Sutil escrita por Jibrille_chan


Capítulo 7
Capítulo 7




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/4809/chapter/7

 

Eu estava muito intrigado. Mas não conseguia me lembrar de nada. Havia passado boas horas na companhia dos rapazes, enquanto narrava minhas aventuras em Londres (sem relacionar Mei ao assalto, claro). Mas depois que eles haviam ido embora, meu pensamento voltou a se focar em Aoi.


Já estava pensando demais nele.


De onde ele me conhecia? Eu tinha sim alguns problemas com nomes, mas isso era por pura preguiça. Sempre fora um bom fisionomista, então mesmo que eu não me recordasse do nome, eu me lembraria do rosto. E o rosto de Aoi não era exatamente do tipo que se esquecia. Os traços marcantes, os lábios carnudos, adornados belamente com o piercing. Hm.


Ficar divagando sobre a anatomia perfeita dele também não ajudaria.


Enfim. Eu tinha que descobrir de onde ele me conhecia. Porque... eu tinha uma vaga lembrança relacionada ao apelido "Kou-chan" em algum canto da minha memória, mas nada além disso. Hmmm. Deveria pesquisar a vida do moreno? Não, isso seria muita invasão de privacidade. E, além disso eu lhe devia o fato de ter percebido que devia dar mais valor aos meus amigos.


Fossem eles gays ou não. Hm.


Droga, odeio ficar curioso a respeito de algo e não saber o que é! E eu sabia que, mesmo que eu perguntasse diretamente a Aoi, ele não me diria. Essa era a parte mais irritante. Talvez se eu o colocasse contra a parede. Se eu o jogasse contra a parede. Se eu o imprensasse contra a parede. Okkay, isso não está dando certo.


Me virei mais uma vez na cama, na vã tentativa de pegar no sono. Faziam muitos anos que eu não tinha problemas pra dormir. Acho que tive, quando era criança, mas em algum momento da minha vida, isso sumiu. Hm. Droga de memória fraca.


X X X X X X X X X X

- Eu esperava de tudo de você, Uru... Mas realmente não achei que você fosse me trazer num parque de diversões.


- Eu sou um homem de palavra, Aoi. Eu disse que ia pagar o favor, e já que ajudar Mei não quita minhas dívidas com você...


- Definitivamente.


- Se bem que, se formos analisar, você foi cúmplice dela. Logo, se eu quisesse, poderia deixar você em maus lençóis.


Caminhávamos pelo parque, aproveitando o sol de domingo. Não sei que surto eu tive de convidar Aoi - justamente ele - para ir num parque de diversões. Parecia um programa típico de casais. Mas, como eu não me lembrava de vir em um, e devia um favor ao moreno, achei justo virmos. Ele sorriu brevemente, algo estranho passando em seus olhos.


- Mas você não o fez.


- Não, não fiz.


- Por quê, Uru?


Eu lhe lancei um olhar, sorrindo. Anotei mentalmente que este hábito já estava ficando comum. E principalmente quando Aoi estava por perto. Hm. Acho que aquele tranqüilizante da Mei não fez muito bem pra minha cabeça.


- Foi uma dor de cabeça infernal achar um intérprete descente, Aoi. Imagina se eu perder você? Acho que eu não ia conseguir voltar pro Japão.


Ele riu, negando com a cabeça.


- Mas a Mei não tinha nada a ver com isso.


- Ah, detalhes. Agora podemos dizer que a Maiden me deve um favor.


Sorri abertamente, a perspectiva de poder sacanear aquele demônio ruivo me alegrando. Logo depois eu ouvi a risada de Aoi.


- Você não existe, Uru. Ah, vamos no trem fantasma? Ou você não gosta de escuro ainda?


- Não, eu...


Parei no meio da frase. "Ainda"? Como assim, "ainda"? Parei até mesmo de caminhar, encarando o moreno, o cenho franzido. Ele ia me dar explicações. Ele percebeu as minhas feições, e sorriu, um sentimento que eu não soube identificar passando rápido por seus olhos.


- O que foi, Uru?


- Como você sabe... que eu não gostava de escuro?


- Hm. Digamos que eu seja mágico. Você não sabia?


- Sem brincadeiras, Shiroyama.


- Ah, desencana, Koyou! Eu só arrisquei e acertei. Tudo bem que era uma chance em cem, mas acertei. A maioria das pessoas não gostava de escuro na infância, isso é comum. Vamos ou não?


Suspirei, derrotado. Os argumentos eram válidos, mas eu ainda estava um pouco intrigado.


