Não Há Quem Possa Ocupar Seu Lugar escrita por Amanda Catarina


Capítulo 18
Capítulo 18




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Capítulo 18

Ele ajeitou, para dentro da manga da camisa, o adereço prateado que liberava seu novo arco-e-flecha, Ginrei Kojyaku, e depois correu a vista por outro arco, que mais parecia uma espada, Seele Schneider. Tudo aquilo lhe seria bastante útil com certeza.

Checou o horário no relógio de pulso, passava das oito da noite. Demorara-se mais que o pretendido ali. Mas já em suas vestes brancas, perfeitamente engomadas, deu apenas uma repassada nas linhas do bilhete que deixaria a seu pai, e não precisava ter receio algum, já que o que estava para fazer não ia contra a condição exigida por ele de que não tomasse mais parte nos assuntos da Soul Society.

– Espere por mim, Orihime!

Deixando então o local, seguiu depressa para a loja Urahara.

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Olhando a rua pela janela de seu quarto, Ichigo, já em sua forma espiritual, estava prestes a sair.

– ...mais alguma dúvida, Kon?

– Não, nenhuma - respondeu baixo.

– Então cuide das minhas irmãs enquanto eu estiver fora.

– Claro. Mas, Ichigo... e quanto a nee-san?

– Rukia... talvez fique brava por eu ir até lá de qualquer jeito, mas não tenho tempo de pensar nisso agora. Depois me entendo com ela.

– Certo.

O leãozinho apenas encarou o adolescente por algum tempo. Assim que soube do namoro dos dois, ficou louco de ciúme, mas aos poucos foi se conformando, mesmo que em sua cabecinha de algodão ainda achasse que o coração da linda shinigami devesse ser só seu. Deixando a desdita de lado, lamentou pela situação que o casalzinho enfrentava.

– Ok, vou nessa - disse Ichigo.

– Boa sorte...

Assim que ele saiu, Kon ficou de pé na janela, tentando imaginar quanto tempo levaria para que aquela confusão terminasse.

ooo ooo ooo ooo

 

Três pares de olhos arregalados observaram o momento em que Ichigo, vestindo kimono e hakama negros, adentrou a casa, que era na verdade uma loja.

– Ele tem feito coisas bem estranhas ultimamente - falou Tatsuki.

– Você não é a melhor pessoa pra dizer isso agora - apontou Mizuiro, todavia bem brando.

– E agora? - desviou Keigo. – Vamos lá ver? - e olhava na direção da moça.

Apesar do receio, a curiosidade deles falou mais alto. Adentrando o local, no espaço que imaginaram ser um sótão, encontraram não apenas o ruivo, mas outros dois de seus colegas de sala: Ishida Uryuu e Yasutora Sado. Ficaram escondidos, ouvindo a conversa.

– Você demorou, Ishida... - reclamou Ichigo.

– Precisei buscar uns equipamentos - justificou-se carrancudo, vendo Urahara se aproximar.

– Ishida-kun, eu fico feliz que tenha vindo. Espero que esteja mais calmo.

– Absolutamente.

– Bem, eu realmente lamento pelo que aconteceu à Inoue-san e até me sinto culpado. Eu já suspeitava que Aizen pudesse estar de olho no poder dela. Por isso farei tudo que estiver em meu alcance para ajudá-los.

– Urahara-san, não tem razão de se sentir assim. E desde já quero te agradecer por tudo. Agora, estou enganado ou o fato de estar nos ajudando, não é dar as costas à Soul Society?

– Ora, desde o início tenho dado as costas para muitas coisas aqui, acredite.

Ichigo ficou bastante intrigado com o comentário, mas achou melhor não questionar.

– Então vamos com isso... - chamou Urahara.

Por meio de um sombrio encantamento e de duas plataformas de madeira, separadas por um vão de alguns metros, o ex-shinigami abriu uma fenda dimensional.

– Esse buraco, usado pelos Arrankar, é chamado Garganta. Não há caminhos lá dentro, vocês terão que construir um usando as partículas espirituais. Atravessando este espaço escuro, provavelmente devem chegar ao Hueco Mundo.

Os três adolescentes assentiram. Encarando-os, Urahara se animou com a determinação que enxergou em suas faces. Mais que determinados, sabia que estavam dispostos a arriscarem as vidas para resgatar sua amiga. Num salto sincronizado, Ichigo, Uryuu e Sado pularam na fenda, que imediatamente se fechou, tal qual a boca voraz de um monstro faminto.

Instantes depois, o loiro voltou-se numa determinada direção e disse:

– Eles já foram. Podem sair agora.

