Pelo corredor ainda sem entender a urgência da conversa que Pedro desejava ter consigo, Caspian seguia o loiro rumo o longo caminho sem manifestar uma só palavra enquanto este mantinha sua expressão fechada e indecifrável em face. Pedro deu inicio ao assunto questionando Caspian sobre seus treinamentos, e seu desempenho em campo.

- Então Caspian, como anda a sua desenvoltura em campo? –perguntou Pedro em tom polido.

- Evoluindo imagino. –respondeu sem se prolongar sabendo que aquela conversa não seria sobre suas habilidades com espada.

- Edmundo disse que seus treinos prolongados estão sendo bem aproveitados. –isso soou como elogio, mas Caspian não se iludiu com a ideia.

- É o que parece. –mais uma resposta vaga e Pedro decidiu o encarar.

- Acha que já possui domínio sobre a espada?

- Qual exatamente é o destino dessa conversa majestade?

- Imagino que saiba que não é sobre seus treinos que desejo falar.

- Estou apenas esperando chegar ao real assunto. –ele foi direto.

- Pois bem... Direto, prefiro assim. Nesse caso irei direto ao ponto. Não quero que passe muito tempo a sós com Lucia, isso pode não ser apropriado.

- Imaginei que se tratava disso. –Caspian concluiu com expressão insatisfeita.

- E acho que deva imaginar os meus motivos.

- Não completamente, mas tenho certeza que pretende me esclarecer.

- Lucia não é uma moça qualquer é uma rainha e do contrário do que deva estar acostumado no seu mundo as moças aqui, principalmente se tratado de uma em tal cargo como Lucia deve ser cortejada e não induzida a romances sem sentido e sem solidez.

- Acha que minha aproximação de Lucia é algo sem importância, sem sentimento? –Caspian encarou o rei sem medo.

 - Acredito que tenha boas intenções, mas o inferno está cheio delas não? – Pedro disse em tom rude. – Se você gosta mesmo de Lucia como parece, não vai querer tratá-la como uma qualquer vai?

- Claro que não, eu tenho muito respeito pela Lucia...

- Ótimo, então presumo que me entenda. –interrompeu o rei.

- Ainda assim acredito que Lucia saiba tomar suas próprias decisões, sozinha.

- Cabe a ela decidir a quem entregar seu coração, mas caberá a mim intervir caso seja uma escolha ruim.

- E como pode ter tanta certeza de que sou uma escolha tão ruim? –questionou Caspian parando no meio do caminho e encarando o rei.

 - Lucia pode parecer durona quando está exercendo seu posto como rainha, mas é doce e ingênua no que se trata de outros assuntos, e sejamos sinceros, somos homens sabemos bem o que sentimos diante de uma bela mulher. Ou você é diferente? –Pedro deu uns passos atrás e parou diante de Caspian.

- Eu jamais desrespeitaria Lucia se é isso que está insinuando. –o moreno fitava olho a olho o rei.

- Não se atreveria. –disse com firmeza e certo tom de ameaça em sua voz. – Mesmo assim não é sobre isso que me referia anteriormente.

- Então sobre o que?

- Não sabemos bem que motivos o trouxeram, nem se eles o manterão aqui por muito tempo, então até sabermos mais sobre o assunto, sugiro que guarde seus sentimentos para si. Lucia não precisa de um sentimento como este agora para confundi-la. –disse se virando.

- Ainda não acho que caiba a você decidir. –o moreno se manifestou logo apressando seus passos e passando pelo rei.

- Isso não é tudo Caspian. –protestou o rei.

- Pretende me dar mais algum sermão? –Caspian girou o corpo lançando sobre o rei seu olhar mais insatisfeito.

- Pretendo fazer uma viagem curta de reconhecimento de campo e devo escolher alguns dos meus soldados mais fieis assim como um braço forte com quem possa contar. –Pedro andou até o moreno e prosseguiu. – Embora não goste nada do seu tom, eu quero que vá comigo assim poderemos nos conhecer melhor e talvez você consiga mudar minha opinião sobre o seu péssimo comportamento. –disse logo passando por Caspian.

- Ou é apenas uma desculpa para me manter afastado da sua irmã. –protestou o moreno sem se virar fitando com vácuo a sua frente.

- Se eu quisesse manter você longe de Lucia não estaríamos tendo essa conversa. –respondeu Pedro. – Pode comunicar sua decisão sobre o assunto no jantar. Eu partirei logo pela manhã... Mas vou entender se decidir recusar.

Dito isso o rei se afastou e seguiu rumo ao outro corredor ficando fora da visão de Caspian, que se virou prensando os lábios um contra o outro formando uma linha reta e tensa entre os mesmos, e fechando os punhos nas laterais dos quadris. Caspian sabia que aquela conversa com o rei não seria amigável, mas não esperava perder a cabeça daquela forma, sentiu-se como se tivesse perdido a razão de certa forma com sua reação, mas já estava feito e ele não poderia ponderar. Naquele momento ele teria que se preocupar com a convocação feita pelo rei para a tal viagem de curto tempo. Ele sabia que não poderia recusar, era uma missão a qual ele deveria ir e o próprio desejava tal para mostrar a Pedro que era deveras confiável, mesmo que ter de provar algo a outra pessoa lhe desagradasse em numero e gênero. Caspian estava extremamente incomodado com aquela discussão e resolveu tomar outro caminho pelo palácio que o levaria para as externas onde ele poderia extravasar seus sentimentos treinando com espadas.

