou para mim, com um sorriso torto querendo aparecer em seu rosto.

–Isto quer dizer que já se considera uma pirata?

Pensei por uns segundos.

–Temporariamente, sim. – respondi comprimindo os lábios. – Vamos que eu realmente quero conhecer essa mulher misteriosa... E beber água. De preferência água, primeiro.

Killian assentiu e me ofereceu seu braço o qual aceitei para que fosse guiada. Landon e Bae ficaram na praia para esperar os outros marujos que estavam descarregando os barris do navio para que pudéssemos pegar os mantimentos.

Subimos uma trilha em silêncio, Jones segurava uma lamparina para iluminar o caminho e eu sentia que ele estava ansioso. Eu queria perguntar o por quê, mas sabia que não iria me responder.

Será que ele teria algum interesse amoroso nessa mulher?

Killian me fez parar, inclinando a cabeça como se para ouvir melhor, seu rosto ficando tenso. Instantaneamente olhei ao redor, alcançando o punhal que estava em meu bolso e apertando mais o braço de Gancho, começando a me sentir assustada.

–Qual o problema? – sussurrei.

Ele olhou para o meu rosto e tirou minha mão de seu braço.

–Fique aqui. –pediu.

–Não. Você não vai me deixar aqui sozinha. – continuei falando com a voz baixa, observando o ambiente sem parar. Killian bufou contrariado. – Pode bufar a vontade, ou eu vou com você, ou nós voltamos para a praia agora.

–Tudo bem. Fique atrás de mim. – instruiu aborrecido.

Me coloquei atrás de Killian, tentando não respirar muito alto ou acabar fazendo algum barulho por estar me sentindo meio apavorada. Jones afastou os galhos de uma planta que estavam em nosso caminho, pisando cuidadosamente, estudando tudo com atenção.

Para mim tudo parecia normal.

Escutei um barulho vindo do lado esquerdo, como se fossem passos amassando folhas secas. Olhei para o lugar e vi os galhos balançando, e no mesmo momento abracei Killian, tendo a certeza que iria morrer ali no meio do nada, em uma ilha que ninguém conhecia.

–Swan, eu fico lisonjeado, mas agora não é hora. – murmurou olhando para o meu rosto.

Dei um passo para trás, me soltando dele e revirando os olhos.

–Eu acho que escutei alguma coisa daquele lado. – apontei.

Jones esticou a lamparina na direção, se aproximando.

–E como exatamente planejava se proteger me agarrando daquele jeito?

–Foi o primeiro instinto que tive me desculpe. Agora será que podemos nos concentrar ou vamos continuar com esse assunto? – perguntei soando um pouco alta demais.

Jones fingiu pensar por uns segundos.

–Continuamos depois, amor.

Voltamos a subir a trilha, prestando o dobro da atenção.

–O que você achou estranho?

–Geralmente nesse horário, os mouros ainda estão nesses lados. Ninguém veio nos recepcionar.

–O que acha que pode ter acontecido?

Killian se virou lentamente para mim, me olhando sério, quase como se estivesse rezando mentalmente por paciência.

–Se eu soubesse não teria pedido para você ficar em silêncio.

–Ah. Tudo bem. Entendi. Vou ficar quieta.

–Eu agradeceria muito se fizesse essa gentileza. - falou irônico, voltando a andar.

Gancho me puxou por um caminho alternativo, mais no meio da mata e fechado. O escutei resmungando toda vez que eu tropeçava nas raízes das árvores, ou reclamava dos cortes causados pelos galhos, assim como sempre soltava um ganido quando sentia algum bicho em mim.

Fora as picadas. Eu já estava me coçando toda.

–Killian cuidado!- gritei o empurrando pra frente quando tive um vislumbre de um homem no topo da árvore com alguma coisa apontada em nossa direção.

–Killian?- a voz indagou abaixando a arma. Jones olhou alarmado para árvore, ainda no chão, alcançando a lamparina.

O homem desceu, guardando o arco e a aljava nas costas. Mesmo assim apontei meu punhal para ele.

–Swan, abaixe isso. - Killian pediu se levantando. O olhei como se estivesse louco. - Ele não vai nos fazer mal. É um mouro. - explicou.

Olhei desconfiada para o homem, guardando o punhal em meu bolso, mas mantendo a ali se caso precisasse.

–Me desculpe por assustá-los. Não sabíamos que era você, Killian.- o homem se desculpou fazendo um cumprimento estranho com o braço, o qual Jones retribui.

–Está tudo bem, Lori. - Gancho o tranquilizou. - Mas quero que me conte o que está acontecendo.

–Claro senhor. Vamos. - Lori tomou à dianteira. - Acredito que não conheça sua nova senhora. - relanceou o olhar para mim, abrindo caminho com o facão que estava preso em sua cintura.

–Esta é Emma Swan.- Killian me apresentou.

–E eu não sou a nova senhora dele. - acrescentei apertando o passo para andar ao lado de Jones. Era importante avisar, já que Killian aparentemente ocultava esse detalhe. Ele me lançou um olhar estranho, antes de voltar a fitar Lori.

–Peço desculpas novamente, senhorita. Não quis ofendê-la.

–Não ofendeu. Não é o primeiro a tirar essa conclusão. Lori, não?

–Sim, senhorita. Prazer em conhecê-la.

