Meu Idiota escrita por marishaya


Capítulo 10
Meu Pov Secreto.


Notas iniciais do capítulo

Seis leitoras acertaram!
Tipo de 102 leitores apenas seis acertaram, meus deuses.
A maioria achava que seria um POV do Henrique ou do Êvan, várias leitoras não amostraram as caras nos reviews e decidiram mandar mensagem por MP! Adorei ♥
Enfim, mandarei o preview do capítulo 12 e a capa dele para essas seis leitoras, e a surpresa seria criar um personagem para MI, vou manter contato com essas leitoras para faze-lo e tomara que coloquem suas mentes de leitoras ou autoras muita criatividade, a ideia foi de uma amiga minha e eu adorei!
Espero que curtem o POV de Vector Dafoe



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Quem te ver passar assim por mim não sabe o que é sofrer♪

As vezes eu saía pra caminhar no parque e ficava observando.

Observava a senhora sentada no banco de madeira dando comida aos passarinhos, bem coisa de filme mesmo.

Observava o cara gordo sentado do lado da senhora que pensava que conseguia disfarçar a direção do olhar tapando a cara com um jornal velho da semana passada mas todo mundo sabia que ele, na verdade, estava olhando as pernas da loira gostosa que ia todos os dias aquela mesma hora correr naquele parque com um rabo de cavalo no topo da cabeça, um shorts mais curto que o comprimento da palma da mão e sempre com fones de ouvido e música no volume máximo. Ela, ironicamente, tinha cara de quem curtia Maroon 5, RHCP, e se brincar até Beatles. Tinha o meu vizinho metódico e pontual fixado que acordava todos os dias às exatas 7:14 da manhã pra passear com aquele cachorro gordo esquisito que ele chama de Brutus, acho que é um buldogue, tanto faz.

Nunca parei pra prestar atenção nas classificações das coisas, pra falar a verdade, muitas especificações me irritam.

Voltando ao meu vizinho do cabelo penteado e mais encharcado de gel que o próprio pote: é, 7:14, não 7:15, 7:14 mesmo. Ele nunca tem nada marcado em horas com minutos ímpares, sem pegadinha, passei quase um mês tentando flagrar um atraso ou avanço de um minuto que fosse ao toque do despertador desse cara.

PÉÉN, falha. Não aconteceu.

Aquela maldita musiquinha de elevador toca todos os dias às exatas 7:14 e eu não consigo acordar um minuto mais tarde há 4 meses -desde que saí de casa para tentar morar sozinho- a mulher dele me traz biscoitos todas as quartas-feiras às pontuais 18:15 da tarde como pagamento pra eu ficar de olho em quem entra e sai do apartamento de cima, onde eles moram.

Só pra esclarecer, ela tem fobia à compromissos em horas com minutos pares, é, eu sei. Talvez seja só coincidência, ou talvez os clichês sejam válidos e os opostos se atraiam e se completem mesmo, sei lá.

Como disse, não gosto de especificações, ditados, leis de newton, leis de sobrevivência ou qualquer coisa estabelecida, nada que não mude.

Aí então a mulher gorda pontual do meu vizinho de cabelo duro brilhoso esquisito e pontual resolveu mudar as coisas um pouco.

Eu passei a gostar dela depois disso.

E passei a gostar de Los Hermanos e de jogar Guitar Hero com a filha dela e passei a gostar da filha dela mas isso veio depois.

Quarta-Feira, 9 de Outubro, 18:20 exatamente.

Quatro batidas na porta.

Primeiro fato escandalosamente anormal: 18:20, seis horas e vinte minutos da tarde, v-i-n-t-e minutos.

Segundo fato escandalosamente anormal: Quatro batidas na porta.

Achei mesmo estranho e, involuntariamente, fiquei esperando pela quinta, nada, quatro, batidas; nem meia a mais, nem 0,7 a mais.

