Mantendo O Equilíbrio - Finale escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 87
Capítulo 86


Notas iniciais do capítulo

MANDA MAIS AMOR QUE TÁ POUCO AMOR - mentira, tá mto amor, mas mais amor sempre é bem-vindo, né? Nesse capítulo temos duas criaturinhas baixando a guarda e sendo lindos!

Enjoy!



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O bom de ter muitos problemas é que quando você não pode resolver um, pode pular para outro. E quando não se tem um monte, não é? Estava me forçando a esquecer das tretas da faculdade, visto que nada por elas eu podia fazer, a não ser ficar fora do radar de Max, o que eu já realizava por inconsciência. Ontem pela manhã Djane me levou para o suposto interrogatório, prometendo eu que Murilo nada sabia. Mencionei que ele achou estranho meu comportamento pela semana e engoliu minha história de dor de cabeça. Vini estava tão focado na faculdade nos últimos dias que só pegou basicamente o mesmo resumo.

Nem com Djane eu tava conversando a respeito. O tempo todo ela quis deixar claro que aquilo estava além do controle dela, que sentia por mentir, e enfim, eu disse que tava tudo bem. Mesmo. Achei que ela tava tão preocupada com isso que melhor pensei e não disse nada sobre Renato. Ele andava mais tranquilo, por que mexer nisso de novo?

A reunião foi na faculdade mais uma vez. Max questionou-me sobre coisas do dia a dia, pessoas que conheço, com quem tenho relação, com quem tive, o que André representava pra mim (uma desgraça na Terra) e mais outros da faculdade, se participei ou tinha costume de participar de atividades... atividades do tipo ilegais ou que envolvam coisas ilícitas. Perguntou também com quem eu vivia, quem era meu irmão (ok, nessa hora eu gelei, por conta daquele episódio de Murilo e André e tenho a impressão que ele sabe, só preferiu não mencionar), quem era meu namorado, minha relação com Djane, Renato, Fabiano e outros. Era uma inconveniência conveniente mais pra checar, do que realmente me acusar de algo. Acontece que eu tava com muito sono, que cada pergunta dele era bem recebida por um belo de um bocejo, palavras monossilábicas e às vezes até incompreensíveis. Acho que por um momento Max acreditou que eu tava fazendo aquilo de sacanagem.

Que culpa tinha eu se fui dormir tarde e me fizeram acordar tão cedo?

Bom, ele também me perguntou sobre o que teve na apresentação de Dani. Enfim, pra, de novo, checar nossos comportamentos.

– Se pudéssemos ficar aqui pra sempre...

Vini comenta entre um carinho e outro, enquanto me fazia esquecer o que tanto me derretia a cabeça esses dias. Estamos na varanda da casa de seu Júlio, assistindo a chuva cair. Era relaxante – e seguro; Murilo nos avisava quando tinha propensões de ocorrer trovoadas. Nesse friozinho gostoso, estreito-me mais no Vini, que se mostra pensativo e sonolento, mas ainda atento a mim, a nós. Estávamos praticamente a sós, pois Murilo não viera para o almoço, nem Iara, Filipe ou Djane. Vô-sogro pareceu triste de ver tão pouca gente na mesa, mas entendia que era a lei da vida, disse ele. Ao retirar-se para seu descanso pós-refeição, ficamos eu e Vini ali, só esperando a chuva amainar mais. A vontade mesmo era não sair dali.

– Ficar pra sempre dá fome.

– Podemos pedir pizza.

Finjo que penso a respeito.

– Hum... Acho que dá pra sobreviver.

Ele me preenche com mais um beijo, me aperta mais contra si, que quase deslizo para seu colo por estarmos tão próximos. Ele estava sentado quase no meio do pequeno sofá e de pernas esticadas sobre a mesinha, enquanto eu estava atravessada, sentada na vaga da ponta e de pernas por cima dele.

Vini contava mais das peripécias de uma maquete sua que resolveu descolar momentos antes de entrar em classe. Eu ria pelo modo que ele narrava e ali parecia tudo tão quieto e perfeito, que eu nem me toquei de quando comecei a divagar, observando seus traços do rosto e admirando-o em algum paralelo, perguntando-me que traços o faziam tão parecidos com Viviane.

Sim, Viviane.

– O quê, tô bonito hoje?

– Oi?

Pisco, voltando a Terra.

