Álcool, Shirley e rock n' roll escrita por AnaMM


Capítulo 5
Exaustos


Notas iniciais do capítulo

Enfim um novo! Agradeço desde já o apoio via twitter à fic. Espero que gostem do capítulo.



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–Até que enfim! – O pai de Shirley exclamou ao vê-la chegar.

– Agora não, pai. – A loira respondeu irritada. – Estou sem paciência pra esse tipo de cena.

– Shirley, olha o respeito com o seu pai!

– Eu não tenho respeito por quem não se respeita, mãe, muito menos por quem não me respeita.

Cansada, a miss se retirou. Boquiaberta, a mãe suspirou. Não sabia mais como lidar com a briga entre a filha e seu marido.

Shirley observou as paredes de seu quarto. Não aguentava mais a vida em Goiás. Cada vez que chegava em casa encontrava seu pai cambaleante. A cada rua, enfrentava os diálogos sobre Helena e suas confusões, sobre como era sedutora e sem limites. Sobre como Laerte a amava. Seu sonho era fugir com Laerte para bem longe da pequena cidade, fora do alcance de Helena e do resto de sua família. Principalmente de Felipe. Parou por um momento tentando entender de onde Felipe havia surgido em seus pensamentos. Sabia que precisava fugir do garoto o quanto antes, antes que... Antes que o que? Não conseguia entender. Concluiu apenas que o nerd a intimidava, sem entender o porquê. Talvez fosse o álcool, talvez lhe lembrasse do pai. Não podia ser pelos beijos, muito menos pela vontade de estar nos braços de uma figura esquálida e ridícula como aquela.

–x-

– Outro beijo?! Vai virar romance, hein? – Clara zombou.

– Credo! Vira essa boca pra lá! – O irmão protestou.

– Que reação é essa, Felipe? Do que vocês estão falando? – Helena chegou ao quarto interessada.

– Nada, não, maninha. Só o nosso irmão querido fazendo sucesso com a mulherada! – A menina riu.

– Opa! Felipinho fazendo sucesso? Eu, hein? Quem é ela? Ou melhor, quem são?

– Nem queira saber... – Clara desconversou. Daria um pouco de privacidade ao irmão.

– Felipe, eu posso falar com você um minuto? – Helena perguntou distraída.

– Saindo! – A caçula anunciou, retirando-se em seguida.

Nervoso, Felipe levantou por um momento e hesitou voltar a sentar. Temia que Helena tivesse visto o beijo em Shirley, que o tivesse visto retribuir.

–Leninha, sobre o beijo... – O irmão começou a se explicar.

– Então, é sobre isso que eu quero falar com você.

O nerd sentiu o coração parar de bater por um segundo, nervoso com o que a irmã perguntaria a seguir. O que responderia? Que fora beijado à força? Shirley era miss e tudo, seria muito provável se entregar ao beijo de uma mulher como ela. Ainda assim, era irmão de Helena, cujo namorado Shirley havia acabado de beijar. Era errado de todas as formas, fosse qual fosse a desculpa. Olhou a sua volta em busca de uma garrafa que pudesse haver guardado. A mais próxima estava escondida demais para que a pegasse antes de Helena continuar a conversa. Passou a mão trêmula pelo rosto.

–O que você viu?

Felipe estranhou a pergunta.

–Você já tava lá quando eu e a Clara chegamos. O que você viu? O Laerte teve alguma iniciativa? Quer dizer, eu sei que ele me ama, que a Shirley não é páreo pra mim, mas é só pra ter certeza, sabe?

– Não aconteceu nada. – Felipe respondeu rapidamente tentando fugir do assunto. – Ela agarrou o Laerte porque te viu chegar, e ele não teve nada a ver com o beijo.

Nervoso, Felipe deu voltas pelo quarto.

–Era só isso? Você pode me deixar- não, eu que vou sair. Com licença. – O garoto anunciou atrapalhado, ainda nervoso.

Helena estranhou o comportamento do irmão, apesar de pouco entendê-lo normalmente. Não ficou no quarto por muito tempo, sendo logo chamada por Virgílio, seu melhor amigo. Desabafou sobre Shirley, sobre o comportamento de Felipe, sobre a discussão com Laerte após o beijo. Andaram pelas ruas da pequena cidade se aconselhando e comentando seus dias.