Quatro. 1, 2, 3, 4, beleza, já deu pra entender, né? Quatro batidas.

Levantei do sofá vermelho onde tinha passado a manhã afundado. Vista pra escada de acesso ao apê de cima. Sacaram a estratégia, né? Eu realmente gostava dos biscoitos.

Mas eu nunca entendi qual a finalidade de se colocar uma janela com vista pra dentro do prédio.

Beleza, sem discussões, abri a porta e BÁ!

Eu juro que quase caí pra trás. Ruiva, branquinha, pequenininha, olhos verdes e dedos finos, unhas com um esmalte descascado num tom que me parecia renda ou qualquer coisa assim, esmalte cor de unha.

–Oi.

–Oi…

–Quer alguma coisa?

–Na verdade, minha mãe me pediu pra te trazer uns biscoitos e perguntar se alguma…como é que ela diz mesmo? Se alguma promís…

–Se alguma promíscua subiu as escadas hoje?

–É, isso aí mesmo!

–Pode dizer que não…mas diz que uma ruivinha desceu aqui e quase me fez cuspir refrigerante quando eu abri a porta.

Que merda eu tava falando? Sério.

–Como?

–Nada, não. Pode dizer que não subiu ninguém.

–Não… eu ouvi o que tu disse.

Droga.

–Hm…Tá a fim de entrar?

–O quê?

–Tomar alguma coisa, sei lá. Ver um filme.

–Não, valeu, quem sabe outro dia, tenho que levar o Brutus pra passear agora – e riu depois.

Eu juro que nunca ouvi um risinho tão agudo que não fosse irritante.

–As 18:31 da tarde?

–É, uai…Por quê?

–Dezoito e trinta e um da tarde?

–Sim, senhor. Algum problema?

–Não, nada…Só achei que ele gostava mais de passear de manhã.

–Ele não gosta de nada, eu é que gosto de andar à tarde.

–Ah, entendi...

–Até!

–Só uma pergunta…

–Fala.

–Você vai me trazer os biscoitos a partir de agora?

–Se você quiser -sorriu mais uma vez, daquele mesmo jeito que garotinhas fazem quando recebem uma boneca nova. Era pra mim aquele sorriso.

–Sem problemas.

Abri um sorriso amarelo meio torto e me senti o maior idiota do mundo quando, pela primeira vez, me preocupei com essa coisa de espinafre entre os dentes.

Eu não comia espinafre há o quê? 7 anos? Desde que eu comecei a escolher o que comer mas foi instinto, sei lá.

Uma semana depois, Quarta-Feira, 17:50 da tarde.

Eu não conseguia parar de checar o relógio, resolvi pegar um livro, folheei umas páginas, li umas duas ou três frases e me lembrei que nem tinha prestado atenção no nome do livro, Não Conte a Ninguém de um cara chamado Harlan Coben. Resolvi ler a sinopse, li no máximo umas seis linhas antes da primeira batida na porta.

Quatro batidas.

Levantei da poltrona num pulo, larguei o livro que caiu no chão e sei lá mais o que eu derrubei. Tropecei nos meus próprios pés umas quantas vezes até chegar à porta. Apoiei-me na maçaneta e não consegui puxar a porta sem fazer um barulho estrondoso que entregasse meu nervosismo, tô nem aí.

–Oi de novo.

–De novo - ela não parava de sorrir, pensei que talvez tivesse gostado de mim, tomara.

–Er…cheguei em hora errada?

–Não, não…chegou na hora de entrar - ela riu de novo.

Que diabos tu quer comigo, mulher? Vai parar com isso não? Já ta virando sacanagem.

–Vou parecer muito oferecida se aceitar o convite?

–Não mais do que eu quero que seja.

Dessa vez eu ri também, foi uma sensação esquisita ela ter gostado da piada.

–Onde é que eu coloco isso aqui?

–Deixa no braço da poltrona mesmo, a gente vai acabar comendo durante a conversa.

