Dias Imprevisíveis escrita por Gil Haruno


Capítulo 13
Capítulo 13 -Um dia após o outro


Notas iniciais do capítulo

Capítulo postado!
Beijos!



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... e os dias mais longos são os mais turbulentos. Age sempre como uma caixinha de surpresa, aparentemente sem ter muito que mostrar ou, simplesmente, adoram nos pregar peças.

–Eu posso vê minha mãe?

–Ela está um pouco alterada e indisposta. Quer vê-la mesmo assim?

Megan refletiu sobre a pergunta do doutor Caleb, sabendo em que estado encontraria a mãe.

–Quero.

–Pois bem. Carmen, a leve ao quarto de Melissa, por favor.

–Sim, doutor. Vamos, Megan.

Carmen levou Megan ao quarto de Melissa e, em seguida, o doutor Caleb pediu licença e se retirou da sala.
Fiquei à espera de Megan naquela sala, desejando que nós fôssemos embora logo. Hospitais não me traziam boas lembranças, apenas angústia e a dor da ausência. Lembro-me das diversas vezes que tive que acompanhar meus pais ao médico. Enquanto eu dirigia nosso velho carro preto, minha mãe reclamava das dores, no banco de passageiro. Pouco tempo depois, me vi, repetidas vezes, fazendo o mesmo com meu pai. Logo passei a encarar hospitais como lugares horríveis, sendo quase impossível permanecer dentro deles por longos e miseráveis minutos.

–Claire?

Virei-me para a pequena entrada da sala e avistei Nicholas.

–Oi.

–O que o Ethan faz lá fora? E o que está acontecendo?

–A Melissa não vai receber alta agora. Ela se embriagou e parece que está sedada. – assim como os demais, Nicholas parecia não acreditar no que ouvia. –Ninguém sabe como uma garrafa de Vodka foi parar no quarto dela.

–Uh. Mas que bagunça! – exausto, ele se jogou no sofá. –Aposto como foi o David!

–Já houve uma grande confusão aqui por causa disso. Ethan se descontrolou e acabou partindo para cima do padrasto. Ele o culpa. – sentei-me.

–Isso explica a cara de bravo dele. E onde está Megan?

–No quarto com Melissa. Eu não entrei por que achei que ela precisava ficar sozinha.

–Sendo assim... Vou esperar ela sair do quarto e vê o que eu posso fazer.

–Err... Ethan está sozinho? – perguntei meio desconcertada, pois minha intenção era de poder ajuda-lo; bastava saber se ele aceitaria minha ajuda.

–Sim. Ele está sozinho.

–Eu vou falar com ele. – levantei-me, mas ao sair, Nicholas segurou meu braço, impedindo-me de dá mais um passo.

–Será que é mesmo uma boa ideia?

–Boa não é, mas eu vou tentar me aproximar dele.

–Ok. Qualquer coisa é só gritar.

Pisquei para ele, arrancando-lhe um sorriso.

Eu não era muito boa com palavras, nem mesmo quando meus poucos amigos mais precisavam de um conselho urgente. Na maioria das vezes, eu deixava de me expressar verbalmente e partia para a escrita, por que sempre achei meus pensamentos mais organizados no papel.
Cheguei à área externa do hospital, olhando para todos os lados a fim de avistar Ethan, e em poucos segundos o encontrei. Em passos curtos me aproximei do minúsculo jardim, sem saber o que eu diria ao chegar lá.

–Trouxe refrigerantes bem gelados.

Parei em abrupto, enxergando a cabeleira loira de Sarah.

–Não é melhor irmos embora? Quer dizer, sua mãe não vai acordar agora e esse ambiente não está te fazendo bem.

–Você pode ir se quiser. Eu vou ficar.

Notava-se o desagrado no rosto de Sarah, embora ela se esforçasse para mudar a expressão aborrecida.

–Ethan... Vamos ser sinceros, por favor. – Ethan a olhou, interessado. –Quando sua mãe vai ser transferida para uma clínica de dependentes químicos? – ele nada respondeu, ficara pensativo demais para dá uma resposta de imediato. –Você sabe... Minha família dá muita importância às aparências e... Eles não vão aceitar o fato de... Ah! Você sabe. – Ethan desviou o olhar para a rua. –Eu quero poder evitar certos conflitos.

–Se você se sente tão pressionada pela alta sociedade de New York, é melhor seguirmos caminhos opostos.

Tão surpresa quanto eu, Sarah o olhou indignada.

–Eu não estou insinuando que vamos terminar, apenas alertando sobre uma possível...