–Apresentações já foram feitas e você já deixou claro que não é minha senhora. Agora conte o que aconteceu.

Lori parou encarando Killian com cuidado, então olhou para mim e de volta para ele, dando risada.

–Vovó vai contar para ela, você sabe que a velha não aguenta ficar com a boca fechada. - murmurou como se fosse um segredo para Jones. - Fomos invadidos uns dois meses atrás pelos homens de Vane, desde então estamos mais cuidadosos.

Killian trincou o maxilar.

– O que aqueles desgraçados fizeram?

–Destruíram, roubaram e bem... Forçaram as mulheres, você sabe... Fora as mortes. Perdemos vários guerreiros que tentaram proteger suas mulheres.

–Eu vou matá-lo quando encontrá-lo. - sibilou acertando uma árvore com raiva com seu gancho. - Rasgá-lo de dentro para fora com esse gancho.

–Acredito que se castrá-lo vai ser um castigo pior. - sugeri, não gostando de para onde a conversa estava indo.

–Estamos tentando nos reerguer depois disso, porém está todo mundo muito assustado.

–Não fizeram nada para vovó, fizeram?

Lori negou com a cabeça batendo o facão em um galho, me dando uma visão de um campo aberto, com várias cabanas construídas e uma grande fogueira no meio.

–Conseguimos escondê-la, com muita dificuldade porque a velha não queria abandonar a luta, antes que chegassem aqui. - informou guardando o facão na cintura. - É Killian!- gritou avisando os outros.

Rapidamente o lugar deserto foi se enchendo de rostos saindo das cabanas e do meio da floresta, ainda temerosos, como se não acreditasse que não era alguém querendo os machucar.

Lori falou com eles em uma língua estranha.

–Eles confiam em você. - constatei. - Por que?

Killian engoliu em seco, olhando para os negros que se reuniam em volta de Lori, com uma emoção no olhar.

–Eu os salvei. Eles tinham sido capturados para serem vendidos como escravos pela coroa que eu servia... Eu era tenente e meu navio estava fazendo a guarda para garantir que chegasse ao destino. Nunca concordei com a escravidão, Swan.

–Foi quando você tomou o Jolly Roger. - afirmei e ele assentiu.

–Atacamos o navio negreiro e os trouxe para essa ilha inabitada. Desde esse dia se tornou Ilha dos Mouros.

Admirei o rosto de Killian, sentindo um certo orgulho ao saber dessa história. Ele me fitou de volta, fazendo meu coração bater de forma estranha.

–Realmente você não é uma pessoa cruel como tenta fazer parecer. – brinquei batendo em seu ombro.

–Apenas não espalhe.

–Seu segredo está a salvo comigo. – prometi. – O que Lori quis dizer com “a vovó vai contar para ela?”- questionei não aguentando mais.

Killian comprimiu os lábios e olhou fixamente para grupo que se aproximava de nós.

–Ele estava apenas provocando, amor.

Lori falava com os mouros em sua língua nativa, mas consegui compreender que estava me apresentando. Logo as mulheres se aproximaram cautelosas, esticando as mãos para tocar meu cabelo e meu rosto.

–Elas a acharam bonita. - explicou Lori vendo que eu estava ficando receosa. Uma das mulheres disse alguma coisa para ele e sorriu para mim. - Ela diz que a senhorita parece um ser divino.

–Obrigada. Diga para elas que também são mulheres muito bonitas.- pedi segurando na mão de uma delas. Lori rapidamente traduziu, o que trouxe uma expressão alegre para o rosto delas.

Uma moça se afastou e cochichou alguma coisa no ouvido de Lori, ele assentiu.

–Elas querem saber se a senhorita permite que lhe arrumem um banho e roupas limpas antes do jantar.

–Ah claro. Sim, sim eu adoraria.- balancei a cabeça positivamente para que elas entendessem.

–Lori diga para as mulheres que logo Emma estará com elas. Quero que conheça vovó primeiro. Claro, se ela estiver disposta para nos receber agora. - Killian segurou meu braço impedindo que eu seguisse as mouras.

Lori aquiesceu e disse o que Jones havia pedido para as mulheres que soltaram uns resmungos, antes de darem as costas.

–Venham. Vou levá-los até a vovó. As mulheres foram preparar seu banho.- avisou.- Devo avisá-la que foi uma péssima ideia concordar com isso.

–Por que?

–Elas vão tratá-la como uma boneca. Ficar arrumando e enfeitando. – explicou.

–Não é nada que eu já não esteja acostumada. – garanti.

Lori abriu a porta de uma cabana e a segurou para que eu entrasse.

Uma senhora estava sentada confortavelmente no chão, envolta com um monte de almofadas. Seus olhos brancos se destacavam na pele escura.

Ela era cega.

–Killian!- exclamou contente juntando as mãos.- Quanto tempo. E veja que menina colorida você tem ao seu lado. Me desculpe, menina não, mulher.

Abri a boca querendo perguntar como ela sabia que eu estava ali e o que quis dizer com colorida, mas a fechei achando melhor não. Ela podia estar louca já.

–Lhe garanto que estou bem sã, senhorita.- respondeu não parecendo estar brava. Arregalei os olhos surpresa e então lembrei que Killian havia me dito que ela era uma mulher "com dom".- Você sabia que não se enxerga apenas com os olhos? A alma também nos dá uma ótima visão.

–Claro, me desculpe. Não quis soar rude.