– Você me olhando assim...

– Assim como?

Ele me devolve o olhar e pisca charmoso, puxando meus braços para rodear mais uma vez seu pescoço e sorrindo lindamente enquanto o fazia.

– Assim, como me amasse.

– Porque amo, oras. E estou feliz... e estou orgulhosa.

– Por eu ter conseguido consertar a maquete a tempo?!

Rio, boba, pela pergunta também boba.

– Pode-se dizer que sim. Mas estive pensando esses dias... sobre os dois homens da minha vida. O quanto vocês têm demonstrado mudanças e isso...

– Iiiiiisso...?

– Vocês me conquistam mais e me fazem querer ser mais também. O Murilo, por exemplo, tem mudado tanto. Às vezes ele me pega de surpresa. Fico orgulhosa de ver que ele está mais centrado, mais sensato e até menos tapado. Na verdade, tem sido incrível o quanto a gente tem conversado, discutido saudavelmente, sabe?

Tudo que eu um dia sonhei.

Só não podia imaginar que o Murilo pudesse ser tão incrível assim!

– É, também tenho visto dessas mudanças. Gosto de ver que vocês não estão se matando.

– Ah, a gente ainda se mata... acho. E você, bonitinho, também não fica atrás.

Vinícius franze o cenho, com graça.

– A gente tá se matando?!

– Não, seu bobo. Também me deixa toda orgulhosa. O que você fez no outro dia... de aparecer naquele encontro com a Iara e o Sávio. Bom, eu não esperava.

Num segundo Vinicius estava com aquele seu sorriso triunfante e lindo, e no outro, um pouco caído e xôxo. Imagino que ele esteja sem graça por eu ter apontado essa atitude e valorizando, algo que provavelmente ele não esperava. Pelo menos não dessa maneira.

– Ah, sobre isso. Na verdade, Mi, eu tenho algo pra te falar... sobre essa ocasião.

Quando assumo sua brincadeira de ficar beijando o outro enquanto fala, Vini se afasta um pouco, incerto. Pra mim, interpreto mais uma vez que está de brincadeira, esquivando-se de propósito pra me provocar.

– É sério, Mi. Você não vai gostar.

– Mas eu gosto...

Ele me para de repente, segurando-me os braços que forçavam mais uma aproximação e parece mais quieto.

– O quê, que foi?

– Só acho que você deveria ficar orgulhosa de mim por algo que eu tenha feito por mim e isso... sobre o encontro... Eu fui porque o Gui me pediu, não porque me bateu vontaaaaade.

Com calma recolho meus braços dele e me permito ouvir melhor o que ele diz. Concluo que, é, essa era fácil de esperar mesmo. E acho que tava tudo bem assim mesmo. Ele fez muito ainda.

– Ok.

– Ok?

– Faz sentido, eu acho.

– Mas tá chateada?

– Não sei.

– Como não sabe?

– Não tendo certeza. É só que... Não quero que faça algo que não queira só por causa de mim. Imagino que deva ter sido complicado estar lá. Acho que não estou decepcionada, só isso. Aqui não vale tanto o que eu acho ou não, desde que a gente entenda o lado do outro. Ainda tenho orgulho de você.

Suavizando seu semblante, ele relaxa mais. Relaxa por todo, na verdade. Acarinhando um ombro meu, ele baixa o olhar, novamente pensativo. Quando achei que ele não acrescentaria nada, Vini declara:

– A Iara gosta mesmo dele, não é?

– Sim.

Mais do que qualquer um poderia imaginar, era o que eu queria dizer.

– Você vai falar pra ela isso que te disse? Sobre o Gui?

– Quer que diga?

– Na verdade não. Apesar dos apesares, prefiro ela sorridente. Não é algo que se vê com taaaanta regularidade.

É, ela é bem reserv... Espera, estou vendo o que penso estar vendo, sociedade? Estou ouvindo o que penso estar ouvindo? Minha boca se estende num sorriso aberto de pronto.

– Então você presssssssta atenção nela, hein?

– Não diria que não e nem diria que sim. Só... foi diferente. Estar lá, digo. Eu gosto dela, vocês que acham que não. A gente só não é... ligado. Sei lá. Acho que não é essa palavra.