–Rejeição? – indagou Ethan, deixando-a muda. –Você já contou a seus pais sobre nós? – olhou-a. –Eu tinha certeza que não.

–Não é tão simples assim. Eu preciso prepara-los aos poucos, até ter certeza de que...

–Você está insegura sobre nós, nem mesmo teve coragem de enfrentar seus pais. Eu não quero te colocar contra a parede, tampouco usar comparações para te impulsionar a tomar uma decisão, mas... Minha irmã te odeia e não aceita nosso namoro, mas nem por isso me afastei de você.

–Eu sei, mas...

–Não vou mais cobrar uma posição firme de você Sarah, por isso vou te dá um tempo.

–Um tempo? O que acha que eu sou?

–É isso ou terminamos. Você escolhe.

–Você não tem o direito de me exigir isso. Por acaso já se esqueceu de que você não fez nada do que eu te pedir? Aquela mosca-morta continua na sua casa e eu não saberia disso se não a encontrasse aqui.

Estreitei os olhos ao ouvir sua ofensa, sem ter imaginado como ela me usaria para contornar aquela conversa.

–O problema não é meu se Claire ainda está na minha casa.

–Expulsa-a de novo ou quantas vezes precisar! – ela quase gritou. –Eu não quero você na mesma casa que ela, não depois daquele maldito beijo na boate!

–Foi um erro. Eu já pedir desculpas por isso.

Claro... Aquele beijo não poderia significar outra coisa senão um erro. Mas por que me doeu tanto ouvi-lo repetir a mesma coisa, que eu disse diversas vezes?

–Fiquei de almoçar com minha mãe. – Sarah olhou o relógio e se levantou em seguida. –Ligo amanhã.

Estiquei-me toda para não ser vista e só voltei a olhar quando o carro esportivo de Sarah deixou a frente do hospital.
Enfim, o momento de ir a Ethan tinha chegado, mas toda a inspiração que vi antes em mim tinha se evaporado. Resolvi deixa-lo sozinho e esperar pelo momento mais oportuno.

&&&&*&&&&

–O que você pensa quando escreve?

Megan se pendurou na cama, fazendo-me olhar para ela, acima de mim.

–Depende muito da situação que eu esteja no momento. Hoje, por exemplo, não foi um dia bom, então não estou inspirada a escrever coisas bonitas. – afastei o caderno de lado e deitei-me observando o rosto pensativo de Megan. –Eu nunca fui boa em me expressar e sentia muita dificuldade de falar as coisas que me vinham à mente, principalmente quando eu estava irritada, triste, ou solitária. Começou como um caderno de rascunho, que eu nunca deixaria alguém lê, até que se tornou em poesias e letras que dariam em música. Eu acho.

–Uh. E você já tentou escrever algo sobre sexo ou desejo sexual?

–Para! – acertei uma almofada em Megan, embora aquilo não fosse conter sua malícia.

–Se eu fosse escrever um livro, o conteúdo seria erótico. – ri alto com sua confissão. –Mas não seria um livro retratando apenas o sexo e o prazer, mas uma história ardente, que girasse em torno de paixões verdadeiras.

–Sabe que... Eu já pensei a mesma coisa?

–Oh! Claire Lewis pensando em erotismo? – indagou divertida e um tanto surpresa.

–Eu já li livros muito bom, tendo o sexo como o centro de uma relação bem sucedida.

–Eu nunca imaginei que você gostasse desse gênero de leitura.

–Acho que boa parte das mulheres gosta. – Megan sorriu concordante.

–Meninas! As pizzas chegaram! – gritou Nicholas do corredor.

–Estamos indo! – Megan olhou-me com cara de choro. –Estou de dieta, mas... Cara! É pizza! Mas que droga!

Megan estava fazendo uma grande tempestade por causa dos quilinhos extras que tinha ganhado. Além de jogar todos os anticoncepcionais fora, ela estava abusando das dietas milagrosas, graças às revistinhas de dois dólares.

–Você pode consultar um nutricionista ou poderemos correr juntas no Central Park, todos os dias de manhã.

–Eu aceito as corridinhas matutinas e o nutricionista, mas somente se não houver resultados com os exercícios.

–Tudo bem.

&&&&*&&&&

Aquela era a primeira vez que nos reuníamos na sala, em uma noite de sexta-feira, e debatíamos sobre o filme que assistiríamos. As pizzas estavam espalhadas por todo o canto, assim como refrigerantes, e cervejas. Também tinha pequenas porções de nachos, amendoins crocantes, e batata frita. Megan culpava Jason pela quantidade exagerada de guloseimas, por que ela se culparia depois de quebrar sua dieta rigorosa.

