Não Há Quem Possa Ocupar Seu Lugar escrita por Amanda Catarina


Capítulo 13
Capítulo 13




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Capítulo 13

 

Deitada de lado, Rukia pensava na situação enfrentada com a nova variante dos hollows, quando sentiu um esbarrar do braço de Ichigo em seu ombro. Estava de costas para ele. Achegou-se mais ao corpo do rapaz, escorando-se nele.

 

O quarto já estava claro, mas ainda devia ser muito cedo para a aula. Talvez, Ichigo nem estivesse com disposição para ir para a escola naquele dia e o mesmo valia para ela. Apreensiva, virou o corpo ao namorado. Pelo respirar, julgou que ele estivesse acordado, apesar dos olhos fechados. O que estaria pensando?

 

Parecia tão tranquilo, entre o mundo dos sonhos e a realidade, com uma expressão calma. Mas ela soube que não demoraria nada para aquele semblante de preocupação voltar a nublar a face dele. Acariciou-o no rosto, arrancando-lhe um suspiro dengoso e encostou os lábios nos dele. Ao se afastar, ouviu ele murmurar um “eu te amo” que a deixou arrepiada. Abraçou-se a ele e, movida por um desejo desenfreado, beijou-o nos lábios com força.

 

Ichigo deslizou as mãos carinhosamente pelas costas de Rukia, correspondendo ao beijo repentino com a mesma avidez. Totalmente enlevado e um tanto surpreso por ela praticamente o tirar do sono com aquele gesto, mas logo sentiu que não havia apenas paixão no beijo. Era urgente demais, quase desesperado.

 

Seu sangue fervia, o corpo inteiro tremia. O ar até chegava a faltar. Não conseguiria se conter se continuasse sendo provocado daquele jeito. Foi então que Rukia descolou os lábios dos seus por um instante e o abraçou pelo pescoço.

 

Respiraram juntos e logo se unirão de novo num outro beijo ainda mais demorado. Depois disso, Rukia deitou a cabeça sobre o peito de Ichigo, que, levemente ofegante, abraçou-lhe o corpo pequeno, notando o quanto as batidas do coração dela estavam mais aceleradas que as suas.

 

– Me deixa te ajudar! - ela falou de repente, causando estranheza nele.

 

– Com o quê? - retrucou, confuso.

 

– Você entendeu.

 

– Não, não entendi.

 

– Sei que vai treinar para ficar mais forte, mas não quero que faça isso por sua própria conta... como naquela vez com os Vaizards...

 

– Ah... - ele ponderou uns instantes antes de responder. – Mas é preciso, já que os inimigos não param de avançar... tenho que ficar mais forte também.

 

Rukia levantou o rosto a ele com um olhar angustiado.

 

– E por que não podemos fazer isso juntos?

 

O adolescente bufou e virou o rosto para o lado, sem dar resposta.

 

– Por que você sempre quer fazer tudo sozinho?! - insistiu ela.

 

– Não é nada disso. Eu apenas... quero te proteger.

 

– E eu também!

 

– Não. Você tem que ser protegida. Não porque seja fraca, mas porque é assim que tem que ser.

 

Bakamono... - murmurou meio chorosa.

 

Querendo cortar o assunto, Ichigo fez Rukia escorregar rente a seu corpo, e depois se inclinou sobre ela. Encararam-se, enxergando a própria apreensão um nos olhos do outro.

 

Ichigo aproximou-se então, buscando os lábios dela outra vez. Rukia relaxou o corpo, solícita e, no exato instante em que suas bocas se encontrariam, ambos ouviram uma voz autoritária a perguntar:

 

– Desde quando um membro da família Kuchiki age com tamanha insensatez?

 

ooo ooo ooo ooo

 

Urahara abriu aquele aparelho semelhante a um notebook, defrontando-se com a imagem do capitão Ukitake.

 

Urahara, bom dia.”

 

– Bom dia, capitão Ukitake.

 

Desculpe chamá-lo tão cedo.”

 

– Ora, não se preocupe comigo.

 

Temos problemas... Byakuya está indo até aí atrás de Rukia.”

