Mantendo O Equilíbrio - Terceira Temporada escrita por Alexis terminando a história


Capítulo 39
Capítulo 38


Notas iniciais do capítulo

Alô shippadores de Milena & Vinícius ♥
Eis o plano de Milena... e o plano de Vinícius [?????]
Enjoy.



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Reflito sobre a primeira lição de meu irmão quando termino meu café-da-manhã – já quase na hora do almoço – e meu namorado desce as escadas depois de ter dito para que eu fechasse os olhos enquanto ele sumia. Parada na sala, espero por seu pedido de abrir os olhos. Quando o faz, retirando minhas mãos do rosto, visualizo a razão da pergunta estranha que estrelou a conversa passada com meu irmão. Lá estavam em punho no espaço entre eu e Vini um pequeno buquê de flores, lindas e graciosas, rosadas com outras mini florzinhas brancas de contraste e por trás delas um sorriso tão meu no rosto dele, sorriso que amo.

– Feliz dia do “tudo relacionado a você me interessa”?

Quero dizer que a primeira lição é fazer com que haja uma separação no que corresponde a amizade desses dois para que não incida diretamente no meu namoro e vice-versa. Estão ligados por demais que pondero sobre a confiança que tenho neles. Quero poder contar com cada um de uma maneira, não como os mancomunados que já se mostraram em várias ocasiões. Que baste para um saber que eu estou com o outro e pronto, não saber cada detalhe do que estamos fazendo ou planejando fazer... É invasão de privacidade, oras. E não tem trauma esse que vai me fazer ceder a esse ponto. Não se alimenta traumas, cuida-se deles.

Ainda assim não posso evitar ter aquela cena de um mês atrás – um mês! Nem parece! – de quando ele me abordou no salão vazio de ensaio de dança, um lugar incomum onde fomos parar naquela noite que meus amigos matavam aula, estávamos com anseios nublados por outras preocupações, que resultou numa boa mistura de sentimentos complicados. Lindo o brilho enciumado em seus olhos, o exaspero em sua postura e a entrega final daquilo tentamos suprimir por tanto tempo. “Porque tudo relacionado a você me interessa”, ele disse. “Todos têm um pouco de você e eu quero mais”, completou. “Você não vê isso em mim? Essa frustração?”, me surpreendeu.

Mordo o lábio antes de conseguir confessar uma mesma fala tal como ele fez ao me apresentar essas flores. Porque seria muito comum dizer um mês de namoro, além de que verdadeiramente não o era, já que tivemos que separar por algumas questões. Era sim uma comemoração pelo dia que finalmente pudemos nos revelar um ao outro. Isso que nos deixava felizes.

– Feliz dia do “você tem toda minha atenção”.

Porque ele tinha. Tem, na realidade. Percebi tão tardiamente que tive de hesitar, duvidar, fugir... achando que nada daquilo eu deveria sentir, tampouco ter esperanças, que matei cada ao estar ao seu lado. Achei que ser sua amiga deveria bastar e quando ouvi isso dele durante a festa em sua casa, um vazio lembro-me ter me tomado. Eu mais que ninguém deveria saber o que é escutar uma coisa dessas da pessoa que mais se quer... e no outro dia essa foi minha oferta. Realmente, não sei como cheguei a fazer tal, pois é algo impossível quando se trata de nós dois.

Recebo o buquê, percebo que são flores artificiais e nem por isso deixam de ser lindas. Envolvo-me em Vini também ainda com vestes de dormir e mostro-lhe quão acordada estou, num beijo que sela tal qual aconteceu naquela noite, não tão ansioso, mas intenso sim de roubar um fôlego. Estou bem consciente para discernir o que é seu corpo colado ao meu, reais mãos me segurando forte e todas as sensações que ele transmite para minha pele quando estamos juntos.

No dia anterior isso foi parâmetro de comparação de realidades, sem brincadeira.

Até então eu pensei estar falando algo para Lucas que não tinha rosto de Lucas quando senti uma coisa me cutucando no braço. Era meio afiado, vinha acompanhado de uma voz que dizia “moça, ei, moça”. Aí abri minimamente os olhos, sem saber onde eu tava e que realidade estranha era aquela. Tudo era muito claro, zoadento, e tinha um desconhecido me encarando. Aquela sobrancelha levantada dele foi assimilada por mim que não tava entendendo nada.

