Rede de Mentiras escrita por Gaby Molina


Capítulo 16
Capítulo 16 - Extraordinário


Notas iniciais do capítulo

Esse cap saiu rápido porque eu vou viajar essa semana pro acampamento (alguns sabem do que tô falando; pra quem não sabe, é meu lugar favorito no universo), então vou ficar fora até sábado (24). E eu não gosto de agendar caps, obg, sjksajlnv

Esse cap vai para aquela pessoa que só de ela tocar em você já te dá arrepios. Do tipo bom. Aquela que você não sabe se quer ser, beijar, casar ou apenas observar à distância pelo resto da vida. Esse cap vai para você que chora em momentos inapropriados em frente a pessoas que quer impressionar. Esse cap vai para você que passa tanto tempo tentando esconder a própria humanidade que quando ela aparece se transforma em um furacão e faz a maior bagunça.



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I wanna lay you down in a bed of roses

For tonight I'll sleep on a bed of nails

I wanna be just as close as your Holy Ghost is

And lay you down on a bed of roses.

— Bed Of Roses, Bon Jovi

Ethan

As coisas estavam indo bem com Veronica. Eu tentava não pensar em tudo pelo o que havíamos passado, em todas as vezes que ela me abandonara. Em geral, tentava não pensar demais em emoções, porque eu era uma merda com elas. Eu entendia por que Elena não queria nada comigo, apesar de uma parte de mim esperar que ela entendesse.

Clarissa gritou meu nome. Não era comum. Geralmente ela mantinha o tom de voz baixo.

— Já volto — esbocei um sorriso para Veronica e me levantei, caminhando até a sala.

Apenas para encontrar Christina parada na porta.

— Querido? — ela sorriu. — Senti saudade.

Meu Deus. Aquilo era um pesadelo. Era a porra de um pesadelo.

— Christina? — Veronica estreitou os olhos, descrente, e se aproximou.

— Você! — Christina disse com nojo. — Fique longe do meu filho, sua vagabunda!

— Ele é meu filho, sua nojenta!

E ali estava. A minha realidade. Christina se aproximou de Veronica e a empurrou, mas já estava velha para ficar brigando. Tinha em torno de cinquenta anos, dez a mais do que Veronica.

— Seu filho? — Christina rugiu. — Diga isso à Corte quando eu conseguir uma ordem de restrição contra você!

Clarissa parecia prestes a vomitar.

— Eu... não deveria tê-la deixado entrar? — ela murmurou para mim, mais hesitante do que eu jamais a vira.

— Tudo bem — tentei sorrir para ela, mas estava exasperado demais. — Todos temos nossos problemas de família.

— Suas mães são lésbicas?

— Deus, não! — Christina revirou os olhos, impaciente. — Eu sou a mulher que cuidou dele por vinte anos, que estava lá para seus primeiros passos, seu primeiro dia de aula, seu último dia de aula, para o diagnóstico... E ela é a que o pariu e deu o fora.

— Não foi bem assim — defendi, mas me arrependi de tê-lo feito quando vi o olhar magoado no rosto de Christina.

— Que gritaria é essa?! — Elena desceu as escadas, levemente irritada.

— Essa é a minha deixa — disse Clarissa e correu para o andar de cima.

— Não era assim que eu imaginava esse momento — suspirei. — Elena, você conhece minha mãe, Christina. Essa é Veronica, minha outra mãe. Veronica, essa é Elena, a garota de quem te falei.

Veronica sorriu.

— Foi modesto quando falou da beleza dela, Ethan.

— Eu... Obrigada — Elena recuou um pouco. — Está tudo bem aqui?

— Imagine minha surpresa quando vim visitar meu filho e me disseram na recepção que a mãe dele já estava aqui — Christina fuzilou Veronica. — Foi assim que se identificou na recepção, sua vaca? Acha que tem esse direito?

— Parem! — pedi. — Jesus! Apenas parem. Mãe, eu passei o dia conversando com a Veronica. Querendo ou não, de uns anos para cá ela virou uma figura importante para mim. E ela sempre foi parte da nossa família, você querendo ou não, porque sim, ela me pariu. E Veronica — encarei-a. — Nunca mais chame a minha mãe de nojenta. Estamos entendidos? — elas assentiram. — Ótimo. Se resolvam. Só volto aqui quando virarem melhores amigas. Deus. Como se eu já não tivesse problemas demais.