–Não soou de jeito nenhum, menina. Veja Killian, até sua aura está com uma cor diferente. Não tão bonita quanto o de sua nova senhora, mas mais agradável de se ver. Fico contente que tenha encontrado alguém com cores tão bonitas, não gostava daquela Milah. Ela tinha uma aura carregada igual a sua. Duas auras escurecidas nunca são boa coisa juntas.

Cocei o braço desconfortável com o assunto, sem ter coragem de olhar para Killian e ver sua reação sobre o que ela havia dito sobre Milah.

–Ela não é a nova senhora de Killian, vovó. - Lori informou zombeteiro encostado na parede.

Vovó pareceu confusa por uns minutos, sua testa se enrugando ainda mais.

–Como não? Você a cham...

–Eu nada, vovó!- Jones a cortou duramente. - Emma está em meu navio porque está procurando a mãe dela, por esse motivo a trouxe até aqui para conhecer a senhora.

Eu olhava de um para outro, tentando entender a conversa não dita que tiveram.

De confusa a expressão da senhora passou para desapontada.

–Você não contou para ela ainda, Killian?- indagou pesarosa. Jones olhou para mim com os olhos preocupados. Desviei o olhar, mordendo o lábio inferior não gostando nem um pouco de saber que ele estava escondendo coisas importantes relacionadas a mim. - Você não contou. - concluiu depois de vários minutos em silêncio.

–Não há nada para contar vovó.

–Lori. Leve a menina para que as mulheres a deem um banho. - vovó pediu, a voz firme.- Preciso conversar seriamente com este rapaz aqui sobre como não é cavalheiresco enganar as pessoas.

–O que ela quis dizer com isso, Jones?- instiguei tentando manter a voz calma. - Você está escondendo alguma coisa importante de mim?

–Amor...- Killian começou.

–Já tive minha resposta. - o interrompi me virando para Lori. - Poderia fazer a gentileza de me acompanhar?

–Swan.

Lori assentiu indicando a porta, assim que ela se fechou atrás de mim respirei fundo para não chorar.

–Não leve tudo que a vovó Libélula diz a sério. Ela é sábia, mas erra sobre muitas coisas também.

Aquiesci, começando a segui-lo. Entramos no meio da mata, e ficamos em silêncio até que chegamos a uma gruta.

–Aqui é a casa de banho noturna. Pode entrar que as mulheres estarão lhe esperando. Provavelmente Zirba estará com elas, ela fala sua língua e assim poderão se comunicar.

–Obrigada Lori.

Ele fez uma reverência e saiu correndo, me deixando sozinha.

Cuidadosamente me aproximei da entrada da gruta, sentindo cheiros variados, que pareciam criar o perfume perfeito. Entrei, me agachando um pouco e logo vi uma espécie de lagoa, as mulheres calmamente ao redor e várias tochas acesas na parede.

–Olá. - as cumprimentei para que percebessem minha presença.

Elas se colocaram de pé rapidamente e uma delas tomou a frente.

–Prazer senhorita, eu sou Zirba.

–Emma. O prazer é meu em conhecê-la, Zirba... Então como funciona o banho? Estou louca por um.

–Nós cuidaremos disso para a senhorita, se não se importa. Como é visita e amiga de Killian, é nossa amiga também, logo deve ser tratada como uma princesa.

–Me tratem como uma de vocês e já estarei satisfeita.

Uma das mulheres cutucou Zirba parecendo irritada, e rapidamente ela fez um resumo da conversa que tivera comigo.

–Elas insistem em dizer que você é um ser divino. Um ser de luz. E elas estão pedindo permissão para lhe ajudar a se despir.

–Tudo... tudo bem. Obrigada. – agradeci sem saber ao certo como me portar. Zirba deu um sinal para duas mulheres que andaram até a mim. Olhei nos olhos dela para mostrar que podiam me tocar quando hesitaram ao meu lado. – Que cheiro é esse?

– Uma essência de lavanda, com algodão, verbena e uma fruta encontrada apenas nessa ilha. Como a senhorita vem vivendo em um navio, achamos melhor pegar um dos nossos óleos mais fortes para deixá-la mais descansada. A lavanda irá ajudá-la a relaxar e assim ter uma boa noite de sono, os outros ingredientes são para limpar esses arranhões. Jogamos alecrim na água para que melhore sua respiração.

Assenti me abraçando quando as mulheres terminaram de tirar minha roupa. Uma delas que estava ao lado da lagoa me estendeu a mão, me ajudando a entrar e me surpreendi ao perceber que a água era quente.

–Essa água é quente... como?

Zirba deu de ombros.

–Não sabemos. É natural. Encoste e não pense em nada, senhorita. Nós iremos lavá-la.

Fiz o que ela pediu me encostando a parede áspera, sentindo as mãos delas em meu corpo e me lembrando de outro tempo quando eu sempre tinha alguém para me banhar.

Eu apenas não conseguia relaxar, minha mente ficava voltando para a cabana e as palavras de vovó, a expressão de Killian e sua quase resposta.

Ele ia mentir para mim.

Vi a mentira nos olhos dele antes que abrisse a boca.

Uma das mulheres falou comigo, me trazendo a realidade. Olhei para Zirba, questionando o que ela estava dizendo.

–Ela perguntou se estamos a machucando.