Já durante á noite todos estavam reunidos novamente à mesa então Pedro foi quem tocou no assunto enquanto o clima tenso pairava ainda sobre ele e Caspian.

- Então Caspian, já tomou sua decisão? –perguntou ele.

- Sobre o que? –perguntou Lucia enquanto sua colher pendia no meio do caminho entre o prato e seu queixo.

 - Pedi a Caspian que me acompanhasse em minha viagem até o vilarejo. –exclamou o rei em tom normal.

- E por que precisa dele?

- Ora, Caspian está bem treinado e já acompanhou Edmundo em uma missão, porque não poderia acompanhar-me em uma tão mais simples?

- Sim, mas sequer me avisou disso.

- Estou informando-a agora Lucia.

- Tem o meu sim majestade. –respondeu Caspian no outro lado da mesa encarando Pedro.

- Ótimo. –sorriu Pedro com ar um tanto quanto irônico. – Imaginei que não recusaria um pedido tão simples. –então voltou a beber sua sopa.

Lucia fitou a face do irmão e logo em seguida a de Caspian notando o olhar tenso na face do moreno que era dirigido ao rei. Confusa, mas já imaginando a intenção de seu irmão Lucia apenas decidiu não se manifestar, e esperar para falar a sós com Caspian e em seguida com o irmão. E assim foi logo após o jantar. Lucia chamou Caspian para uma conversa no gabinete onde ambos poderiam ficar mais a vontade e então foi direto ao assunto:

- Quer mesmo acompanhar meu irmão nessa viagem?

- E por que não?

- Bem, eu achei uma surpresa ele ter convidado justo você para tal, pensei até então que a relação entre vocês não fosse muito amigável, de repente ele confia em você?

- Me parece uma boa proposta Lucia. –respondeu ele em tom calmo, porém distante.

- Sobre o que mais conversaram esta manhã? –disse ela formando uma ruguinha entre os olhos.

- Apenas sobre isso. –disse ele se levantando da poltrona onde até então se prostrava sentado e andou até a janela larga.

- Não falaram sobre mim? –ela se virou escorando-se com os quadris na mesa e cruzando os braços.

- Não.

- Está mentindo.

Caspian virou o rosto olhando-a com surpresa e ficou em silencio vendo-a o fitar a face com olhar interrogatório.

- Não estou mentindo Lucia. –disse firmemente.

- Está sim, e eu não gosto disso. –ela se manifestou do mesmo modo como falava sobre assuntos do reino. – Está na cara que Pedro apenas o quer distante de mim pelo tempo que ele puder evitar. E você está no seu direito de recusar se quiser...

- Eu não vou recusar, não foi pra fugir dos meus deveres que eu vim pra Nárnia. –respondeu em tom sério. – Você me chamou para ajudar e aqui estou. Não vou me negar a nada que me for pedido. –disse ele se virando e escorando as mãos na beirada da grande janela.

- Tudo bem, a escolha é sua, assim como a minha pode ser perfeitamente acatada caso eu desconfie que os motivos do meu irmão não sejam por Nárnia. –Caspian voltou a olhar para a rainha.

- Não quero que intervenha Lucia eu já dei minha palavra e vou cumprir com ela.

- Você fará o que for necessário por Nárnia e por este reino se eu achar que isso é necessário. Mas se Pedro desejar intervir quanto a isso por um ciúme infantil te dou a minha palavra de que tanto você quanto ele deverão acatar as minhas ordens. –disse em tom firme e um pouco rude.

- As razoes dele não são infantis, Lucia ele teme que eu a machuque e em parte está certo.

- Então simplesmente concorda com ele assim?

- Essa viagem será boa para mim. Reconhecer outros lugares, sair em trabalho de campo ou seja lá como chamam isso aqui pode ser útil. Além do mais, toda vez que você intervém por mim é como se não acreditasse na minha capacidade como diz.

 - O que quer dizer? –disse Lucia franzindo a testa.

- Quer dizer que nem você acredita que eu seja o grande rei que você esperava Lucia. Seja sincera, a maneira como você se refere a ele, mostra claramente que existe certa decepção de sua parte comigo.

- O que está dizendo é um absurdo. –ela gira sobre seus sapatos e se afasta.

- Tem certeza? Você não duvida sequer um momento que eu tenha a mesma capacidade que o grande rei? Lucia... Você tem feito um esforço enorme para acreditar em mim, e eu admiro isso, mas você está mentindo pra si mesma e sabe disso.

Lucia permaneceu em silencio contemplando a verdade naquela palavras então Caspian apenas prosseguiu:

- Eu sei que sou nem a metade do que você esperava Lucia, mas que mesmo assim você confia em mim. Então deixe que eu prove que posso ser pelo menos um terço do homem que você espera que eu seja e assim talvez eu me sinta digno de você.

- É isso que você quer? –disse ela se virando para ele.

- É.

- Tudo bem. Que seja...