– ...mas quando soube que estávamos aqui? - perguntou Keigo, apatetado.

– Desde que chegaram, é claro, por isso deixei a porta aberta - e lançou um olhar incisivo à moça entre os dois rapazes – Fiquem tranquilos, eles voltarão a salvo. Agora, se me dão licença, tenho um outro trabalho a fazer.

Havia muitas coisas que Tatsuki, Keigo e Mizuiro gostariam de perguntar, mas não era chegado ainda o momento de obter as respostas. Ao menos os três sentiram-se mais aliviados em constatar, com os próprios olhos, que seus amigos de poderes sobre-humanos pareciam confiantes para encarar fosse o que fosse que os esperava do outro lado.

ooo ooo ooo ooo

 

Karin estava quase tendo um surto com a choradeira interminável de sua irmã.

– Por que o oni-chan nunca mais pode ficar em casa?! Por que, Karin-chan? - reclamava a loirinha sentada sobre os joelhos no meio do sofá.

– ...ai, mas que coisa... é sempre isso, Yuzu - retrucou a mais velha.

Chegando à sala, Isshin se aproximou da filha chorosa e fez um afago no alto da cabeça dela. Quando essa ergueu o rostinho molhado a ele, com uma nova queixa saltando da boca, ele valeu-se de um golpe atordoante para fazê-la perder os sentidos.

Imediatamente, Karin levantou os olhos ao pai, bem abismada, mas logo compreendeu que ele devia ter usado seus poderes de shinigami. Suspirou fundo então.

– Não sei quando vou me acostumar com essas coisas - comentou ela.

– Você sempre soube lidar muito bem com tudo - replicou Isshin, numa seriedade que ela não achava que ele fosse capaz de demonstrar. – Reze pelo seu irmão, Karin. Dessa vez, ele está se metendo na cova dos leões, literalmente.

Uma expressão de susto foi toda a resposta da menina por um tanto de tempo.

– Como se tudo que ele enfrentou até agora tivesse sido pouco - falou ela então, fazendo com isso o pai a encarar. – Eu confio no Ichi-nii - e havia muita firmeza em sua voz.

Assentindo com um sorriso estreito, Isshin logo deixou a sala. Karin sentou-se então junto de Yuzu, pensando consigo que seu pai também devia acreditar em Ichigo, do contrário não teria deixado ele ir.

ooo ooo ooo oooo

 

Através de uma janela obstruída por três grades, os olhos graúdos de Inoue fitavam a lua minguante do Hueco Mundo.

– Eles me disseram pra ficar quietinha aqui, mas não tem nada pra fazer. Que fome... Será que o Ishida-kun está muito chateado comigo?

A dúvida lhe trouxe de volta à memória seu pequeno deslize com Kurosaki. Ruborizou fortemente então e abaixou a cabeça. A vergonha a revestiu como um manto e, tamanha foi a revolta que sentiu de si mesma, que chegou a estremecer.

– Tudo bem que ele não confiou em mim - considerou tristonha – ...mas claro que fez aquilo querendo me proteger.

E não pôde deixar de pensar que estava sendo injusta com o namorado.

– Será que foi mesmo bom eu ter vindo pra cá? Ishida-kun fez de tudo pra me manter a salvo, e no fim eu mesma vim até os inimigos.

Sua mente foi tomada então pelas cenas de quando usou seus poderes, para reconstituir o braço cortado do Arrankar chamado Grimmjow, e isso a fez pensar na desconcertante sensação que foi estar na presença do enigmático Aizen Sousuke.

– E se eu ficar curando os ferimentos deles, não estarei aumentando a tormenta da batalha? - questionou-se, lembrando-se das últimas lutas. – Mas não importa, tenho que fazê-los acreditar que posso ser útil. Pelo menos até que o resto do pessoal esteja mais preparado para a guerra.

Subitamente, interrompeu suas divagações, quando passou a sentir, de modo contundente, presenças poderosíssimas chegando àquele mundo. E ela não foi a única.

Numa sala ampla, assentado num sofá largo, o próprio Aizen, também se acercou disso. Dentro de um meio sorriso, ele falou consigo:

– Enfim, eles chegaram.

ooo ooo ooo ooo

 

Ichigo, Uryuu e Sado, depois de um tanto de tempo seguindo pela escuridão da Garganta, causaram um rombo enorme numa parede, ao surgirem no interior de uma edificação.

– Ora, vejam só... - começou Ichigo – até que é uma construção boa. Quando falaram Hueco Mundo, achei que fosse mais detonado.

– Fale mais baixo, Kurosaki! - exclamou alto o quincy.

– Ih, sem essa. Assim logo aparece alguém e poderemos achar a Inoue mais rápido! Oe! Tem alguém aí?

