Winter Soldier - Retomando o Passado escrita por Vendetta23


Capítulo 8
Seu Próprio Inimigo




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Fury recebeu uma pancada na parte de trás da cabeça com o cano que eu segurava na minha mão, mas não antes de eu poder vislumbrar sua preocupação quando viu que a cadeira na qual ele me manteve amarrado estava vazia e sua surpresa quando deslizei, como um fantasma, de um canto negro do bunker. Solto o cano que cai com um baque metálico no chão e ergo com facilidade o corpo dele, o peso extra causa uma ardência muito maior nos meus pés mas ela passa assim que o coloco sentado na cadeira e o seguro com as amarras. Seu óculos escuro tinha caído no chão e rachado a lente, podia ver que ele não tinha nenhuma proteção em seu olho esquerdo que, mesmo cego, parecia estar olhando para mim através da cicatriz que cortava sua face. Ele não havia trazido nada consigo além de um fino arquivo que jazia caído no chão, aberto em uma página aleatória. Pego-o e observo a página cheia de informações sobre ex-agentes da H.Y.D.R.A. ainda em operação, viro as folhas uma a uma e não preciso muito mais do que isso para obter a confirmação do que eu estava olhando, uma nova lista negra, repleta de nomes e organizada forma tão semelhante quanto eram os nomes que a H.Y.D.R.A. me fornecia para que eu riscasse da lista. Mordo o lábio inferior, eu quase recebi outra lista, quase risquei mais outros tantos nomes, foi por muito pouco. O modo como Fury age não é diferente do da H.Y.D.R.A., somente se esconde sobre outra fachada. Agradeço com um sussurro Natasha, enquanto passo os olhos pelas fotos de alvos que enchem o arquivo.

Não... não é fácil pensar em quantas pessoas, boas ou más, não importa, que eu matei. Não me parece justo que eu me esconda sobre a desculpa de que me forçaram a fazê-lo, e me vem a pergunta, minha mente foi tão distorcida a ponto de eu ver sentido no que eu estava fazendo, nessa causa, ou eu encontrei nisso uma justificativa para trazer à superfície uma parte da minha natureza que ansiava matar todas essas pessoas? Pensar que eu teria uma parte de mim que faria isso me trouxe um gosto amargo à boca. Largo o arquivo numa bancada e seu impacto levanta a camada de pó que havia embaixo. A questão é... eu não me reconheço mais nesse soldado, eu não tenho ideia do que me levou a fazer... todas as coisas que eu fiz. Mais assustado que eu deve ter ficado Steve. Penso um pouco no que Natasha quis dizer sobre ele me considerar seu herói, eu estou encharcado de sangue inocente, o rastro que deixo a cada passo que dou deixa isso bem claro, eu não sou herói algum. Fury começa a se mexer na cadeira, dando sinais de que está recobrando as consciência.

Então aquela mesma voz no fundo da minha cabeça sussurra ‘Mas você ainda pode se tornar um’.

Me aproximo lentamente da cadeira por trás e me agacho na frente dele, esperando ele conseguir focar sua visão e me reconhecer, não falo nada até então, tem algo belo no silêncio, pois ele não precisa de justificativa nem de ser preenchido. Ele luta contra as amarras por alguns segundos até perceber minha presença, então sua boca se contorce em uma expressão de ódio profundo. Continuamos mergulhados no silêncio pelo que penso serem alguns minutos, quando Fury começa a mostrar sinais de impaciência.

“Acabe logo com isso” ele disse, engolindo em seco. As emoções estampadas em seu rosto se diferenciam muito da imponência com a qual ele se apresentava nas reuniões da S.H.I.E.L.D., a segurança com a qual ele dava ordens. A expressão de medo em seu rosto me lembrou de que todos os homens temem a morte.

Eu havia, contra as ordens do general, saído da segurança da trincheira, me esgueirando por entre as árvores procurando o autor do tiro que havia acertado meu colega de batalhão no ombro, ele deve ser um dos últimos vivos, escondido por entre o mato alto, eu havia escutado o tiro e sabia com clareza de onde ele tinha vindo. Saltei de trás de uma árvore grande para me deparar com um garoto mais novo e muito menor que eu segurando desajeitadamente uma AK-47, seu rosto pálido contorcido em terror justificava a tremedeira em suas mãos.

“Abaixa a arma” eu disse apontando meu rifle para ele, ele era só uma criança, e eu não queria matá-lo. O garoto de capacete torto me olhou completamente paralisado, suas mãos pequenas largaram o rifle e foram levantadas acima de sua cabeça. Ainda bem que Steve não está aqui, ele seria tão ruim quanto esse garoto. Logo o general surgiu atrás de mim, resmungando sobre como eu deveria ter ficado na trincheira.

