Laços escrita por CowardMontblanc


Capítulo 1
Alicerce


Notas iniciais do capítulo

A primeira parte de duas aqui ♥Esse capítulo é mais centrado no Berthold, porque ele é meu marido lindo e eu o amo ♥ ♥ ♥ *Apanha* Mentira, é porque a ideia original era pra falar só dele, por isso foi o que saiu primeiro.Acho que não preciso repetir, mas tem spoilers do mangá aqui embaixo. Spoilers e tentativas de jogos de palavras.Boa leitura! ♥



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Alicerce

O guerreiro que Berthold costumava ver nos olhos de Reiner era o mais forte de todos. Agora, no entanto, não era sempre isso que ele via quando o encarava.

Ele não sabia dizer ao certo quando foi que o loiro começou a oscilar, quando sua pose de guerreiro passou a fraquejar aos poucos e transformar-se num soldado. A mudança começou de forma tão discreta e gradual que demorou um pouco para que o garoto mais alto a percebesse - o que era um grande feito considerando o fato de que os dois meninos se conheciam praticamente desde que nasceram.

Berthold se lembrava muito bem da infância que tivera com o amigo, dos momentos doces que ambos compartilhavam, rindo e brincando enquanto aproveitavam ainda seus anos de inocência. Desde aquela época, Reiner era um guerreiro. Era ele quem sempre tinha as ideias para as brincadeiras mais desafiadoras, que o incentivava a caminhar e correr com ele até longe de suas casas, que não tinha medo de ficar todo sujo de lama ou de se machucar enquanto tentava fazer carinho nos animais que encontravam.

Quando começaram a treinar seus poderes, o loiro foi quem mais se empolgou e também aquele que se adaptou mais rápido. Ficava animado quando se transformava, achando incrível sua forma tão grande e forte e também pulava de alegria quando via Berthold fazendo o mesmo, se impressionando com toda a altura que ele assumia, e não tinha medo de ficar ali perto, pois sabia que o amigo jamais o esmagaria. Além disso, também era um garoto muito gentil com o moreno. Sempre estava ali para amparar suas lágrimas, para brigar com os meninos que zombavam de sua timidez, até mesmo para ficar de castigo junto com ele por causa de suas travessuras.

Desde criança Reiner era um guerreiro não apenas forte como também benevolente. Parecia que ele nascera para ser assim, que ele agia desse modo com a mesma naturalidade que respirava.

Isso mudou após eles penetrarem as Muralhas. A presença de Annie não foi o que o fez ficar assim, o moreno sabia - a garota era quieta e taciturna, mas não era má e se dava bem com os dois meninos desde antes deles saírem em sua missão. Talvez tenha sido porque foi ali em que os três viram pela primeira vez em seus poucos anos de vida o que era a dor e o desespero.

Eles conheceram o desconforto que era não ter uma cama macia e quentinha para dormir, a sensação de vazio no estômago e a vontade de mastigar algo, nem que fosse um pedaço de pão velho e mofado que poderia fazer mal depois, as doenças que se proliferavam por consequência da falta de higiene que era viver num aglomerado de sobreviventes, o terror nos olhos dos que estavam ali.

Era impossível viver daquele jeito sem ficar abalado. Cada um dos três lidava com aquilo do melhor jeito que conseguiam. Annie permanecia quieta em seu canto, cuidando de si mesma e ignorando o sofrimento daqueles que não fossem seus companheiros. Berthold também se isolava, roubava livros para se perder em seus mundos de fantasia, dormia bastante para esquecer a fome e os lamentos daqueles que o cercavam. Reiner, porém, era diferente. Ele se voluntariava. Ele ajudava. Carregava e distribuia comida e água, cuidava dos doentes, tentava divertir as crianças. Para ele, saber que estava ajudando a melhorar a situação que criara por sua culpa tirava o peso do arrependimento de seu peito, ao menos temporariamente.

Porque Berthold sabia que seu amigo tinha pesadelos durante a noite, dormia inquieto e algumas vezes até chorava dormindo. O moreno muitas vezes o escutava gemendo e soluçando baixinho ao seu lado, e eram nessas noites que ele oferecia o seu abraço não apenas para protegê-lo do frio noturno como também para acalmá-lo. Ao contrário de Reiner, ele raramente tinha pesadelos. Na verdade, dificilmente sonhava com algo, já que costumava apagar completamente e só acordar horas depois, geralmente no dia seguinte mesmo, no que devia ser um método inconsciente para conseguir suportar todo aquele inferno.

Eventualmente, os pesadelos do guerreiro foram se esvaindo, tornando-se ocasiões raras. No lugar deles, o garoto contava de sonhos maravilhosos em que era um incrível soldado, leal e muito respeitado, que voava gracioso com seu equipamento e matava os titãs inimigos com uma facilidade incrível, salvando a todos. Berthold escutava os relatos de seus sonhos fantásticos, vendo o quanto ele ficava entusiasmado e o quanto seus olhos dourados brilhavam apenas de pensar em se tornar militar.