–Você é tão exagerado, Jason!

–Os fins de semana existem para isso, Megan. Não entendo o porquê de você está tão pirada com seu peso. Você está ótima, gata!

–Opinião de namorado não vale muito, pois vou achar que você só está sendo legal comigo.

–Eu sou um cara sincero, por isso não duvide do que eu falo.

Ao terminar de falar, Jason entregou-se ao primeiro pedaço de pizza, e gemeu satisfatoriamente ao saboreá-lo.

–Ação, terror, suspense, comédia, drama ou romance? – perguntou Megan.

–Por mim tanto faz, desde que apareçam peitos enormes na tela.

Ri do comentário de Nicholas.

–Eu gostaria que fosse comédia.

–Ótimo palpite, Claire! Estou com ela. – disse Jason.

–Eu também. – completou Megan.

–Tudo bem pra mim. – afirmou Nicholas. –E você Ethan?

Ethan estava concentrado na tela do seu celular e, em nenhum momento, interagiu com os demais.

–Pode ser qualquer um.

Ethan estava distante e aparentemente aborrecido. Nada naquela sala era do seu agrado, principalmente os momentos de discussão entre Megan e Nicholas ou Megan e Jason. Enquanto eles conversavam, concordavam e discordava, Ethan se via cada vez mais sufocado entre eles.

–Eu adoro esse ator!

–Qual é, Megan? Ele não tem nada de especial!

–Jason está certo! Vocês viram a expressão dele ao rir? Foi tão forçado que me constrangeu.

–Você nem sabe rir, Nicholas. Tá palpitando o quê?

–Estou avisando, Megan. Vou pegar no seu pé!

Ethan suspirou alto e rapidamente lançou um olhar revoltante para os outros. Sem nada a dizer ele se retirou da sala e bateu a porta ao sair. Aproveitando o barulho da balbúrdia, saí da sala e, ao fechar a porta, fiz o possível para não chamar a atenção dos outros.
Aproximei-me de Ethan, sentado na escada observando a rua. Era tarde para mudar de ideia, então só me restava seguir em frente, e rezar para que minha presença não o irritasse mais.

–Posso me sentar aqui?

–Uh. – murmurou ele, achando que eu entenderia o significado.

–Eu não entendi se é para sentar ou...

–O que você acha que é? – indagou olhando-me.

–Não acho que foi um sim, mas vou me sentar assim mesmo. – Ethan sorriu timidamente, desviando o olhar e, naquele momento, acabei me dando conta de que seu sorriso estava fazendo falta.

–Pensei que você me odiasse.

–E eu odeio, mas aprendi a não guardar mágoa. – seus olhos voltaram a focar os meus. –Toda a igreja ensina isso.

Falei como se fosse óbvio e, de fato, era.

–Uh. Que tipo de garota ainda frequenta igrejas? Aquelas que se consideram certinhas ou aquelas que querem ser certinhas?

–Que tal, aquelas que gostam de impressionar os pais ou apenas acreditam em Deus?

–Você acredita em Deus?

–Acho que sim. Você não?

–Não sei ao certo. – ele desviou o rosto, parecia pensativo. –Deixei de acreditar em muitas coisas.

–Eu o entendo. – Ethan voltou a me observar. –Eu costumava ‘sonhar acordada’, hoje mal consigo fechar os olhos e ter bons sonhos. Isso é tão estranho. – sorri timidamente, mas o momento de descontração foi quebrado pela seriedade de Ethan. –Eu sei que não temos nada em comum, tampouco um nível aceitável de amizade, mas eu quero que você saiba que... Você pode contar comigo quando achar que... – Ethan olhava-me aguardando a continuação daquela frase, dificultando minha desenvoltura.

–Você é uma garota muito estranha. – desanimada com sua sinceridade, baixei a cabeça. –Mas esforça-se para ser legal, o que a torna divertida, e um tanto confusa.

Minhas bochechas coraram, sendo inevitável esconder o grande embaraço que suas palavras me causaram.

–Acho que lhe devo desculpas pela forma grosseira que te tratei, mas entenda uma coisa. – ele fez uma pequena pausa, pensativo com o que diria. –Eu tenho meu estilo de vida e somente eu, me dou o direito de muda-lo. Você não pode chegar aqui achando que pode concertar erros ou dizendo tudo o que lhe vem à mente. Entende isso?

–Não muito. – suspirei. –Eu só estava tentando entender o que...

–Não tente me entender, é uma coisa inútil. – cortou-me adivinhando meus pensamentos.