- Tudo bem, nós vamos. Mas primeiro eu quero comer alguma coisa. To morrendo de fome...


Ele sorriu, bagunçando meus cabelos e seguindo até a área reservada para barracas de comida. Ele parou de frente a uma carrocinha de cachorro-quente, e quando eu cheguei lá, ele já havia pedido. Não demorou muito até que os lanches ficassem prontos.


- Aqui o seu, Uru... com bastante molho e sem batata palha, ne?


Franzi o cenho, assentindo. Aquilo estava me irritando muito. Aoi sorriu e disse apenas uma palavra.


- Ruki.


- Ah.


Isso sim era uma explicação plausível. Como eu já disso, quando Ruki abria a boca, ninguém mais conseguia fazê-lo se calar, com exceção de Reita. Mas, até onde eu sabia, não era do feitio de Ruki ficar espalhando as minhas preferências por aí. Aoi se encaminhou para uma mesa desocupada e eu o acompanhei.


- Aoi? Quando é o tal casamento da Mei?


Ele franziu o cenho, uma expressão de desagrado.


- Daqui a duas semanas. A família toda foi convidada.


- Hm. Então você vai?


Ele sorriu, amargo.


- Eu sou o noivo, Uru.


Engasguei imediatamente com o lanche. Como assim, ele era o noivo? Eu tinha ouvido errado. Não era possível. E o pior de tudo... era perceber que a imagem de Aoi com outra pessoa... me magoava. Respirei, tentando recuperar a fala.


- Como assim, você é o noivo?


- Ela deve ter te dito que o casamento é arranjado. Ela é filha única, e como sempre nos demos bem, acharam que seríamos um lindo casal. Mas ela vai fugir, então nem estou preocupado.


Comecei a rir, negando com a cabeça.


- Sem dúvidas... esse é o casamento mais incomum. A noiva foge com o consentimento do noivo...


Continuei a rir por alguns segundos, até notar o olhar de Aoi sobre mim.


- O que foi?


- Você fica... melhor sorrindo, Koyou. Já te disseram isso?


Parei de rir na hora, ficando completamente escarlate. Não esperava um elogio assim vindo dele. Vindo dele. Foi a vez dele rir, e eu acabei emburrando. Senti suas mãos nos meus cabelos, bagunçando-os mais uma vez.


- Não precisa ficar bravo, foi um elogio...


- Não estou bravo com isso, estou bravo porque você riu do meu embaraço.


- Desculpe... mas você ficou muito meigo todo vermelho... digo, roxo. Quer um algodão doce? Eu vou lá pegar um pra mim.


Sem esperar pela minha resposta, ele se levantou da mesa, indo buscar o algodão doce. Eu fiquei na mesa, pensativo. Forcei um pouco a memória. Aquele elogio me era familiar...


- Você fica melhor sorrindo, Kou-chan...


Mas quem havia me dito isso mesmo? A parte mais importante eu não conseguia me lembrar, droga! Talvez se eu me esforçasse mais um pouco, eu me lembrasse. Ou não.


- Quer algodão doce?


Assustei com a súbita chegada de Aoi, quase pulando da cadeira.


- Quer me matar, Shiroyama? Acho que a família Shiroyama tem algo contra mim. Pelo menos os primos. Uma me dá um tiro, o outro me mata de susto...


E, de repente, tinha um chumaço de algodão doce azul na minha boca. Lancei um olhar assassino à Aoi, resignando-me a comer o doce, enquanto ele sorria triunfante. Depois de desbloquear a minha boca, acabei por sorrir bobamente.


- O azul é meu favorito.


- É? Seu favorito é o azul? Aoi?


- Não foi isso que eu quis dizer, Shiroyama. Você nem de longe é doce.


- É porque você não experimentou.


Lancei um olhar descrente ao moreno, ignorando descaradamente o duplo sentido escancarado da frase. Ele começou a rir, o brilho predatório no olhar.


- Não achei que você um dia fosse admitir que eu era seu favorito, Kou-chan.


Suspirei, exasperado, procurando algo para mudar de assunto. Até ver onde ele havia me levado.


- Casa dos Espelhos? Não íamos no trem fantasma?


- Mudei de idéia. Vamos? Por favor, por favor, por favor?


Ele parecia uma criança. E o algodão doce fazia o quadro se tornar mais realista.


- Ta bom. Eu não tenho preferências mesmo.


