Dilema Platônico escrita por Metal_Will


Capítulo 19
Capítulo 19 - Antipatia




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    Miguel se senta timidamente do lado de Paula. Por um lado, era uma oportunidade e tanto poder conversar com Danieli naquele momento. Mas, por outro lado, o garoto não se sentia muito à vontade com aquela amiga do lado. Paula, por sua vez, também não parecia estar gostando muito da situaçã e Miguel sentia, de certo modo, uma certa reprovação vindo dela. Danieli estava bem ali, na outra ponta do banco, feliz da vida sem ao menos perceber nenhuma alteração no clima.
    - Ai, que sono - exclama Danieli - Ontem fui dormir tarde de novo
    - Sério?
    - Lá pela meia-noite e meia...estava ensaiando as falas de uma peça
    Meia-noite e meia, é? Bem, para Miguel, acostumado a jogar madrugada a dentro, ela dormiu até cedo.
    - É verdade, você disse que logo, logo vai encenar, não é? - comenta Paula, que, com Danieli, assumia uma postura bem mais gentil
    - Mais ou menos. Ainda tem uns dois meses de ensaio
    - Sobre o que mais ou menos é essa peça? - pergunta Miguel, procurando se mostrar o mais interessado possível. Paula sequer olha nos olhos dele e apenas escuta a conversa olhando para o horizonte do pátio. O que ela tinha contra ele?
    - É sobre uma moça que perde os pais num acidente. Como ela não tem outra família, precisa aprender a viver sozinha, sem os pais. Trata mais ou menos disso, de eventos capazes de mudar a vida de uma pessoa - a ruivinha explica com bastante empolgação.
    - Hmm..parece interessante - comenta Miguel.
    -  Quando a peça estrear você vai, não vai? - pergunta Danieli
    - Eu?
     Era isso mesmo? Ela estava fazendo o convite?
    - É. Você. Quero te ver lá
    Miguel nunca gostou de prometer sua presença nos lugares. Mas, nesse caso, não importava o dia que fosse, ele daria um jeito. Afinal de contas, ele era, como o próprio Leandro gostava de brincar, um vagabundo. O dia que fosse, seria. Apesar de teatro não ser um dos programas preferidos de Miguel.
    - Bem, farei o possível para ir.
    - Você não gosta de teatro?
    - Eu? Claro...claro que eu gosto...
    Como ele poderia responder algo diferente?
    - Você não parece muito animado. Diz que você vai, sim. Seja firme!
    "Farei o possível para ir", pensa o rapaz, "oh, por que sempre tenho que dar respostas assim?"
    - Eu vou, eu vou, sim
    - Aí. Assim é que se diz. Convide a Camila e o Leandro também. Eles vão gostar
    Sobre a Camila era certeza que sim, mas quanto ao Leandro...eventos culturais não eram muito a cara dele.
    - Bem, eu aviso para eles
    - Avisa sim. Eu sei que a Paulinha já marcou presença, né?
    Paula faz um sinal de positivo com a mão.
    - E a Sandra também deve ir..pena que não deu as caras hoje.
    - Ela disse que não estava se sentindo lá muito bem...mas, você sabe, ela fica no computador por muito tempo - comenta Paula
    - Ah, é verdade. Ela fica online direto!
    - E o mais engraçado é que eu uso óculos e ela não
    - Ela deve boicotar o oculista, não é possível!
    Isso Miguel não podia opinar. Bem, Danieli entrou na escola naquele ano. Tanto Sandra, quanto Paula já estudaram na mesma sala de Miguel antes, mas ele nunca tinha tido muito contato com nenhuma delas. Sabia apenas que as duas já eram amigas há algum tempo. Nenhuma das duas era de falar muito em sala, mas, das duas, Sandra era relativamente mais extrovertida.
    - Vocês não vão comer nada?
    - Bem, não tô com fome... - diz Miguel
    - Tenho um pacote de bolachas aqui. Aceitam? - diz Paula, abrindo o pacotinho de bolachas que estava segurando já há algum tempo (o que Miguel mal tinha reparado)
    - Não, não precisa. Eu já vou comprar alguma coisa - diz Danieli, contando algumas moedinhas que tinha na bolsinha - Será que a fila da cantina tá muito grande?
    Miguel dá uma olhada geral na cantina, localizada bem no lado oposto de onde estavam
    - Não. Não parece ter muita gente, não.
    E realmente não tinha.
    - Sério? Bem, então eu vou lá rapidinho comprar alguma coisa e já volto.
    Vontade de levantar e ir junto com ela não faltou. Mas a ruivinha já tinha saído correndo. E esse nem era o problema maior: agora ele teria que ficar sozinho com a Paula, que, por sinal, não estava com cara de muitos amigos.
    - Quer uma bolacha? - pergunta Paula, sem ao menos olhar nos olhos dele.
    - Não, não, obrigado
    Ela não fala nada e continua comendo. Surge, nesse momento, o que se chama de silêncio constrangedor. Às vezes, não se passa por constrangimentos apenas por falar algo: não falar também pode ser constrangedor, por mais paradoxal que isso possa parecer.
    - Quente hoje, né? - comenta o rapaz
    Falar do clima. Mais clichê impossível.
    - Sério? Tô achando até que tá bem fresquinho...vai chover à tarde - comenta Paula, comendo uma bolacha, e sequer olhando para a cara de Miguel
    O garoto volta a ficar em silêncio por alguns instantes. Qual o problema daquela menina? Era como se estivesse ignorando a presença dele. Miguel estava começando a se irritar. Ela se sentia tão superior para agir daquele jeito? O silêncio continuava. Miguel limpa os óculos, olha para o chão, vê as horas no celular. Já estava começando a ficar irritante de novo. Miguel resolve puxar algum assunto de novo.