Não sou tímida, porém, em nada isso me impede de ter uns momentos vergonhosos. Na verdade, às vezes acho que os coleciono.

– Moça, a senhorita não pode dormir aqui.

Dormir?

Ok, me ambientei. Sol, vento, areia, brega, coqueiros, mar... praia. Me percebi debruçada numa mesa de bar debaixo de um guarda-sol. Sob os olhos do atendente que batia a caneta na mão num gesto inquieto, impaciente e bufante, fui me movendo, me afastando da mesa para sentar mais reta na cadeira. Deve ter sido com a caneta que ele me cutucou. Não consegui encarar senão a própria mesa, piscando rapidamente, torcendo que nenhum rubor aparecesse no meu rosto.

Eu esperava por uma vergonha sim, só que não desse tipo. Minha mente havia previsto um constrangimento após aquela noite de crise, que até então não havia vindo, o que eu agradecia... era cedo, no entanto, para cantar vitória que eu sei. A madrugada foi dureza e que me deu muita coisa para reavaliar, mas nada disso me fez ficar tão perdida tanto quanto me senti ao levantar da mesa e deixar o atendente para trás. Andei meio sem rumo, por passos lentos, porque simplesmente não sabia como tinha ido parar ali.

As pessoas passavam por mim, conversavam, riam, brincavam. O vento levantava e bagunçava meu cabelo. Pensei se não sonhava. Um sonho dentro de outro? É possível. Sonhos lúcidos? Já não saberia dizer, não lembrava de um assim. As coisas ao meu redor não necessariamente pareciam surreais, elas aparentavam normais, eu que... não sei, achei estranho. Remexi na minha bolsa, peguei o celular, marcava 16h39. Levantei a cabeça, olhei ao redor e me veio outra pergunta... Por que estou sozinha?

Nada fazia sentido.

Ao longe ouvi um chamado. Meu nome.

– LENA!

Me virei por instinto. Vinícius. Alguém conhecido pelo menos.

– Hey.

Por que ele está com a camisa do Murilo?

Reconheço porque no colarinho tem uma mancha que nunca saiu. Lutei tempos e tempos para tirar, desisti. É, é sonho mesmo.

– Para onde você estava indo?

– Eu?

Eu estava indo pra onde mesmo?

É sonho. Não é pra fazer sentido.

Vinícius me avaliou, semicerrou os olhos, inclinou a cabeça. A pergunta que veio foi com tom duvidoso. Me pareceu que ele queria insinuar algo como “você sabe seu nome?” Claro que eu sabia meu nome, oras.

– Sabe que dia é hoje?

– Dia 5 de janeiro. Não é não?

– É, é.

Ele não pareceu me dar muito crédito. A sobrancelha dele que duvida das coisas estava ali, em alerta. Só tinha um jeito de eu saber se era mesmo sonho – e de quebra tirar esse ar “duvidoso de sanidade” dele.

Fiz um pedido repentino. Na mesma hora ele desinclinou sua cabeça, meio surpreso com minha atitude. E um pouco risonho, diga-se de passagem.

– Me beija.

– Hum?

É, eu entendi que era sonho coisíssima nenhuma. Sonho algum conseguiria reproduzir tão bem aqueles lábios como o verdadeiro sabia usar. Pego pelo inesperado, de primeira meu namorado nem se mexeu enquanto avancei nele. Só quando se tocou do que eu fazia que ele retribuiu tão ávido e cauteloso ao mesmo tempo – ele realmente abraçou essa ideia de ir com calma e cuidado.

No fim das contas descobri que não é recomendado ficar com muitas poucas horas de sono. Fico tão lerda que minha concentração fácil se desfaz, eu faço e falo coisa com coisa, sou mais anormal do que já sou. Minha lucidez não se é confiável, pois cheguei a acreditar que estava perambulando num sonho, senão num sonho lúcido.