Pela rua oposta, o irmão de Helena divagava com uma garrafa em mãos. Havia sido ignorado ao sair de casa tão tarde, porém, a uma quadra ou mais de distância, ouvira uma briga e o bater de uma porta. Um ritual clássico: seus pais brigavam com Helena por querer sair à noite minutos depois de ignorarem a saída do filho. Estava cansado de ser invisível para os pais, de alcançar boas notas, correr para mostrar-lhes o boletim e ter seu desempenho ofuscado por alguma travessura de Helena. Não aguentava mais ser notado pelos pais apenas quando bebia, e, para ser notado, bebia ainda mais. Era um ciclo vicioso que andava terminando em beijos com Shirley. Precisava parar, precisava fugir da miss. Sentia-se intimidado pela loira, ainda que a conhecesse mais do que ela gostaria. Era o único que sabia, por vagar tanto àquela hora, que a miss estaria em algum canto desconhecido da pequena cidade procurando descanso e anonimato para chorar em paz. Era o único que sabia por quê chorava, e que estava se entregando ao mesmo vício que o pai de Shirley. Sabia por encontrá-lo no mesmo bar onde ia, em algum canto oposto ao escolhido pela loira, ainda que a filha de Viriato costumasse vê-lo entregue ao álcool no bar a caminho de casa.

Vagou pelas ruas em círculos. Não queria que Shirley o visse junto ao pai. Não entendia o porquê da preocupação, apenas se importava. Tampouco queria encontrá-la. A garota havia sido a ele como uma assombração nos dias que se passaram desde o desfile da miss e precisava, pelo menos por um momento, não pensar na loira. Lembrou-se de repente que apenas o bar mais afastado lhe venderia o que beber. Sua garrafa poderia ou não durar tempo suficiente para que não cruzasse com Shirley ao tentar refil. Confiaria na sorte.

Ao chegar ao bar afastado, Felipe titubeou. Um conhecido de seu pai gritava efusivo, agrupado com amigos em torno de uma das mesas, sobre algum resultado de rodeio. Há alguns anos Felipe não conseguia acompanhar sequer um animal sem um porre. Contornou o bar até as escadas de fundos. Ali se sentou, à espera da partida dos conhecidos de Ramiro.

–Você de novo? – Shirley suspirou derrotada.

Felipe levou um susto ao vê-la sentada às escadas.

–Você não acha que já bebeu demais, não?

–Desde quando você se importa?

– Eu não me importo. Eu não aguento mais ver bêbados na minha frente, só isso.

– Então vai embora. Já está na sua hora, não? A princesinha miss da cidade deve se retirar de volta ao castelo e deixar os perdedores patéticos se afogarem nas próprias mágoas.

– Felipe...

– Você sabe o meu nome. – Fingiu surpresa.

– Nem sei como lembrei. Você pode sair, por favor? – Pediu exausta.

– Você não aguenta mais.

– Não. – Confessou por um instante. – Eu não aguento mais... – Segurou as lágrimas. – Ter que olhar na sua cara. Você não se cansa de me seguir?

Felipe ignorou as palavras da loira. Tampouco aguentava tantas coisas que entendia a exaustão da garota. Sabia que havia chegado a um limite, que ambos haviam chegado ao limite em relação a seus dramas familiares. Calou-se. A tão frequente intimidação. Levou a garrafa à boca.

–Chega! – Shirley se exaltou.

Segurou a garrafa no ar, tentando tirá-la do irmão de Helena. Não se importava com Felipe, apenas não queria ter que aguentar outro bêbado. Suas mãos se encontraram sobre o vidro, hipnotizando ambos. Olharam-se fixamente.

–Os seus olhos são meio verdes. – Felipe notou rindo.

–Para, Felipe. – Shirley pediu seriamente. – Eu não devia nem estar falando com você, mas eu te levo pra casa, vem.

Tentou conduzi-lo. Felipe não saiu de onde estava. Puxou-o novamente sem sucesso, sendo puxada de volta pelo nerd em uma tentativa de se manter nos degraus. Um sutil erro de cálculo sobre a força levou a loira ao corpo de Felipe como se voasse. Em um puxão, Shirley havia tropeçado e caído em seu colo. Nervoso, tentou segurá-la firmemente para afastá-la.

–Você só tá piorando as coisas! Olha, agora os botões se engancharam, seu idiota! – Shirley gritou em voz baixa.

Estavam novamente próximos demais. Tremendo, Shirley se afastou por um momento. Não podia beijá-lo, não de novo. Não se controlava quando o beijava, não era a mesma. Olhou fixamente para os olhos de Felipe por um momento. Também eram um pouco verdes, percebeu. Seus lábios quase se encostavam quando se afastou de leve pela segunda vez. Estava hipnotizada por Felipe? Não podia ser verdade, era impressão. O único interesse que via no nerd era pela proximidade de Helena, por como poderia ajudá-la. Olhando fixamente nos olhos castanho-esverdeados de um Felipe confuso, Shirley o beijou, enfim. Beijou-o sedutoramente, com o controle da situação. Não se deixaria levar, porém precisava que Felipe se deixasse levar. Enquanto conseguisse controlar seu próprio desejo ao sentir a língua do garoto na sua, estava fazendo o certo. Fugiria com Laerte de Goiás, por mais que o beijo ardente de Felipe lhe provocasse calafrios e sensações que nunca havia sentido antes.


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Notas finais do capítulo

Comentários são mais importante do que parecem e podem ser feitos aqui embaixo /