–Ah, é? E vamos conversar sobre o quê?

–Sei lá.

Eu juro que fiquei olhando pra ela por uns cinco minutos até que resolvi me pronunciar, o silêncio estava me matando.

–Aceita, sei lá, um refrigerante?

–Não tomo refrigerante…

–Chá? Café? Água?

–Café, pode ser.

–Então tu vai ter que fazer porque eu não sei.

–Tem pó?

–Tem, sim.

E se eu te disser que sabia fazer café? Sempre soube, só pensei que ela acharia engraçado, funcionou.

–Posso pegar gelo?

–Oi?

–Gelo, posso?

–Claro que pode, mas gelo pra quê?

–Café, uai. Não gosta?

–Não que eu saiba

–Já provou?

–Sei lá, devo ter provado. Não me parece nada legal.

–Prova aqui -ela jogou as pedras de gelo na xícara e estendeu-a pra mim de forma que quase passei a respirar café.

–Não, fica tranquila, pode tomar seu café aí.

Ela riu de novo, puta merda.

–Prova logo, estranho - ela estendeu a xícara de novo e eu quase que me senti obrigado pela minha própria vontade a engolir aquilo.

O gosto era horrível, gostei.

–E aí?

–Até que é bom, estranha.

–Hm, sei, essa cara aí de quem gostou. Imagina se não tivesse gostado -ela se apoiou de costas na pia e eu me apoiei do lado.

–E aí, o que tava lendo?

–Eu?

–Obviamente...

–Nada, por quê?

–Vi um livro no chão da sala, deu vontade de pegar, mas preferi ficar imóvel e te deixar constrangido.

–Hm…Harlan Coben.

–E o livro fala sobre o que?

–Não faço idéia, li umas frases que juntas formariam meia página, no máximo.

Ela me encarou por uns segundos e resolveu voltar pra sala, segurou minha mão e me arrastou até o sofá, a ficha de ela ter me pegado pela mão demorou a cair, então se sentou na minha poltrona e cruzou as pernas numa daquelas posições de borboleta de ginástica.

–E aí...

–E aí o quê?

–O que tava fazendo antes de eu chegar?

–Ouvindo música, tomando refrigerante, o de sempre e você, tava fazendo o que antes de vir pra cá?

–Nada, na verdade, cochilando, ei tive uma ideia -e deu um sorriso enorme, mostrando todos os seus dentes enfileirados e só da frente um tiquinho separados, isso tornava ela ainda mais linda.

–Diz!

–Me diz as coisas que tu gosta, que eu te digo do que gosto.

–Não dá, tenho vergonha de falar…

–Então escreve.

–O quê?

–Escrever, não sabe? É fácil, a gente normalmente aprende isso no pré -não me segurei, tive que ri e me senti envergonhado ao mesmo tempo, ela não parava de olhar.

Senti-me desconfortável e, simultaneamente, realizado. Sei lá, e se ela tivesse gostado de mim? E se a ruivinha dos dedos finos e pés pequenininhos estivesse gostando de mim? Que puta sorte.

Eu ainda não tinha entendido qual o entusiasmo, mas não dava pra tirar o sorriso da cara.

Era normal, não? Alguém gostar da gente? Costumava ser normal no colegial, sempre tinha alguém a fim, sei que o jeito como ela me olhava me deixava sem reação e o cheiro dela, então? Ela cheirava a lilás e dia chuvoso, suspirar perto dela dava uma vontade enorme de beijar.

–Então, vamos? Me alcança um pedaço de papel e uma caneta.

–Ok. Vou pegar, espera.

A única coisa parecida que eu achei foi um bloquinho de notas do Batman. O que ela pensaria de um marmanjo de faculdade que usava um calção desbotado até os joelhos e chinelos, tinha a barba mal-feita e…gostava de desenho animado?

Ela achou engraçado e riu que nunca vi. Ela ficava mais sexy naquela blusinha branca com renda no decote e jeans rasgado que a Angelina Jolie de lingerie.