A camisa do Murilo que também ajudou na minha dúvida da realidade foi um acaso. Vinícius tinha deixado a janela do seu quarto aberta durante a noite de chuva e trovões e... bom, não foi muita coisa que sobreviveu seca. O dia nublado não estava ajudando também. Vinícius contou-me que já havia me dito isso, o que me deu certo medo do que eu poderia fazer ou ter ideia do que faço quando estou nesse estado de... lerdeza. Nem pensei sobre as horas que estava em casa pela manhã, ou mesmo o almoço.

Devo prezar mais meu sono.

E maquinar um jeito de trabalhar essa relação amigável demais de Vini e Murilo.

Nada que eu não possa fazer depois de um dia quase todo preparado de comemorações.

~;~

Vinícius foi mais rápido que eu, planejou todo um dia para que ficássemos juntos. Para não dizer que sumiu comigo, ficamos para almoçar em casa com a família. O depois não dava para garantir, ele me sequestrou... com meu consentimento. Ele só não lembrou que era dia de estreia de um filme de ação de grande sucesso e que o cinema que traçou iria por água abaixo por causa de lotação no estabelecimento. Quando vimos o movimento na entrada, ainda antes de estacionar o carro, perguntei se ele não tinha um plano B, pois certamente ali não seria um bom lugar para namorar.

E foi assim que paramos na praia.

Pisar na orla com aquela ventania crepuscular me fez agradecer ter optado por uma calça, porque não teria jeito de andar por ela de vestido. Só se eu quisesse expor minha lingerie e... Não, muito obrigada. Como o tempo permanecia fechado, quase não dava para ver o sol que dali um tempo daria seu tchau, todavia, para aquele horário, as coisas estavam leves e calmas. Acho que todo mundo resolveu ir para a tal estreia no cinema, que por um momento Vini pensou ter estragado seus planos, mas para mim foi bem melhor. Ali estava bem mais disperso.

Caminhando pelo calçadão meio sem rumo, optamos por um barzinho que oferecia umas mesas numa sacada, bem no fundo. Nem sentamos na verdade, ficamos nessa sacada um do lado do outro observando o mar tão longe tão perto de nós no seu movimento natural de ressaca. Mesmo com o céu nublado por muitas nuvens, o dia estava lindo. A favor do vento, nem precisei prender os cabelos.

Com um braço entrelaçado ao meu, Vini captura minha mão para brincar com meus dedos que evitam cruzar com os dele numa luta boba. Cutuco-o de ombro para ombro pelo seu sorrisinho meio aborrecido que ele tentava esconder.

– Chateado por aquilo no cinema?

– Num sei... eu não pensei no filme, só queria ter você do meu lado.

– E não estou?

Minimamente ri por eu ter sido literal demais. Não era bem isso, no entanto, apesar de sua expressão se suavizar enquanto abaixa a cabeça e continua brincando com nossos dedos juntos.

– Está. Quero dizer que... bom, você é mais “linda” no escuro.

– Acho que não sei bem o que isso quer dizer.

Do que ele tá falando?

– Às vezes eu... eu quero mais, sabe? Mas não quero ser precipitado... que seja por um impulso natural, não outra coisa, não porque sou homem. Gosto de te ter muito perto, mesmo, como no dia do último suspiro daquele abajur na minha última noite na sua casa, que você estava “linda” no escuro. Toda minha. Eu respirava seu shampoo através dos seus cabelos que roçavam no meu nariz, sentia sua pele e meus efeitos nela. Não pense que é perversão... é que... me dá paz, sabe?

Seu aspecto facial era meio confessional, seus olhos sem foco, uma testa que franzia e desfranzia, a boca só se mexia, com cantos que subiam para risos que não vinham e disfarçava ainda brincando com nossos dedos, então entrelaçados, da boba guerra perdida. Quando diz que lhe dá paz, é diferente. Ele toma foco em mim, roça seus dedos em minha mão num mínimo aperto e até seu tom... sim, é algo diferente. E entendo o que me fala.

– Acho que sim.

Vini vira-se novamente, o horizonte torna-se seu centro. Numa voz calma, ele descreve o que tem dentro de si. Uma suposta falta que tende a lhe acometer.

