Depois do escargot, uma escapada

O jantar corria bem, apesar do meu nervosismo. Eu tinha planejado fazer uma declaração para a Chi Chi, mas – pode acreditar – eu não conseguia ter coragem pra isso.

Nisso, chegou o prato principal. Como é o nome? Isca... Esca... “Escargot”! É isso! Vi a Chi Chi comer e resolvi fazer o mesmo. Mas, quando enfiei aquela comida na boca...

“Eca! Que nojento!”, pensei.

Foi quando senti que aquelas coisas atravessadas na minha garganta eram lesmas. Tinha sido a coisa mais difícil de se engolir, não consegui evitar uma careta. Tive que dar uns soquinhos no peito pra fazer tudo descer. Na mesa ao longe, até vi Vegeta fazer aquela mesma cara que ele fez quando vimos as lombrigas dentro do estômago de Majin Boo. Assim que consegui engolir aquilo, virei um copo d’água num gole só.

Jurei a mim mesmo que nunca mais comeria um treco daqueles...

Vi o garçom passar por perto e o chamei. Aí pedi:

- Ehh... Bem... Vocês não têm aí um sushi, ou até mesmo um lamen?

- Sim, temos. Qual o senhor vai querer?

- Bom... Por favor, traz pra mim umas dez tigelas de lamen...

- D-Dez tigelas?! Você está esperando mais pessoas?

- Não – eu respondi. – São pra mim, mesmo...

- T-Tá bom... Logo traremos seu pedido...

*

- O que aconteceu, Goku? – Chi Chi perguntou. – Por que está tão calado? Não vai dizer que é por causa daquele “escargot”... – acrescentou aos risos.

A verdade é que eu travei na hora de dizer alguma coisa no restaurante – e aquelas lesmas também não ajudaram, só atrapalharam. E, agora, enquanto dirigia o carro pela estrada que saía da cidade, pensava apenas em que dizer a ela e como.

Nunca fui muito bom nisso...

Encostei o carro e saí. Em seguida, abri a outra porta e ela também saiu – mesmo que um pouco desconfiada. Transformei o carro em cápsula e guardei no bolso.

- Goku, o que você pretende fazer?

- Vamos voar pra casa... Ir de carro demora muito... – eu respondi meio sem jeito.

- Vai chamar a nuvem voadora?

- Não... Pensei em voar com você no colo...

Eu a peguei nos meus braços, e nisso ela se segurou no meu pescoço. Sinceramente, eu não sabia ao certo o que estava fazendo, mas minha cabeça ia a mil, tentando planejar os próximos passos. Voava, mas sem muita velocidade, apenas o suficiente para ser bem mais rápido do que um carro. Enquanto Chi Chi admirava a paisagem lá de baixo – iluminada pela lua e pelas luzes das cidades – eu a admirava e sentia seu perfume me invadir.

Desci em um morro, de onde dava para se ver a nossa casa ao longe.

- Por que a gente está aqui? – ela perguntou.

Bom... Eu não podia mais enrolar...

- Chi Chi... Este lugar não te lembra nada?

Ela ficou ruborizada e depois me encarou. Em seguida sorriu.

- Se for o que eu estiver pensando... Você fala... Do nosso primeiro beijo...?

Mais uma vez, senti que meu rosto queimava. Aposto que fiquei vermelho feito um tomate. Dei um risinho nervoso. Puxa... Quase quarenta anos de idade, vinte anos de casado, dois filhos... E eu continuo tão tímido como um garoto? Lidar com sentimentos, definitivamente, não é fácil...

Mas vale a pena.

- Goku, até agora você me deu uma bela noite. Obrigada. Mesmo tendo brigado com você... Bem, você não desanimou e quis me ver feliz... Agora sei que você, mesmo com os defeitos que tem, é perfeito para mim. Você não precisa me dizer nada, o que você faz já diz praticamente tudo.

Agora eu ia falar... Eu precisava falar, embora ela me dissesse o contrário. Alguma coisa no meu peito – mais precisamente, lá no meu coração – me mandava tomar coragem pra isso.

Se eu tenho coragem de enfrentar um inimigo mais forte do que eu, por que não teria coragem pra dizer a Chi Chi o que sinto por ela?