E quando começamos a brincadeira eu nunca caprichei tanto na caligrafia, escrevi cada letra com a maior vontade do mundo de aquilo ficar legal mas nunca parei pra pensar nas coisas que gostava. Eu gostava um pouco de tudo, ficou difícil escolher; coloquei só os mais comuns.

Ela me pareceu meio indecisa, rabiscava e riscava o tempo todo.

–Terminou?

–Terminei.

–Beleza, faz assim: entrega-me o teu que eu te entrego o meu tá?

–Tá, no três!

–1…2..— ela interrompeu a contagem e puxou o papel da minha mão e jogou o dela em cima de mim — tava demorando muito.

Rimos, antes de ler o que ela havia escrito, fiquei observando a reação dela ao ler minha lista.

“-Rock e indie rock

–Angelina Jolie

–Biscoitos

–Números pares

–Ruivas + Batman

Ela sorriu em silêncio, senti-me aliviado e não consegui conter um sorriso também, li a lista dela.

“-Desenhos animados

–Rock e indie rock

–Chinelos

–Guitar Hero

–Estranhos

–Batman

–Anna Julia”

–Ei!- Sei que era uma proposta meio idiota, mas ela ia gostar.

–Diz, estranho.

–Tenho uma coisa pra você, já volto!

–O que é?

–Surpresa.

Ela me olhou feliz.

F-E-L-I-Z, com todas as letras.

Um amigo meu uma vez tentou me ensinar a jogar Guitar Hero: odiei, me estressei, não tinha coordenação motora suficiente pra isso e meus dedos nunca pressionavam a tecla certa e eu nunca acertava no tempo, desisti.

Eu tinha lá em casa um “quartinho da bagunça”, guardava toda e qualquer tranqueira lá dentro, esse amigo meu acabou deixando o Guitar Hero dele lá em casa e eu, já completamente cansado daquela coisa, joguei lá dentro do quartinho e esqueci que aquilo existia, muita sorte, acabei encontrando a coisa dentro de uma caixa e tava tudo lá certinho. Nada faltando.

–Ei? -Ela já tava ficando impaciente mas tava animada com a “surpresa”.

–Achei! To indo!

Quando cheguei na sala, ela tava balançando a perna daquele jeito que todo mundo faz quando esta ansioso, coloquei a caixa no colo dela e pedi que abrisse.

Ela gargalhou, foi lindo.

–Não acredito, sério mesmo?

–Sério, que tal? -ri, ela era tão ingênua rindo que parecia uma criança ganhando a primeira bicicleta.

–Tá querendo me conquistar, é?

–Algo me diz que eu já consegui...

–Besta, nem chegou perto.

Preciso confessar uma coisa, nunca amei tanto a sensação de ingenuidade, eu era tão ingênuo perto dela que cheguei a achar que fosse uma pessoa apaixonável.

Conectei os cabos à tevê e depois de dez minutos tentando encontrar o menu, decidi que a melhor coisa a fazer era esquecer a cultura do cavalheirismo e pedir que ela arrumasse aquela coisa.

–É assim mesmo? Tem certeza?

–É, sim, deixa eu arrumar, sei o que estou fazendo.

Sei que ela sabia, depois de algum tempo percebi que ela sempre sabia, sabia que me torturava quando sorria pra mim, sabia que o jeito como caminhava, se vestia e até como se mexia despertavam em mim aquela coisa ridícula de amor platônico, aquilo de achar que tudo que o outro faz é uma pista ou um sinal, é o melhor de tudo? Era.

Depois eu descobri que até a caligrafia dos bilhetinhos que ela grudava na geladeira era de propósito, ela conseguia colocar um pouco da sensualidade ingênua dela em cada coisa.

–Pronto, senta aí - me sentei no sofá maior e sentou do meu lado de forma que as nossas pernas e os braços ficaram grudados, preferi pensar que foi de propósito.