– Então... estávamos lá, e depois não. A nossa separação abrupta me deixou meio desnorteado... Eu tinha me acostumado a ter você tão perto, e agora, bom, não estou reclamando. Eu só queria ter você só pra mim por algumas horas e não competir atenção com outras coisas. No escuro seria só você e eu. Não é que eu não me contente com seus beijos, não se trata disso. É que parece que te perco tão facilmente...

Ele havia mencionado isso na noite da crise enquanto conversava com Murilo, os dois achavam que eu já dormia. Também não tinha pensado em como abordar isso com ele, até porque não sei bem o que fazer para dar sossego a sua cabecinha nesse quesito.

– Vini, quantas vezes preciso te dizer que você tem minha atenção? Mais que muita gente? Quando vim para cá inventei um plano idiota de não pensar nada sobre o que tinha acontecido, não pensar mesmo em você. Desculpa, é a verdade... mas quem disse que eu consegui? Você esteve no meu pensamento o tempo todo. Você me rouba a atenção e nem percebe.

– Eu sei. Só não sei por que às vezes sou assim, inseguro. Nunca quis tanto cuidar de alguém como quero com você. Tem sido tudo muito diferente com você, essa é a verdade. Mesmo com um curativo na cabeça, não queria que cuidasse de mim, mas eu de você, que estava com o coração magoado. Magoado por mim. Cheguei a sonhar uma vez que você foi me visitar naquela sala que dormi... devia ser o efeito do remédio, algo assim. Inconsciente, tive uma momentânea noite de paz. Idiota, eu sei.

Sabia que cada escapada minha do meu quarto para o dele e vice-versa durante os dias que ficou na minha casa era um hábito ruim, que costumei a me referir como “bom mau hábito”, pois despertava necessidades em ambos que logo seriam cortadas. Era esse o medo de seu Júlio e como bem eu entendia desde que me caiu a ficha. Agora quando penso no meu relacionamento com Vini isso não me sai da cabeça.

Foi muito bom enquanto durou, claro, porém, não era algo que podíamos levar em frente, não no momento. Se antes já era inseguro por essa história de atenção, houve um baque no seu coração por eu ter me afastado do jeito que fiz. E no fim das contas, ambos estávamos alimentando o que agora exige calma. Tomar uma atitude sobre isso é pensar em deixar o exaspero para trás e aproveitar o que temos, chegar à calma sem ter que acelerar tudo. Não é a toa a velha expressão de “sede ao pote”.

Toco-lhe no queixo, viro-o para mim.

– Não, não é idiota. Idiota talvez seja essa insegurança, que te cega para não ver o que realmente tem na sua frente. Mas insegurança todo mundo tem. Só... tente não se preocupar muito com isso. A gente disse que ia resolver, não?

Não sei bem o impacto que minhas palavras tiveram porque ele não responde. Não com palavras. Se inclina e me beija, delicado, perto da boca. Devagar ele migra assim que uma mão segura meu rosto. É intenso sim, mas não voraz ou ambicioso como tantos outros que costumam ser. Tem um apego sensível, de movimento leve, enternecedor. É bem singular, desperta aquelas sensações que gosto de outra maneira, e sinto que, de alguma forma, ele precisava disso. Também precisava de calma, estar assegurado. Acho que acabei assustando-o um pouco, chacoalhei demais seus sentimentos nessa bagunça que nos metemos que...

Pigarreio. Um pigarreio fora de nossa bolha.

Vini encosta sua testa na minha ainda de olhos fechados. Um sorrisinho chateado volta a sua face antes de ele se levantar e dizer obrigado ao atendente acanhado que trazia as bebidas de nosso pedido. Garçom dispensado, Vini exclama com uma carinha engraçada:

– Viu como te perco fácil?

~;~

Ficamos o resto da tarde no mesmo lugar. Estava tão quieto e bom, que acho que o dono colocou uma trilha especial para tocar com músicas românticas e leves, nacionais e internacionais. Com minha cadeira junto da dele, ficamos bem juntinhos, que nem bem o cinema conseguiria. Logo escureceu, luzes quentes tomaram o espaço e todo o ambiente foi ficando mais romântico como se Vini mesmo tivesse preparado.