    - Acho que meu celular está um pouco adiantado...que horas são no seu?
    - Dez e meia
    - É...uns dois minutos adiantado. Obrigado
    Ela não fala nada de novo. Danieli já estava demorando. Quando Miguel, após olhar para o celular mais alguma vez, vira o olhar para Paula, como se fosse querer falar alguma coisa, ela o interrompe.
    - Se você não quer falar nada, então não fala. Não precisa ficar falando comigo toda hora.
    - Desculpa
    Ela para de falar de novo. Naquela hora, Miguel tinha certeza de que Paula não foi com a cara dele. Uma garota de cabelos castanhos lisos, amarrados em rabo de cavalo, óculos leves e algumas pulseirinhas. Olhando de perfil, até que era bonitinha. Mas, aquela implicância não estava bem explicada. Apesar do aviso seco da garota, Miguel resolveu se arriscar mais um pouquinho
    - A Dani tá demorando, né?
    - Mas ela acabou de sair
    - É que a fila tá curta. Já deveria ter voltado   
    - Ela pode estar esperando terminar de assar algum salgado ou algo assim.
    - Hmmm
    Parece que mais um momento de silêncio estava prestes a acontecer, quando Paula resolve, enfim, falar alguma coisa.
    - Escuta. O que você quer com a Dani, heim?
    Miguel se arrepia com a pergunta. Por que diabos ela estava perguntando aquilo?
    - Como assim?
    - Eu estudo com você há algum tempo. Você nunca sequer falava com outras meninas. Ou melhor, você não falava com ninguém. Agora está aí, querendo ser amiguinho dela do nada? Alguma coisa deve ter
    - N-Não...não estou querendo nada, eu...
    - Ah, vá - ela come mais uma bolacha - Você é homem. Pensa que eu não sei o que você quer?
    A moça falava em um tom sério e reprovador. Aquilo já estava ficando ofensivo. Sem muita saída, Miguel acaba cedendo.
    - E se eu te dissesse...que eu gosto dela?
    Ela dá uma risada cínica
    - Você e ela? É isso mesmo que eu ouvi?
    - É verdade. Eu gosto dela e...
    - Gostar...gostar...isso é o que pelo menos você pensa agora
    - Como assim?
    - Você diz que gosta dela, não é? Tá bom. Então, se vocês ficassem juntos, você estaria disposto a levar esse compromisso em frente?
    Miguel exita um pouco, mas responde.
    - É claro. Se ela aceitar...
    - É o que todos dizem
    Miguel não estava entendendo nada.
    - Desculpa. Onde você quer chegar?
    A garota termina de comer mais uma bolacha e, sem olhar para Miguel, começa a falar
    - Eu já namorei um cara, por quase um ano. No começo, ele vivia dizendo que gostava de mim e tal; beijinho de um lado, carinho do outro e assim vai. Mas ele não se importava nem um pouco com as coisas que eu gostava. Tudo tinha que ser do jeito dele. Tudo tinha que ser o que ele escolhia. Nossos gostos não eram nada comuns.
    - Nada comuns? E como vocês começaram a namorar?
    - Aí é que está. Do jeito que ele falava, parecia que ele tinha os mesmos gostos que eu. Mas, no fim, era tudo mentira
    - Mentira? - diz Miguel, já meio preocupado.
    - Por exemplo, eu gosto muito de ler livros de suspense...e, quando a gente se conheceu, ele também disse que gostava
    - Hmm
    - Mas, foi só a gente começar a namorar, para eu descobrir que, no máximo, ele leu um livro da Agatha Christie e já dizia ser fã
    - Acho que entendi
    - Olha, depois desse relacionamento, aprendi que homem não presta mesmo. Vocês querem mais é agarrar e beijar na boca, sem nem se preocupar com as outras coisas. Como você quer namorar alguém com base em mentiras? Como você quer que a pessoa te aceite por algo que você não é?
    A revelação de Paula pareceu bastante sincera. Então, ela já tinha namorado antes, mas o cara mentiu sobre si mesmo só para conquistá-la. Será que Miguel também estava sendo esse tipo de patife? Não, não pode ser. Não era bem vontade de agarrar e beijar Danieli. Miguel sabia que era algo mais amplo. Ele sabia que não estava no primeiro nível do amor platônico. Mas, parando para pensar, ele viu que realmente poderia acabar mentindo para Danieli. Afinal, seus gostos não eram parecidos. Será?
    - Eu bem que suspeitei que você está de olho nela. Mas, sinceramente, não sei te dizer o que ela falaria: ela é muito tímida pra esse tipo de assunto
    Miguel continua sem falar nada
    - Só te peço para não acabar decepcionando a Dani. Ela é uma pessoa muito legal que não merece passar por isso
    - Que é isso? Eu não vou decepcionar ninguém
    - Sei...olha, eu sempre te achei meio esquisito. Tô de olho em você. Se você aprontar alguma com ela...você vai ouvir...
    Ótimo. Danieli podia não ter namorado, mas tinha uma amiga de cão de guarda. Por que isso tinha que acontecer?
    - Ufa. Cheguei. Desculpa, gente. Estavam terminando de assar esse pãozinho - diz Danieli, chegando apressada da cantina - Alguém quer?
    - Não, não obrigada. Talvez o Miguel queira.
    - Quer Miguel? - oferece Danieli
    - Não, não...obrigado
    - Também não gosta desse tipo de pão? É tão gostoso
    Miguel olha de lado para Paula, que estava sorrindo disfarçadamente.
    - É que...eu não estou com fome mesmo...


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