Nada convencido da tática do outro, Uryuu insistiu que ele fosse mais cauteloso, mas foi totalmente ignorado. Sem escolha, seguiu o ruivo então, acompanhado de Sado.

Enquanto andavam por um corredor estreito, Sado observava, com sua inexpressividade, os dois discutindo feito moleques. No entanto, se contentou em notar que Ishida parecia mais amistoso com Ichigo, pois pelo que tinha ouvido do ruivo, ele ficara bem revoltado ao saber da decisão da Soul Society de abandonar Inoue a própria sorte.

Por incrível que fosse, o lugar estava cheio de armadilhas simplórias, e só algum tempo depois, apareceram dois Arrankar: Iceringer e Demoura. Uryuu e Sado deram cabo deles, o que serviu para Ichigo conhecer suas novas habilidades. Uryuu, com o arco Ginrei Kojyaku, capaz de disparar mil e duzentas flechas por segundo, derrotou Iceringer. Enquanto Sado, usando um disparo de energia, nomeado El Diretto, rechaçou Demoura.

Logo após a derrota dos Arrankar, o local, que descobriram ficar sob o solo, começou a desmoronar. Os jovens invasores conseguiram escapar, alcançando a superfície, que era na verdade um deserto.

– Hã... o que é aquilo? Um castelo? - indagou Ichigo, apontando para uma construção.

– É imenso - comentou Sado.

– Orihime só pode ter sido levada pra lá! - deduziu o quincy.

– Então vamos! - chamou o ruivo, mas antes que desse um passo, ouviu alguém gritando por socorro.

Os três se voltaram numa mesma direção, e então avistaram três hollows esquisitíssimos perseguindo um ser pequenino, trajando um pano de saco que cobria sua cabeça, correndo e  gritando, desesperadamente.

– Um humano! - adiantou-se Ichigo, vindo depressa ajudar.

Sem desatar a faixa que continha sua shikai, o shinigami lascou uma cacetada no meio da cara de um dos hollows, um grandalhão cabeçudo, que vestia um traje amarelo. Uryuu sacou seu arco acertando o outro hollow, que era magricelo e tinha a pele cor de lilás, enquanto Sado segurou na raça o último deles, que parecia uma minhoca gigante. E teriam eliminado os tais se aquele pequenino, até então perseguido, não tivesse berrado:

– Parem, por favor!! - e tirando a veste de cima da cabeça, revelou sua face. – O que eles e a Nell fizeram pra vocês?

– Uma máscara! - exclamou Ichigo. – Você é um hollow?

ooo ooo

 

Era um quarteto pra lá de bizarro, pensava Ichigo. Nell Tu, a nanica; Pesche Gatishe, o magricelo; Dondochakka, o cabeçudo; e Bawabawa, o minhocão, que segundo os outros três era o bichinho de estimação. Pesche e Dondochakka esclareceram que não estavam perseguindo Nell na verdade, mas brincando de um tal “pega-pega pra sempre.”

De todo modo, Nell, além de lhes falar um pouco sobre a hierarquia dos Arrankar, como uma forma de se desculpar pelo mau entendido, lhes ofereceu Bawabawa como meio de transporte para levá-los até o colossal palácio, conhecido por Las Noches. Assim, flutuavam há alguns metros do chão, sentados no dorso do hollow.

– Mas você é mesmo uma Arrankar? - Ichigo perguntou à Nell, meio desconfortável com o fato de ela estar sentada em suas pernas.

– Claro que sou. Não está vendo a incrível máscara quebrada na minha cabeça? Mas olhando melhor, vocês é que são meio esquisitos. Esse kimono preto... O que vocês são, hein?

– Kurosaki Ichigo, shinigami substituto.

– Ishida Uryuu, quincy.

– Yasutora Sado, humano.

A óbvia revelação deixou os excêntricos hollows em pânico total.

– Um shinigami! - exclamaram os três.

– Vamos morrer! Vamos morrer! - choramingou Nell.

Ichigo revirou os olhos e balançou a cabeça numa negação.

– Não iremos matá-los - anunciou ele, logicamente. Mas o trio hollow não teve tempo de se acalmar porque um ser imenso surgiu subitamente à frente deles dizendo:

– Mas vão morrer de todo jeito! Eu, o guardião Lunuganga, irei matá-los!

Com pinta de herói, Ichigo saltou ao chão, empunhando a zanpakutou.

Getsuga Tenshou! - bradou, e sua meia-lua dividiu ao meio a cabeça do monstrengo. Porém, o tal se regenerou por completo em instantes. – Que?! - abismou-se ele.