Me vem a lembrança de eles dois dançando uma vez lá na pizzaria, quando a Dani fez surpresa sobre estar na banda. Eles conversaram também. São, de fato, pouco chegados quando nos encontramos aos fins de semana aqui, mas aquele ódio... Realmente, aquele seu ódio por ela eu não mais vi.

Estaria Vinícius baixando tanto a guarda que reconsiderava sua relação com Iara? Quero apenas abraçá-lo e beijá-lo, mas contenho-me a favor de não me animar demais. Vai que ele fica mais sem graça? Vinícius percebe, no entanto, o quanto quero sorrir por isso.

Ele acanhado é uma das coisas mais fofas do mundo!

– Então, de certa forma, você gostou de... estar lá?

É, ele ficou sem graça.

– Digamos que eu... eu não queria ser um estraga-prazer. Achei melhor ficar na minha. Mas quanto a ele... você sabe minha opinião.

– Sabia que o Murilo que deu um soco nele na hora de dar a lição de protetor?

– Soube... e soube que você não ficou chateada. Quer dizer, não ficou brava.

Com a voz mais meiga do mundo, dosada com toda a fofura que eu transbordava, aproveito e declaro:

– Ô modesu, meu irmãzão tá virando gente.

– Talvez todos nós estejamos virando gente. Foi realmente uma pena não ter ido para a apresentação. Eu teria feito companhia a ela também.

Ai, meu coraçãozinho! Meu coraçãozinho não aguenta. Quase num pulo, abraço-o, beijo-o. Retribuições à parte, Vini também parece muito feliz pelo que confessa. Inclusive mais cedo, na empolgação de contar-lhe sobre a piração do show de Dani ainda na mesa, além da homenagem ao nosso amigo aniversariante, contei sobre ter puxado Filipe e termos dançado. Não dava pra entrar em detalhes perante o almoço, mas se antes já estava feliz por ter tido essa oportunidade de dançar (e de descobrir coisitas mais) e muito animada por Vini ter comentado que só faltava eu dançar com seu avô (que de prontidão disse que era só escolher a música) pra completar a família, quase desfaleço de emoção quando ele conclui algo tão maior que isso tudo:

– Desse jeito você me faz parecer que eu era o pior irmão do mundo, amor.

Sabe quando a gente fala sem muita pretensão, mas tendo muita? Desse jeitinho que ele falou. Como se fosse uma coisa corriqueira. Sério, fico sem palavras e até brota água nos olhos. Pra não pensar que eu estava a imaginar coisas, achei melhor verificar.

– Você disse a palavra com I, Vinícius Garra?

I de Iara? Sim, eu disse... Irmão. Acha que eu tô muito atrasado?

Ver de tão perto seu semblante tão feliz como o meu e ter tanta coisa boa acontecendo ao mesmo tempo, eu não tava mais nem aí pra nada, pras implicâncias do Gui, pras estratégias de Max, pras inconsequências de André, que seja. Os olhos que tanto se mostravam embaraçados pelo que agora revelava também sorriam. Melhor, brilhavam. E os meus deviam brilhar junto, eu podia apostar.

Acarinho o rosto de Vini e tento me recompor um pouco. Era de um passo enorme que eu queria sair dançando por aí, espalhar para o mundo, mas o certo, eu via, era para se conter. Embora fosse um passo grande, era um passo acanhado. E isso o Vini por si tem que dar com calma. Agora, tão pré-disposto, eu só posso comemorar.

E colecionar mais essa vitória com ele.

– Acho que tá mais que na hora certa.

~;~

– Você viu?

Murilo tá tão estufado de orgulho e pretensão, que se a gente bater o carro, ele nem vai precisar de air-bag. Ok, brincadeira. E, por favor, NÃO BATA O CARRO. Eu tenho muita coisa pra resolver essa semana e não dá pra encaixar isso na agenda.

Olha o pensamento da pessoa.

Murilo não bateria. Melhor dizendo, Murilinho não bateria nem se fosse pra bater. Ele tem certo apreço por seu carro e tá tão tão tão tão besta essa noite que deve estar se sentindo dirigindo nas nuvens. Imagino que seja relaxante dirigir com pista liberada e, com o tamanho contento com que saímos da casa da irmã de Aline, o bichinho tá bem feliz.

– Vi.

– Ouviu também?

Vai começar a parte que ele começa a se achar. Titubeio um pouco, indecisa sobre deixar ele abrir toda essa sua pretensão ou jogar uma água fria só pra ele maneirar esse tamanho orgulho. Nah, vou ser boazinha dessa vez. Ele merece esse reconhecimento.