E então lembrei de uma conversa no dia anterior, logo depois que meio que me perdi na praia, quando o atendente tinha me cutucado com a caneta para acordar. No caminho de casa, Vini ria descaradamente do meu comportamento, dizia que estava tão adorável que se tivesse uma câmera, ele tiraria uma foto – e ele tentou com o celular, que arranquei dele em tempo. Me fiz de zangada pelo embaraço. Ele sabia que era mentira, de qualquer maneira. Cruzei os braços, fiquei olhando a orla ir embora pela minha janela.

– Ainda não acredito que você me largou lá.

– Lena, eu não te larguei lá. Só não quis te acordar. Estava tão tranquila...

Ele tentou, daquele seu jeitinho de querer me convencer, a acreditar nele. Quando paramos num semáforo, ainda ria e tentou pegar na minha mão. Parti para meu drama, estava curiosa sobre o porquê de ele ter saído de perto de mim na praia. Ele pensa que eu não tinha notado isso? O que ele foi fazer? E por que não disse?

Resmunguei.

– Eu podia ter sido assaltada, sequestrada, baleada... mutilada.

– Calma, amor, aconteceu nada. Além do mais, eu estava logo ali.

Ah, mas ele sabia jogar sujo. Me chamou logo de amor. Gostava de como ele dizia, tão natural quanto qualquer outra palavra, o que ele bem sabia. Não nego que me escapou um sorrisinho discreto, que escondi dele ao inclinar-me para meu próprio ombro do lado que ele não teria acesso.

– Tive que levantar por um momento só, não quis interromper seu sono. Você poderia ficar zangada, estava muito relaxada.

– É, aí o atendente fez esse trabalho por você.

– Como assim?

– Ele me acordou. Na verdade, me cutucou com a caneta.

Falei fazendo pouco caso, Vini já não interpretou bem assim. Penso que meu estado de lerdeza ainda brincava comigo, pois nem me toquei do quanto isso poderia soar outra coisa. Esqueci de como Vinícius pode ser... impulsivo. Ou protetor. “E que belo par de homens ela foi arranjar” ele disse naquela conversa que ouvi sem querer.

Preciso cuidar de verdade de minhas horas de sono.

– Ele TE expulsou? Que maldito... vô voltar lá pra...

Vini alternava a atenção entre mim e o trânsito a nossa frente. Cortei logo.

– Não, não vai não.

– Milena, o cara te...

– Ele tinha razão. Eu não devia dormir ali. Vai ver foi até o chefe dele que pediu por isso, vai saber.

– Mas eu já vi uns bebuns dormirem nas mesas. Qual a diferença? Por que eles podem e você não? Esse atendente devia receber uma...

– Eu não acredito que você tá exaltado por causa disso. Ok, ele não foi nenhum gentleman, foi um pouco vergonhoso sim, mas eu não tô condenando ele por isso.

– E você ainda não quer que eu não fale nada?

– Vini, diferente dos bebuns, eu não estava consumindo nada. Só tava dormindo.

– Isso não justifica.

– Justifica. O que não justifica é seu sumiço e sua enrolação. Eu posso num tá boas das ideias, mas já entendi que tem coisa aí. Diz logo, o que você aprontou?

– Nada.

Deu de ombros.

– Sei.

– Grande fé que você tem no seu namorado, hein.

Quando ele virou novamente para mim, apelando para me convencer – leia-se me enrolar, de novo – devolvi o olhar com uma desconfiança permanente. Não desistiria fácil, neguei com a cabeça para que visse. Ele suspirou tentado a dizer algo. Soltou por fim que...

– Ok, é segredo.

– Eu disse! Agora conta.

– É segredo, Milena.

Bufei e voltei a minha posição de falsa zanga, mantive os braços cruzados, o que o levou a rir novamente. Tá, eu também estava rindo, ele que não precisava se deliciar tanto assim. Dou o golpe de misericórdia. Aí que ele abriu um sorrisão mesmo, eu vi.

– Você não mereceu aquele beijo que te dei.

– Ô se mereci. Estaria aceitando outro se não tivesse que dirigir... deixa que quando chegar...

– Que quando chegar em casa estarei negando. Você anda se aproveitando da minha inocência sonífera. Ou devia dizer onífera? Não sei, não importa.

– Amor, você tá dizendo coisa com coisa de novo.