Em parte, aquilo era bom, já que a missão dos três necessitava disso. Eles precisavam do treinamento, e ver Reiner animado com isso era ótimo, mas ele estava daquele modo pelos motivos errados. Ele não deveria ser um soldado. Ele era um guerreiro, mesmo sendo tão jovem, mesmo tendo ainda um corpo de menino, mesmo que não gostasse de ver o sofrimento que suas ações tão necessárias - ao menos segundo seus pais e todos os moradores de sua terra natal, da qual todos sentiam muitas saudades - causava às pessoas que moravam presas naquelas muralhas.

Os anos de treinamento militar não ajudaram muito a manter a sanidade de Reiner - pelo contrário, apenas pioravam a situação. Seus lapsos se tornavam perigosamente mais frequentes, e Berthold via o garoto oscilando entre o soldado e o guerreiro diariamente. Em um momento, Reiner era o guerreiro perfeito, focado em sua missão, consciente do que fazia, mas no outro ele se transformava no soldado leal ao seu dever, que treinava arduamente para poder exterminar os titãs e que adorava ajudar todo mundo, desde Eren até Sasha.

Berthold podia sentir quando ele virava o soldado. Seu olhar mudava em apenas poucas piscadas, sua voz se tornava mais branda, a sua pose era perfeita. A princípio ele tentava pensar que era tudo fingimento, tudo parte do ator que o loiro precisava ser para concluir a missão e garantir a eles dois e Annie o retorno para casa, para seus lares, para o conforto das lareiras e dos braços de seus pais que os soltaram no mundo tão jovens, mas ainda assim com sorrisos nos rostos e juras de amor eterno e incondicional.

O soldado era bom, gentil, generoso, simpático. Além disso, era apaixonado por Christa, a jovem baixinha de cabelos loiros e olhos tão azuis quanto o céu em dias claros, tanto que delirava falando sobre como um dia iriam se casar, como viveriam em paz e felizes, como se amariam todas as noites e iriam dormir um nos braços do outro, nos filhos que teriam e em como permaneceriam juntos até a idade os separar. De nada adiantava Berthold dizer-lhe que ela era claramente interessada em Ymir e não parecia dar atenção especial a nenhum tipo de garoto. Reiner não se importava, não dava ouvidos, deixava de lado. Um dia ela o notaria, se apaixonaria por ele, aceitaria seu pedido de casamento.

Era frustrante para o moreno ver aquilo tudo. Ele sentia-se inquieto toda vez que olhava para aqueles olhos amarelos que o lembravam dos campos de trigo e não enxergava o guerreiro, mas sim o soldado. O maldito e perfeito soldado, tão perfeito que doía, que parecia se alimentar das memórias de Reiner como se fosse um parasita e ele nada mais que seu hospedeiro, que costumava o encarar com dúvida durante as refeições para então perguntar "o que há de errado, Berthold?" como se nada estivesse acontecendo.

"Nada, eu estou bem" era a resposta padrão. No entanto, a mentira era tão óbvia que o deixava enjoado. Ele podia estar bem, mas Reiner estava se desviando demais da missão, das promessas de que eles ficariam juntos para sempre como melhores amigos, que sairiam daquela situação assim que pudessem e retornariam vitoriosos para casa onde poderiam comer até se empanturrarem, dormir até tarde todos os dias, tomar banho de rio sempre que desse vontade, voltar a viver sem preocupações.

Aquele Reiner não se lembrava de como eram as casas de madeira de sua vila, de como ele adorava dormir na casa do melhor amigo porque eles podiam ficar trancados no quarto inventando histórias durante a madrugada, das canções que eles adoravam cantar. Não havia para ele espaço para esses momentos, para as promessas de vida boa de Berthold, para seus conselhos. Na mente do soldado, cabia apenas a obrigação de acabar com a raça dos titãs que arruinaram a humanidade, de cortar seus pescoços, de libertar as pobres almas que sofriam nas muralhas.

A cada vez que Berthold escutava frases como "vamos matar todos", "a humanidade vencerá" ou "iremos mostrar pra eles nosso poder", ele tinha vontade de dar tapas no rosto do loiro até que ele voltasse ao normal. Porém, não podia fazer aquilo, e tal fato o deixava furioso e chateado. Ele não queria usar a violência com Reiner, até mesmo porque sabia que ele era um dos recrutas mais fortes fisicamente, e também porque jamais se perdoaria se o fizesse. O moreno sabia muito bem que deveria mantê-lo com os pés no chão, centrado no que tinha sido instruído a fazer, mas era difícil. Berthold era tímido, se enrolava com as palavras, nunca parecia formar as frases certas para se comunicar com o soldado, pois só sabia conversar com o guerreiro.

Por causa de tudo isso, o jovem muitas vezes se enrolava em suas cobertas durante a noite, quando estava muito escuro para se ver alguma coisa, e chorava em silêncio. Chorava lágrimas amargas, de raiva e acima de tudo, arrependimento. Ver Reiner, que sempre estivera tão próximo de si como se fosse seu irmão - e que ele realmente amava como um irmão, da forma mais pura e fraternal possível - se afastando, se perdendo era insuportável. E saber que ele não conseguia parar com aquilo era pior ainda.