“Apague-o” ele disse, eu congelei minha respiração e me virei para o general, suas ordens eram claras e certas, mas eu não iria fazê-lo. Abaixei o rifle, ele não pode estar falando sério. O general suspirou e sacou a arma de seu coldre, desferindo dois tiros no peito do rapaz. Eu ainda abaixei e tentei remotamente estancar o sangue, mas foi em vão e ele morreu menos de um minuto depois, com o olhar de horror que tinha ainda vivo. Eu não dormi por quase uma semana.

Semanas depois o general fora baleado por um sniper bem no intestino, eu o vi sendo transportado para a enfermaria e morrer com o mesmo olhar que aquele garoto tinha.

“O forte e o fraco são a mesma coisa, Fury, a única coisa que muda é a forma como aparecem para os outros” a amizade entre eu e Steve me deixou isso claro durante a vida inteira, ele sempre teve mais coragem do que eu, me recostei na bancada na frente da cadeira, fugindo da luz forte da lâmpada. “Você ia me usar quando eu estava fraco e não tinha noção de quem eu era” não que eu tenha agora, mas ele desfez tudo o que eu consegui construir até então em uma questão de horas, e isso mexeu comigo “... me usar como uma arma, como me usaram antes e você ainda questiona os métodos da H.Y.D.R.A.” essa última parte me fez sorrir um pouco, porque era tão irônica. Ele me olhou por longos segundos.

“Meus objetivos eram outros” ele disse com sua voz rouca.

“Pare de tentar se justificar” agora respondi em tom mais agressivo “Por quê pessoas como você não conseguem entender que um dia você pode ser o mais fraco e precisar de ajuda!?” as palavras saem desenfreadamente da minha boca, então percebo que o que eu quero com aquela conversa não é justiça, não é buscar entender o que ele queria comigo, isso eu já sabia, é fazer alguém entender o quão fraco eu me sinto. Paro então de falar, eu não deveria estar tendo essa conversa com alguém como ele.

Quando Steve me tirou daquela base militar da H.Y.D.R.A., voltamos como heróis para o acampamento, mas na calada da noite eu me esgueirei até sua cabana, sentei em sua cama e encostei em seu braço para chamá-lo, ele logo me olhou, também não conseguia dormir. E toda a morte e dor e destruição que eu tinha visto nos últimos meses vazou pelos meus olhos com as lágrimas, quentes como o inferno que eu vivi. Ele me envolveu e ficamos assim até amanhecer.

O flashback me remeteu à primeira vez que chorei na frente de Steve, pela primeira vez não tive vergonha de me sentir mais fraco que ele e admiti que estava destruído por dentro. Não era comum que fosse eu quem precisasse ser aparado, eu sempre fui o protetor, o mais forte, pelo menos era isso que eu sempre busquei aparentar, mesmo quando não era bem assim, mas não conseguiria fazer nada disso sem ele, no fundo era ele quem me sustentava. E essa mesma situação está ocorrendo agora, eu precisava dele, me sentir inteiro novamente.

Por que diabos eu estou falando com Fury?

“Eu não vou te matar” eu afirmei calmamente, avançando para a luz para que ele visse que estava falando sério. Eu sinto medo, eu sinto raiva, vontade de machucá-lo da mesma forma que ele me machucou, mas eu paro para entender o que eu estou sentindo e todo esse ódio remete à falta de um amigo, de ajuda. Uma única imagem se repete incessantemente na minha cabeça, eu atacando Steve quando éramos crianças e ele não atirar em mim. Essa definição de herói me fez entender meu próximo passo “Na verdade, agora eu vou ser a última coisa que você alguma vez pensou que eu seria...” eu desamarro um dos braços de Fury, isso me daria tempo, uma vantagem sobre ele, segui em direção à porta enquanto ele me olhava com uma mistura de medo e surpresa “...eu vou ser um herói”.

Subo pelas escadas de concreto e puxo meu capuz para cima para me proteger do vento, o Sol ainda está alto no horizonte, isso é bom. Desejo ardentemente que Fury não me siga, eu só preciso de uma chance e eu vou concertar tudo, só uma chance. Eu só preciso me despir desse fantasma que está grudado à sombra de cada um dos meus passos, desse frio soldado que marca de negro meus passos no chão. Meu coração acelera em meu peito e pela primeira vez em muito tempo sinto que ele está de alguma forma vivo, os demônios que deixavam a minha vista obscura não me rodeiam mais, minha mente está mais limpa e aproveito isso para pensar no que eu vou dizer para ele. A ansiedade cresce quando me dou conta de que não tenho ideia. Eu não tenho como me preparar para o pior, nem como provar para ele que eu não sou o inimigo.

‘Na verdade agora você é seu próprio inimigo’ me pego pensando, puxo o ar calmamente para os meus pulmões, tentando não entrar em pânico.

Puxo o papel que Natasha me deu do meu bolso e me dirijo ao centro da cidade.


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