–Não. Claro que não. Na verdade faz tempo que não sou tratada com tanto mimo assim. – respondi com um sorriso. – Por que a pergunta?

–Está chorando, Emma. – ela respondeu em um sussurro, massageando o meu couro cabeludo.

Balancei a cabeça e funguei tentando me controlar. Eu nem havia percebido que havia começado a chorar. Disse algumas palavras tranquilizadoras para as mulheres, dizendo que não era nada e tentei me concentrar nos aromas, em sentir as mãos daquelas mulheres lavando meu corpo com cuidado como se eu fosse quebrar se usassem força demais.

Foi o banho mais longo que já tinha tomado em minha vida. Depois que elas terminaram de me lavar, permaneci sentada ali dentro, enquanto elas se banhavam e conversam alegremente.

“Você não contou para ela ainda, Killian?”

“Vovó vai contar para ele. Você sabe que a velha não aguenta ficar com a boca fechada”.

“Você não contou.”

O que raios estavam escondendo de mim? O que podia ser que Killian estava escondendo de mim? Eu queria continuar confiando nele, mas como? Como se ele continuava a me esconder coisas que eram sobre mim?

Ouvi Zirba me chamando e me forcei a sair do estupor em que me encontrava. Eu estava exausta e queria poder ir dormir, sem ter que conversar com mais ninguém.

–Essa é uma roupa do nosso povo, espero que não se importe em usá-la. Percebemos que a senhorita deve ser uma dama, da Europa e não são acostumadas a exibir o corpo em suas roupas.

–Depende de como são. Ultimamente não estou podendo me gabar por ser uma dama, não estou me portando como uma.

Uma saia branca e longa foi colocada em minha mão, de um tecido leve. Observei as mulheres vestindo- as para saber como colocá-la. Logo uma das mulheres se postou atrás de mim enrolando um tecido verde em meus seios, o prendendo ao meu corpo, deixando meus ombros expostos e parte de minha barriga.

–Nossa. – comentei acanhada ao perceber que estava realmente com muita pele exposta. – Vocês não tem nada, mais fechado? – indaguei com um sorriso sem graça.

–Sentimos muito, Emma. Depois do ataque espalhamos o que temos pela ilha. Nós até temos, porém está muito longe e não temos permissão para ir buscar nesse horário. Assim que amanhecer iremos pegar para você.

–Não se preocupem. – garanti mesmo que eu estivesse extremamente desconfortável e tentava me esconder da melhor forma possível com meus braços. – Poderiam fazer uma trança em meu cabelo? Pode ser uma simples.

Exatamente como Lori me disse, as mulheres perderam um bom tempo brincando comigo. Arrumaram meu cabelo em um trança, o enfeitando com as flores silvestres que encontraram ali por perto, assim como ganhei desenhos intricados em dourado em meu braço, como se fosse um bracelete.

–O desenho é para atrair bom casamento. – explicou Zirba. – No caso bom casamento, com um bom homem.

–O que não vai ocorrer tão já. Espero eu. – murmurei sarcástica.

As mulheres se levantaram e me admiraram por uns minutos, saindo da gruta dando risinhos alegres. Zirba me estendeu a mão, me guiando para fora.

–Ah espere. – pediu me deixando na entrada e voltando em segundos. – Peguei esse xale para que se enrole, percebi que esta desconfortável.

–Obrigada. Se Granny me visse assim iria dizer que estou deixando muito pouco para imaginação. Como conseguiram essas roupas? – perguntei jogando o xale em meus ombros, me sentindo contente por ele ser longo o suficiente para ir até minhas costas.

–Killian nos reabastece de seis em seis meses. – explicou. – Me desculpe perguntar, mas você e ele não são...?

–Um casal? – completei, soltando um suspiro pesado cansada de ouvir aquela pergunta. – Não. Por que?

Zirba balançou a cabeça em uma negativa.

–Ele é muito bonito. – sussurrou e eu a encarei entendendo sua pergunta.

Ela estava interessada nele.

–Bem e está solteiro. Deveria tentar algo, mas duvido que ele queira algo sério com alguém no momento. Com licença que preciso falar com Landon. Obrigada por tudo – me despedi dela, sentindo uma leve irritação sem motivo. Uma certa raiva por ela tocar naquele assunto comigo.

Tinha uma tripulação inteira para fazer aquela pergunta. Por que eu?

Sai pisando duro, segurando o xale com uma mão e erguendo um pouco a saia com a outra para que não sujasse, tentando encontrar algum rosto conhecido entre os mouros que estavam espalhados por ali em suas atividades noturnas antes do jantar.

–Emma!

–Bae. Finalmente encontrei alguém. Sabe onde está Landon? Bae?

Baelfire olhou para o meu rosto parecendo estar em outro mundo.

–Desculpe. Estava contemplando o quanto está bonita.

–E praticamente nua. – rebati em voz baixa. – Quais a chance de eu conseguir ir até o navio pegar um vestido?

–Está decentemente vestida, senhorita Swan. Não se preocupe que aqui não vão dizer que está vestida de maneira indecorosa. Já conversou com vovó Libélula?

Fiz que não com a cabeça, olhando para os meus pés.

–Ela está conversando com Killian. Sabe onde está Landon?

–Tem alguma coisa errada, Emma?

