Em Família escrita por Aline Herondale


Capítulo 4
Primeiros Infortúnios


Notas iniciais do capítulo

Estou bastante empolgada com essa fic e com isso tive muita inspiração e já consegui terminar mais um capítulo.
Espero que gostem.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/477406/chapter/4

Inicialmente acreditei estar sonhando, já que, desde que ouvira a melodia assobiada pelo meu tio, havia gastado boa parte da minha noite tentando relembrar aonde já a escutara. Falhei vergonhosamente.

Mas em determinado momento, meu consciente teve a certeza de que aquilo não era fruto da minha imaginação, que eu estava realmente ouvindo alguém assobiar, novamente, aquela melodia. Ouvindo ele assobiá-la, novamente. E pelo som, presumi que estava próximo à minha janela.

Levantei-me e andei até donde a música vinha. Corri os olhos e o encontrei ao lado de uma pilha de pedras quadradas, próprias para criar “caminhos” sobre a grama, cavando um pequeno buraco com uma pá velha. Qualquer que fosse o motivo, era de extrema urgência e não poderia esperar, ou meu tio não estaria fazendo um trabalho considerado pesado demais para uma manhã em que o sol acabara de nascer. Tentei imaginar tal motivo, sem sucesso mais uma vez.

Me irritei.

De repetente ele parou e levantou a cabeça olhando diretamente para mim – como se soubesse que eu estava lá. Seus olhos seguiram em minha direção de forma tão convicta que cheguei a pensar em ter me enganado quando acreditei que não havia feito barulho nenhum e que não teria como ele saber que eu estava ali. Ele fincou a pá na terra e um largo sorriso, sem dentes, de satisfação surgiu no seu rosto.

Não me importei estar de camisola – era branca e longa – , mesmo que a janela fosse de corpo inteiro, continuei parada de braços cruzados. Não expus expressão alguma.

– Esse jardim é muito bonito. – Disse num tom em que eu, no segundo andar, consegui escutar. Continuei cética encarando-o. Então ele se agachou e pegou um pouco de terra na mão, apertando-a. – O solo...é tão macio. Bom pra cavar. – Disse por fim, antes de colocar uma das pedras pentagonais sobre o buraco.

– Já acordou, Evie, querida? – A voz da Senhora Deville atrás de mim fez com que eu virasse o corpo em alerta. – Oh, me desculpe querida. Não quis assustá-la. – Ela pediu, parada com uma mão na maçaneta enquanto a outra carregava uma pilha de vestidos em tons pasteis.

– Tudo bem. – Respondi e entrei para o banheiro.

Quando sai a Senhora Deville pendurava peças de roupas em cabides e os guardava no armário. Havia um vestido preto que batia no meio das minhas coxas, com mangas ¾ e gola de padre branca, estendido sobre minha cama. Sorri discretamente e o vesti.

Aquela senhora de cabelos já totalmente brancos, dona de uma voz macia e paciência infinita era a única pessoa pela qual eu não tinha nenhum outro sentimento se não de afeto. Era a mãe que nunca tive.

– Sente-se aqui, Evie. – Ele pediu puxando a cadeira da minha escrivaninha. – Hoje vou lhe fazer uma bela trança.

Obedeci e a senti, agilmente, ela manusear mechas do meu cabelo enquanto um penteado se formava. Desde que eu me lembrava ter cabelos a Senhora Deville era a responsável por eu exibir, todos os dias, um penteado diferente. Indo desde aos mais elaborados até os mais singelos. Ela sempre fazia questão de analisar minha negritude – que é meu cabelo – e pensar no que seria melhor para aquele dia, e para a roupa delicada que usava.

– Pronto. Espero que goste. – Ela respondeu e apertou levemente meus ombros antes de sair do meu quarto. Eu sabia que gostaria mesmo sem olhar em espelho. Não precisava disso, é claro, mas fui até o banheiro e levantei um canto dos lábios quando confirmei o óbvio para mim.

