- Se você ficar, pode ter certeza que eu vou fazer o que for preciso para que não se arrependa. Eu sei que é difícil confiar em mim, mas... – suspirou, soava muito verdadeiro, o que estava me deixando ainda mais indecisa. - Acredite ou não, tudo o que eu disse pra te ofender era mentira. Você foi a primeira pessoa que eu consegui confiar e desejar mudar, só para ter por perto. Você me fez questionar quem eu realmente era, no que eu me tornei, no que eu sou... Eu sinto que sou diferente quando estou com você, eu sou... Melhor. Se decidir ficar comigo, vou fazer o possível para que não se arrependa do que fez.

 - Eu preciso de um tempo.

Dei as costas, agoniada, respirei densamente, procurando me estabilizar emocionalmente, depois de todas aquelas propostas inesperadas.

 - Preciso pensar, não posso me decidir tão rapidamente, eu...

 - Quanto tempo? - indagou. – Não me importo em esperar.

 - Hoje à noite eu tomo a minha decisão.

Respondi, num suspiro inseguro. Anthony me fitou um tempo em silêncio, e em fim concordou:

 - Tudo bem.

Saiu da sala, caminhando calmamente.

Mas eu não estava nem um pouco calma. Haviam duas faces na minha mente, me atormentando, lutando para tomar seu espaço.

Uma delas, era a face doce e protetora de Kyle. O meu melhor amigo de infância, a pessoa que sempre tive ao meu lado. Com seus cabelos castanhos de cachos bagunçados, os olhos cor de mel, sempre confortadores. Que sempre tinha uma palavra de apoio e além de ser meu namorado, era um companheiro, para todos os momentos. Uma figura confiável, amigável e feliz.

Enquanto pensar em Anthony, me fazia soltar o meu mais intenso riso abafado e sarcástico. Era totalmente o oposto de Kyle, era perigoso, sublime, instável.

Anthony era capaz de lançar as suas piores palavras e transformá-las na mais rica sedução. O seu olhar era feroz, a sua aparência era tão bela, quanto a sua personalidade era deformada.

E tanto que era difícil de entender, que os meus sentimentos também se tornavam conturbados, desarranjados. Não sabia como definir o que realmente sentia por ele.

 E a pior parte, era que essa se tornava a melhor delas. O quanto a incerteza de estar com ele me deixava em total êxtase. A expectativa sobre o que iria fazer, qual atitude iria tomar, me deixava envolvida. O jeito que me irritava, podia me levar a socá-lo, e ao mesmo tempo me jogar em seus braços rígidos, enlouquecida.

Quando ele chegava perto, meu corpo todo se exaltava. Minha mente não conseguia distinguir o certo do errado, e isso por muito tempo havia sido algo ruim para mim. Mas agora, eu percebia que gostava.

Gostava a ponto de não me imaginar mais estar longe daquela sensação. Me sentia insana.

Insana porque gostava da sua perversidade, e isso me tornava um tanto masoquista.

E por isso era difícil me decidir. Era complicado aceitar o fato de que estava desejando embarcar na loucura de deixar a segurança para trás para viver aquela imensidão de dúvida com o Anthony.

Não sabia nem mesmo se era paixão, se era desejo... Só sabia que era forte, e só agora eu notava que me consumira desde o início.

Mas era complicado me entregar aos riscos, saber que quero correr esses riscos.

E Kyle, quando pensava em abandoná-lo, sentia um aperto no peito. Como poderia me desfazer tão facilmente de alguém que significa tanto? Não era justo, nem certo, mas... Aquele energúmeno tinha razão, eu precisava correr riscos para minha própria felicidade, precisava disso, precisava cometer um ato insano, uma vez na vida.

E por incrível que me parecesse, esse ato seria ele. Eu o queria, estava decidida. Eu abriria mão das seguranças, para viver aquela loucura com Anthony.

****

Eu fui até o jardim. Os jardins me lembravam Kyle, e eu sabia que dali à alguns dias, eu precisaria contar toda a verdade para ele.

Não seria justo traí-lo daquela maneira, mesmo que no fim das contas eu me desse conta que não amava Anthony, voltar para Kyle como se nada tivesse acontecido por estar arrependida seria a forma errada de resolver as coisas. Doía no peito, sentia medo do arrependimento, das frustrações que poderia sofrer.

Estava tentando ser corajosa. Eu iria conseguir, só precisava de tempo para absorver tudo que estava acontecendo.

 - Você está bem?

A voz de Anthony entoou no ar, preocupada. Olhei para trás e vi sua figura um pouco apreensiva, com as mãos no bolso.

 - Não sei.

Admiti num suspiro, virando para frente e encarando o lago em frente. Havia me sentado em um banco em frente para jogar pedrinhas, o que eu fazia para me distrair ali desde que cheguei. Sempre que precisava de um tempo para mim. Mas aquilo não estava funcionando muito bem para me acalmar daquela vez.

Até porque, eu olhava em volta e ao notar que estava num jardim, flashes do rosto de Kyle me agonizavam. E a dúvida sobre se eu estava tomando a atitude certa me invadia novamente.

Anthony chegou perto devagar e sentou-se do meu lado. Continuei olhando em direção ao lado iluminado pelas luzes noturnas, perdida em pensamentos.

