O dia passou rápido e logo o sol começou a se pôr. A paisagem do lugar onde estávamos, se é que sabíamos onde estávamos, era surreal. Bandos de pássaros de todas as cores possíveis cruzavam o horizonte no fim do dia, a cachoeira continuava a correr, constante, e o céu adquiriu uma cor roxeada que eu jamais vira.

Maxon e Jason haviam conseguido ficar um dia inteiro sem brigar, por mais que eu achasse que era uma trégua pela morte de Aspen. Eu ainda me sentia triste, com um vazio no coração incapaz de ser preenchido, nem mesmo pelo amor dos dois. Só queria Aspen comigo, mas infelizmente ele não estava. Era tudo tão louco pra mim, porque eu estava no castelo, tentando ganhar o coração de um príncipe cobiçado, e de repente estava fugindo de uma guerra com esse príncipe e com um sulista.

Eu estava curiosa para saber o motivo da rivalidade dos dois. Eu sabia que Jason não gostava de Maxon pelo fato de ser da família real, mas tinha que ter algo mais. Maxon sabia o nome de Jason, e os dois pareciam já ter se conhecido. Também havia o mistério de Samantha, e toda a coisa com a guerra. De repente, a Seleção e o meu plano para descobrir qual era a dos sulistas tornaram-se coisas supérfluas perto do que realmente estava por vir. A guerra. Os Mercenários estavam invadindo tudo, e de certa forma Samantha soube que eu deveria ficar longe de Illéa para não arrastar a guerra até lá. Mas o que essa guerra tinha a ver comigo?

O que os mercenários tinham a ver comigo?

Massacrada pelos meus pensamentos, decidi fazer algo diferente. Jason e Maxon estavam meio á toa, depois de trabalharem durante o dia para arranjar comida.

Sim. Arranjar comida. Porque aquele oásis no meio da floresta não oferecia um prato pronto. Eu imaginava como Maxon deveria estar se sentindo. Isso quase que colocava á prova sua masculinidade. Mas se é pra ser sincera, ele havia conseguido uns dez peixes, e trabalhou sem camisa o dia todo.

Então por mim estava tudo bem.

– Fogueira. - eu me levantei e disse para os dois, que estavam deitados numa rede improvisada. Jason foi o primeiro a se manifestar.

– Não mesmo. - ele disse, e voltou a descansar.

– Sim! - eu insisti. - Vamos fazer uma fogueira, além do mais é o certo a fazer, já que aqui deve ter... animais. - relevei a última palavra. Maxon levantou a cabeça com uma expressão de desespero.

– Estamos. Mortos. - ele falou.

Olhei para os dois surpresas. Então decidi fazer essa fogueira sozinha. Na verdade, eu nunca precisei de homens mesmo.

Levantei e saí do abrigo, batendo os pés com força.

– Isso é sério? - Jason perguntou.

– Ah, é sim. - Maxon sussurrou. - Essa garota é teimosa.

Depois de um suspiro simultâneo, os dois levantaram e vieram atrás.

– O que estão fazendo? - perguntei, procurando algum pedaço de madeira. - Pensei que as princesas queriam tirar um soninho de beleza.

– Não podemos deixar você sozinha. - Jason ironizou. - Esqueceu de sua habilidade em desmaiar?

Maxon riu em silêncio e eu me virei para trás.

– Ótimo. - eu disse. - Então comecem.

Os dois se entreolharam e começaram a me ajudar. Depois de meia hora, conseguimos madeira para fazer fogo. Juntei os pedaços no meio da caverna e procurei algumas pedras.

Mas Jason tirou um isqueiro do bolso e acendeu.

– Conhece? - ele apontou o isqueiro para mim. - É atual.

Hum... bem, era só o Jason sendo o Jason de sempre.

Depois da fogueira acesa, eu me sentei na beirada e comecei a rodar no fogo um espeto com um peixe. Jason tirou da moto um pacote de marshmallows.

Os sulistas comiam marshmallows?

– Sim, America, nós comemos marshmallows. - Jason disse virando os olhos e lendo minha mente.

– Tudo bem. Hora das perguntas. - eu anunciei.

Maxon se sentou ao meu lado. Ele trazia uma coberta da mala que estava na moto. Colocou a coberta sobre meus ombros delicadamente, e tive que olhar para baixo ao ver a expressão de Jason. Ele deu um rápido riso para si mesmo e virou alguns marshmallows no fogo.