— Foi adorável conhecê-la, Elena — Veronica sorriu.

— O... O mesmo — Elena balbuciou e me acompanhou quando saí da casa para o pátio. — Ethan? Você está bem?

— Pareço bem? — Eu estava gradativamente perdendo o controle, e sabia disso. Essa é a pior parte: quando você sabe disso.

— Eu não sabia que você era adotado — disse ela. — Apesar de não se parecer nada com os seus pais.

— Eu estou tão cansado, Elena — fitei seus olhos azuis apreensivos, e pela primeira vez não controlei minhas palavras. Eu não conseguia controlar. — Tão cansado de ficar aqui me escondendo, mas ao mesmo tempo não quero lidar com isso. Com elas. Comigo. Não quero. Porque se eu me permitir pensar nisso tudo, se eu me permitir sentir... Você lembra como eu era quando não sentia. E entendo que não queria nada comigo, e eu quero prometer para você que não sou aquela pessoa, que eu mudei, que posso ser para você tudo o que você precisa e merece, mas aí eu me vejo parado nesse frio de merda querendo chorar porque tenho duas mães e elas não se dão bem, e como diabos eu posso esperar algo de você quando não consigo me controlar?

— Ethan. Relaxe — sua voz era suave, quase hipnótica.

Eu estava chorando. Merda, eu sentia uma lágrima descendo pelo meu rosto. Eu estava chorando em frente à garota que eu queria impressionar.

— Eu geralmente não reclamo das coisas, você sabe. Tem gente passando fome, gente que não tem onde morar, mas... É tão difícil, droga.

— Tudo bem. Tudo bem. Relaxe — ela segurou minha mão com uma das mãos e com a outra limpou uma lágrima dos meus olhos. — Não pense nisso. Você pode lidar com isso depois.

— Eu sou patético — suspirei, agora mais frustrado do que triste. — O único jeito de eu fazer com que você fique perto de mim é chorando como uma criança e odiando a vida. Merda. Não era pra acontecer assim. Não era.

— Ethan — seu tom era mais sério agora. — Relaxe.

— Você não me ouviu? — ergui uma sobrancelha. — Como diabos você espera que eu relaxe?

Então ela puxou minha cabeça para frente e me beijou. Talvez por pena, talvez porque queria muito que eu calasse a boca, mas eu não me importava. Eu era miserável o bastante para beijá-la de volta mesmo assim.

As pessoas dizem que uma boca é uma boca e que não faz diferença beijar alguém que você goste muito ou alguém que você conheceu há dois minutos, e eu digo que é mentira. O simples ato de tocar na cintura de Elena, de sentir suas mãos em meu cabelo, de compreender por aqueles segundos quem eu tinha em frente a mim me arrepiou e tirou meu fôlego. Porque, no fim do dia, não é sobre uma língua enfiada na sua boca, é sobre todo o resto. É sobre querer tanto uma pessoa que isso te corrói por dentro e te explode, e ao mesmo tempo estar completamente confortável observando à distância, apenas para não correr o risco de se aproximar demais e perdê-la.

Ela se afastou de mim primeiro. Eu jamais a afastaria, porque isso significaria que o resto do mundo voltaria a existir. E eu não gostava do resto do mundo.

— Você não precisava ter feito isso — murmurei.

Ela me fitou.

— E quem disse qualquer coisa sobre precisar?

— Eu gosto de você — falei, porque toda a minha dignidade já se fora, mesmo. — Eu gosto mesmo de você.

Ela me abraçou com força, e senti seu ombro em meu queixo quando baixei a cabeça.

Hora ruim? — ouvi uma voz grave ao meu lado.

Parado ali estava meu pai. Elena me soltou, reconhecendo-o.

— Ganho um olá depois de... quanto? Uns dois anos? — Frank Blackery sorriu.

Não era assim que eu queria ver meu pai depois de dois anos: chorando e me declarando para uma garota no frio. Mas, depois da noite que estava tendo, a situação não me abalou muito.

— Olá — foi tudo o que consegui dizer.

— Eu me lembro de você — ele fitou Elena. — Não o bastante para me lembrar de seu nome, é claro, mas me lembro de você.