– Vamos atacar todos ao mesmo tempo, Kurosaki! - sugeriu Ishida, já se posicionando para um disparo. Sado também estava a postos.

Os três lançaram seus melhores ataques, mas foi totalmente em vão. E num instante estavam quase sendo tragados por uma cratera de areia movediça.

– Nell, ele não tem algum ponto fraco? - berrou Ichigo.

– Não, ele é feito de areia. O único jeito de detê-lo é com água - contou desesperada. – Mas não tem água no Hueco Mundo, por isso ele é invencível!

A empreitada dos adolescentes parecia fadada ao fracasso, mas eis que o monstro foi definitivamente aniquilado por uma estupenda rajada de gelo.

Ichigo arregalou os olhos, reconhecendo imediatamente aquela técnica. Volveu então o rosto, deparando-se com a pessoa responsável pelo golpe.

– Rukia! - exclamou ele, e viu que ela não estava sozinha. – Renji?!

Linda, ela lhe sorria graciosamente, há uma não tão curta distância. Correu depressa até onde estava, reparando momentaneamente na capa bege que tanto ela quanto Renji usavam por cima do kimono. Ele vinha com um riso radiante nos lábios e o coração saltitando de alegria no peito, ansioso pelo enlace daqueles bracinhos magrelos, mas...

...ao invés de um abraço carinhoso, recebeu foi um belo dum soco de direita, bem embaixo do queixo. Gemeu se condoendo, enquanto Rukia dava uma batida de mão com Renji, e este logo trocou de posição com ela e lhe acertou um soco também, de esquerda. Caiu estatelado no chão, um tanto para trás, quase aos pés do quincy, que ali chegava, sempre seguido de Sado.

– Tudo bem, Kurosaki? - perguntou Uryuu, abismado.

– Não mesmo - balbuciou, sentando-se no chão.

– Seu imbecil! - vociferou Rukia, vindo de encontro a ele. – Por que veio pra cá todo afobado desse jeito? Por que não nos esperou voltar?!

– ...mas como eu ia saber que vocês iam mesmo voltar? - retrucou simplesmente.

– Claro que íamos voltar! - devolveu num berro. – Há qualquer custo! Eu e o Renji estávamos dispostos a isso desde o início!

Diante daquele tom tempestuoso e severo dela, Ishida ficou passado, vendo o quanto Rukia era diferente de Inoue; Sado permaneceu bem quieto, pois tinha até medo da shinigami quando ela falava alto daquele jeito; e Renji, apenas riu sozinho, achando que Ichigo merecia mais esporro ainda.

– Por que não nos esperou, Ichigo? - perguntou ela com uma voz tão branda que até parecia outra pessoa.  – Por que não acreditou em nós?! Inoue não é nossa amiga também?

De olhos bem vidrados, ele apenas a encarou por alguns instantes.

– É, certo... foi mal - disse então.

Com uma expressão bem dura ainda, Rukia se endireitou.

        

– Se entendeu, tudo bem. Mas não me faça ter que dizer esse tipo de coisa novamente.

Virando o rosto ao lado, o adolescente deu um riso discreto. Claro que se sentia mal por ter duvidado dela, mas a satisfação com o fato de ela estar ali logo se sobrepôs a todo o resto.

– Vamos - chamou a nobre. – Não fique aí parado desse jeito. Temos que salvar a Inoue.

ooo ooo

Dentro em pouco, o grupo estava sendo outra vez transportado pelo imenso Bawabawa. Ichigo sentou-se à frente, com Nell a seu lado, e Rukia, por qualquer razão, ficou logo atrás dele.

– Ah, é... e essas capas? - perguntou Ichigo por sobre o ombro. – Onde vocês arranjaram?

– Uma pessoa nos deu - respondeu Rukia. – Disse que nos protegeria das tempestades de areia do Hueco Mundo.

– Quem? - indagou desconfiado.

– O nii-sama... - revelou ela, enrubescendo.

Totalmente assombrados, os três adolescentes arregalaram os olhos, incrédulos.

– Como é que é?! - exclamou Ichigo. – Então o responsável por vocês estarem aqui é o Byakuya?!

– Quem abriu a Garganta foi o Urahara-san - interveio Renji –, mas chegamos ao Mundo Real graças ao capitão.

– Ele disse que só havia recebido ordens de nos levar de volta. O que faríamos depois não o interessava - complementou Rukia.

– He... aquele Byakuya está deixando de ser tão rígido - fofocou Ichigo.

– Ademais ele disse que um fedelho insignificante como você, sozinho aqui no Hueco Mundo, sequer seria notado.