– Só por isso não tiro esse seu tamanho sorriso da cara.

Dava pra ver até mesmo no escuro do carro, principalmente quando passávamos por algum poste e feixes de luz batiam dentro. Meu irmão parecia tão em paz, contente e, olha, até besta emocionado.

Acontece que estamos vindo de um jantar na casa da irmã de Aline. A barriga dela de grávida está enorme já, com 6 meses. Murilo fica um bobo pra sentir os chutes (ok, eu também), brincando sobre que profissões dá pra adivinhar através de um chute. Jogador de futebol, dançarina, professor de educação física ou apenas chutadora de bundas... É, não se sabe o sexo do bebê por opção mesmo.

Passamos a noite por lá e simplesmente acho um amor como é dinâmica de Murilo com os outros. Sempre afirmei que ele conquistaria todos com a aquele gênio tapado (ok, amoroso e apaixonado) dele. Acho que passamos muito tempo sendo só nós dois e às vezes nem só nós dois juntos. Claro que temos família, só que tendo horas de chão e estrada entre a gente, é diferente. Como meu avô me disse uma vez, lá na casa de nossos pais não é mais nossa casa. Não somos de casa. Somos visita.

Enquanto eu me fundi na casa dos Garra, assim como na de seu Júlio, Murilo tem se fundido à família de Aline, também dividida por conta da repentina volta da irmã dela. É algo bonito de se ver (Murilo com eles, não a separação da família). Aline inclusive tem pretensões de se mudar dentro em pouco para acompanhar mais dessa gravidez, a irmã já não pode ficar sozinha assim, os próximos meses prometem.

Murilo também tá nessa promessa. Meu irmão tá muito envolvido, coisa que eu já via, mas parece que a ideia ainda não tinha sido constatada na minha cabeça. Foi nessa noite em especial que as coisas ficaram mais claras. Na verdade, foi pelo que a irmã de Aline disse ao Murilo na hora de virmos embora. A Aline insistiu em levarmos bolo pra casa e, enquanto a ajudava com a tigelinha e então levei pro carro, peguei uma conversa dos dois.

Ao que parece, a barrigudinha chamou meu mano de canto, perto do carro e... eis o que deu pra pegar na escuta:

– Eu sei que a Aline retirou o pedido de ter você como padrinho, mas só quero dizer que gostaria que fosse você. Vejo um coração enorme aí dentro. Você gosta mesmo dela. A Aline se preocupa com isso, de vocês se separarem algum dia e ficar uma criança prejudicada, algo que eu não desejo, mesmo. Mas eu nunca poderei esquecer o que você fez por mim e por essa criança, Murilo. Você também já a ama.

Depois dessa chegou o marido dela pra se despedir também – e levar a mulher de volta pra casa, já que a barriga pesadinha a faz caminhar devagar – e os dois disfarçaram. Entrei no carro só de olho no meu mano, que tava todo atrapalhado e emocionado. Aos poucos que ele relaxou e aí sim puxou assunto comigo. Porque ele sabia que TAVA na cara.

Acho que se eu contasse o que o Vini tivesse me dito sobre a Iara essa tarde, ele estaria radiante. Melhor, exultante. Mas achei melhor que meu mano descobrisse por si só, dando esse tempinho pro Vini de se acostumar com a ideia.

– A Aline ainda tem uma porção de dúvidas, né?

– Tem lá e cá... Não é que ela não tente, porque ela entrou de cabeça nessa comigo, é só que... Acho que ela não quer tornar isso uma preocupação, sabe? A Aline passou muito tempo tentando ter algum relacionamento de verdade e só teve decepção atrás de decepção. A gente tem um compromisso... E queremos apenas isso por enquanto.

– E aqueles planos que você disse ter?

– São apenas isso, planos. Pro futuro. Futuro tipo anos à frente. Ainda tem muito chão pra isso. Enquanto isso, a gente vai lidando com as coisas que temos devagar e... Ah, sabe quem apareceu no centro meteorológico essa semana?

– Você sabe que eu posso passar uma vida adivinhando, né?

Pra enfatizar a piadinha, virei para ver o perfil de meu irmão e dá pra assistir ele irmão sorrir de canto, embora não tão feliz. Não tenho a menor ideia de quem possa ser. Quando ele responde, nem eu posso acreditar.

