Após a pergunta de Lucy um silêncio pesou sobre eles, quebrado ocasionalmente pela respiração descompassada de Sting. O loiro fitava a parede defronte a cama, enquanto Lucy lhe olhava atentamente. Ela relembrava cada palavra que ouvira durante anos na escola preparatória de Crocus e também em seu serviço, sobre os procedimentos diante alguém com sintomas. O primeiro, e mais recomendado – até mesmo no velho folheto sobre adquiridos e como agir nesse caso – era levar a pessoa que teve um sintoma ao terminal de verificação. E era exatamente nisso que Lucy estava pensando enquanto olhava o rosto pálido de Sting.

Ela determinada se levantou, Sting a seguiu com o olhar. Rapidamente a loira estava devidamente vestida com um traje branco e azul. Sting continuou na cama, olhando-a como se estivesse apavorado. Olhava-a como se Lucy fosse o próprio pesadelo que tivera há pouco.

–Temos que ir ao terminal de verificação da cidade. – sentenciou.

–Não, eu não adquiri Lucy, o que eu tive não foi um sintoma. - disse ele firme.

A loira lhe olhou duramente e deu um passo para se aproximar mais dele.

–Não foi? – indagou duvidosa. – Realmente pode garantir que não foi? – desafiou.

Sting ficou um tempo em silêncio sem olhar diretamente para ela. Lucy o olhava com a certeza que tinham que ir ao um terminal de verificação, era assim que o Sistema orientava a todos e assim tinha que ser feito, mas caso Sting não colaborasse, a loira não via problemas algum de acionar a guarda da região afastada.

–Eu... – começou ele. – Não é necessário. – ele se levantou agilmente. – Sei quais são as minhas obrigações, Heartfilia.

Lucy sustentou o olhar dele, o loiro parecia o velho Sting de sempre, o Agente Elite frio e fiel ao Sistema, qual sempre comandava com rigidez os agentes do Além.

–Fico feliz em ouvir isso. – disse ela por fim. – Estarei lhe esperando na sala. – e se retirou do quarto.

Lucy se sentia estranha em falar essas coisas, em fazer exatamente as coisas como elas deveriam ser feitas, mas o Sistema nunca errava e por isso tinha que confiar nele, se era orientado levar alguém com sintomas até um terminal de verificação, assim tinha que ser feito. Entretanto algo dentro da loira gritava com angustia, algo que ela reprimia com fervor.

Assim que chegou a sala, ela se sentou calmamente na poltrona, o amanhecer penetrando pela fresta da cortina, iluminando a escuridão que sala estava entregue. Lucy sabia que dia antes estaria próxima a sacada, abrindo satisfeita a cortina dessa e as portas, para então contemplar com entusiasmo tudo aquilo, entretanto não era isso que ela queria fazer naquele instante, na verdade nem conseguia entender porque antes deseja tanto por aquilo. Era tão desnecessário. Algo que o Sistema não achava valido, por isso ela não compreendia como e porque pensara em tais bobagens.

Você estava tento sintomas. Pronunciou em pensamento. Ela ignorou aquilo, desconhecia isso, não porque não sabia desse fato, afinal não tinha não saber, o caso é que ela não queria mais pensar daquilo, não queria mais admitir que sintomas lhe dominassem, já que esse sempre ia contra o que o Sistema orientava, e ela não precisava dessas coisas. E sabia que Sting também não, por isso o melhor que faziam era ir ao terminal de verificação e colocar um basta naquilo tudo.

Ele será mandando para região afastada. Novamente sua mente se pronunciou. Lucy respirou fundo, tentando controlar-se. Logicamente que, caso confirmado que Sting adquiriu ele seria mandando para Região afastada, era o melhor para todos, para todos dentro do Sistema, para ela, e principalmente para ele. Havia relatos que alguns sistemáticos adquiridos conseguiram se recuperar tempos depois que foram mandados para a Região afastada... Sem falar dela própria, Lucy sabia que havia de alguma forma, dominado os sintomas, e poderiam perfeitamente fazer o mesmo com Sting, era só questão de cooperação e o Sistema realizaria todo que fosse necessário para o bem de todos.

Ele simplesmente será mandando. Lucy olhou em direção ao corredor, respirando fundo, ela não poderia deixar-se levar por aquilo, não mais. Levantou-se e seguiu de volta para o quarto.

Ele será mandando para lá. A mente perturbada continuava.

–Sting? – chamou afim de calar sua mente.

Mas o silêncio como resposta lhe deixou mais frustrada. Ele será mandando para lá.

–Sting?- chamou novamente já na porta do quarto.

Lucy olhou surpresa o cenário incomum. As portas do guarda-roupa estavam abertas, e suas roupas e de Sting estavam jogadas no chão, sobre a cama encontrava-se uma mala simples, já lotada de roupa. Sting apareceu, segundos depois, saindo de dentro do banheiro devidamente vestido.

–Para que a mala?

O loiro não respondeu, seguiu para perto da cama e com dificuldade fechou o zíper da mala; Lucy o observava atenta, imaginando que ele, tal como ela, suspeitava que fosse mandando para a região afastada, e por isso já se preparava para o inevitável. Aquilo, por alguma razão desconhecia, a incomodou terrivelmente. Sem entender o porquê, ela avançou porta adentro, e segurou a mão dele, que ainda estava sobre a mala, e o encarou.

–Dará tudo certo, sei que dará.