– Aquele desgraçado! - praguejou o adolescente, e reagindo por impulso, socou, como se fosse o chão, o corpo do hollow minhoca, que urrou de dor.

– Não judia do Bawabawa! - esganiçou Nell , se agarrando à manga do kimono dele.

– Ah, foi mal...

Ainda sem o soltar, Nell virou o rosto na direção de Rukia e ficou um tempo a encarando com um olhar feio. Não tinha gostado nada daquele jeito mandão dela, e muito menos do modo como seu mais novo amigo passou a se portar depois que ela chegou.

Oe, Ichigo? Por que essa aí está me encarando? - perguntou a nobre.

– E eu que sei? - devolveu ele.

– Qual é a sua relação com o Ichigo? - Nell perguntou à shinigami, num tom arrastado.

Franzino o cenho, Rukia disse tranquilamente:

– Pergunte a ele, oras.

Reparando no evidente ciúme da menina hollow, Abarai não poupou o garoto de uma provocação.

– Sempre popular com as mulheres, Kurosaki - disse com um risinho de canto.

– Não enche.

– O que ela é sua, Ichigo? - insistiu Nell, impaciente.

– Minha mina, sacou? - respondeu ele e virando o rosto, deu uma piscadela à shinigami, que apenas esboçou um sorriso.


Em face à simples troca de olhares deles, Renji enfim se convenceu, não só da verdade do sentimento que tinham um pelo outro, mas também do quanto combinavam juntos. Além do que, já não sentia qualquer mágoa por Ichigo, e mesmo que seu carinho por Rukia fosse todo especial, ele não precisava mais do que da amizade dela.

– Sua... sua... mina? - gaguejou Nell, com os olhinhos claros se enchendo de lágrimas. – Quer dizer... sua mulher? Ela?! - e imprimiu muita descrença na voz, medindo inconformada a shinigami da cabeça aos pés.

Indiferente, tal qual um perfeito exemplar do clã Kuchiki, Rukia perguntou acerca dos hollows:

– Ichigo, o que exatamente são eles?

– O que... o que nós somos? Mas que grosseria! - ultrajou-se Nell.

Levantando-se de súbito, a baixinha se apresentou, escandalosamente. E depois de seus dois amigos hollows fazerem o mesmo, os três se juntaram numa pose ridícula, gritando cada qual um título que os representava. Note-se tudo isso em cima daquele Bawabawa.

– Bem... - sobrepôs-se Ichigo à algazarra – como pode ver, eles são hollows.

– Como eu posso ver? - ironizou ela.

– O importante é que estão nos levando até aquele lugar - intrometeu-se Ishida, já meio impaciente com a bagunça.

Felizmente para o quincy estavam quase chegando ao tal Las Noches. E uma vez nas imediações, Ichigo e Renji trataram de fazer um buraco numa das paredes, para que pudesse enfim começar a busca.

Ichigo aproveitou então para agradecer Nell e seus amigos, e explicou que dali em diante iriam seguir sozinhos, mas a baixinha se recusou terminantemente a deixá-lo, alegando que o simples fato de ter os trazido até ali já fazia deles traidores.

Sem alternativa, em companhia do trio hollow, a turma seguia por um corredor escuro, quando, num repente, o chão faltou sob os pés deles todos. Aos berros caíram num fosso, que provavelmente servia de ventilação.

– Que raios... - bronqueou Ichigo. – E agora aonde viemos parar? - falou se recompondo.

– Acho que vi uma... - dizia Rukia, porém, ao dar uma passada ao lado, acabou despencando em um outro fosso.

– Rukia! - berrou Ichigo por cima do grito da shinigami, que ressoava cada vez mais longe.

Sem nem pensar, ele saltou atrás dela.

Itsugo!! - exaltou-se Nell, querendo seguí-lo, mas Renji a deteve, pisando na barra de sua veste, fazendo-a tombar de cara no chão.

– Parada aí.

Enquanto Pesche e Dondochakka queixavam-se da aspereza do ruivo, Uryuu se aproximou cuidadosamente da borda do fosso e chamou alto:

– Kuchiki-san? Kurosaki?

 

A resposta demorou uns instantes.

– Não vejo Rukia - falou lá de baixo o adolescente – fiquem aí, eu vou achá-la.

– Seja rápido, não temos tempo a perder - rebateu o quincy.

– Ok.

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– Por pouco você não me acha aqui... - comentou Urahara, assentado à mesa baixa, diante de um monitor que exibia a imagem do capitão Ukitake.

“Ah, imagino que deve estar muito ocupado com tudo aquilo. Serei breve, apenas gostaria de lhe repassar um recado do Byakuya.”