Berthold não podia perder Reiner. Já tinha passado tanto tempo sem seus pais, não queria ficar sozinho, se recusava a deixar que as outras pessoas tomassem seu amigo para elas mesmas. Ele já ajudara Berthold tantas vezes, o defendera dos outros durante o passar dos anos dentro e fora das Muralhas, velava seu sono e checava sua temperatura quando ele ficava com febre, doente, procurava com ele locais onde podiam se abrigar da chuva e do frio, oferecia um ombro amigo e carinhoso quando ele sentia a necessidade de chorar.

E nem mesmo para retribuir todos aqueles favores o moreno estava servindo, pois a cada dia o soldado se fortalecia, e o guerreiro perdia aos poucos suas forças, sua vontade, seu tamanho. O guerreiro que um dia Berthold achara ser invencível e perfeito.

Tudo que ele queria fazer era bagunçar aqueles cabelos loiros e macios como as penas dos canários que viviam cantarolando perto de suas casas e receber um sorriso, uma risada vívida e gostosa, daquelas que faziam seu peito se encher de alegria e que o davam certeza de que estava com o guerreiro que tanto amava e que conhecia tão bem, e não com o soldado que apenas tiraria sua mão da cabeça e soltaria um riso seco, sem muita graça. Queria encarar fundo naqueles olhos amarelos tão bonitos e ver o brilho vitorioso e determinado do guerreiro, e não a ira irracional do soldado. Queria segurar sua mão e não estranhar o toque de seus dedos, abraçá-lo e sentir-se seguro e querido, coisa que não sentia quando estava com o soldado.

Os anos passaram. Os dois meninos cresceram, viraram homens junto com seus colegas de treinamento. Ganharam voz, altura, músculos, resistência. Reiner, então, tinha mesmo um corpo de homem, grande e forte, capaz de deixar muitos com inveja, e que ao mesmo tempo era tão perfeito para o guerreiro que se escondia em sua alma, e que a cada momento queria ceder o controle completamente para o soldado.

Eles conseguiram entrar para o top dez. Berthold sentiu-se esperançoso com isso. Poderiam agora entrar mais ainda nas Muralhas, concluir sua missão e finalmente voltar depois de todos aqueles anos, e então poderiam voltar a viver normalmente, como se nada tivesse acontecido.

Mas as coisas não foram como o esperado. Nada foi como o esperado.

"Eu vou para as Tropas de Exploração." Aquelas palavras abalaram Berthold profundamente. Ele tentaria ser racional, usar argumentos para convencer o outro a desistir daquela ideia, mas nesse momento Reiner estava sendo um soldado, e o moreno não sabia como falar com o soldado. Por isso, sua resposta foi um simples "eu também".

Depois disso, tudo passou rápido demais. Muitas coisas aconteceram em tão pouco tempo, que era impossível não ficar atordoado com tudo aquilo. Annie tentou prosseguir sozinha, mas não conseguiu, houve a invasão da Muralha Rose, Ymir se revelou como sendo mais do que se via, e quando o moreno se deu conta, estava na floresta fora das Muralhas, de pé em um dos galhos das árvores altas junto com Reiner, que ainda mostrava sinais de sua transformação recente em seu rosto, ao redor dos olhos - marcas estas que Berthold apreciava ver, pois só o guerreiro as tinha -, deixando Eren e Ymir descansando em outro ali próximo.

Naquele momento, Berthold percebeu que estava olhando nos olhos dourados de Reiner. Sem entender se estava encarando o soldado ou o guerreiro, ele piscou, se concentrou, prendeu a respiração.

Não funcionou. Por mais que olhasse, por mais que se esforçasse, se concentrasse e mirasse fundo naqueles olhos tão claros, ele já não sabia mais se via no fundo daqueles olhos um soldado, um guerreiro ou simplesmente um menino confuso e perdido.

E nada no mundo conseguia ser mais assustador do que isso.


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Notas finais do capítulo

Calma, Berthie, vemk que eu te abraço e te consolo, vem ;-; Escrever essas coisas machuca demais o meu coração D:O título aqui pode ter duas interpretações. Tanto pode ser sobre como o Berthold é o alicerce que segura o Reiner na realidade (ou pelo menos tenta) como o Reiner sendo o alicerce de Berthold em sua vida.Choremos.Como não sabemos como é a vila deles, tentei especular um pouco -q Espero que o Tio Isa depois mostre como ela é e principalmente, que eu esteja certa SAOHSAOSOHSAHS Eu pessoalmente vejo como sendo um lugar bem rural, perto das montanhas, cheio de natureza... Espero que seja canon isso -qTambém espero ter conseguido passar aqui os sentimentos do Bert e tudo o que ele pensa sobre o Reiner estar se dividindo em dois... Eu adoro esse tema, mas é uma pena que as fics BRs não falem muito sobre isso. Enfim -qNos vemos no próximo e já último capítulo, que vai falar de tudo no ponto de vista do Reiner! Até lá! ♥



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