Dies Illa escrita por Akise Aru


Capítulo 31
Capítulo XXIX - O Banquete -




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Simon adormecera enrolado como um gato no colo de seu tio enquanto do outro lado do internato, o bando de Adam reunido nos fundos de um galpão do prédio do restaurante discutia alvoroçado o incidente recente em meio a bandagens porcas e curativos mal colocados.

– Deixem o Morgan cuidar disso depois, ele deve saber melhor que vocês! - Exclamou o líder sobre a inaptidão de todos seus companheiros em cobrir uma simples ferida.

O grupo optou por manter o louro na ignorância para que este não lhes causasse nenhuma complicação extra por se achar próximo o suficiente da besta sanguinária que os atacou.

–-- ♪ ---

Tiveram filosofia pela manhã. Como Rihito se deleitava com esta arte do pensar, não se limitava apenas a ler os livros indicados pelos professores e também arranjava mais alguns que chamavam sua atenção.

Desta vez interessou-se nosso menino por um diálogo platônico chamado "O Banquete" que discutia sobre o Eros. Discorria-se sobre o amor e a sexualidade humana. Segundo o comediógrafo Aristófanes, havia três criaturas míticas de oito membros e duas cabeças que explicavam a natureza humana: Andros, a entidade masculina, Gynos, a entidade feminina e Adrogynos, hermafrodita, sendo este metade homem e metade mulher. Por não estarem agradando aos deuses, estes os separaram ao meio. Tendo sido decepadas suas outras metades, suas almas ficaram divididas e estes indivíduos passaram a buscar por elas novamente, gerando dos Andros os gays, dos Gynos as lésbicas e dos Androgynos os heterossexuais.

Apesar de surreal, a teoria toda o maravilhava, sentia uma razão extraordinária nos mitos apesar de saber, racionalmente, que aquilo não passavam de hipóteses da antiguidade sobre os mistérios fisiológicos, científicos ou universais. Rihito pensou em qual dos seres que poderia ter originado-o e assim que recordou-se de Simon, desistiu.

Vampiros também eram apenas um mito.

–-- ♪ ---

Morgan sentia um frio na barriga cada vez que punha um cigarro na boca, mas jamais deixava isso transparecer. Mais e mais vestia uma fachada esnobe e superior, irritante, arrogante, soberana e egocêntrica. Possuía um belo punhado de pessoas ao seu redor que dariam e fariam tudo que ele pedisse em troca de favores, por menores que estes fossem. Ao mesmo tempo que sentia desprezo, aquilo massageava seu ego como ninguém. Agora sim o louro tornara a ser o centro das atenções e isto graças àquele grupinho de rapazes imbecis que desde o início das suas aulas ali no colégio o atazanava.

Claro que eles continuavam a ser os mesmos seres torpes de sempre, mas próximo deles, Morgan sentia-se idolatrado. E Adam era um caso à parte. Certamente que o fantasma de Rihito ainda o obsediava em seu interior machucado e o tal Adam não lembrava em nada seu amado amigo, só que aquele rapaz impunha uma presença tão marcante, tão forte e dominante (sobre seus colegas de bando, diga-se de passagem) que o louro simplesmente não podia ignorá-lo. Sabia de tudo o que lhe fizeram no passado, mas... E daí? Apenas se deixava levar pelo fluxo, nada mais lhe interessava como dantes.

O grupo sempre tivera os olhos nele. Todas provocações e perseguições pestilentas visavam culminar nesta exata situação: queriam que Morgan se juntasse a eles. Teria uma função diferente no bando, obviamente, mas só depois que o menino se desgarrasse de suas companhias antigas é que ele consideraria a insistente convocação.

Morgan foi empurrado pelos outros para dentro do celeiro onde dormiam os cavalos do centro hípico. Ali também, com suas reservas, ocorreria um banquete.

–-- ♪ ---

Rihito fechou seu livro índigo e dirigiu-se ao quarto de Simon. Queria falar-lhe, acreditava que ultimamente os dois apenas se encontravam para fins impróprios e que por conta disso nem paravam para conversar. A maioria das informações que obteve vieram de Norman, e Norman não era o seu namorado.

Bateu à porta e aguardou, olhando a capa d'O Banquete que segurava embaixo dos braços. Simon estava a dormir no momento e não atendeu-o de pronto. O sono era, depois do sangue e do sexo, o que mais agradava o híbrido e o que mais o contentava grande parte do tempo.

– Ah.... Pode entrar... - Disse, ainda com a voz enroscada de tanto dormir.

Enxugou um fiozinho de saliva que pingara do canto da boca com o pulso quando Rihito entrava.

– Com licença...

O quarto do pálido garoto era um breu completo, todas janelas e cortinas estavam fechadas e ficar ali provocava em Rihito uma sensação desesperadora de estar perdido.

– O--oi, vamos Simon, abra essas janelas, já são três da tarde... - O menino de longos cílios pediu.

– Hah! Eu nem sei quando foi a última vez que eu as abri. Não me faz diferença... - Ele deu com os ombros - E o que você veio fazer aqui, amado irmão?

– Para de chamar as pessoas de irmãs, Simon... É estranho - Ainda no escuro ele reclamou.