–Só quero conversar com Landon. – pedi

Bae assentiu e ofereceu seu braço. Ele foi me guiando calmamente, como se estivesse gostando de mostrar que estava me levando. Já tinha aceitado caminhadas o suficiente com homens para saber quando eles estavam se exibindo com a dama que levava nos braços.

Mas nem esse momento de exibição de Bae me fez tirar minha mente da cabana da vovó Libélula. Eu queria saber o que ela e Killian estavam conversando e o que tudo queria dizer. Depois de alguns minutos, paramos em frente a uma tenda.

–Landon está aí. Pode entrar.

–Você não vem? – indiquei com a cabeça e Bae me olhou como se eu estivesse doida.

–Não muito, obrigado. Essa tenda definitivamente não é lugar para mim. Nos vemos mais tarde. – se despediu, dando as costas assobiando alegremente.

Homens.

–Landon?- o chamei assim que entrei e o encontrei segurando um bebê nos braços e no chão havia algumas crianças pequenas brincando.

–Olá, Emma... Nossa! – exclamou. – Está diferente e bonita, senhorita.

–Obrigada, mas prefiro meus vestidos. Estou me sentindo muito exposta desse jeito. – falei retirando o xale e o prendendo em minha cintura. – Então você gosta de crianças?

–Sempre gostei. Gosto de ficar aqui nesta tenda quando visitamos a ilha.

–Posso segurar?- estiquei os braços, louca para ter aquela pessoinha neles.

–E você sabe como segurar uma criança? – indagou incrédulo.

–Não me ofenda com essa pergunta! Claro que sei. – atalhei indo pegar o bebe de seus braços. – E não vejo a hora de ter uma minha. Oi pequeno, eu sou a Emma. – cumprimentei segurando a mãozinha pequena e aproximando o rosto. – Como você se chama?

–Xoloni. – respondeu Landon. – Significa perdão na língua deles. Já que está aqui e gosta tanto assim de crianças, eu irei chamar os responsáveis por eles. Você aguenta alguns minutos sozinha?

–Claro. Eles estão quietos. Vamos cuidar de tudo, não é Xoloni? – perguntei não conseguindo esconder o sorriso bobo em meu rosto ao admirar aquela criatura tão sensível em meus braços.

Comecei a cantarolar para o bebê que estava quase dormindo em meus braços ainda segurando meu dedo. Olhei para as crianças que brincavam no chão e uma menininha me encarava. Percebendo que eu a tinha visto, ela ficou envergonhada.

–Urbi. – falou com sua vozinha infantil indicando o lado dela.

–Me desculpe, mas não sei o que isso significa. – lamentei me agachando ao lado dela, tomando cuidado para não machucar Xoloni em meus braços que ressonava suavemente.

–Urbi. – repetiu apontando para mim.

–Sim, claro. Urbi. – apontei de volta para ela que sorriu para mim.

Eu esperava que significasse uma coisa boa.

Sentei no chão embalando Xoloni em um braço e pegando um dos brinquedos de madeira que as crianças estavam brincando, tentando me enturmar com elas. O que não foi muito difícil.

Crianças davam oportunidade para qualquer um, independente se os entendessem ou não. Elas apenas queriam brincar, se sentirem amadas e seguras. Não julgavam, não havia malicia, nem maldade quando criadas de forma correta.

Inconscientemente apertei Xoloni em meu braço e me inclinei para dar um beijo na cabeça da garotinha, que se colocou de pé cambaleante e abraçou meu pescoço, dando um beijo estalado em minha bochecha.

Eu queria tanto ter a inocência ainda daquelas crianças. De não saber como as pessoas podiam ser más, e apenas confiar nelas quando viessem se sentar comigo para brincar.

Queria não ter crescido e estar passando por toda essa situação que estava me confundindo tanto.

–Urbi. – falou novamente encostando o rostinho no meu.

–Eu não sei o que significa, mas urbi para você. – ri, enroscando meu braço em seu corpinho lhe dando um abraço, sentindo as lagrimas vindo de novo sem motivo nenhum.

–Significa “princesa”. Urbi. – Killian respondeu as minhas costas. Eu o ignorei, soltando a garotinha que voltou a se sentar. – Vovó quer conversar com você agora.

–Vou daqui uns minutos. Estou cuidando das crianças no momento. – respondi sem emoção nenhuma, tentando parar de chorar.

Eu nem sabia por que estava chorando!

Voltei a brincar com eles, sem olhar para Jones. Eu estava magoada com ele. Magoada por me esconder coisas.

–O que aconteceu, Emma? – questionou se sentando ao meu lado e erguendo a mão para tocar meu rosto. Desviei olhando para o outro lado. – Amor, converse comigo. – pediu.

–Claro do mesmo jeito que você conversa comigo, não é Jones? – retruquei controlando a voz para não acordar Xoloni.

–Emma aquilo que vovó disse... Não é nada importante.

–Se não é nada importante me conte o que é! – exclamei minha voz falhando no final. – Se não fosse nada importante você não estaria até agora conversando com ela. O que está me escondendo, senhor?

Killian fitou meu rosto, soltando o ar lentamente, se aproximando.

–Eu sabia que iria encontrá-la aqui. – desconversou seus olhos percorrendo meu corpo.

–Já eu estou surpresa que tenha se sujeitado a entrar aqui. Sabe como é? São crianças. – soltei em um tom maldoso.

–Emma...

–Se não vai me contar o que está escondendo, saiba que não tenho interesse nenhum em conversar com o senhor.