 

– É... eu soube. E se minha percepção não estiver me traindo, ele já chegou.

 

Já?!” - exclamou, lívido. “Ele deve ter usado um portal privativo.” - deduziu certeiro.

 

– É provável.

 

Então não há tempo a perder, você precisa avisar os dois!” - disse alarmado.

 

– Eu até poderia, mas há essa hora, ele já os encontrou.

 

ooo ooo ooo ooo

 

Ele não saberia definir ao certo o que sentiu diante daquela cena, mas se recordou de ter experimentado algo semelhante na primeira vez em que se deparou com o jovem Kurosaki Ichigo, na ocasião de sua vinda ao Mundo Real, precisamente atrás da irmã, no momento em que ela insistiu aproximar-se do corpo inerte dele, vítima de seu golpe.

 

Chegara ao Mundo Real há poucos minutos, e a surpresa daquele flagrante o fez estancar no lugar, atônito. Não imaginava que aqueles dois estivessem em tal nível de intimidade.

 

Já estava ciente do fato deles se amarem, contudo, não cogitara que Rukia intentasse estar com ele daquele modo tão cedo. Em seu entender, manteriam a amizade até que o moço alcançasse a maturidade e, dali uns quinze ou vinte anos, formalizariam o relacionamento. Mas não, Rukia portava-se como uma adolescente irresponsável e não como a shinigami disciplinada que sempre fora, ou seja, como uma Kuchiki.

 

Kurosaki até podia ter poderes de shinigami mas a vida dele estava no mundo real, da mesma forma que a dela estava na Soul Society e com o clã. O convívio que pudessem ter naquele estágio era esporádico. Como manter um relacionamento afetivo naquelas circunstâncias?

 

Não era uma questão de classes sociais como fora com ele e Hisana, aqueles dois ainda pertenciam a mundos diferentes literalmente. Ou Rukia estaria disposta abandonar seu posto e passar a viver no Mundo Real, decaindo de nível? Depois de tanto esforço faria algo assim? Ele definitivamente não podia acreditar.

 

Então aquela paixonite inconveniente era a principal razão da presença dela ali e não a nova espécie de hollows? Viam-se diante de uma suposta ameaça e aqueles dois só pensavam neles próprios.

 

Ficou desgostoso e à medida que as carícias deles tornavam-se mais intensas, a vontade de repreendê-los começou a sufocá-lo. Chegou a dar um passo naquela direção, mas deteve-se ao ouvir a voz de Rukia.

 

Me deixa te ajudar”.

 

Permaneceu parado, estava próximo aos dois, mas só alguém de exímia habilidade seria capaz de perceber sua reiatsu. Por isso, esperou e, muito atento, acompanhou toda a discussão.

 

Bakamono”. - foi a última coisa que ouviu a irmã dizer.

 

Uma ponta de arrependimento chegou a alfinetá-lo depois de ter escutado a conversa deles. Afinal, não eram tão irresponsáveis como tinha pensado.

 

Suspirou fundo, buscando abrandar a revolta, mas logo concluiu que não podia simplesmente ignorar aquilo, voltar por onde tinha vindo e fazer de conta que estava tudo bem.

 

Não estava!

 

Ao perceber que eles voltariam a se beijar, decidiu revelar sua presença, apenas hesitou uns instantes pensando em como abordá-los.

 

ooo ooo ooo ooo

 

A voz de Byakuya fez Ichigo e Rukia enregelarem-se como se tivessem despencado no Pólo Norte.

 

Afastaram-se com rapidez, endireitaram a postura, ficando sentados sobre os joelhos, e curvaram as cabeças, desconcertados. O susto e a vergonha impedindo que qualquer um falasse.

 

– Heim? Desde quando, Rukia? - insistiu com o olhar fixo na cabeça baixa da irmã.

 

Ichigo ergueu momentaneamente o rosto só para ter certeza de que o irmão de Rukia não parecia fazer caso dele.

 

– Oe... Bya-

 

– Cale-se, Kurosaki Ichigo! - cortou-o de pronto.

 

Rukia se retraiu com o tom severo do irmão. Condoeu-se por ele falar daquele modo com o Ichigo e por isso tentou desviar aquela ira toda para si própria.