 - Você tomou sua decisão, não foi?

Quis saber, cauteloso com as palavras. Era a primeira vez que não demonstrava vergonha em não desejar me ofender.

 - Eu fiz. – respondi, numa baforada densa e cheia de tensão. Fitei seus olhos sobre os meus. – Só não sei por que tomei essa decisão.

Ficou um tempo em silêncio, fugiu do meu olhar para disfarçar o quanto estava nervoso pela minha resposta:

 - Posso saber qual foi, então?

 - Por que eu escolhi ficar com você? – sussurrei, um pouco constrangida. Desviei o foco, incerta. Anthony começou a curvar um sorriso torto irresistível de satisfação. – Não faz o menor sentido, eu... – hesitei, pairei antes que falasse algo muito rude. – Por favor me diga que não vou me arrepender.

Fitei-o fixamente, suplicante. Queria que entendesse quanta confiança estava depositando nele.

Ele deu uma risada abafada e boba de felicidade, não conseguir evitar em admirar suas feições enquanto ria, era quase que um anjo rebelde.

 - Eu não me deixaria perder você. – respondeu, depois de um longo silêncio, passando os dedos suavemente no meu rosto. Umedeceu os lábios encarando meus lábios apetecido, começou a chegar perto para me beijar e confesso que estava querendo muito o seu beijo. Precisava fazer algo que me lembrasse do porquê estava fazendo tudo aquilo. Me lembrar daquele sentimento que nos envolvia. – você é a primeira garota que eu realmente quero ficar, e não posso me deixar estragar tudo. Foi preciso vinte e quatro anos para encontrar você... Acho que já esperei de mais para isso.

Eu quis tomar a atitude dessa vez, mordi o lábio e segurando na gola da sua camisa eu puxei ele para beijá-lo, estava muito ansiosa para ter aqueles lábios nos meus de novo. O seu hálito me deixava em êxtase, esquecia de todas as coisas ruins que estavam acontecendo em segundos. Só podia sentir o prazer de seus lábios movendo-se com os meus em perfeita sintonia e desejo.

Quando nos afastamos, não o fizemos completamente, Anthony permaneceu o rosto junto ao meu, ofegando para recuperar o fôlego.

 Seguiu-se um silêncio, faltaram as palavras, só conseguíamos sorrir feito bobos. Quando Anthony se manifestou, fazendo graça:

 - Aposto que não sabe fazer a pedrinha dar três pulos na água.

Tocou a minha mão, tirando uma das pedras que eu segurava. Eu dei risada, da mudança repentina de assunto da situação.

Se levantou e com a pedra na mão ele instruiu:

 - Precisa deixar a mão firme e...

Arremessou a pedra, que deu três toques na água antes de afundar.

Bati palmas enquanto ria, parabenizando.

 - Obrigada, eu sou mestre em arremessar pedrinhas.

Fez graça, com sarcasmo. Me levantei e fui até ele.

 - Você é mestre em jogar polo, esgrima, golf... E arremessar pedrinhas. Suas habilidade são muito diversificadas.

Brinquei. Ele abriu um sorriso torto.

 - Acho que nossos pais iam adorar saber que você mudou de ideia sobre mim... E que nós estamos dando certo. – lembrou. – Quer contar para eles?

Pegou na minha mão, atencioso.

Respirei fundo. Meu pai a maioria das vezes errava nas suas decisões sobre minha vida, mas daquela vez, talvez tivesse acertado, em fim. Depois de tantos erros, o que eu achei ser o maior deles era apenas a maior oportunidade que já tive de questionar todas as minhas escolhas.

Achei que meu amor por Kyle fosse suficiente, mas... Talvez Anthony tenha me provado que não. Ele significava muito, mas, não era uma paixão tão forte quanto eu poderia ter com outra pessoa.

 - Acho que quero.

Assenti.

Fomos andando até atravessar todo o jardim e entrar na casa. Nossos pais estavam reunidos na sala de jantar, comendo.

Assim que entramos houve uma certa mudança na feição deles. Pois estávamos abraçados e parecíamos muito mais próximos do que havíamos demonstrado durante todo aquele tempo.

Quando tudo aquilo começou, os Chavalier estavam esperançosos que nós pudéssemos acabar nos gostando, mas com o passar do tempo, eu podia notar que a face deles demonstrava desestímulo, depois que viram que passaram semanas e nada havia mudado entre nós e continuávamos muito indiferentes.

Quando aparecemos abraçados podia ver que seus rostos se iluminaram de novo. E me pai e minha mãe inflaram o peito de satisfação.

 - Temos um comunicado a fazer. – Anthony contou. Todos nos encararam, atentos. – Eu e Anna passamos a gostar um do outro. – eu corei, escondi meu rosto, era embaraçosa toda aquela cena e o jeito que nos olhavam. – E estamos namorando.

Assim que terminou de fazer o comunicado, uma onda de risos e palmas de comemoração vindas deles soou alto na sala. Falavam por cima dos outros, contentes.

Continuei desconfortável por uns instantes, ouvindo seus parabéns. Quando nos sentamos, minha mãe ainda disse:

 - Eu te disse filha, tudo ia dar certo.

Sorrindo, maravilhada. Assenti, ainda encabulada.