“Enquanto acabava a frase, ele me fitava com um olhar de medo e agonia. Como se fosse impossível contar.”

Tora POV

Não posso contar. Não quero envolver mais ninguém nessa história. Já estando aqui é um atrativo para eles. São essas decisões impensadas que me ferram.

-Voltei! Trouxe um café da manhã completo com tudo o que gosta. - Enquanto Saga punha a bandeja sobre minhas pernas, tinha uma feição preocupada mas ao mesmo tempo alegre – Vou tomar banho, quando voltar quero essa bandeja v-a-z-i-a, sim? – deu uma leve risada e seguiu seu caminho ao banheiro.

Sentia meu estomago cheio de borboletas, não sei se de fome ou de nojo de mim mesmo, mesmo assim comi sem cerimônias.

As cores claras trazem uma harmonia com os objetos bem colocados em cada canto do quarto, trazendo sensação de grandeza e pura clareza. Mas uma coisa prendeu minha atenção : um porta retrato com nossa foto, ainda quando éramos pequenos, naquele parque onde sempre brincamos. Bons tempos.

Flashback on

- Saga- chan! Cuidado! – tarde demais.

Corri até seu corpo deitado no gramado do parque.

- Eu avisei! Você nunca presta atenção onde anda não? Seu desastrado!

- Gomen, ne ... AI!...  Tora- chan, aqui dói – apontava para o seu  joelho

Depositei um beijo em seu  machucado  - Agora sara! Vamos, nossas obaachan devem estar preocupadas, consegue andar?

- Acho que sim, me ajuda? – estiquei minha mão mas perdi o equilíbrio, caindo em cima dele – ahm, gomen , acho que não consigo..

- Oh, por Kami-sama! Onde vocês dois estavam? Estava muito preocupada, e o que aconteceu com você Takashi-chan? E você senhorzinho Tora, porque está em cima do coitado? – disse a Sra. Amano .

- Gomem obaachan, Saga-chan e eu estávamos brincando de pega pega e ele não viu o buraco no chão e se machucou, e tentei ajudar ele mas perdi o equilíbrio – lá vem bronca.

- Ah sim. Venha os dois, compramos sorvete, dos seus sabores preferidos.

- Sim! – dissemos juntos

Flashback off

Aquela cena me fazia rir. Saga sempre desastrado.

- Nossa, que fome de leão! – aquela gargalhada me fez sair do transe – Não quer tomar banho? Tenho umas peças de roupas suas aqui, qualquer coisa eu empresto alguma minha.

- Ah sim, por favor. Se não for incômodo, vou agora.

- Claro, vou preparar a banheira para você. Qualquer coisa estou na sala.

-Sim, muito obrigado.

Nada tão relaxante quanto um banho em uma banheira. Joguei minhas roupas sem me importar onde iriam parar. Me afundei na banheira, apenas tentando não pensar, mas isso é impossível.

Flashback on

- Por favor, me conte o que anda acontecendo com você. Seu mal humor e sua falta de vontade de tudo anda me  irritando. Nem seu filho mais você dá atenção, semana que vem será seu aniversário, já passou isso na sua cabeça?

- CALA A BOCA! – ouvi um tapa.

O que anda acontecendo? Sabia que papai andava muito ocupado e irritado, mas isso é estranho. Desci as escadas silenciosamente, apenas escutando a conversa.

- Minha mulher, são tantos problemas no meu negócio que não tem a mínima noção.

- Não venha me titular como sua propriedade, okay? E não faço a mínima idéia, porque nunca me conta? Não confia em mim?

-Confio o bastante, mas isso é importante demais para contar a você.

- Seu trabalho é mais importante?

- Não, claro que não. Me desculpe amor, não quero descontar em você e no pequeno Shinji.

- Ainda não entendo...

-Não queira entender, por favor, deixe isso de lado. Quero minha família sã e salva.

- Não me diga que... vai acontecer de novo?

-Humpf... Sim, vai acontecer e pior se descobrirem que mais alguém sabe.

Aquela feição de pavor em minha mãe me deixava inseguro, sentia que nada conseguiria me proteger.

- Shinji- chan? Está chorando por quê? Desde quando estava aqui?  Venha cá.

Senti calorosos braços me envolvendo. Apenas assim me senti preenchido naquele momento.

- Eu lhe falei,amor. Shinji- chan, se você ouviu essa conversa, não se preocupe, nada vai acontecer okay?Eu lhe prometo.

Flashback off

Enfim, terminei meu banho e me troquei com as roupas do Saga e joguei fora aqueles trapos. Antes, a casa silenciosa, agora com uma melodia no ar; um som de baixo, tocando No More Tears*.

Desci curioso, me apressando para vê-lo tocar.

- Finalmente acabaste o banho Tora!Achava que tinha ido junto ao puxar a tampa do ralo – Riu com aquela cara de deboche típica dele – Sente-se, quero lhe mostrar outra música, mas na guitarra.

- Desde quando ouve Ozzy Osbourne? – indaguei

- Ah, faz pouco tempo, mas isso não vem ao caso. Ouça apenas.

Saga começou a tocar aquela melodia de uma forma muito convicta, demonstrando todo o sentimento que nela havia.

“I've been out walking for hours.
I've got something on my mind.
How did we get here? Where are we going?
And why is life so hard?” *

Nunca uma musica foste tão compatível com o que já passei, aquilo acertava meus machucados abertos a facadas, arrancava-me lágrimas inconscientemente. Posso dizer que não foi apenas de mim.

Não queria demonstrar tal fraqueza, mas ser forte era impossível em um momento desses. Escondia meu rosto e engolia o choro.

Senti de repente um calor me envolvendo, junto com seus braços. Era como um calor de mãe, protegendo seu filho de qualquer mal que aparecesse. Aconcheguei-me em seus braços , apoiando a cabeça em seu ombro. Desmanchei-me em lágrimas.

      Saga POV

 Por mais que tenha aparência de uma pessoa forte e decidida, por dentro era uma pessoa de certo modo insegura com o futuro. Deixei-me levar pelo momento, aquele abraço apertado, sentindo sua respiração descompassada contra meu peito, um momento parecido a esses era tudo o que desejava fazia tempos.

Aninhava seu cabelo úmido e o silencio dominava. Ele me apertava, parecendo inseguro, cada vez mais, desejando isso mais que eu. Olhou-me diretamente nos olhos, quebrando o abraço.

- Saga...

- Shhh – tampei-lhe os lábios com o indicador – Daijyoubu, daijyoubu... Estou aqui

Nossos lábios cada vez mais pertos, tendo em briga, nossas respirações em direções opostas, roubando todo o ar disponível por perto. Desejava muito, mas não poderia fazer tal ato sem aprovação, poderia apenas piorar a situação e  nossa relação. Não quero aproveitar de nada, apenas que aconteça naturalmente.