 

Nii-sama... - chamou num tom firme, ganhando a atenção dele – minhas sinceras e humildes desculpas. Sei que elas não bastam para aplacar meus atos insensatos, mas rogo que, pela vossa clemência, deixe Ichigo fora disso. Ele não tem culpa alguma.

 

Indignado, Ichigo não deixou por menos:

 

– Não começa com isso, Rukia! - esbravejou ele.

 

­Ainda sem levantar o rosto, ela estendeu uma mão espalmada a ele, pedindo com esse gesto que ele não dissesse nada. Apesar da raiva Ichigo se conteve por causa dela.

 

– Um pedido de desculpas é tudo que tem a me dizer? - indagou Byakuya, muito sério.

 

A jovem ergueu o rosto na mesma hora e o encarou com uma expressão perdida.

 

– Bem... eu...

 

– Rukia... a insensatez a qual me referi não está no fato de amar este moço, mas sim em você consumar um relacionamento sem ao menos anunciá-lo à sua família e, obviamente, assumir as implicações que tal decisão acarretam.

 

Espanto e surpresa ficaram impressos nas faces dos dois jovens. Não esperavam por aquilo.

 

– Até quando pretende valer-se das regalias de seu capitão para poder ficar ao lado desta pessoa? Desaprendeste a arcar com as consequências de tuas decisões? Acaso lhe ensinei a ser inconseqüente assim?

 

Ichigo ficou perplexo, perguntando-se porque Byakuya tinha que ser sempre tão rígido.

 

– Compreendo... - assentiu Rukia.

 

– Mas sua falta de consideração não é nada perto do que me foi relatado agora, razão pela qual estou aqui. Você não pôde cuidar nem daquilo para o qual foi tão escusamente designada.

 

– Está se referindo ao hollow de ontem? - adiantou-se Ichigo.

 

– E do que mais? - o nobre retrucou seco.

 

– Mas eu sou o responsável por Karakura! - gritou em defesa de Rukia.

 

– O que só torna a situação mais lastimável. Mesmo que ser um shinigami substituto não signifique grande coisa, você contava com a ajuda de alguém que dizem estar no nível de um vice-capitão. Ainda sim, ambos são tão incompetentes que obrigaram um capitão vir até aqui fazer o trabalho de vocês.

 

Rukia sentiu o peso de uma montanha nas costas. Ichigo emudeceu diante da ideia de incompetência, então aquela apreensão que o atormentara durante a noite voltou com força redobrada. Nem mesmo se tivessem sido confrontados pelo capitão comandante, Yamamoto Genryusai, aqueles dois teriam ficado tão abalados.

 

– Chega de conversa. Rukia, você vem comigo - intimou Byakuya.

 

– Como assim? - sobressaltou-se Ichigo.

 

– Essa brincadeira termina agora. Voltaremos à Soul Society imediatamente.

 

– Quê!? Brincadeira? E quem está de brincadeira aqui?! - exclamou ultrajado Ichigo. – Nada disso! Você não pode fazer isso!

 

– O que quer dizer com eu não posso? - rebateu Kuchiki na altivez típica.

 

– Claro que pode, Ichigo. Afinal de contas ele é um capitão.

 

– Mas ela não veio por conta própria! Está aqui em missão, seguindo uma ordem direta do Ukitake-san! - esbravejou o garoto, encarando o capitão.

 

Um olhar indiferente foi toda a resposta de Byakuya, ainda que o argumento do rapaz fosse pertinente.

 

– Ichigo, na posição em que estamos devemos obediência a qualquer capitão - explicou Rukia.

 

– Sem essa, Rukia! Sempre fizemos nosso melhor, como ele pode dizer que não é problema você gostar de mim e agora vir com essa... - dizia ele, mas Byakuya usou qualquer coisa nele, pois quando deu por si, estava impossibilitado de se mexer ou falar.

 

– Chega de conversa - repetiu o capitão.

 

Rukia, que tinha abaixado o rosto novamente, não percebeu nada.

 

– Vamos - ele a chamou.

 

– Sim, ni-sama.