— Elena Donovan — ela estava desconfortável. — Boa noite, sr. Blackery.

— Acho que depois que meu filho age como um psicopata apaixonado e o pai dele aparece do nada você recebe o direito de me chamar de Frank.

— Está bem. Frank.

Fez-se silêncio constrangedor.

— Conversou com a sua mãe? — meu pai me fitou.

— Veronica está aí — falei, pois não sabia como despejar a informação de modo suave.

Ele estreitou os olhos.

— E você a deixou lá com Christina para beijar sua namorada?

— Não. Não venha me julgar. Eu não tive escolha. E Elena não é minha namorada. Ainda.

Elena

Não deixei que Ethan notasse, mas esbocei um sorriso e acompanhei os dois Blackerys de volta à sala de estar, onde Veronica e Christina estavam sentadas uma de cada lado do cômodo, em silêncio.

— Bem — Frank tomou a dianteira. — Acredito que temos que nos atualizar sobre nossas vidas, não é mesmo? Podemos começar com Ethan contando sobre a nova namorada dele.

— Você é surdo? — Ethan ergueu uma sobrancelha, tentando soar rude, mas não conseguiu. Soou apenas inquieto.

— Eu não sou a namorada dele — murmurei, hesitante.

— Por que não? — Christina franziu o cenho. — Decerto seria um progresso monumental em relação àquela última... Qual era o nome dela? Laura?

— Lisa — Ethan corrigiu. O nome me deu arrepios. — E ela também não era minha namorada. Alguém está com fome?

— Ei, sua nova namorada poderia cozinhar alguma coisa, certo? — Tenho certeza de que Frank tinha boas intenções, mas eu quis bater nele. Fitei Ethan, desesperada.

— É... — Ethan murmurou, pegando carne na geladeira. — Melhor não.

Clarissa

Eu estava deitada na cama de Fletcher, olhando para as 730 linhas no teto, quando ouvi batidas na porta. Ignorei-as, mas o visitante insistiu, então levantei-me e abri a porta, apenas para deparar-me com Fletcher ali.

Ele estava com cara de exaustão — mais do que o que se tornara normal no último mês. A camiseta estava amassada e eu tinha quase certeza de que ele a estava usando da última vez que eu o vira, dois dias atrás. Os cabelos não eram penteados há séculos. Em suas mãos pálidas ele carregava um buquê de flores azuis.

— Isso não são rosas — foi tudo o que eu disse.

— Feliz aniversário — seu olhar continuava o mesmo: presunçoso e vulnerável de um jeito ligeiramente suicida.

Ergui uma sobrancelha.

— Como você...?

— As flores são miosótis. Também são conhecidas como “não-me-esqueças”. Tem uma história. Quer ouvir a história?

— Não — admiti.

— Ótimo — ele me ignorou. — Diz a lenda que dois jovens apaixonados se encontraram à beira de um rio num dia de Primavera. A garota viu um exemplar de miosótis no rio e ficou maravilhada por sua beleza, então o rapaz foi buscar para ela. Mas as águas estavam turbulentas e ele foi arrastado pela correnteza. A lenda diz que antes que ele se afogasse ele gritou “Não me esqueças, me ama para sempre!”. A partir desse dia a flor miosótis passou a crescer nas margens dos rios, para que mais ninguém tivesse que morrer por sua causa.

— Isso é perturbador — estreitei os olhos.

— Mesmo? — ele fitou a flor. — Foi o que o florista disse também. Eu achei bem extraordinário. Mas, bem — ele me estendeu as flores. — São para você.

E então eu bati a porta na cara dele e voltei a me deitar na minha cama. Ele abriu a porta, irritado, e entrou no quarto sem pedir licença.

— Qual é o seu problema?! — ele bufou.

— Por que está fazendo isso? — encarei-o, encolhida. — Já não me machucou o suficiente?

Agora ele estava simplesmente descrente e perturbado.

— Quer saber? Esqueça — ele jogou o buquê para mim e se jogou na própria cama. — Vou morrer sozinho, mesmo.

Ficamos em silêncio por um minuto, mas ele estava inquieto.

—... York, por que diabos meu travesseiro está com o seu cheiro?

— Qual é o meu cheiro?

— Cheiro de menina.

— E não pode ser o cheiro da Elena?