Ela fizera uma trança embutida que terminava na minha cintura, amarada na ponta por uma liga imperceptível. Alguns fios mais curtos começaram a se soltar em volta do meu rosto, dando cor ao meu rosto pálido. Calcei meu companheiro Oxford preto com branco e desci para o primeiro andar.

Para o meu espanto minha mãe se dispôs a deixar seus aposentos para aproveitar da presença de Charlie e gastar a tarde contando-lhe leviandades; já que havia passou a manhã inteira trancada no quarto.

Tomei café da manhã sozinha.

As minhas aulas retornariam somente após o feriado e com meu dia vago pus me a andar pelo jardim, escalando árvores, pulando de buracos, e catando flores. Ajudei um passarinho que havia caído do ninho e tentei pegar um esquilo.

Não vi mais meu tio e continue adentrando mais ainda na floresta; se não estava vendo-o por ali então estenderia quilo ao máximo que eu conseguisse. Por algum motivo o sorriso que ele me lançava fazia com que meu sentisse uma criancinha, inferior. E eu odiava me sentir assim.

Em algum momento indeterminado da tarde, lembrei-me que perto da casa onde a Senhora Deville morava haviam nascido morangos. Enormes morangos carnudos perfeitos para meu almoço e peguei a trilha que levava até a sua casa. Estava passando pelos fundos, segurando um ramo de lavanda, quando uma voz me fez enraizar os pés no chão:

– Eu não estou entendendo aonde você quer chegar. – Eu não me esqueceria daquele timbre tão fácil.

Andei até aonde a voz saía – por uma das janelas abertas – e quando vi meu tio conversando bem próximo à Senhora Deville, me escondi na árvore perto o suficiente para escutá-los e grossa o suficiente para me esconder. Espiei por entre os galhos.

– Eu não quero problemas. – Afirmou a Senhora Deville, usando o tom de voz que fez com que eu me lembrasse de quando era repreendida por ter feito algo de errado. – Sou a única que sabe disso. Fiz tudo que me pediu! Mantinha você informado a cada ano. Fui seus olhos, seus ouvidos, suas mãos...todo esse tempo. – Ela gesticulava graciosamente no ar, mantendo o tom de voz firme. – Age como se ainda fosse um bebê e faz isso comigo desde quando era uma criança! Estou cansada disso!Estou cansada disso! – Senhora Deville fechou os punhos e balançou-os no ar, em frente ao espaço entre eles.Ela franzia o cenho com força, de tamanha revolta.

– Eu sei disso. Por isso não quero que sofra mais... – Charlie estava meio de lado, meio de costas para mim, mas pela deformação frontal do rosto imaginei que tinha mais um de seus sorrisos no rosto. Então ele apoiou as mãos nos ombros da minha babá e de repente algo como uma faixa grossa estava sobre o colo da Senhora Deville. Não entendi de início mas então tudo se encaixou quando vi o rosto da minha babá ser tomado pelo pavor e medo e Charlie apertar aquilo – que descobrir ser um cinto masculino – sobre seu pescoço enrugado. Ele estava enforcando-a.

Esquecendo minha fome, que eu estava escondida, ou até mesmo que deveria ajudar uma das pessoas que mais adorava, me virei e saí correndo dali. Eu não ia, não queria assistir minha querida babá morrer. E o que eu poderia fazer, afinal? Só ter o mesmo destino que o dela.

Nunca soube lidar, com situações e emoções nenhuma. Sempre fazia o errado ou a pior forma. Sabia que, mais tarde, me arrependeria por não ter se quer gritado ao ver meu tio asfixiar minha babá até a morte. Mas eu era assim. Estranha.

Corri de volta para a mansão e notei que estava quase cuspindo meus pulmões quando parei na porta da cozinha e me sentei no degrau da porta. Retomei o fôlego e acalmei meus pensamentos, voltando a perguntar, mais uma vez:

O que aquele cara quer de nós, afinal?!


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Fiz uma coleção de imagens que, penso eu, ajudará vocês a imaginar essa fic. Espero que gostem.
http://www.pinterest.com/alinekamel/em-fam%C3%ADlia/
NÃO DEIXEM DE COMENTAR,

XOXO



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Em Família" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.