– A Débora.

– Que Déb...? Noooooooooooo.

Não a Débora, cara.

– Siiiiim.

– O que ela tava fazendo por lá?

– Ela é repórter, tava fazendo uma matéria com a chefe da Aline.

– Ela sabe quem foi a Débora?

– Sabe.

– E você?

– Também sei, oras.

– Dã, você entendeu. Quero saber o que você fez.

– Eu nada, ué.

Murilo tranquilo, dando de ombros, como se fosse nada. Me admiro. E também me enche de perguntas. Detalhes, eu quero detalhes! Mas é bem provável que vou ter de arrancar da Aline, porque quando o Murilo acha que é nada demais, o mesmo vale para os detalhes.

– Como assim nada?

– Nada sendo nada. Ela foi um passado, passado distante até. A gente só se cumprimentou de longe. Ela parece bem.

Ela era bem louca, isso sim. Paranoica – e não do tipo interessante. Possessiva. Escandalosa. Vaca. Desprezível. Eles viviam indo e voltando. Era desgastante. Se foi desgastante pra mim só de ver, imagina de ter um relacionamento desses. Com o tempo a gente apagou ela das nossas vidas, paramos de mencionar, até pra fazer referência. Tanto é que eu praticamente a esqueci também. Aquele furacão ainda merecia o completo esquecimento. Em minhas brigas com o Murilo, inclusive, eu poderia feri-lo como nunca, mas era consciente o bastante de não mencionar esse nome, porque era baixo demais até pra mim.

Mas tem algo... que nunca contei pro meu mano.

– Mu, tenho uma confissão a fazer.

– O quê?

– Fui eu quem... quem pus o chiclete no cabelo dela daquela vez. Ela tava falando a verdade.

Ah, qualé, eu tinha visto recentemente uma matéria sobre como tirar chiclete do cabelo com refrigerante Coca-cola, achei inspirador. Não que eu tenha contado essa solução para a tal. A Denise até tava nessa festa. Rimos juntas da bagaça que deu. Resultou numa briga tão sem noção que o Murilo saiu da festa que estávamos, pra se resolverem.

Nem lembro bem que festa era, só que era de família, e sei que eu tinha ouvido ela falar de mim no banheiro com uma amiga dela, dizendo que eu era fingida e criança demais – foi na época que nossos pais ainda moravam com a gente e andávamos um pouco pra baixo por conta da vovó, que só piorava – e eu fiquei com muita raiva, mas não quis complicar nada pro meu irmão. Porque ela falava criança no sentido de eu ter que precisar o tempo todo proteção do meu irmão, proteção que às vezes bagunçava as programações dela. Então mostrei que era uma criança, uma criança que talvez não medisse consequências e só fazia o que lhe desse na telha na hora da raiva.

Cuspi aquele chiclete e fiz de um jeito para não ser vista. Mas ela presumiu que fui eu, porque eu não tava mais mascando quando voltei pra mesa, quando ela tava surtando. Cuspi e cuspiria de novo, se fosse preciso. Depois disso, eles terminaram de vez. Nem pra eu saber o que ela fez com o cabelo após esse incidente...

– Eu sei.

– Saaaaaaabe?

Quase caio, embora estivesse bem sentada e segura na poltrona do carona. O caso é que o Murilo desvia rápido de um motociclista que quase o cortou na hora de entrar no bairro e acho que ele ainda tava tão relaxado que nem ligou.

– Vovô viu. Me contou depois, claro. Mas aí eu já tinha terminado com ela, e pra mim já bastava tudo aquilo. Ela tinha ido longe demais, eu já tinha avisado. Ninguém mexia daquele jeito com você sem levar uma dura minha. Se não fosse quem fosse, eu teria metido um soco sem reservas.

– Fui eu o motivo? Você nunca disse.

– Não diria que foi o motivo por si, mas com certeza a gota d’água. Não sei o que ela pensava pra falar mal de você na minha cara. Eu não aguentava. Se ela não te respeitava, não estaria me respeitando. Se ela não me respeitava, aquilo não era algo pra se levar pra frente.