— Não, a Elena tem cheiro de shampoo de framboesa e perfume cítrico.

— E como é cheiro de menina?

Ele afundou a cara no travesseiro.

— Não sei explicar.

— É um cheiro bom?

— Sim. Quando não me dá vontade de me matar.

— Você quer se matar?

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Não é nisso que achei que essa noite daria. E não, não quero me matar, não sou tão corajoso assim.

Eu fingia que Fletcher nunca me assustava, mas era apenas uma atuação. Às vezes ele me aterrorizava. Quando falava sobre morte tão tranquilamente... era uma dessas vezes.

Peguei as flores no pé da cama e as cheirei. Eram boas. Eram bonitas.

— Me desculpe — soltei. — Eu não deveria ter menosprezado seu gesto.

— Tanto faz.

— Não, não é tanto faz — revirei os olhos, sentando-me na ponta da cama dele. — Eu quero confiar em você, mas tem partes de você que eu tenho receio de conhecer.

— Por quê? Acha que escuridão é contagiosa? — ele sorriu, mas era um sorriso debochado.

— Não. Tenho medo de encontrá-la em mim também.

Ele se sentou, me fitando com os olhos quase negros.

— Pergunte o que quiser. Como presente de aniversário de dezoito anos.

Pensei por um instante.

— No que você pensa quando não consegue adormecer?

Ele suspirou, recostando-se no travesseiro e fitando o teto.

— Não tem uma coisa exata. Às vezes penso na minha família. Na minha vida. No propósito da nossa existência.

E então me lembrei de algo que me incomodava há dias.

— Você é cristão, não é? Quando falou com seus pais, disse “Durmam com Deus”. Foi só um dialeto?

Ele parecia surpreso por eu ter notado algo assim.

— Não sei se sou cristão. Acredito em Deus. De todo o jeito bíblico e tal. Mas acho que Ele desistiu de mim, só isso — ele tomou coragem para me fitar. — Eu acredito Nele. Ele não acredita em mim. E não me leve a mal, eu não O culpo por isso. Eu desisti de mim mesmo há muito tempo. — Ficamos em silêncio por um minuto. — Clarissa?

— Sim?

— Vem cá?

Eu fui. Encostei-me em seu peito e senti suas mãos ao meu redor. Seu coração batia muito forte, como sempre.

— Por que disse que me ama se sabia que isso ia me destruir? — indaguei.

— Porque sou egoísta o suficiente para passar o peso para você em vez de deixá-lo quase me esmagando. Só não imaginei que fosse me sentir uma merda depois, mas me senti, então te comprei flores, porque é isso que os caras fazem nos filmes, mas não consegui nem escolher as flores certas.

— Foram as flores certas — eu disse.

— Elas são pequenas, e não são grande coisa, mas eu queria que significassem alguma coisa.

— Eu também sou pequena e não sou grande coisa. Não tem problema.

Ele riu e beijou o topo da minha cabeça sem motivo aparente.

— Fletcher?

— Sim?

— Você acha que poderíamos ter um futuro juntos? Tipo, um futuro de verdade.

— Provavelmente não — ele deu de ombros. — Mas você me faz querer acreditar nisso.

— Essa foi uma resposta de merda.

— Sério? Achei extraordinária.

— Você é uma pessoa de merda.

— Não posso discordar.

Ele me empurrou para frente e subiu em mim, afastando meu cabelo do rosto e me beijando. Senti seus lábios em meu pescoço e puxei seu corpo mais para perto de mim, já esperando o momento que cairíamos no chão pela falta de espaço, mas não aconteceu. Ele me fitou por um minuto e não consegui desviar o olhar de seus olhos, tentando identificar o lugar exato onde a íris encontrava a pupila, de tão escura que era. Percebi que não estaria nem de perto tão obcecada por seus olhos se eles fossem claros. Olhos claros têm todos os seus segredos expostos em um relance. Olhos castanhos são subestimados, mas olhos escuros como os de Fletcher são quase impossíveis de serem lidos.

Pus as mãos sob a camisa dele, e logo ela estava jogada do outro lado do quarto, revelando seu peitoral definido por conta da magreza, porém ainda macio. Pude ver que ele estava desconfortável, mas ele só me parou quando fiz menção de tirar minha blusa.