O loiro assentiu com um gesto. Ao seu lado, escorada no batente da porta, Yoruichi, na forma humana, ouvia a conversa.

“Ele está um tanto preocupado, é claro, mas me pediu para agradecê-lo por ter ajudado Rukia e Abarai a chegarem no Hueco Mundo.”

– Mas quem diria... - intrometeu-se a mulher – até o certinho do Byakuya, indo contra o velho e fazendo coisas assim? Esse mundo dá voltas mesmo.

Os dois homens riram com discrição.

– Eu tenho me surpreendido com Byakuya ultimamente - falou Urahara. – Não esperava que ele fosse reagir tão bem à notícia do relacionamento afetivo da Kuchiki-san com o Kurosaki-kun. E agora, esse seu apoio à decisão deles de irem a Hueco Mundo também foi uma surpresa.

– Digo o mesmo... - falou Yoruichi.

“Acho que sou obrigado a concordar. Mas, de todo modo, aqueles dois se amam, e Byakuya melhor que ninguém sabe o que é lutar por um grande amor. Particularmente, Urahara, sinto-me muito feliz por tudo que fizemos pela Rukia-chan e pelo Kurosaki-kun. Desde a morte de Kaien, eu não a via tão bem assim.”

O loiro sorriu em compreensão e acrescentou:

– E justamente para que nossos jovens continuem vivendo “felizes para sempre” - falava num tom cantado –, temos que deter os planos do Aizen - isso ele disse num tom bem mais sério.

Ukitake e Yoruichi assentiram, ambos encarando o ex-capitão com olhares compenetrados, pois eles todos sabiam que a real batalha estava para começar.

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Rangiku fingiu não ouvir a fofoca de seus oficiais sobre o sumiço de dois afamados shinigamis: Abarai Renji e Kuchiki Rukia.

Afastando-se um pouco, ela se escorou na lateral da entrada da sede do esquadrão, e ficou introspectiva ao lembrar-se de sua breve conversa com Renji, na noite anterior, minutos antes de ele partir foragido. Ele e Rukia, decidiram ir ao Hueco Mundo, desobedecendo a uma ordem do próprio capitão-comandante. Deu um profundo suspiro, sentindo um dedo de inveja da coragem dos dois, uma vez que sua velha estima por Ichimaru Gin não bastou para que menosprezasse as ordens.

“Eu nunca negaria um pedido dela. E claro que não posso deixá-la ir lá sozinha.” - recordou dessas palavras do ruivo, bem como do olhar determinado dele, tão admirável que a fez sorrir naquele momento.

Renji era realmente um homem e tanto. Sabia bem que o coração dele era tão apegado a quem não o podia corresponder quanto o dela mesma, e até chegou a lamentar por isso, pois talvez pudesse ser interessante compartilhar algo além da amizade com aquele bonito vice-capitão.

– Eu e o Renji? - falou baixinho, e depois de agitar a cabeça para os lados, querendo afastar essa ideia, soltou um risinho contido.

Adentrando a sede então, tratou de ir tomar conhecimento da nova ordem que haviam recebido.

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O coração de Ichigo vacilou no peito, no instante em que ele avistou Rukia caída de bruços alguns metros à frente.

Oe, Rukia!

O tom escandaloso dele a fez recobrar os sentidos e levar uma mão na cabeça.

– Essa doeu... - reclamou sentando sobre os joelhos, de costas ao rapaz que se aproximava. – Estou bem - avisou, e antes que pudesse dizer qualquer outra coisa, foi erguida do chão por ele.

– Tudo bem mesmo? - perguntou preocupado, virando-a para si.

– Sim... - disse se desvencilhando para recompor-se.

– O que aconteceu?

– Cai e depois escorreguei nesse lodo... devo ter batido a cabeça em algum lugar.

– Que susto você me deu - disse expirando de alívio, fitando os olhos graúdos, brilhantes na penumbra daquele lugar que parecia um calabouço.

– Desculpe-me - disse ela, e receosa com a proximidade que ficaram, saiu de lado. Tinha dado apenas algumas passadas quando Ichigo a chamou.

– Rukia?

Estremeceu da cabeça aos pés. Conhecia muito bem aquele tom apelativo dele.

– Obrigado mesmo por ter vindo - disse sério.

– Não tem o que agradecer - respondeu de costas a ele. – Inoue é minha amiga também, oras.

Permaneceram em silêncio uns instantes.

– ...mas sabe - começou Rukia, hesitante –, senti um pouco de ciúmes pelo modo como você ficou naquela hora, na casa do Urahara, quando o capitão-comandante nos proibiu de vir aqui.

– Ciúme? - sobressaltou-se ele.