 

De olhos vidrados Ichigo viu Rukia se colocar de pé e uma torrente de pensamentos inundou a mente dele. O fato de ter sido aprisionado por alguma técnica que não conhecia, a frustração com o conflito na noite passada, o tom severo com que Byakuya falava com Rukia e a atitude resignada dela, tudo isso, fez com que algo dentro dele se rompesse.

 

Estranhando então a quietude repentina do rapaz, Rukia virou o corpo na direção dele.

 

– O que foi? - perguntou ela.

 

Byakuya observava a expressão desconfiada dela, mas, de repente, virou o rosto para o lado do jovem.

 

Foi então que a forma shinigami de Ichigo saltou de seu corpo, sem o uso de qualquer dispositivo para a separação. Devido ao bakudou paralisante, o corpo vazio não tombou e permaneceu na mesma posição, sentado sobre os joelhos.

 

Intrigados, os irmãos observaram com os olhos vidrados, Ichigo dar alguns passos à frente e então fitar o capitão Kuchiki com um sorriso estranhíssimo, desafiador e maquiavélico.

 

Yo?! - falou e na mesma hora os dois notaram o timbre de voz de quando ele usava a máscara de hollow.

 

– Como ele conseguiu se livrar de um bakudou de nível 70? - murmurou Byakuya consigo, abismado.

 

– Eu... já vou te mostrar como! - o outro retrucou num tom debochado.

 

ooo ooo ooo ooo

 

Uryuu acordou de repente, meio desorientado, sem saber direito onde estava, e espantou-se ainda mais ao ouvir um resmungo atrás de si. Ergueu-se na mesma hora e voltou-se naquela direção, deparando-se com Orihime, encolhida sob um cobertor, dormindo tranquila.

 

Seus lábios se curvaram num leve sorriso ao relembrar de tudo então. Aconteceu que depois de tê-la acompanhado até em casa, ela o convidou a entrar. Conversaram sobre o ocorrido, fizeram um lanche e acabou que ela perguntou se ele não queria dormir ali.

 

Na hora, devido ao cansaço, não atinou para o fato daquilo ser um tanto inapropriado, mas sendo que ela ainda aparentava estar abalada, não com a aparição do hollow em si, mas com a dificuldade que tiveram para contornar a situação, acabou concordando.

 

– E sequer ficamos em cômodos separados - observou e até corou diante do fato, vendo que estavam em futons dispostos lado a lado no meio da sala.

 

Foi bom ele ter acordado primeiro. Ainda teria tempo de passar em casa e aprontar-se direito para ir a escola, talvez nem chegasse atrasado. Buscou os óculos ali ao lado e depois se sentou bem perto da amiga.

 

Ela estava linda. Parecia até uma daquelas modelos famosas, com a diferença de possuir um corpo bem mais... avantajado, uma autêntica musa, pensou ele. Mas logo balançou levemente a cabeça, deixando de lado as comparações.

 

Esticou uma mão então e afagou bem devagar a franja dos cabelos da moça. Esperava que ela acordasse com isso, pois não queria sair sem avisá-la, mas, subitamente, sentiu uma emanação de poder fortíssima não muito longe dali.

 

– Que presença é essa? - indagou-se preocupado.

 

ooo ooo ooo ooo

 

Ichigo! Pára com isso! Ichigo!”

 

Ele ouvia a voz de Rukia gritando aquilo, mas não entendia porque motivo. Correu as vistas ao redor e viu que estava naquele mundo de céu azul e prédios de vidro, dentro de seu próprio coração.

 

Aflito, tentava saber de onde a voz dela vinha quando de repente, o espaço a sua volta começou a ser tragado e, antes mesmo que se acercasse do novo local, entreabriu os lábios num susto ao deparar-se com os olhos vidrados de Byakuya, e suas duas mãos apertando a garganta dele!

 

Né, Ichigo?! Deixe-me matá-lo pra você, e não atrapalhe dessa vez.” - seu lado hollow falou dentro de sua cabeça.

 

– Ichigo!! Solta o nii-sama! Ichigo! - gritava Rukia a todo fôlego.