–Killian, Emma. Já pedi para me chamar de Killian. – lembrou. – E amor, se fosse algo que eu achasse que deveria saber eu iria te contar... Mas assim como pede que eu respeite suas conversas com Graham, peço que respeite o que não quero lhe dizer dessa vez.

–Minhas conversas com Graham não tem nada a ver com você. – rebati, mesmo sabendo que estava mentindo. Não tinha uma carta que eu não havia citado Jones, era exatamente por isso que eu as escrevia.

Killian tentou rir, segurando na mãozinha de Xoloni.

–Você está linda, Swan. – elogiou mudando de assunto.

–Já deve ser a terceira pessoa que me fala isso.

–Terceira? Eu queria ter sido o primeiro. – respondeu encostando a testa em meu ombro. – Meu Deus! Conseguiram deixá-la ainda mais cheirosa. – comentou. Mesmo não querendo, senti meu coração reagindo e meu estomago se agitando. – Urbi, não quero que chore. – sussurrou beijando meu maxilar.

O olhei de soslaio, sentindo meu corpo todo se arrepiar ao sentir seus lábios em minha pele.

–O que está fazendo, Killian? – indaguei com a voz mole.

Jones se afastou me olhando, com os olhos azuis cintilando. Levantou a mão novamente para o meu rosto e dessa vez não me afastei. Ele passou os dedos lentamente embaixo dos meus olhos, mesmo que eu soubesse que já havia parado de chorar fazia uns minutos.

–Você é linda, Emma. – me elogiou de novo. – Assim como esconde as coisas de mim, tenho coisas que não estou pronto para lhe contar. Dê tempo e não fique de cara fechada para mim. Sei que é de sua natureza querer ter as respostas logo, mas assim como você está em busca de algo, eu também estou.

Pisquei deixando que ele segurasse meu rosto. Nisso ele estava certo. Eu não podia forçá-lo a contar algo sobre mim, quando eu escrevia cartas sobre ele por não ter coragem de conversar sobre o assunto.

Eu não estava sendo justa.

Acontece que eu sentia que o que ele estava me escondendo era muito mais grandioso do que meus sentimentos confusos em relação a ele.

Assenti, colocando minha mão livre sobre a dele que estava em meu rosto a apertando.

–Tudo bem. Amigos ainda. Me desculpe.

Killian abriu um sorriso sincero, enlaçando nossos dedos e trazendo o rosto para perto do meu.

–Emma, Landon me pediu... Ah me desculpem. – Zirba estava parada na porta da tenda nos olhando sem jeito. – Eu volto depois, acontece que Landon pediu para eu ficar aqui para que pudesse...

–Não está interrompendo nada. – falei rapidamente me afastando de Killian e soltando nossas mãos.

Me coloquei de pé com dificuldade, apertando Xoloni nos braços.

Jones soltou um suspiro frustrado olhando para cima.

–Na verdade está sim. – o escutei murmurando. – Irei acompanhá-la até a cabana da vovó.

–Não é necessário. – o dispensei. – Eu sei como chegar até lá. Fique aqui com Zirba fazendo companhia. – sugeri entregando Xoloni para ela e jogando o xale novamente sobre meus ombros. – Nos vemos depois.

–Claro. Por que não? – concordou não parecendo satisfeito. –Ficarei aqui com Zirba, não é mesmo?

Os deixei na tenda e fui em direção à cabana da vovó, repassando toda a conversa que Killian e eu tivemos, sentindo um arrepio percorrer meu corpo ao me recordar do beijo em meu maxilar. Se Zirba não tivesse chegado eu teria quebrado a promessa que havia feito a Graham de ser forte.

Bati na porta para avisar que estava entrando e a encontrei sentada ainda no mesmo lugar.

–Emma, venha se sentar aqui comigo. Já mencionei que suas cores são lindas? Porém vejo um pontinho negro no meio delas e detestaria que ele aumentasse. Conte para vovó o que está lhe perturbando. – bateu ao seu lado me convidando a ir até ali.

Me ajeitei ao seu lado e segurei em sua mão enrugada e com aparência de frágil.

–Que cores a senhora vê?

–A rosa é a que predomina, seguida de verde e azul. Elas a emolduram. E por favor, me chame de vovó, ou Libélula.

Franzi a testa. Aquele era realmente um nome?

–Sim, é realmente um nome. – respondeu minha pergunta mental. – Com um belo significado. Gostaria de saber?

Assenti me aconchegando mais perto dela, até que lembrei que ela não podia ver o gesto.

–Claro, por favor.

– Para vários povos a libélula é símbolo de novos começos, de felicidade. A esperança e amor que nunca podem ser perdidos. Veja bem, as libélulas tem vidas curtas, logo sabem que tem que viver plenamente. Com isso adquirem a maturidade para saber aproveitar o tempo que tem de vida. Meu tempo neste mundo é tão curto, como se fosse um piscar de olhos. Antes que questione o que quero dizer com isso, porque como vê não tenho mais a beleza da jovialidade, pense como ainda sou uma criança comparada ao mundo em que vivemos. Ele já existia antes de eu nascer e continuará existindo depois que eu partir. O tempo que ficamos aqui é breve demais para ser desperdiçado com coisas banais, ser desperdiçado evitando sentimentos ao invés de abraçá-los, Emma. Foi com o intuito que eu nunca me esquecesse disso que minha mãe, que já partiu há muito tempo, me deu esse nome. Do qual tenho muito orgulho.

