Eskalith escrita por haru


Capítulo 17
Imagens


Notas iniciais do capítulo

Nem vou pedir desculpas pela demora.. porque não tem como perdoar.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/345313/chapter/17

A luz do sol que entrava pelas brechas da janela me despertou. A sensação que tive era de ter dormido durante décadas, e levei um tempo muito grande para me lembrar onde exatamente estava.

De repente tudo pareceu tão estranho para mim, me encontrar deitado no chão entre alguns cobertores mofados e tantas tralhas amontoadas em cantos e objetos enfileirados em prateleiras velhas. Coisas que eu não havia reparado na noite passada pareciam ter sido plantadas do nada, e eu me incomodei um pouco com isso.


O quarto onde Suzuno dormia parecia diferente de dia, onde as coisas podiam ser enxergadas direito. Como o tom de parede azul-celeste tão desbotado quanto a parede velha de meu apartamento. Os moveis eram limpos e tinha uma certa organização nos objetos, por mais que parecesse impossível arrumar alguma coisa naquele lugar. A ausência de moveis, que levou Suzuno a empilhar caixas velhas para colocar suas coisas, e os vestígios de limpeza nos vidros das janelas – isso das quais não haviam sido pregadas pedaços de madeira e lonas para tampar os buracos. Tudo me dava uma sensação esquisita, de pena ao mesmo tempo com um certo encanto.


Eu nunca poderei realmente explicar o que estava sentindo.


Levantei-me zonzo e observei o quarto por alguns minutos antes de me dirigir até as fotografias. Elas estavam penduradas em uma espécie de varal por toda uma parede – fora algumas que foram coladas na própria, junto a alguns recortes e desenhos. Eram em boa parte fotos antigas e muitas haviam vestígios de queimadura, como se houvessem sido salvas da destruição certa.


A primeira que notei era uma mulher de cabelos longos e brancos. Ela exibia um sorriso sereno, que me fez pensar que era uma mulher muito elegante, ao mesmo tempo, gentil.

Ao passar por outras fotografias, pude ver que ela estava em algumas outras. Sentada em uma cadeira em frente a praia, com um vestido branco, ou em um sorriso tímido enquanto abraçava uma criança.


Eu nunca esqueceria aquele sorriso. O mesmo da foto que eu havia encontrado a alguns dias atrás. Ela só podia ser a mãe de Suzuno.

Seu pai, aparentemente, não estava em nenhuma outra. Assim como a única foto dela grávida era uma em que aparentemente havia sido jogada numa fogueira e recuperada na hora certa. Assim como eu não havia visto nenhum bebe em nenhuma das outras.


Fotografias de Suzuno na escola eram poucas e muitas vezes ele não passava de uma figura no meio das outras. Um garotinho tímido e sorridente nas primeiras, e depois cada vez mais serio conforme eu ia avançando. Havia também imagens de Kurione pequena, e algumas pessoas desconhecidas. Nos recortes de jornal, colados na parede, pude ver algumas noticias sobre “Suzuno”, das quais eu só não li com cuidado pois me deixei distrair por uma outra imagem mais ao fundo da sala.


Alguns desenhos realistas, coloridos com giz, exibiram entre eles um rosto inesperado. Pude ver desenhos da mãe de Suzuno, e esboços estranhos de lugares de céu vermelho e figuras sorrindo, mas o que me fez parar para olhar mais uma vez aquela parte da parede foi a imagem de um rosto detalhado, feito com varias cores para dar efeito. Um jovem sorrindo como numa fotografia de um momento alegre. Seus cabelos haviam sido coloridos com tons claros, quase esbranquiçados, de rosa e azul, e os olhos pareciam queimar e era impossível dizer se Suzuno queria deixa-los azuis ou amarelados. Era provavelmente o mais realista de todos, em traço, pois instantaneamente me fez lembrar de alguém.


“Fubuki Shirou? Porque Fubuki esta aqui?” perguntei a mim mesmo varias vezes antes de ser despertado por um barulho.



Fui rapidamente até o outro cômodo, onde as coisas pareciam mais bagunçadas e eu pude ver a porta do banheiro escancarada. Fuusuke me olhou, largando o barbeador na pia irritado, com uma das mãos no rosto.


