–Eu tenho dupla personalidade. – eu disse relutante. – Mas nunca é bom falar sobre ela.

–Como é, quando ela assume? – disse o meu psiquiatra, monotonamente, sem parar de anotar.

–É como se houvesse uma barreira e ela a quebrasse. Uma guerra mental pelo controle.

–Hm... E como você se sente sobre isso? – disse ele mecanicamente, mas já levantando os olhos para mim.

–Eu? Só sei que quando ela assume, eu não consigo pegar o controle de volta tão cedo. Ela é maligna, terrível, assustadora.

–E você não é? – disse ele já mais interessado.

–Eu diria que sou o oposto dela. – eu disse, suspirando, já vendo o rumo que aquela conversa ia tomar.

–Vocês conversam?

–Nós discutimos. Muito.

–Posso falar com "ela"? – ele perguntou erguendo as sobrancelhas.

–NÃO. – respondi já sentindo ela forçar a barreira, me encolhendo na poltrona em que eu estava sentada.

–Calma, Lyla, relaxe. Está tudo bem... Deixe a sair... – e foram precisas apenas essas palavras para agita-la. Então não consegui a conter. O escuro começou a tomar conta de mim, e eu me sentia voando. Eu via e sentia tudo como antes, mas não estava mais no controle. Ela estava.

Três horas depois.

"Dr. Jhon Stander, psiquiatra renomado da instituição Maverick Maclein (MM), foi encontrado hoje, as 21:30, torturado a mãos frias. A denuncia foi feita anonimamente por um garota, que parecia ser sua paciente, segundo a secretária do mesmo, que havia saído mais cedo aquela noite. A denunciante saiu do local antes da chegada da policia, e é a principal suspeita.

O crime brutal foi cometido cruelmente. Jhon foi encontrado sem sua língua, mãos e pés. Não sabemos o motivo dessa cruel tortura. O psiquiatra não corre risco de morte, mas ele e sua família estão bastante abalados.
Temos a informação de que crimes parecidos ocorreram em várias outras cidades. Pessoas diferentes, de profissões diferentes vem morrendo a cerca de 1 ano. Talvez juntando essas informações a policia chegue em algum lugar.”

Eu suspirei. Isso foi dessa vez, mas eu não fazia ideia de como poderia ser na próxima. Continuei fitando o holograma atrás da vitrine da loja, sem escuta-lo mais. Peguei o jornal que estava debaixo do meu braço. Não haviam se passado nem três horas e todos os jornais já falavam sobre essa noticia. E pelo que eu pude ver, a policia já havia começado a investigar. Parece que iriam pedir até a ajuda de um detetive, já que não havia sido o primeiro crime daquele tipo.

Olhei a data no jornal. Era dia 02 de Julho de 2178. Um dia antes do meu aniversario de 15 anos.

–Vai ser um péssimo aniversario... - Ajeitei a mochila em minhas costas, coloquei os fones da velharia do meu iPod no ouvido e fui andando para a estação de trem, cantarolando uma musica antiga chamada Radioactive.