– Pode começar, senhorita. - Jason disse, me lembrando do nosso primeiro encontro na Base, onde ele lia um livro e insistia em me chamar de senhorita.

Eu tive medo de perguntar, pois não queria reacender a rivalidade dos dois.

Mas, eu precisava saber.

– De onde se conhecem? - perguntei fingindo não dar importância. Jason suspirou.

– Ele tá na tevê o tempo todo. - Jason falou e deu um sorriso de lado.

– E você me vigiando. O tempo todo. - Maxon retaliou.

– Tudo bem, vou ser sincero. - Jason ignorou e levantou as sobrancelhas rapidamente. - Eu e Maxon nos conhecemos num chá de panela, America. Amberly queria uns presentinhos pro casamento.

Maxon mordeu os lábios, irritado, e então devolveu outra.

– Chá de panela? Pensei que fosse no dia da sopa. Você sabe, os renegados sempre aparecem por lá pra conseguir comida. - Maxon disse isso dando de ombros, e eu abri a boca surpresa.

Que lado era esse que eu nunca havia visto?

– Tudo bem, chega. Já vi que não vai funcionar. - eu cedi e comi um pedaço do marshmallow.

Nenhum dos dois disse nada.

– Agora minha vez. - Jason anunciou sem me dar espaço para protestar. - Por que você quer a Alteza Real, querida?

– Hum, Jason, é melhor parar. - tentei não rir de sua ironia, mas Maxon respondeu por mim. Ele me deu um leve beijo nos lábios e Jason visivelmente foi dominado pela raiva.

– Você deve estar desesperado, não é? - Jason se levantou, o que Maxon fez em seguida. - Para beijá-la assim, na minha frente. Cadê aquele cara bondoso, respeitoso e compreensível? - Jason fez uma cara de desdém ao dizer isso. - Cadê o príncipe que respeita a decisão de suas namoradas? Ah, espere. Você nunca teve namoradas! - Jason pausou por um segundo, e então fez cara de surpresa. - Não, se eu me lembro bem, você já se apaixonou, não foi? Como era mesmo o nome dela... Hum, ah é! Aquela ruiva de lábios carnudos. Silvia, Sara, Sade, e que tal Sally? Soa familiar para você? Ah, espere, se eu me lembro bem, o nome dela não era só Sally, era Sally Anders. A ruiva que te pegou, e depois te largou.

Jason jogou uma enxurrada de indiretas para Maxon, eu fui ouvindo cada uma enquanto tentava me levantar e separá-los, mas a cada coisa que Jason dizia, parte de meu cérebro acordava.

Sally Anders. Não era o antigo amor de Jason? Espere, talvez eu deva corrigir.

Sally Anders. Não era o antigo amor de Maxon?

Ou o amor dos dois.

Uma ruiva de lábios carnudos. Caramba, ela realmente era bem diferente de mim.

Maxon estava visivelmente furioso, e a primeira coisa que fez foi dar um soco no rosto de Jason. Em seguida, tentou outro soco, mas Jason segurou sua mão.

– O que você acha que eu faço na Base? Brinco de casinha? - Jason perguntou. - Não, eu luto. Eu treino. Sabe por que? Porque nem todo mundo tem uma trupe de guarda-costas para te salvar caso uma bala tente acertar seu coração.

Droga. Jason havia calado Maxon.

Porque Aspen tinha morrido por causa de uma bala.

– Então é isso? - Maxon exclamou. - Acha que é minha culpa?

– Você é burro ou o que? - Jason perguntou com uma expressão de "meu filho, acorda!". - Faz alguma ideia do mundo que existe fora de Illéa? Espera, não faz! Seu pai mentiu para você, Maxon! Eu sou o sulista, o cara que tá tentando salvar as coisas! E eles são os mercenários, os que mataram o soldado Leger! Sabe por que minha Base entrou em guerra? Porque America estava lá. E sabe por que America estava lá? Para saber porque diabos nós odiamos tanto Illéa. E sabe qual a razão dela estar lá? VOCÊ! - Jason gritou e chutou as madeira longe, depois subiu na moto, acelerou e saiu em alta velocidade.

Jason sumiu junto com a luz do Sol. Mas havia mais uma coisa que tinha sumido: minha confiança neles dois.

Quem realmente eram eles dois?