–E se não for tão inútil como você diz? – perguntei desafiando suas convicções. –Eu disse que não temos nada em comum, mas não é verdade. O fato de termos que, carregar calados, grandes problemas nos torna bem parecidos. – Ethan nada disse, mas parecia aceitar minha observação. –Eu nunca contei aos meus amigos o quanto minha vida estava desorganizada e sem freio. Na verdade... Eles estavam tão ocupados consigo mesmo que não eram capazes de enxergar minha outra face. E eu vejo a mesma coisa acontecendo com você. – pausei respirando fundo. –As pessoas te cercam, mas não enxergam o lado vulnerável que você tanto camufla.

Visivelmente desconcertado, Ethan virou o rosto para outro lugar, e assim permaneceu por um bom tempo. Respeitei seu silêncio, sabendo que minhas palavras tinha conseguido penetrar seus sentimentos mais sensíveis.

–Se quiser conversar um dia, é só me dizer. – levei a mão no ombro dele, mas desisti no meio do caminho. –Eu vou voltar pra sala. – levantei.

–Claire!

Parei, ouvindo-o pronunciar meu nome. Virei-me para ele, voltando um degrau da escada, e seus olhos já estavam sobre mim.

–Obrigado.

Surpresa com seu súbito agradecimento, sorrir para ele e não mais tardei a entrar. Ao fechar a porta, encostei-me a ela, a fim de conter as batidas descontroladas do meu coração.

–Que sensação estranha é essa?

Algo como bem estar, importância, cumplicidade, e uma terrível sensação de que, a partir daquele dia, estaríamos cada vez mais próximos.

&&&&*&&&&

Como era de costume todas as manhãs, acordei, tomei banho, e voltei para o quarto. Megan se vestia preguiçosamente, pois tínhamos combinado de ir ao supermercado logo cedo, antes das nove horas.

–Foi dormir muito tarde ontem?

–Muito. Jason bem que tentou me arrastar para o apartamento dele, mas eu estava exausta. Ao contrário de nós, você dormiu cedo.

–Ainda não consegui deixar os velhos hábitos.

–Uh. – Megan olhou-me divertida. –Então você conseguiu conversar com Ethan?

Não pude evitar o sorriso bobo, nem as lembranças recentes da noite anterior.

–Ele é uma pessoa rígida consigo mesmo, mas não é difícil entender os motivos que o leva a adotar essa postura.

–Eu sei.

–Sabe que, no final de tudo, Ethan disse ‘obrigado’.

–Poxa! Você conseguiu mesmo penetrar aquele coraçãozinho de gelo. E, não rolou nenhum beijinho?

–Claro que não! – disse desconcertada e passei a dividir o espelho com ela.

–Mas aposto como sentiram vontade de se beijarem de novo.

–Quer saber? Vou te esperar lá fora.

–Não adianta fugir, senhorita Lewis!

Ao fechar a porta, sorri divertida achando Megan uma boba, pois eu ainda ouvia a continuação do seu discurso.
Sentei-me no último degrau de cima, da escada, e esperei por Megan. A rua era sempre sossegada aquele horário da manhã. Eu gostava de vê os comerciantes abrindo suas lojas e, até mesmo, a correria das pessoas indo para seus empregos.
Distraída com o clima, observei, sem interesse, um carro preto de luxo se aproximar lentamente. Assim que ele foi estacionado, o vidro escuro da janela foi baixado automaticamente, e o rosto de um homem apareceu.

–Estou procurando o Ethan. Você sabe onde ele está. Certo?

Ele sorriu, tentando ser simpático, e seus dentes de ouro brilharam contra a luz do sol.

–Err... – levantei-me sem saber o que dizer. –Quem é você?

–Eu sou o Crash. – fiquei surpresa ao saber quem ele era. –Vejo que você sabe quem sou.

–Não exatamente.

Dois homens altos saíram do carro e andaram na minha direção.

–Eu tenho muita urgência em falar com Ethan, mas ele é muito bom em desaparecer. Mas acho que, se a irmã dele estiver comigo, com toda a certeza ele virá me visitar.

–Esperem!

Meus braços foram agarrados.

–Sem gritos e escândalos, mocinha. – disse o homem que sorriu cinicamente. – Tragam-na para o carro.

–Sim, senhor.

Fui levada ao carro e convidada a entrar. Acabei hesitando e, amedrontada, lancei um olhar desesperado ao prédio.

–Temos pressa, garota. – disse um dos capangas, deixando sua arma na cintura à mostra.

Sem saída, acabei entrando no carro.


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