–Antes de começar, posso perguntar uma coisa?

–Claro que pode.

–Quem é Anna Julia?

Ela riu e dessa vez ela riu de mim, mas não num tom de deboche, ela não era desse tipo, riu de como quem tava adorando tudo aquilo, riu do jeito de que tava apaixonada pela forma como eu era ingênuo perto dela.

–É uma música!

–Uma música?

–É, uai, nunca ouviu? Todo mundo já ouviu.

–Ouvi não...

–Claro que ouviu… Nunca acreditei na ilusão, de ter você pra mim…me atormenta a previsão do nosso destino; eu passando o dia a te esperar; você sem me notar…quando tudo tiver fim, você vai estar com um caraaaaaaa, um alguém sem carinhooooooo, será sempre um espinhooooo, dentro do meu coooo-raaaaaaa-çãaaaaaao

Ela deu uma pausa e me encarou nesse meio tempo. Mas dessa vez me olhou mais que dentro dos olhos.

Ô Anna Juliaaaaaaaaaaaaaaaaa–ela levantou num pulo e usou a mão como um microfone pra cantar o refrão.

Acho que nunca ri tanto, doía tudo; pernas, estômago, bochechas.

Eu quase soube o que significava “morrer de rir”.

Ela terminou a performance e eu bati palmas, ainda rindo, ela gargalhava de perder o ar e eu juro que achei a coisa mais linda quando ela roncou no meio da risada.

Andou tropeçando, se sentou no braço do sofá e foi descendo de costas até cair com a cabeça no meu colo, fechou os olhos e apoiou a mão nas costelas, respirando devagar. Pensei, por um segundo, em beijar a testa dela.

Sei lá, me deu uma vontade enorme.

Mas ela acabou abrindo os olhos e levantando antes de eu criar coragem, ela se sentou de novo e segurou meu pulso, procurando por um relógio.

–São 18:25.

Sei que é meio esquisito, mas me senti feliz por ela ter ficado desapontada.

–E daí?

–Tenho que levar o Brutus no parque...

–Ah…Tudo bem.

–Mesmo?

–Mesmo.

Se levantou, calçou os chinelos e foi em direção à porta, apressei-me em levantar e abrir a porta pra ela.

–Senhorita -Fiz reverência e ela correspondeu.

–Cavalheiro. -ela saiu e eu não resisti.

–Ei!

–Oi?

–O Guitar Hero fica pra amanhã?

–Claro!

–E mais uma coisa…

–Pode dizer.

–Não te deixo sair até confessar que está apaixonada por mim.

Aí o amor da minha vida riu e subiu as escadas.

Eu não gostava de café com gelo, Guitar Hero ou Anna Julia, juro. Aí eu comecei a gostar de números pares.

Anos depois.

Sabia que voltando para aquela cidade tudo iria vir a tona, o motivo por ter fugido de tudo e de todos e ter ficado todo aquele tempo com Girtudes.

Quanto a isso, até não foi chato morar com a vovó.

Ela podia ser o tipo de pessoa que odeia um contato pessoal, mas ela até que se preocupava.

Quando não comia mostrava aquela famosa frase de que muitos não percebem que é de preocupação mas é, aquela de “Você não anda comendo? Esta trabalhando para que? Para viver de abstinência?” nos primeiros meses ali eu quase pirei quão tantas perguntas que aquela velha fazia e por sempre estar observando o que todos fazem e criticando.

Quando cheguei lá com minha primeira tatuagem ela nem ligou, sério!

Achei tão cômico que fiquei semanas usando regata só para ver ela reclamando, mas nada.

E comecei a gostar dela assim, e ela de me dar conselhos que não parecia conselhos e sim críticas, mas era engraçado isso, a forma distorcida de conviver com as pessoas.

Ela iria ter adorado minha vó, sempre gostou de distorcer, de sair dos padrões e ser diferente.