 

Ele quis largar na mesma hora, mas, desconcertado, percebeu que não tinha controle algum de seu corpo.

 

Não!” - berrou à própria consciência.

 

Que não o que?! Esse metido duma figa já devia estar morto há muito tempo.” – foi o que ouviu em resposta.

 

Se pudesse teria ficado trêmulo ao ver os olhos semicerrados do irmão de Rukia perdendo a vitalidade. Tentou com todas as forças retomar o controle, mas era inútil.

 

– Não! - gritou Rukia e num ato desesperado pulou nas costas do corpo espiritual dele, querendo afastá-lo, puxando os braços dele para trás, mas sem conseguir movê-los um centímetro.

 

–-Por que tenta me impedir, lindinha? Não é melhor pra todos nós que ele morra?! Ele e suas detestáveis normas?!--

 

– Solta!! - gritou transtornada.

 

Rindo, aquele que dominava o corpo do rapaz, atendeu, ainda que sua intenção fosse realmente se livrar deles todos.

 

Nii-sama!

 

Byakuya se esparramou no chão, sem fôlego, pálido, mas precisou apenas de um segundo para se recompor e desaparecer, com a rapidez de um raio.

 

Rukia, ainda pendurada nas costas daquele ser, virou a cabeça à procura do irmão, preocupada, mas então sentiu um apertão doído na nuca, e em seguida, seu corpo foi alçado para frente e jogado com tudo no tatame. Assustada, ela encarou seu agressor, reparando nas córneas totalmente negras dos olhos dele. A expressão era sádica, a reiatsu tremenda e assustadora. Não era o Ichigo que conhecia e amava.

 

–-Você também não passa de um estorvo.-- bronqueou ele, meio curvado sobre o corpo dela, e num gesto rápido puxou a zampakutou das costas.

 

Rukia só teve tempo de fechar os olhos, incapaz de se defender contra uma zampakutou estando ainda naquela gigai.

 

Hadou 63, Soren Sokatsui - bradou Byakuya, ainda rouco, contra o corpo espiritual de Ichigo, sem pestanejar.

 

Atingido em cheio pela bola de fogo azul, o ser que dominava Ichigo, foi arremessado para longe de Rukia devido ao impacto do ataque.

 

– Ichigo!! - gritou Rukia, alarmada.

 

Byakuya captou a nota de desespero no tom dela, afinal, aquele era um ataque bastante forte. Agiu por instinto, diante da ameaça dela vir a ser morta, mas sabia que não mataria o rapaz com aquilo.

 

Rukia se ergueu num instante e vinha na direção do rapaz, mas logo estancou no lugar quando o derrubado voltou a falar:

 

--Bom... isso foi bom... - disse num tom arrastado, o dano fora alto, mas sua regeneração era aceleradíssima. --Até que você melhorou um pouco. Mas ainda sim, não é páreo pra mim!!-- bradou e se colocou de pé.

 

Antes que Rukia pensasse em fazer qualquer coisa, Byakuya surgiu à frente dela.

 

– Afaste-se - mandou ele.

 

--Vai me mostrar outros truques legais, capitão?-- provocou irônico, batendo as mãos nas vestes para livrar-se das cinzas deixadas pelo ataque.

 

Rukia deu um passo para o lado e encarou aquele ser. Ele parecia ter estampado na face uma satisfação insana pela luta e uma ânsia por poder que fazia a racionalidade se esvair por completo. Não podia deixar Ichigo ser consumido por um instinto tão destrutivo.

 

–-Vem.-- o tal chamou por Byakuya.

 

Alarmada, ao ver o irmão levar a mão ao cabo da zampakutou, Rukia fez a primeira coisa que lhe veio à cabeça.

 

Bakudou 61, Rikujokoro! - lançou ela contra o corpo espiritual de Ichigo e, logo depois, seis fachos de luz o aprisionaram.

 

Byakuya ficou boquiaberto com o fato de Rukia conseguir lançar um kidou daquele nível estando ainda numa gigai. Até ela mesma parecia surpresa com o próprio feito.

 

--Acha que pode me prender só com isso?!-- desdenhou o aprisionado.

 

Ignorando a provocação, Rukia ficou diante de seu irmão.