– Você ainda esta aqui..? – perguntou tentando disfarçar o ferimento no rosto – Tinha até me esquecido de você.


– Tenho certeza que sim – respondi secamente, olhando para ele com ar de desaprovação.


Fuusuke estava sem camisa e de bermudas limpas. Seus cabelos úmidos me fizeram pensar que ele havia acabado de tomar um banho e planejava sair antes que eu acordasse – o que explicaria a bermuda e a camisa pendurada em seu ombro. Algumas de suas cicatrizes eram visíveis e me irritavam.


– Tudo bem? – perguntei, ainda em tom grosseiro.


Ele me olhou irritado e depois voltou sua atenção a pia.


– Hmm..

Houve um momento de silencio enquanto o albino lavava o rosto de deixava o banheiro, andando até próximo a mim enquanto vestia a camisa.

Mais uma vez com mangas mais longas do que ele costumava usar.



– Creio que você não esteja pretendendo morar aqui – começou ele, parando em minha frente – acho que você esta aqui apenas para me provocar ou algo assim.


– Você dormiu bem?


– Esta aqui para fazer piadas sobre mim? O que pensa que esta fazendo?


– Porque essas perguntas? Eu salvei você ontem, eu fiquei aqui apenas para...

– Me proteger? – ele deu uma risada curta e sarcástica – você sabe que não é a primeira vez que eu vou aquele lugar, certo? E nem a ultima. Assim como você já deve ter notado que eu moro aqui e costumo estar sozinho, não é?


– Isso não significa que você não precise ser salvo.

O calouro balançou a cabeça e me olhou com ar de rejeição, passando a mão nos cabelos enquanto parecia pensar nas palavras certas.

Seus dedos eram muito finos.



– Você só pode estar brincando...

– Fuusuke, tenha certeza de que eu não teria entrado naquele lugar nojento e te arrastado até aqui e então dormido no chão ao seu lado, apenas por brincadeira.


– Como saber? Talvez você seja apenas algum tipo de depravado...que sente prazer em fazer coisas assim, apenas para tentar a chance de ir para a cama com um cara.


– Ah, eu poderia ter feito muitas coisas com você ontem a noite, se eu estivesse aqui apenas pela chance de “ir para a cama” com você.


– TUDO BEM – Suzuno balançou os braços de leve a minha frente, aproximando-se um passo – então me diga, qual é a sua?


Pisquei por alguns instantes evitando o peso que o olhar direto de Fuusuke provocava em mim. Era como se ele pudesse convencer até mesmo a mim, que no fundo, tudo que eu havia feito e o motivo pelo qual eu estava ali era exatamente tudo o que ele pensava.


– Fuusuke, eu só...eu quero ajudar você.


Sua expressão permaneceu a mesma.


– Me ajudar? – repetiu ironicamente.

– Sim, porque eu...eu acho que eu posso fazer algo por você. Não é uma coisa que eu costume fazer, acredite, mas... eu quero fazer isso para você.


– Por quê?

– Eu acho que porque eu realmente gosto de você...eu não sei, caralho. Eu não quero ver você daquele jeito de novo, só isso.

– Arg... não, sem essa. Vá embora.


– Eu não vou. Você sabe.


Ele pareceu nervoso.

– O que? Eu vou tirar você daqui, então.

– Vamos lá, tente.


Fuusuke serrou os punhos e veio até mim. Por um instante, pensei na hipótese de que ele provavelmente estava com sua navalha no bolso e a usaria como um ultimo recurso. Porém, a única coisa que eu fiz foi recuar alguns passos e bater as costas em uma prateleira atrás de mim, onde havia alguns CDs antigos empilhados, que foram levados ao chão fazendo barulho por suas capas de plástico velho e duro.


O que não impediu Fuusuke de puxar-me pela gola da camisa antes que eu me recuperasse. Fechei os olhos esperando por seu golpe, quando percebi que o que ele estava fazendo era apenas me puxar e largar na parede do lado oposto, me fazendo perder o equilíbrio.

Era provável que minha sonolência tenha contribuído para meu estado um tanto ‘molengo’ naquele instante.