– É, mas já passou.

Ele acabou rindo levemente uns instantes depois. Rukia nunca demonstrara sentir ciúmes antes, ao passo que ele vivia espantando os garotos que flertavam com ela no colégio.

– Sua boba, eu só amo você - e como ela ainda estava de costas pra ele, adorou imaginar a cara de espanto que ela devia ter feito ao ouvi-lo dizer isso. – E... sempre sou eu quem precisa te lembrar que você é louca por mim.

Apesar da provocação, Rukia sorriu discreta e voltou-se a ele.

– Sei que foi bobagem minha, até me senti mal depois. Ah, nem sei porque quis te contar isso.

Ele assentiu com um gesto.

– Mesmo quando soube da gente - retomou a nobre –, Inoue continuou sendo legal comigo. Ela podia ter me virado a cara... quem poderia condená-la? Mas não fez isso.

– Vocês são boas amigas - pontuou de pronto.

– É sim - concordou amena. – Vem, estamos perdendo tempo aqui.

Outra vez, a shinigami tinha dado só uns passos, quando o adolescente a chamou de novo.

– Rukia?

Voltou-se irritada, pronta a soltar um xingo daqueles, mas paralisou ao vê-lo se aproximando com um sorriso de derreter iceberg. E muito depressa ele já estava a sua frente, e mais rápido ainda, passou um só braço por seu corpo, erguendo-a do chão. Não teve tempo de protestar porque ele colou a boca na sua.

Rindo contra os lábios fechados dela, Ichigo apertou o corpinho esbelto, esperando com isso que ela passasse a beijá-lo de uma vez. Ficava doido com aquela mania dela de sempre demorar a corresponder. Rukia até pensou em detê-lo, de verdade, mas ceder se tornara um hábito incontrolável desde o primeiro beijo deles. Passou então os braços pelo pescoço de Ichigo, beijando-o, apaixonada.

Desejo mesclado a um temor cruciante, permeavam suas almas, e a adrenalina constante por estarem em terreno inimigo, o medo de serem flagrados pelos amigos, o senso de descabido e inoportuno, enfim toda a situação, fez daquele um beijo diferente de todos os outros que já tinham trocado.

Separaram os lábios, porém permaneceram abraçados num momento maravilhoso, que durou uma eternidade efêmera. Simplesmente não havia quem pudesse ocupar o lugar que tinham um no coração do outro. Eis a certeza que ficou estampada no olhar cheio de cumplicidade que trocaram, instantes antes de Ichigo descer, cuidadosamente, Rukia ao chão.

– Por que você sempre faz isso? - rateou ela, todavia num tom bem afável.

Ichigo lhe sorriu travesso, mas então, num repente, ele sumiu num shunpo e reapareceu um tanto à frente.

– O que está fazendo parada aí desse jeito? - provocou, vendo-a encará-lo por sobre os ombros, aparvalhada. – Temos que salvar a Inoue!

Rukia não conteve o riso, e valendo-se do mesmo truque, apareceu um pouco à frente dele.

– Vou chegar lá encima primeiro! - disse ela, entrando na provocação.

Infantes e confiantes, seguiram depressa, lado a lado. E dentro em pouco, com um salto, saiam de dentro do fosso, alcançando o espaço onde seus amigos ainda estavam.

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Gastaram algum tempo andando por um corredor escuro, ou melhor, parcamente iluminado, graças a um kidou bem pouco sucedido de Renji, quando se acharam num amplo salão, no qual havia cinco grandes aberturas.

– Cinco caminhos - comentou Ishida, visivelmente descontente.

– Sem chance de ir cada um por um - adiantou-se Ichigo, entendendo o que ficou implícito no tom dele.

– Pois é exatamente isso que faremos - afirmou Rukia. – Vamos nos separar aqui.

maluca?! - vociferou Ichigo. – Os inimigos são Espadas! Vamos ficar todos juntos!

Os outros três fitaram os dois com espanto, assim como o trio hollow.

– Se está dizendo isso - começou a nobre –, deve ser porque está preocupado comigo.

– E esse por acaso não é um ótimo motivo?!

Antes que Rukia respondesse, Renji se colocou entre os dois.

– Preocupar-se com a vida de um guerreiro no campo de batalha é um insulto, Kurosaki.

Atordoado, o adolescente o encarou e depois olhou para Rukia.

– Eu já te falei: a Inoue é minha amiga também! - exclamou muito séria. – Viemos salvá-la, então não perca o foco! Eu seria um estorvo se tivesse vindo aqui só pra ser protegida por você!