Fomos entrando, rindo das formas estranhas que os espelhos formavam. Paramos no meio da casa; digo, parei no meio da casa, onde havia um espelho sem distorção, conferindo se eu continuava limpo. Aoi sorriu ao meu lado, e segurou meu queixo com os dedos de uma mão, obrigando-me a olhá-lo.


- Tem algodão doce aqui...


Ele esfregou o polegar com suavidade do lado esquerdo do meu queixo, e eu senti corar violentamente. O toque de seus dedos era muito macio. Me lembrava o toque... de alguém. Mas não sabia quem. E aquela aproximação... não estava me fazendo muito bem.


- Pronto, saiu.


Ele sorriu mais abertamente e se afastou. E eu voltei a respirar. Nem tinha sequer reparado que minha respiração havia ficado presa na minha garganta. Droga, agora estava meio sem jeito de andar ao lado dele. Já fazia algum tempo que eu andara reparando no corpo dele, no seu jeito de andar...


Mas nada a ver em absoluto.


Assim que saímos da Casa dos Espelhos, uma chuva torrencial começou a desabar, e eu e Aoi ficamos abrigados na saída da Casa. No instante seguinte, Aoi estava dando um passo à frente, em direção à chuva. Segurei seu braço antes que ele pudesse entrar no dilúvio.


- Onde você pensa que vai?


Ele se virou, sorrindo abertamente, mais largo do que jamais havia visto. E definitivamente, era um sorriso bonito.


- Uru, quanto tempo faz que você não toma um banho de chuva?


- Hein?


- Isso mesmo... quanto tempo faz?


- Não sei, acho que desde a minha infância... O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO, SHIROYAMA?


Antes que eu percebesse, ele agarrou a minha cintura, me suspendendo alguns centímetros do chão, e me levando direto pra chuva. Vamos esquecer o detalhe de eu estar usando uma camisa branca.


- Shiroyama, me solta! Porra, ta frio! Me solta, Yuu!


Ele parou, a chuva gelada batendo de encontro a minha pele. Ele me olhava com um brilho estranho nos olhos.


- Você... me chamou pelo nome.


- Até onde eu saiba, esse é seu nome, não é?


- É sim, Kou-chan. Pronto, pode descer. Já se molhou mesmo...


Ele me soltou com cuidado. Eu o encarava com um olhar mortífero. Ele fingia que nem notava, o sorriso bobo espalhado na cara. Aoi ergueu os braços, rodopiando. Depois de um tempo, parou, de frente pra mim.


- Não é bom?


Eu ri, negando com a cabeça, não acreditando que o homem à minha frente era dois anos mais velho que eu. Depois fechei os olhos, apreciando as gotas de chuva batendo no meu rosto, jogando minha cabeça pra trás. Sim, faziam muitos anos, mas muitos anos desde que eu ficara assim, apreciando a chuva. Sentindo a chuva.


Senti um sorriso bobo se formando nos meus lábios, e abri os olhos, notando uma movimentação à minha frente. Encarei o moreno, que agora se encontrava a poucos centímetros de mim. Mordi os lábios, me debatendo internamente. Se por um lado eu queria socá-lo por estar tão perto, por outro eu queria que ele se aproximasse mais. Mesmo porquê eu já estava começando a ficar com frio.


- Se eu fizer uma coisa, você promete que não vai correr de novo?


- Ta, mas como assim, "de---


Minhas palavras foram interrompidas por seus lábios colando-se aos meus. No primeiro instante, arregalei os olhos, principalmente por estarmos num local público. Mas quando sua língua tocou meus lábios, pedindo passagem, deixei qualquer racionalidade pra trás.


Senti seus braços envolvendo a minha cintura, acabando com qualquer espaço entre nossos corpos, e minhas mãos foram parar sabe-se-lá-como no ombro e na nuca do moreno, num mudo pedido que aquele beijo se aprofundasse. E ele se aprofundou, as línguas quentes contrastando com a água gelada da chuva que desabava à nossa volta, o metal igualmente frio do piercing roçando na minha pele.


E naquele momento, somente naquele momento, eu senti que o mundo se resumia apenas à Yuu. Não haviam problemas, pai dominador, empresa chata... Nada. Apenas Yuu. Apenas Yuu e o sentimento estranho que começava a brotar em mim, que não tinha nada a ver com desejo. Digo, não apenas com desejo, porque queria ou não, Aoi era sim algo a se desejar. Mas não era isso. Era um sentimento... que eu parecia ter a muito esquecido.


Continua...

Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Sutil" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.