Logo seus punhos foram puxados e aos tropeços o nissei caiu na cama do vampiro, sendo preso em seguida pelas pernas do outro e pelo peso de seu corpo. Sentiu-se capturado. "Droga!"

Sem tempo para qualquer reação dele, Simon beijou-o no pescoço e sugou seu sangue, com o estômago se aquietando a cada gole. Em meio ao silêncio do quarto, os únicos ruídos audíveis eram suas respirações e o som espiral dos fluídos de Rihito passando para dentro do trato digestivo de seu namorado.

– Simon... Eu não vim pra fazer aquilo– Esclareceu o garoto, interrompendo-o.

– Não? - Ele perguntou confundido.

– Não - Assegurou novamente, empurrando seu peito para longe de si.

Só daí percebeu que o garoto das pintas não vestia camisa e que seus dedos tocavam os largos e delicados mamilos dele. "Malditos mamilos, por que tão macios..??"

– Vim conversar, é tão improvável assim que a gente converse?

Levantou-se e abriu janelas e cortinas enquanto falava.

– Gah... - Os olhos de Simon espremiam-se com a claridade incômoda.

Deixou seu livro de lado. sua ferida quente ainda não cessara completamente de escorrer. Sentou-se.

Simon não fazia ideia do tipo de besteiras que seu menino queria lhe dizer e estava prestes a perder o interesse quando o ouviu perguntar:

– Quantos anos você tem?

– Vinte - Ele respondeu sem hesitar.

Rihito intimidou-se um pouco porque ele mesmo tinha apenas dezesseis.

– E o tio Norman tem trinta e sete.

Algo ocorreu a ele.

– Mas só?

Fez-se um breve silêncio.

– Na verdade, o tempo para os humanos é contado diferentemente... Anos passam do mesmo modo, mas o referencial é outro pra você e pra mim. Depois de uns anos vividos que se percebe. - Seus olhos abriram-se um pouco além - Então pode por muito mais nesse 37 do tio Norman! Hahahaha!

– E no seu 20 também.

Isso afundava ainda mais o abismo entre suas idades. Rihito sentia-se um feto. Simon suprimia uma risada.

– Você sabe, Rihito? - Disse o garoto das pintas, empolgado - Aquela história que se cortarmos uma árvore horizontalmente, podemos contar quantos anos ela tem pela quantidade de anéis no tronco dela?

– ... Ha.... Sei....

– Então, com os vampiros é a mesma coisa! Quanto mais gordo for um vampiro, mais velho ele é!

O jovem híbrido balançava a cabeça positivamente para a expressão desconfiada do outro, as ondinhas de seu cabelo pulavam graciosamente com o movimento.

"Que... Lindo..." Pensou o nissei, envergonhado, hipnotizado.

– ... Sério?

– Não.

Simon riu, satisfeito de sua brincadeira.

"Waaah... Que idiota! Chega! Ele não tem 20 anos!?" ele pensava.

– Mas uma coisa te digo em verdade... É que por culpa dessa "imortalidade", estamos sujeitos a esquecer certos fatos, pessoas, nomes e lugares ao longo dessa vida infindável. Assim como um humano comum os esqueceriam, mas proporcionalmente, esquecemos muito mais.

O comentário fez Rihito enrijecer. Nunca havia pensado nisso antes.

– A única coisa que "salva" nessa situação é que os vampiros tem a memória melhor que a dos humanos... Talvez por já ser adaptada a esse tipo de existência. Só que no meu caso, eu não sei como vai ser, eu posso tanto viver eternamente sem lembrar-me de nada se minha memória for mais similar a de um humano tanto como acabar morrendo de repente lembrando de tudo; de cada som, de cada aroma, de cada nome e cada voz e ter isso arrancado ainda vivo de dentro de mim, caso seja o meu corpo o mais próximo de um humano.

Simon falava do assunto com um certo distanciamento e até uma pitada de indiferença, mas aquela descrição apenas já era suficiente para agonizar o menino dos óculos. Ambas opções eram dolorosas demais em sua concepção e ainda assim o híbrido tratava disso com uma aceitação inacreditável.

Sem uma palavra, Rihito tomou seus lábios nos dele e pondo de leve a mão atrás de suas orelhas manteve seus rostos próximos num beijo. Sentiu-se impelido a consolá-lo.

– Pode... Tomar quanto sangue você quiser de mim - Avisou, afastando a gola da camisa.

Quis ofertá-lo também um 'banquete'. Simon sorriu, surpreso com a imprudência do convite e o aceitou, o som do líquido grosso em sua garganta já tintilando em seus ouvidos. Mal sabia Rihito, porém, que seu ato repentino e caridoso não advinha de pena ou simpatia para com o outro, e sim de um outro algo que desenvolvia-se taciturno em seu corpo.


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Notas finais do capítulo

é a tara dele! Rihito (tbm) tem tara por gente coitada! -QQQ
"aaaah como eu quero comer essa pessoa, ela tá tão triste, tão deprimida, no fundo do poço... que deplorável... rawr!"
lol
depois de escrever 'vampiros também são apenas um mito' eu pensei... já pensou se o Simon era fruto da imaginação do Rihito? daí o Morgan tinha percebido a 'doença' do Rihito e tentou se aproximar, mas parecendo inútil ele desistiu? 8'D
parei -Q