E o canalha havia feito aquilo apenas para me puxar de volta para cima e tentar me arrastar até a porta. Foi quando “acordei” e tentei segurar seus braços. Fuusuke podia ser ligeiramente mais alto, no entanto, eu era suficientemente mais forte do que ele – principalmente em seu estado atual de desnutrição – para agarrar seus braços e resistir a ser empurrado para fora.


– Fu-fussuke... pare com isso, caral...


– Saia!


Suzuno tentava livrar seus braços de mim, enquanto xingava em um tom que parecia não ser alto o bastante para ser ouvido por quem pudesse estar passando na rua. Sua voz parecia estar ficando mais rouca do que o normal, a medida que ele tentava se soltar. Até que finalmente eu fosse capaz de abraça-lo, enquanto rezava para ele não sacar a faca que possivelmente estava em seu bolso.


Ainda senti seus braços tentando me afastar com o que restava de suas forças por alguns instantes, até que ele se rendeu. Eu tinha certeza de que no fundo ele sabia que não tinha como me expulsar no estado que ele se encontrava.

Algumas semanas antes, era provável que teríamos tido uma espécie de batalha e eu teria levado vários chutes – talvez até, admito, ele poderia ter ganhado de mim num de seus golpes baixos.

O apertei em meu abraço.


– Pronto? Será que você pode tentar falar comigo agora? – perguntei.

Suzuno resmungou e encolheu os ombros. O libertei vagarosamente, ainda segurando seus ombros.


– Qual é o problema com você? As pessoas tentam te ajudar e você tenta chuta-las para fora!

Ele fez uma careta.

– Ah, por favor, Haruya... eu não me lembro de ter pedido sua ajuda ou algo assim. Aliais, eu não me lembro se quer de ter dito que havia algo errado comigo, para inicio de conversa, assim como não me lembro de termos nos tornado amigos ou coisa do gênero.

– Acho que essa não é a questão aqui, seu babaca.

– Então qual seria? Qual é o seu plano?


Balancei a cabeça negativamente, serrando os dentes. Fuusuke me olhava esperando, como se tivesse certeza de que eu não tinha nenhum bom argumento para estar ali.


– Eu quero que você venha comigo – respondi, depois de um tempo.

– O que? Para onde?

– Para casa, digo, minha casa.

Ele pareceu um pouco surpreso.

– Porque eu iria com você?

– Porque tenho certeza de que você não gosta de estar aqui.


Ele deu um risinho.

– É mesmo? Saiba que eu não me importo, desde que os noiados fiquem longe... e os pervertidos também.

– Ah, sim ,você com certeza não se importa com o fato disso aqui ser um prédio abandonado, sujo e cheio de ratos. Muito menos com o fato de que, mais cedo ou mais tarde, alguém vai entrar aqui. Sinceramente Fuusuke, até o cara mais fracote do universo poderia fazer mil e uma atrocidades com você, se te encontrasse como EU te encontrei...

Fuusuke abriu a boca para me interromper, mas pareceu que suas palavras simplesmente desapareceram.

– Tenho certeza de que, se fosse qualquer outro, você estaria com muito mais do que apenas um estranho tentando TE AJUDAR como problema...

– Isso não é motivo para mim aceitar o que você...

– Então me diga, o que poderia ser um bom motivo para convencer você.

Ele pensou por alguns instantes, olhando para o lado – em direção a parede de imagens.

– Eu não sei se posso confiar em você.



– Acho que você nunca vai saber, se nem se quer tentar. Você é tão...arg... arrogante, seu idiota... não ouviu nada do que eu disse até agora, né? O que você tem a perder, me diga? Estou te oferecendo um lugar para morar.

– Ninguém dá nada a ninguém, sem ter alguma intenção por trás.

Suspirei.

– Você esta certo – falei, finalmente o deixando livre – então quer saber o que eu quero em troca?

– Acho que eu já sei.

– Acho que você é convencido demais.


O calouro pareceu inquieto, ao mesmo tempo, pensativo. O clima parecia pesar enquanto eu tentava o convencer. Em meio as minhas próprias palavras, ainda me perguntava o porquê eu estava insistindo tanto. Eu sabia que estava parecendo um babaca na frente de Suzuno, ou pior, não apenas um babaca, mas um tipo de babaca que eu não costumava ser.


– Considere isso um favor. Ou coisa assim.






Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Eskalith" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.