— Clarissa. Para.

Fitei-o.

— O que foi?

— Essa é a última linha — ele ergueu uma sobrancelha e me encarou para ter certeza de que eu estava ouvindo. — Não podemos cruzá-la assim.

— Tecnicamente, ainda tem o casamento.

— Casamento é um pedaço de papel. Estou falando de linhas emocionais.

— Eu estou bem.

— Bem, eu não estou — ele revirou os olhos. — A possibilidade de eu não querer cruzar essa linha com você não te ocorre?

— Não é grande coisa.

— É, sim. Você é virgem e nós temos problemas emocionais. É grande coisa.

Recuei.

— Eu não sou virgem.

Ele riu. Um riso debochado, o que me perturbou um pouco.

— Clarissa, você tem “virgem” escrito na sua testa.

— Eu não sou virgem — repeti, encarando-o.

Ele ergueu uma sobrancelha, ainda se divertindo.

— Ah, não?

— Não. Quer detalhes?

— Quero. Cada detalhe sujo.

Ele podia ver que a resposta havia me surpreendido.

— Não era para você dizer “quero”, seu maníaco. Não vou falar disso com você.

Ele não insistiu.

— Está bem. Ainda assim. É grande coisa. Eu estou magoado com a minha família, você está magoado porque fui o único que se lembrou do seu aniversário.

— Você não fez um voto de castidade, fez?

— Já disse que casamento é um pedaço de papel. Não dou a mínima para casamento. Só estou dizendo que deveria ser um momento importante toda vez. Deveria ser com alguém que você se vê passando o resto da sua vida, e não necessariamente seu marido ou esposa. Só... aquela pessoa.

Eu respeitava a opinião dele, e não brigaria por isso, mesmo que não concordasse totalmente. Eu me deitei na cama dele e, quando ele foi me abraçar, notei algo em suas costas.

— Fletcher... Você está machucado?

Ele tentou esconder o hematoma roxo e deu de ombros.

— Não é nada.

— Fletcher. O que houve?

— Devo ter esbarrado em alguma coisa.

— Não, foi uma puta pancada — encarei-o. Uma ideia me ocorreu. — Onde você conseguiu as flores?

— Já disse, numa barraca de flores.

— Você pagou pelas flores?

Ele estreitou os olhos, se afastando.

— Acha que eu roubei?

— Como pagou?

— Não acredito que...

— Fletcher.

Ele suspirou.

— Eu não ia, mas o máximo de dinheiro que consegui pegar da minha irmã foi para o ônibus, e eu fiquei olhando para as flores, e o florista começou a me contar a história da miosótis, e eu sabia que havia encontrado algo para dar para você. Então peguei as flores, mas ele pegou um bastão de beisebol embaixo da barraca e me acertou. Eu continuei correndo. Ele desistiu quando eu entrei no ônibus.

Fletcher

Observei o rosto dela mudar. Ela ia me bater. Merda, ela ia me bater.

— Você podia ter morrido!

— Mas não morri.

Ela me ignorou.

— O que eu ia fazer se você morresse roubando flores para mim, caralho?

— Hã... Voltar para o Kevin?

— Seu idiota!

— Eu poderia me desculpar, mas não sinto muito.

Ela me fitou por um momento com os olhos castanho-claros. Os lábios finos quase desapareciam quando ela os apertava um contra o outro.

E então ela se inclinou e me beijou, por fim se deitando ao meu lado.

— Nunca mais faça isso. Eu não preciso das flores.

Quase perguntei se aquilo significava que ela precisava de mim, mas eu não gostava quando ela me pressionava, então também não a pressionei.

Clarissa

— Eu realmente não quero te perder — ele murmurou tão rapidamente que quase não entendi.

E, pela primeira vez, eu acreditei nele. Eu acreditei que eu era importante para ele, e foi bom. Talvez fosse ser muito ruim depois, quando não fosse tão verdade assim, mas naquele momento era verdade para mim, e foi bom.

— Bem, minha analista acha que você é uma boa ideia — comentei, e ele riu. Seu riso de verdade, leve, baixo, o riso que eu gostava.

E eu sorri também, porque mesmo que Fletcher fosse uma pessoa de merda às vezes, percebi que isso não fazia com que ele fosse nem um pouco menos extraordinário.


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