–É um belo significado, vovó. Tentarei me lembrar sempre dele... Agora quanto aquela ajuda que Killian disse que talvez a senhora pudesse me dar?

Vovó Libélula soltou um som estranho com a garganta.

–Me deixe tocar seu rosto, menina. – pediu erguendo as mãos trêmulas, segurei-as delicadamente colocando sobre minha face. – Não é apenas bonita por dentro, é bela por fora também. – constatou tocando meus olhos, apertando minhas bochechas.

–Obrigada... A senhora tem como me ajudar?- insisti voltando a pergunta.

Vovó ficou em silêncio pensativa, as mãos imóveis em meu rosto.

–Tenho... Mas para que eu possa lhe ajudar, Killian precisa lhe contar a verdade.

–E que verdade é essa pelo amor de Deus! ?– soei desesperada. – Jones não me diz nada e não posso forçá-lo a me contar, quando nem tudo compartilho com ele. Vovó, eu preciso de respostas, eu preciso achar minha mãe ou algo que explique aquela carta. Eu não aguento mais não saber se esse esforço que eu estou fazendo vai dar em alguma coisa. – desabafei, chorando sem vergonha nenhuma, cansada de não conseguir respostas, de não saber se minha mãe estaria viva ou se foi alguma brincadeira de mau gosto que interpretei de forma errada. – A qualquer momento alguma coisa pode acontecer comigo naquele navio, desde ser atacada por uma doença ou morrer em um naufrágio. Quero saber se isso não é em vão. Vovó eu quero me casar e ter filhos, por mais que eu diga que não me importo em ser uma solteirona. Eu me importo sim, e não precisa ser por amor, sou sentimental quando se trata da minha vida e quero uma família minha. Eu não quero passar minha vida naquele navio, atrás de uma pessoa que pode nem estar viva.

–Emma, sua mãe está viva. – garantiu com convicção. Levantei os olhos para o rosto da senhora que estava lívido. – Mas eu a aconselho a não prosseguir com isso. Peça para Killian deixá-la em segurança em sua casa. Cora não é quem você pensa. Emma você não conhece o poder e o quanto de luz carrega dentro de si e de como as pessoas se interessam nessa luz rara que possuí.

Fiquei confusa com o que ela disse.

–O que quer dizer? Está falando que eu sou especial? Uma pessoa com dom, como a senhora?

–Todos somos especiais, meninas. Alguns de nós somos mais que outros e o seu poder, o seu dom é muito maior que o meu.

–Não. Não, eu sou normal. Nunca fiz nada... Não.

–Os dons são diferentes de pessoa para pessoa. Eu consigo ver o seu e o entendo, porém não posso dizer o que é. Não sou permitida a isso. Mas confie em mim quando digo que Cora está viva e que não é quem você pensa. Que o melhor a fazer é desistir e voltar para sua casa. Se seu coração assim permitir, levando em conta que mesmo que não queira viver para sempre em um navio, ele já pertence ali. Seu coração já encontrou um lar onde se sente bem e eu poderia lhe dar todas as respostas que borbulham em sua mente, mas qual seria o sentido disso? O que você aprenderia, menina? Você já possuí as respostas, Emma. Apenas tem que encaixá-las nas perguntas certas.

Fechei os olhos sentindo meu corpo sendo atingido por tremores. Não era aquilo que eu queria ouvir, mais uma pessoa confirmando que minha mãe não era o quem eu pensava. Mais coisas para me deixar confusa, mais incertezas para os meus dias que já eram incertos. Mais agonia para eu carregar em meu coração, o fazendo pesar.

Vovó puxou minha cabeça, me fazendo deitar em seu colo, onde me permiti chorar como uma criança, sentindo suas mãos fazendo carinho em minha cabeça, enquanto ela me cantava uma doce cantiga em sua língua nativa. Eu abracei sua cintura, apertando meu rosto em sua barriga querendo que nada daquilo tivesse acontecido. Desejando que eu tivesse ficado em casa e nunca ter cogitado ir atrás de respostas.

Desejando que meus pais fossem outros e eu fosse feliz de verdade.

Como podia eu carregar cores tão coloridas como vovó dizia quando por dentro eu me sentia sendo engolida por uma escuridão que não me deixava ver algo que ela dizia estar comigo?

–Libélula, eles estão a chamando para o jantar. – a voz de Landon preencheu o ambiente. –Emma?

–Ela está bem. Só está liberando as energias negativas que estava prendendo dentro dela. Nós duas iremos daqui a pouco.

Me sentei limpando o rosto, meu nariz entupido e fazendo um barulho nojento.

–Pode ir, vovó. Obrigada pelo colo, eu estava precisando. – agradeci com a voz embargada. – Eu gostaria de ir dormir se não se importam. Eu estou cansada. – soltei uma risada tentando deixar o clima mais leve.

–Terá meu colo sempre que precisar, menina. – vovó tateou até encontrar meu rosto o afagando com carinho. – Você está tão preocupada em cuidar dos outros que se esquece de cuidar de si. É importante ter esse sentimento, mas nunca se esqueça de deixar você bem antes de pensar nos outros. Emma, você não tem ninguém cuidando de você agora e não pode se abandonar desse jeito, novamente. Não guarde as lágrimas, elas não são sinal de fraqueza e sim libertação. Pense no que lhe falei. Sobre essa jornada que se colocou.