Quis completar com o Sistema não erra, mas seu coração disse que não era para utilizar desse termo, Lucy começava a se sentir confusa com isso, seu lado racional sabia que sua atitude não era certa por alguma razão – talvez o Sistema não quisesse que ela o apoiasse – mas seu coração gritava para seguir assim, para demonstrar que estava ao lado dele.

–Não dará. – disse friamente.

Rispidamente ele tirou a mala de cima da cama afastando Lucy de si. Sting em passos duros saiu do quarto, Lucy continuou parada próxima da cama, ainda analisando o conflito que estava acontecendo dentro de si. Diante a um fato assim, ela por orientação do Sistema teria que segui-lo e garantir que fosse até um terminal de verificação, porém algo dentro de si dizia apenas para deixá-lo ir.

Ela virou o rosto em direção a porta, os passos de Sting cessaram, certamente ele já estava perto da porta de saída, ela como um agente do Além, uma sistemática fiel ao Sistema, deveria ir até lá e persuadi-lo. Tinha que garantir a perfeição dentro do Sistema. Entretanto ela ficou parada olhando o nada, esperando que ele seguisse com seu plano, não importasse qual fosse esse.

‘Todos, criança, adultos e principalmente os funcionários diretos do Sistema, em nome da perfeição deste, e para mantê-la. Precisam lhe ser fiel, seguir as orientações..,’

Lucy não podia, de forma alguma, deixar de cumprir com seu trabalho, ela teria que garantir a ordem dentro do Sistema. Teria então que fazer com que Sting, como um agente Elite, seguisse fielmente as orientações. Fosse por vontade própria ou não.

Em passos apressados a loira deixou o quarto, passou rapidamente pelo corredor e entrou na sala abruptamente, Sting estava na porta, e essa já estava aberta.

–Você irá ao terminal de verificação, não vai? – questionou Lucy.

–Porque quer saber? Acha que estou fugindo? – a olhou em desafio.

–Na verdade não pensei nisso. Afinal um agente Elite nunca deixaria de cumprir seu dever, não é mesmo?

–Porque é assim que o Sistema ordena, não é?

–O Sistema apenas nos orienta, e por suas orientações não terem erros, que devemos segui-las.

Sting deu um sorriso de lado e depois saiu do apartamento, Lucy mais que depressa o seguiu. O loiro seguia em passos calmos em direção ao elevador, apertou o botão deste e voltou-se para a loira, que estava alguns passos dele.

–Suas palavras são treinadas e repetitivas.

–Isso porque não há necessidade de novas palavras, uma vez que as velhas e sábias frases utilizadas pelo criador do Sistema, são vívidas até hoje. Reais e suficientes para o nosso cotidiano.

–Entendo.

As portas do elevador se abriu, Sting adentrou, sendo seguido por uma Lucy agitada.

– Você irá ao terminal de verificação, não é? – repetiu.

Sting observou a porta do elevador se fechar, e ficou o encarando por um longo tempo, já estavam próximo ao térreo, quando ele se virou para Lucy. A loira o olhava com dureza, distinta a mulher assustada de dias antes.

–Caso eu não ir, o que pensa em fazer?

Lucy levantou sua mão esquerda um pouco abaixo de seu queixo e seguiu com a mão direita para perto da parte inferior de sua palma, encarando o loiro.

–Acionarei o Sistema. – alertou.

–Obvio. – declarou ele. – E eficiente. Mas somente será assim, se realmente fazê-lo.

–Dúvida?

Sting não respondeu, assim que abriu as portas do elevador ele saiu deste e seguiu para a saída, ainda com Lucy atrás de si.

–Não vai acionar? – provocou ele, quando já estava a um passo de sair do prédio. – Pois posso muito bem ir para qualquer lugar, a partir do momento que sair deste lugar.

–Você não fará isso.

–Veremos. – e saiu do prédio.

Lucy continuou a segui-lo, o loiro foi até seu carro estacionado, onde deixara quando chegaram de Magnólia, e entrou neste, Lucy parou ao lado da porta do passageiro, a espera que Sting abrisse a porta, mas o loiro não fez.

Frustrada com a situação, ela seguiu para o lado do motorista, ao fazer isso, Sting simplesmente arrancou com o carro dali, seguindo em direção oposta que ficava o terminal de verificação de City of Era.

Lucy ficou um tempo parada na calçada, olhando a rua desprovida de carros, e agitada de pedestre, apesar de ainda ser cedo. Olhava aquele cenário de modo desolador, tentando compreender o que se passara, como poderia encarar aquilo.

Uma fuga. A primeira fuga. Concluiu apavorada.

Olhou para a palma de sua mão esquerda, tremendo, o conflito novamente estava crescendo dentro de si. Devo ou não acionar?

Voltou a olhar o caminho que Sting pegara. Lucy não conhecia City Of Era, somente pelos mapas, e caso ela não estivesse enganada o caminho que Sting pegara, não só era o oposto do terminal de verificação, como também ligava a outra cidade, qual Lucy sabia, pelos seus treinamentos, foi o palco número um da resistência dos adquiridos, no tempo que o Além do Sistema estava em experimento. Um lugar que somente alguns agentes sabiam possuir uma estrada que levava a uma antiga cidade – já desativa – mas que alguns ainda acreditam possuir resistentes - quais nunca foram encontrados.

Lucy voltou a olhar a palma de sua mão, pensando em deixar aquilo de lado, e fingir que não presenciara tal evento, mas seus ensinamentos não a deixaram seguir com isso, e num rápido movimento ela apertou sua mão exatamente no local do chip. Afinal ela sabia que o Sistema não erra...