Não foi só isso que eu me especializei em todos esses anos, em entender a minha vó, me especializei em mulheres.

Não, não sou nenhum canalha que procura uma foda a cada noite só para satisfazer a fonte da muscularidade –claro que as vezes tem uns deslizes e enfim- acha que todas as mulheres são iguais etc, eu me especializei de tanto observar.

No Alasca era algo muito solitário, ou você sabia pescar e ser útil como um contador ou era um excluído que estudava algo diferente que o lugar precisava.

Enfim, eu comecei a observar tudo e a todos, como antigamente eu era.

E eu observei principalmente mulheres, vi algumas terem um jantar furado, vi muitas chorando sozinhas, vi outras se oferecendo tão facilmente.

E com toda essa minha especialidade nelas, eu criei classes para todas elas.

A classe A é das mulheres ingênuas que acredita que todo homem que conhece é perfeito, aquela mulher que desde o começo é programada para casar e ser mulher de casa, cuidar dos filhos e ficar o dia inteiro no fogão ou lavando roupa, aquela que sempre tem paixonites e sempre esta a procura do amor, e é isso que influência a classe B composta de mulheres rancorosas que já teve alguma desilusão amorosa e que acredita que nenhum homem presta e não vai se apaixonar nunca mais.

A classe C é as mulheres sedentas por atenção, aquela que usa um vestido melhor que o teu e exagera na maquiagem só para encontrar um homem que a leve para cama no final da noite e se sentir realizada por existir alguém que a deseje.

E tem a classe D, mulheres foda-se tudo que não se importa com nada e só pensa em seu próprio nariz, sempre mandona mas que no funda espera uma alma gêmea, na verdade todas as mulheres esperem uma alma gêmea, e assim como na Classe F também esperam, as lésbicas e feministas.

Toda minha especialidade foi dada a minha observação, mas o que eu mais adoro ver é as que não têm classe ou melhor as que procuram ser o que quer e não o que precisa ou foi ensinada a ser, garotas querem um amor verdadeiro como a classe A quer mas não é ingênua e deseja ser algo mais além que mulher de casa, mulheres da classe B que eu vejo saindo de casa e procurando alguém novamente ou assistindo um filme de matança –pode assistir filme de matança a vontade desde que não tente cortar os testículos de um homem por te fazer sofrer, er isso eu não quero nem imaginar- e as que já foram vadias por um tempo e decidiram ser boazinhas e procurar um homem fixo, ou melhor um pau fixo.

E eu adorava essa experiência, acho que morar tanto tempo com minha vó me deu mais visão ampla, era quase a mesma visão que eu tinha quando minha garota estava viva, e eu agradeço muitos os meus pais pelo espaço que deram, fui esquecido? Fui, mas acho que ser invisível e pensar melhor nas coisas ao seu redor foi promissor.

E voltar para aquela cidade iria me trazer problemas e lembranças, persentia isso.

O primeiro problema foi se sentar em frente e na mesma mesa de uma família que eu não via há muito tempo e que era muito constrangedor, ainda mais do jeito que minha mãe me olhava como “quem é esse menino e o que fez com Vetinho?” , voltar com o braço fechado de tatuagens e com uma boa forma, era bem diferente do garoto inseguro e magrelo que mandaram pra lá.

Eu me sentia deslocado; ver meu pai, antigamente era ele que mais puxava assuntos nas mesas das jantas de família, em silencio e meio alheio... nem me cumprimentou direito, havia Verônica com os cabelos de um vermelho forte que até doía nos olhos com uma expressão desconfiada, última vez que a vi ela tinha seus 7 anos com cabelos loiros castanhados, sem peitos toda reta e bem elas apenas continuava com o mesmo tamanho e o olhar desafiador, mas aquele cabelo...Pergunto-me qual devia ter sido a reação de Amelia quando o viu, a mulher parecia estressada com tudo, antes ela era mais calma.