Assenti segurando em sua mão e dando um beijo nela.

–Irei. Obrigada.

Me coloquei de pé a ajudando se levantar. Respirei fundo, colocando sua mão no interior de meu cotovelo e Landon fez o mesmo.

Lori nos encontrou a meio caminho da fogueira, onde todos estavam reunidos pronto para jantar. Entreguei vovó para ele, lhe desejando boa noite.

–Não irá jantar senhorita? – Lori indagou com uma careta.

–Não estou com fome, irei procurar algum lugar para passar a noite. – avisei apertando o xale em meu corpo.

Meu maxilar ainda tremia da força que estava fazendo para não chorar mais. Eu havia chorado tanto, mas ainda assim não parecia o suficiente. Era como vovó tivesse aberto uma barreira que eu não sabia que havia construído dentro de mim e agora não conseguia colocá-la no lugar novamente.

–Landon sabe onde deixá-la, menina. – vovó disse antes de sair dando passos lentos acompanhada de Lori.

Observei a fogueira e como todos estavam animados, conversando, cantando, alguns dançando e desejei estar feliz para me juntar a eles. Caramba eu estava bem algumas horas antes, lembrava de rir na praia com Bae e gostar do som. Porém tudo o que eu queria naquele momento era ficar no completo silêncio, encolhida e tendo a mim mesma como companhia.

Como nosso humor podia mudar em questão de horas?

Avistei Killian e Zirba conversando animadamente, trocando sorrisos, bem próximos um do outro e concluí que naquela noite ele poderia passar mais do que bem sem mim.

Segurei no braço de Landon, para que ele me levasse onde vovó dissera que poderia passar a noite.

Landon não questionou, nem tentou conversar, o que agradeci profundamente levando em conta que não aguentaria manter uma conversa sem engasgar com as palavras.

Paramos em frente a uma cabana distante de toda a bagunça que se encontrava ao redor da fogueira, o qual ele abriu, iluminando o interior. Havia camas improvisadas montadas em fileiras. Escolhi a mais distante da porta, me encolhendo e encarando a parede.

Landon jogou uma coberta em mim, tirando as flores do meu cabelo e desfazendo a trança.

–Durma bem, Emma. Se precisar de mim, sabe que pode chamar. Sei que Libélula disse que não tem ninguém para cuidar de você, mas está errada. Você tem a mim, Emma e sabe que pode recorrer sempre que precisar, filha.

Aquiesci fechando os olhos com força, tentando fazer alguma coisa ter sentido em tudo aquilo. Eu queria parar chorar, eu queria que aquela dor que vovó havia me mostrado parasse de doer. Eu não percebia como estava até ela cutucar.

Por que Killian não me ajudava se vovó disse que tudo dependia dele para eu ter minhas respostas?

Soltei um lamento alto de dor, escondendo o rosto no colchão e me abraçando.

Eu queria Granny, meu pai e Graham agora comigo.

Queria que Landon fosse meu pai de verdade.

Eu queria não estar tão longe de casa.

Queria entender o que minha mãe era, já que não é a pessoa que eu pensava.

Queria entender o quem eu era.

Queria minha vida entediante de volta.

Escutei a porta se abrindo e passos cautelosos se aproximando. Cobri a cabeça com o cobertor não querendo que ninguém me visse.

–Swan? – Killian me chamou hesitante. – Deixe- me vê-la. – ele se sentou na cama tentando puxar o cobertor de meu rosto. – Trouxe seu jantar, amor.

Solucei e funguei freneticamente, tentando me acalmar.

–Não estou com fome, Killian. Só quero ficar quieta. Vai embora.

–Não me mande embora, Emma. Não a mim. – murmurou com a voz suave. - Tente comer pelo menos um pouco. Você tem se alimentado mal nesses últimos dias.

–Não quero Jones.

Killian se levantou e puxou a coberta novamente.

–Emma deixe-me ajudá-la.

–Você sabe como me ajudar. Vovó me disse que apenas depende de você me dizer a verdade. – retruquei com a voz embargada. – Volte para Zirba e os mouros. Eu só quero ficar sozinha. Por favor, me deixe sozinha.

–Aceite minha ajuda, Emma. Eu a deixei me confortar durante todo esse tempo, está na hora de eu confortá-la.

–Não quero que o faça por obrigação. Agora por favor, saía! – grunhi.

Jones bufou impaciente.

–Tudo bem. Boa noite, Swan. – se despediu com a voz seca e saiu batendo a porta.

Descobri a cabeça e virei para encarar a porta.

Eu nunca teria desistido tão fácil de uma pessoa que estava determinada a ajudar.


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Notas finais do capítulo

Então o que acharam? Consegui recompensá-los do capítulo anterior ou devo me esforçar mais? Espero de coração que tenham gostado desse, porque foi um dos meus preferidos que escrevi até agora (não me perguntem por que, apenas é)

Não que seja interessante, mas enquanto eu estava fazendo a última revisão agora cedo antes de postar uma libélula entrou no meu quarto. Foi a primeira vez que uma libélula invadiu meu quarto e não tenho como agradecer a vovó por essa visita. Foi um presente maravilhoso.

Obrigada por lerem.

Beijos.



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