Chegando na nossa rua, que esperamos um carro que bloqueia de passarmos por estar entrando numa garagem, fica aquele silêncio no nosso carro. Eu não tinha conhecimento de que a tal Débora falava mal de mim na cara do meu irmão ou que eles brigavam por isso. Isso é o que ele está dando a entender agora. Novamente, para ele isso não importava mais e se não importava, tampouco os detalhes valiam a pena. Mas agora, reconsiderando tudo, minha cabeça maquina sobre isso.

Branda, começo:

– Sinto muito, Mu.

– Sente pelo quê?

– Sinto muito que... Na verdade não sinto por ela, sinto por ter interrompido seus relacionamentos. Esse com a Aline incluso.

Está escuro e a gente não tá se olhando. Meu irmão está manobrando o carro para virá-lo e eu tô xôxa pela descoberta. Prejudiquei meu mano mais do que eu imaginava, a ponto de interferir muito em seus relacionamentos.

– Nah, tudo bem. Se as pessoas não compreendem nossa relação de irmãos ou minha relação com a família, então não são pessoas que valem a pena. Existem outros no mundo. Mas, já que você tocou no assunto... Ora, ora, veja só.

Eu toda sem graça e lamentosa e ele vem com essa:

– O quê? Veja o quê?

– Você também era uma protetora cabreira.

Quase posso enterrar minha cara no banco e começo a rir, desacreditada. Nisso meu irmão desce do carro para abrir o portão da garagem e quando ele volta, risonho, ainda estou estirada no banco rindo a danar.

– Acho que eu só era cabreira mesmo.

– Vou fingir que acredito.

– Ela falava mesmo mal de mim?

Enquanto entramos na garagem, com ele observando bem o carro pra não bater, ele meneia a cabeça, mostrando que não gostava mesmo da tal maneira com que Débora falava de mim. E deixa claro que ele não deixava barato também.

– Mais do que pude calar. Mas eu também não ficava quieto.

Sorrio, na minha, de repente agraciada por isso. Saímos do carro e nos encaminhamos para entrar pela porta da cozinha, que ligava à garagem. Ao entrar finalmente em casa, bato ombro com o ombro dele, acanhada.

– Obrigada, viu.

– Pelo quê?

Ele está me obrigando a dizer, esse bonito!

Mas, vá lá, ele merece de novo.

– Por sempre ter tido cuidado comigo. Não agradeço por ter sido aquele excessivo, mas... você entendeu. Quero dizer que você passou por cima de tanta coisa e por mim. Me defendeu mesmo. Então... Obrigada.

Pronto, aquele sorrisão dele estava lá, aumentando, aumentando, o peito inflando e, sei lá, tudo, ali, valia a pena. Ele passou o braço por meu ombro me levando pra sala e suspirou, mais contente, orgulhoso e tranquilo. Todos aqueles transtornos enfim eram passado.

– Sempre, mana, sempre.

Assim que joga as chaves na mesinha ao lado da porta da sala e eu retiro minha bolsa, cansada, mas feliz deste dia, que nos viramos, topamos com uma pilha de louça de ontem na pia. Murilo olha pra mim, eu olho pra criatura – sim, criatura – e por uns segundos a gente só considera, naquele suspense. Era a vez dele e ele sabia, mesmo mostrando de repente estar tão sem coragem. Por isso prefiro enfatizar:

– Sua vez, viu.

– Masssssssssssssss...

E veio. A carinha de cachorro chutado em um torrencial, que coloca as mãos no bolso e cisca no chão todo todo, como se tivesse cansado pelo mundo, esperando uma resposta minha.

Eu passo uma vida dizendo que é só dar a mão, que ele quer puxar todo o resto, mas ninguém acredita. Olhaí.

– Eu posso ajudar, mas não faço o trabalho todo não, viu, coisa. Vou só tomar um banho rápido e volto.

– Ok. Eu também.

Enquanto ele me segue no corredor, que eu entro no meu quarto e ele vai para o dele, repenso no que me disse ainda pouco: se as pessoas não compreendem nossa relação de irmãos ou a relação com a família, então não são pessoas que valem a pena.

Nosso sistema de favores, então, esse sim tinha que ser bem compreendido.


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Notas finais do capítulo

Nadando em feels pq ♡♡♡♡♡♡♡♡♡♡♡

Vou fazer um esforcinho de aparecer dentro em breve, mas não posso prometer muito... Iria colocar um trechinho do próximo, mas ainda não está revisado... Anyway, espero que estejam curtindo!



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