Eu tinha uma mania de me apegar ao passado e não me acostumar com o presente.

Sinto-me em um universo alternativo, isso que é o problema da saída e do retorno, quando você sai esta de um jeito e quando volta esta de outro e não sabe reagir, é como se cada palavra que tu iria falar teria que revisar cinco vezes pra não falar algo de errado.

Ainda mais com uma Dafoe olhando daquele jeito pra mim.

–É a universidade, Vector? –perguntou Amelia de repente, todos me encararam, menos vovó Girtudes que estava ocupada com a comida.

–Hã, eu tranquei–dei um sorrisinho tentando disfarçar a careta, o melhor foi à cara que ela fez, do tipo horrorizada, engoliu o seco, catou um guardanapo limpando a boca e prendeu o cabelo.

–Me de o molho, Verônica!

–Esta do seu lado, mãe.

–Ah...

Prendi a risada e me concentrei na comida, seria bem ridículo Amelia falar alguma coisa da minha faculdade já que depois de tanto tempo em aérea sobre mim só o que saiba é isso.

Seria um orgulho ter o filho mais velho prestando Direito, fiz isso no começo para provar para mim mesmo que iria calar minha mãe, mas com o tempo fui cansando, da mesma rotina e de estar fazendo algo pra uma mulher que nem ao menos se deu o trabalho de fazer uma chamada via Skype –já eu tive uma surpresa desagradável como Morgan mostrando os seios para mim...vou pensar melhor quando alguém pedir o meu skype e não der para garotas com cara de classe C- e eu tranquei, não pensando em ninguém mas sim em mim, e acho que foi uma das melhores coisas que eu fiz, depois de claro, sair daquela cidade.

E depois do jantar com todo aquele clima teve o momento família.

Todos se reuniram na sala, estava passando um jogo de futebol americano e meu pai foi assistir, minha mãe ficou olhando para o nada com uma cara desagradável, Morgan no celular e Girtudes foi dormir, e eu e Verônica sentamos no mesmo sofá, lado a lado, meio errado você ter uma irmã é não saber absolutamente nada dela.

–Er, eu vou dar uma saída.

–Eu também - me levantei junto, faria tudo para não ficar mais naquela casa brincando de filhinho perfeito mas não tão perfeito assim que voltou para fazer a mãe ter um treco, prefiro rever a cidade.

***

–Eu não sabia que Verônica tinha um irmão –disse um garoto com cabelos pretos e expressão duvidosa, pelo jeito que seus dedos se movimentam todo momento era um fumante, é dos piores.

Fazia cerca de meia hora que eu e maninha havíamos saído de casa, e o melhor foi não dizermos nada o caminho inteiro até o bar de karaokê, lembro que já fui uma ou duas vezes com minha garota aqui, e de todas às vezes cantava Anna Julia, e todas elas eu ria como se fosse à primeira vez que eu a via cantando, e quando pisei ali quase ouvi as risadas aos fundos e as ironias que trocávamos.

Aquele lugar mudou, tinha um palco melhor e parecia mais espaçoso, tocava músicas melhores.

Verônica foi de encontro com 2 garotos, um deles eu já conhecia e vi hoje de manhã na casa ao lado ficando surpreso, era Henrique Collis; o vizinho que fazia implicância com Verônica, lembro das várias vezes que ela chegava chorando dizendo que brigou com Henrique, na época Amelia trabalhava então eu que cuidava dos desentendimentos dos dois.

O pirralho havia mudado, era alguns centímetros mais alto que eu e tinha uma postura de macho alfa, me fez lembrar da minha época de colegial.

O outro era o garoto fumante com cara de delinquente.

–Vivi por muito tempo longe de Verônica e a família, prazer Vector - estendi a mão e ele apertou me olhando com os olhos estreitos.

–Me lembro de você –falou Henrique fazendo uma careta- a última vez que te vi você brigou comigo.

