Os dados rolaram pela mesa, gritos e pragas o acompanhando. Dedos cruzados observando o resultado. 5 e 6. Números impossíveis, mas um casal gritou de felicidade. Abraçando-se, eles felicitaram a boa sorte. Dei um meio sorriso, orgulhosa de mim mesma. Fácil.

Era muito fácil jogar com a sorte. Ganhar e perder. Para mim, as duas palavras se encontravam na minha mão e eu podia manipula-las como quiser. Não que eu gostasse de jogar com a vida de pessoas alheias, mas era divertido ajudar alguns e amaldiçoar outros.

Levantei-me da mesa em que estava, saindo o mais discretamente o possível. Não era do meu perfil, tentar se manter para baixo, mas hoje eu daria a chance para que aquele casal fosse feliz. Eu havia gostado deles e... a sorte estava ao seu lado, não é?

Saí do cassino para o ar frio da noite de Quebec. Meu vestido preto não cobria muito e o casaco era fino, mas o caminho era rápido e de certa maneira eu havia aprendido a me acostumar com o frio. Os saltos altos faziam barulho na calçada. Era meia-noite, uma hora muito perigosa para uma garota normal andar sozinha. Não havia porque me preocupar, eu não era nem um pouco normal.

Peguei um baralho de minha bolsa. Era quase uma mania. Eu jogava toda hora do meu dia. Sempre sabia o resultado das minhas apostas. Sem surpresas, sendo o jogo de loteria ou xadrez. Eu sempre ganhava, era apenas o normal de quem eu era. Então por que eu amava tanta jogar? Porque era fácil e constante. Se você sabe o resultado, não há porque temer o amanhã.

Meus passos pararam de forma hesitante pelo caminho. Um sentimento de mau presságio em meu peito. Ganhar era fácil, lembrei a mim mesma. Eu havia salvado minha família da falência, ajudava meus amigos e salvava pessoas que me interessava. Então, porque havia aquele sentimento irritante na parte de trás de minha mente gritando que era impossível ganhar todas?

Mãos apertadas em punho. Não, não mesmo. Eu nunca iria aceitar perder. Nem mesmo se o destino queria isso. De um modo ou de outro, eu sempre vencia. As cartas esmagadas em minhas mãos foram jogadas no chão. Encostei-me na parede de um prédio ao lado.

Eu gostava da sorte, de ganhar, ter poder e controlar. Por quê? Porque eu não podia controlar os monstros debaixo da cama, nem os pesadelos que me fazia acordar gritando ou... a loucura em minha mente.

Eu não era louca, lembre-me a minha mesma. Apenas inconstante. O jogo de sorte fazia isso com você. Controle a situação, perca a si mesma. Oh, meu Deus. A confusão de espírito que segue a sorte é uma droga.

Respirei fundo de repente. A hesitação perdida e a confiança de volta. Pelo menos a aparência dela. Fraquezas destroem seus inimigos. Confusões mentais são o pior tipo de fraqueza. Eu não podia mostrar elas, nunca em nenhum dia da minha vida. Eu não perdia e por isso não tinha fraquezas. Sorri com felicidade e voltei a caminhar com alegria. Saltos que estalavam na calçada em uma melodia da sorte. Sim, eu não perdia. Nunca.