Ichigo sentiu como se garras afiadas o perfurassem. Como ela podia lhe impor aquilo? Mas sua razão compreendia, ainda que seu coração relutasse. Bufou resignado então.

bom, Rukia... a gente se separa aqui.

Por breves instantes, Ishida encarou os dois, perplexo com o jeito com o qual se tratavam, mas não era hora nem lugar para divagar sobre o relacionamento deles. Orihime estava em algum canto daquela fortaleza e precisava encontrá-la de qualquer jeito. Ajeitando os óculos, expressou sua urgência:

– Estamos perdendo tempo aqui.

– Já estamos indo, Ishida - falou Ichigo e voltou-se à nanica hollow. – Nell, está sentindo a força dessa reiatsu, não é? Daqui não tem como vocês continuarem.

Naquele momento, a baixinha nem se mexeu e nem disse nada, de tão arrasada que ficou com a notícia.

– Muito bem... - começou Renji – vamos cada um por uma direção, mas antes gostaria que fizéssemos uma coisa para termos boa sorte.

– Boa sorte? - repetiu Ichigo.

– Isso mesmo. Antigamente os shinigamis faziam esse ritual. Parece uma cantiga. Vamos, juntem suas mãos aqui no centro - falou e estendeu a sua, com a palma voltada para baixo.

Os adolescentes o olharam com total estranheza.

– E não façam cara de que não querem - intimou ele.

Depois que as cinco mãos estavam sobrepostas, Renjii falou num tom alto:

“Vamos entrar agora no campo de batalha. Acreditem, nossas espadas não serão quebradas. Acreditem, nossas almas não serão destruídas. Mesmo que nossos caminhos se separem, nossa determinação permanecerá unida. Prometam, mesmo que o chão se parta, voltaremos vivos para este lugar!”

Palavras de efeito sem dúvida, e tão logo Abarai Renji terminou de proferi-las, velozmente cada um deles adentrou uma das aberturas.

ooo ooo

Enquanto corria pelo corredor estreito, Ichigo tocou os próprios lábios, com a lembrança daquele beijo de há pouco vívida na mente.

– Droga... tudo culpa desse bastardo do Aizen - resmungou, de punhos cerrados.

A sufocante preocupação com a segurança de sua querida shinigami, mesclada à exaltação do combate eminente, fazia seu corpo inteiro fremir. Buscou se dominar, tentando manter o foco na missão, como Rukia mesmo havia mandado, mas não pôde.

– Espera, espera, espera! - e freou bruscamente. – Até parece que Rukia dá conta de enfrentar um cara do nível do Grimmjow.

Num ímpeto, ele deu meia-volta. Porém, depois de correr desembestado por alguns metros, foi diminuindo as passadas até parar.

– Mas ela consegue, consegue sim... É agora que tenho que mostrar que acredito nela.

Erguendo os olhos ao teto alto, suspirou fundo.

– E se eu não me apressar, ela passa a perna em mim...

A poeira da preocupação baixou, e então sim Kurosaki Ichigo avançou rumo ao que estivesse pela frente. Convencido de que assim como seu amor pela shinigami o tornava mais forte, o mesmo iria valer para ela. E perceber isso foi tudo de que precisou naquela hora, pois sabia que nem pessoas, nem a distância, nem mesmo o tempo, poderia extinguir seu amor por Kuchiki Rukia, e enquanto a amasse, não seria vencido.

~ Fim ~

 

 

ooo ooo ooo ooo

Notas

Este capítulo foi feito com ênfase no mangá, capítulos 243-248, e baseado também nos episódios 144-150 do animê. Os episódios filler foram desconsiderados porque Rukia acabou com Lunuganga com um único golpe, a direção do animê pode ter menosprezado isso, mas eu não.

 

Justificativa

Peço compreensão se o capítulo ficou muito meio-a-meio, meio original, meio copiado da série. Optei em fazer dessa forma, porque essa parte da série traz momentos bem significativos do Ichigo e da Rukia juntos, e que, na minha opinião, depõem a favor deles como um casal.

Encerrando então...

Agradeço a todas as pessoas que acompanharam essa fanfic,

bem como a todos que mandaram reviews, mensagens, e-mails, que a “favoritaram”...

 

Aprendi demais com este texto, e confesso que não achava

que ele fosse dar tanto retorno.

 

E, ainda que tenha sido maravilhoso receber

comentários, minha maior recompensa, com certeza,

foi ter conhecido pessoas maravilhosas através dele.

 

Bem, só tenho mesmo a agradecer por tudo!

 

Desejo a todos tudo de bom, Deus no coração e muita força!

BANKAI!

 

=^.^=

Amanda Catarina, setembro / 2009

 

 

 

 


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