–Não era legal na sua idade ficar vendo garotinhas da janela do quarto e ainda mais depois de sair do banho

Os dois coraram tanto que quase ficaram da mesma cor que o cabelo de Verônica, o amigo dela gargalhou de quase cuspir a bebida da boca, dei uma risadinha.

–Eu vou pegar uma bebida –resmungou revirando os olhos e deixando Verônica sozinha com sua vermelhidão.

–Seu babaca –e me deu soco- não podia falar isso, nossa que vergonha!

–Fica calma maninha, ainda não falei da vez que... –ela tampou minha boca e bufou.

–Adorei esse cara, –disse o amigo dela- vamos sentar aqui e fofocar um pouco da vida de Verônica Dafoe.

Êvan Dolse era o tipo de cara que todas as mães querem que as filhas se afastem e diria “fique longe desse moleque, só trará problemas”, ele fez mais coisas ilegais que eu com meus 25 anos, apesar disso ele era divertido meio exótico, um humor ácido, acho que desloquei a boca de tanto que ri.

–Ta bom, já entendi que vocês viraram grandes amigos essa noite e agora vamos embora, Vector –Verônica me puxou pra saída meio estressada.

–Não dê muita liberdade para Êvan, daqui a pouco você vai estar em um tráfico e nem sabe

–Esta com ciúmes do amiguinho? –resmunguei, ela me encarou irritada e cruzou os braços.

–Até parece que vou ter ciúmes de um garoto fudido como Êvan, por favor –bufou mas eu vi que ela estava nervosa, ela gostava demais daquele moleque que era seu único amigo.

–Vamos para casa!

Na volta consegui tirar algumas coisas de Verônica; má notas, ódio por uma tal de Carie, tem intriguinha com Morgan, e seu inimigo estava na cara que era Henrique Collis, ela falou mal dele praticamente o caminho inteiro dizendo algo como “eu ainda acho que ele vai pegar Aids ou herpes genital sabe, essas doenças sexualmente transmissíveis , ele nem se importa se a garota namora ou não, se tiver um rabo de saia ele está lá, e parece que adora esfregar na minha cara que pode ter todas elas só de olhá-las” , percebi que Verônica faz parte da classe D.

Chegamos a casa, estava tudo escuro e havia apenas uma luminária de girafa que rodava na sala, corremos até o quarto e quando entramos Verônica bateu com força a porta.

–Droga.

–Tomara que nunca vá para uma balada, por que do jeito que é vai derrubar a casa quando voltar...

Ela resmungou alguma coisa e se jogou na cama amontoada de coisas, o meu lado só tinha duas malas grandes que logo joguei no chão e deitei encarando o teto, na parte dela tinha pôsteres da banda punk que eu deixava tocando no pen drive, sorri.

Talvez tivesse bom ter voltado, não só por mim e por ela, e sim por Verônica.

Minha maninha precisava de ajuda com Henrique, ou eu acho que precisa... se não deu certo pra mim vai dar certo pra ela.

–Eu gostei de você ter voltado - ouvi uma voz fininha e sufocada pelo travesseiro.

–Eu sei, –suspirei e ri- quero minha camiseta do Yankees de volta.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado do POV de Vector c: a garota que ele comenta e do começo da narrativa será em uns dos capítulos revelada.

✖ A música Anna Julia é do Los Hermanos, o link esta aqui: https://www.youtube.com/watch?v=umMIcZODm2k
✖ Leitores, eu sei que a maioria esperava um POV do Henrique ashuahsaush quem não quer um POV desse lindo? Mas infelizmente uma narrativa dele vai esperar um pouco mais :c
O próximo vai ser postado dia 04/02 ou 13/02, torcem para ser dia quatro auhsuashua espero vocês nos reviews!

ESTE CAPÍTULO SERÁ REVISADO AMANHÃ, 29/01.

(PS: postei um capítulo antes desse mas foi excluído pois o horário estava errado, por isso repostei)