Já disse que amo quando ele fala assim? Digo, que me chama de amor?

Safado, sabe meus pontos fracos.

– E você tá me enrolando. Deixa está.

Interrompidos pelo garçom que trazia o pedido de nosso jantar, nos ajeitamos na cadeira. Fiquei me perguntando se a cidade em peso estava distribuída pelos cinemas da cidade – que não passavam de dois, o que demos a visita rápida e outro que ficava bem a sul do município – pois era sexta-feira e o movimento da praia para um horário de 20h estava bem leve. Para a área da sacada não havia ninguém além de nós dois. Vai ver era o universo nos dando essa chancezinha... Rio discretamente disso enquanto puxo os talheres e me sirvo.

– O quê? De que é esse risinho, namorada?

Boa oportunidade para falar da enrolação que fez no dia anterior.

– Lembrei agora que você tinha mencionado um segredo. Foi tudo isso? As flores, o cinema, o passeio?

– Foi. Aquela hora que levantei e você dormia na mesa foi porque segui uma senhorinha que vendia flores na praia. Não sabia se você gostava, arrisquei. Fui o mais rápido que pude pegá-las e deixá-las escondidas no porta-malas. Gostou?

– Hmmmmmm, agora tudo faz sentido, ser largada numa mesa e Murilo perguntando do nada se eu gostava de flores. Nem eu sei se ele já deu flores a alguém. Ainda pensei que eram pra Aline.

– Lena, eu não te larguei lá.

– Eu sei, tô te zoando. Só não gostei dessa part... Me passa o molho.

Atento ao que deixei morrer, me passou o molho ligeiro e seu aspecto me incitou a falar direito. Me parecia uma boa hora para abordar o incômodo que guardava, afinal, combinamos de sempre conversar sobre o que nos deixava desconfortáveis e que eu não devia guardar tanto – eu já guardava demais mesmo.

– Que parte?

– Dessa de Murilo me perguntar. O que quer dizer que você o consultou antes.

– Comprei primeiro, depois perguntei.

– Não é isso. É que você o coloca muito por dentro do que acontece com a gente. Tudo bem, vocês são amigos. Mas isso não quer dizer que ele tem que saber de tudo, tem? Ele tem é que confiar em mim, em nós, e assim confiarei nele. Desse jeito sim vocês me colocam numa posição difícil. Sei que conversam sobre mim e já tomaram decisões por mim... isso, Vini, eu não posso deixar seguir adiante.

– Tá dizendo que minha amizade com Murilo é prejudicial... a nós?

– Estou dizendo que o modo como vocês levam pode ser. Às vezes os sinto como mancomunados. Vocês dizem muito que guardo as coisas para mim, mas sou forçada a isso se vocês dividem tanta informação assim. Sabe que não gosto de marcação em cima.

– Quer que eu me afaste dele então?

Encontro suas sobrancelhas levantadas quando ergo a cabeça de meu prato. Mal me deixo engolir para esclarecer.

– Não. Não disse isso. Que a amizade de vocês seja assim, amizade apenas. Parceiros, irmãos, que seja. Vocês devem ter seus segredos também, não me importo. Só quero que haja limites. Existem coisas que só devem ficar entre o casal... Já pensou se eu mencionasse aquelas noites que passei no quarto de hóspedes com você? Uma vez ele me disse que se rolasse desrespeito, ele partiria pra cima, que bateria de novo se tivesse que o fazer.

Num suspiro mais aliviado, Vini vai mastigando a comida e mexe nela com os talheres sobre o prato. Antes de levar a boca, assente um pouco do que proponho. Essas nossas últimas conversas tem sido bem esclarecedoras, devo confessar.

– Olhando por esse lado, acho que podemos maneirar. Dá pra trabalhar nisso. Confiança não é algo para se deixar por isso mesmo. O que mais quero é que possa confiar em mim, para qualquer coisa, mesmo.

– Então me passa o guardanapo. Confio em você para isso.

– Engraçadinha.

– Continua sendo uma boa surpresa, de qualquer forma.

– A surpresa ainda não acabou.


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Notas finais do capítulo

Hmmmmmmm...

E aí, acha que a Milena tá lidando bem? Mesmo zumbi rs
E o Vini?



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