Respirei fundo. “Agora vai!”, pensei.

- Chi Chi... Bem, você sabe que não sou muito bom em falar coisas desse tipo, mas... Eu precisava dizer que você é muito importante pra mim, e... E... E...

“Ah, não!”, pensei. “Travei de novo! Vamos, Son Goku! Coragem!”

- Às vezes – consegui retomar – pode parecer que não me importo com o nosso casamento, mas é que não consigo demonstrar direito isso... E tenho uma memória horrível pra guardar uma data... Mas, mesmo assim, sempre... Sempre amei você e nunca deixei de fazer isso!

Pausei aliviado. Olhei para os olhos dela e disse:

- Chi Chi, muito obrigado. Obrigado por ser minha esposa, por me dar dois filhos extraordinários... E, principalmente... Obrigado por me ensinar sobre o que é amar e o que é ter uma família... Pra mim, você é maravilhosa, e é por isso que eu te amo...

Chi Chi ficou surpresa com tudo o que eu disse. Confesso que até eu fiquei surpreso...

Mas é a verdade...

Não é qualquer uma que suportaria o que ela suportou de dor ao colocar o Gohan no mundo – e provavelmente passou pela mesma coisa com o Goten. Quando estive doente, ela ficou o tempo todo ao meu lado. E, quando fiquei ausente por sete anos, ela criou, sozinha, os dois garotos. É a mulher mais forte que conheço, e eu a amo. Sempre aprendi, aprendo e vou aprender muita coisa com ela.

Aquela promessa – que eu nem sabia o que era – mudou a minha vida... Com certeza pra melhor.

Eu estava mais aliviado, mas ainda me faltava uma coisa... Cheguei mais perto dela e, de repente, ela veio pra cima de mim com um soco, mas me esquivei facilmente.

- Chi Chi, o que você tá fazendo?

Ela não respondeu e me atacou com um chute, que eu bloqueei. Nisso, ela começou a rir. Aí, eu entendi.

- Ah... Então é isso, não é? – eu também disse aos risos.

Começamos a lutar. Ela atacava, eu defendia. Depois, invertemos. Eu atacava – com o mínimo de força que eu podia – e ela defendia. Quando ela baixou a guarda, eu a agarrei.

- Ahá! Te peguei! – falei.

Olhamos um para o outro. Nem parecia que a gente tinha quase quarenta anos de idade e vinte anos de casamento. Tive a sensação de que tínhamos voltado aos dezoito e que estávamos casados há apenas um mês.

- Goku... Você me ama?

- Ah... Eu tenho que responder...?

- Uhum...

- Sério?

- Uhum...

- Tá bom...

Abracei Chi Chi pela cintura, bem junto a mim. Ela se agarrou ao meu pescoço e ficamos ainda mais próximos. Mas uma vez, o perfume dela me invadia. Aqueles olhos escuros me deixaram em transe.

E aí eu não resisti e a beijei. Senti a doçura dos lábios dela nos meus, enquanto respirava seu perfume e sentia o calor do corpo dela no meu. O meu coração batia forte, e senti que o dela também batia do mesmo jeito. Tudo praticamente igual ao dia do primeiro beijo. A diferença foi que a gente agora se amava mais do que no começo. Nessa parte, o tempo só fez bem.

Quando acabamos de beijar...

- Goku...

- Hm...?

- Por que você não se transforma?

- Fala do Super Saiyajin?

- Sim.

- Mas você sempre disse que pareço um delinquente e...

- Esquece isso agora. – ela disse, após pôr um dos dedos em minha boca. – É que faz tempo que você não faz isso...

Realmente fazia tempo. A última vez que a gente se beijou quando eu estava transformado foi na véspera do torneio de Cell. Hehe... Acabou indo muito além do beijo e, meses depois, nasceu o Goten...

Mal me transformei, ela se atirou para me beijar. Percebi que ela ficou arrepiada e senti que o coração dela estava a mil. O meu coração também acelerou e apenas me deixei levar pelo momento outra vez.

- Goku... – ela sussurrou.

- Hm...?

- Obrigada... Eu te amo...

- Eu, também... – sussurrei no mesmo tom.