 

– Por favor, nii-sama, deixe-me cuidar disso! Deixe-o comigo! - implorou aflita.

 

Ele a encarou por breves instantes, mas sem consentir e nem responder, empurrou-a para o lado, tirando-a do caminho.

 

– Byakuya ni-sama, por favor! - ela gritou. – Acredite em mim! Me dê essa chance! - insistiu.

 

O temporariamente aprisionado desatou a rir.

 

--Não precisam brigar! Eu dou conta dos dois!!-- prosseguiu provocando-os.

 

Byakuya voltou o rosto a irmã. Além de aflição encontrou também muita determinação no olhar dela. Refletiu um pouco. Kurosaki podia estar fora de si, mas ainda sim era a pessoa que ela amava. Endireitou então a postura, soltando o cabo da espada.

 

– Saia dessa gigai. Seu bakudou não irá segurá-lo por muito mais tempo - disse ele.

 

Assentindo com a cabeça, Rukia correu a um canto em busca da gikongan, passando a forma shinigami num instante.

 

Mae, Sode no Shirayuki - disse liberando sua zampakutou.

 

–-Não me faça rir, sua anã de jardim!-- aquele ser debochou e concentrando uma áurea negra ao redor de si, libertou-se com certa facilidade.

 

Diante da assombrosa onda de reiatsu, Byakuya, precisou se esforçar ao extremo para manter a resolução de não interferir, sobretudo, ao ver Rukia se posicionando a sua frente.

 

--Agora, você não me escapa!-- berrou e saltou com tudo na direção da corajosa Kuchiki, rindo e com a zampakutou em punho.

 

Tomado de arrependimento, Byakuya sentiu o coração falhar uma batida, ao som daquela gargalhada enlouquecida, certo de que a irmã não iria resistir.

 

No instante derradeiro entre a vida e a morte, vendo a lâmina de Zangetsu a centímetros de sua testa, Rukia bradou:

 

Bakudou 39, Enkosen!

 

Um escudo de reiatsu surgiu à frente dela, bloqueando o ataque com precisão.

 

Quando a lâmina bateu contra a proteção, tanto a zampakutou como seu portador foram repelidos longe, este último vindo a bater o corpo contra a parede oposta do quarto, que por pouco não desmoronou.

 

Byakuya piscou, estupefato, diante do que tinha acabado de presenciar.

 

– Ichigo! Volte a si! - gritou Rukia ao namorado, naquele tom firme tão conhecido dele.

 

Aprisionado dentro da própria consciência, Ichigo achou que teria um surto. Ver a si mesmo atacando a mulher de sua vida e ter se safado por um triz de perdê-la para sempre, o deixou em estado de choque. Um instante a mais daquela loucura e sua existência seria completamente absorvida por aquele insano.

 

– Deixe o Ichigo em paz! - gritou ela ainda.

 

--Cala essa boca! - vociferou em resposta e se colocou em pé. --Você é igualzinha a esse metido. Na verdade, os três são iguais! Cheios de querer! Bando de inúteis, eu vou mostrar pra vocês o que é poder de verdade!--

 

Atônitos, os dois irmãos ficaram a encarar aquele insano.

 

--Bankai!-- ele bradou, fazendo o quarto todo tremer.

 

Byakuya vidrou os olhos ao perceber que o tal iria desferir o mortífero Getsuga Tenshou ali dentro. Precisava impedir! Mas então viu que Rukia já se adiantara em agir.

 

Movendo-se numa velocidade que nem ela mesma sabia ser capaz de atingir, Rukia desapareceu momentaneamente e surgiu junto do corpo espiritual de Ichigo e então fechou uma mão no pulso dele. A surpresa foi tanta que, num gesto involuntário, ele abriu a mão deixando Zangetsu cair no chão.

 

Como um vínculo que se enfraquece, sua vista turvou na hora e a consciência contida do dono daquele corpo se agitou, mas conseguiu impedir a retomada do controle no último instante.

 

– Ichigo? - ela chamou num tom mais ameno, notando uma certa hesitação nele.

 

--Sua cretina, eu te pego!-- retrucou num berro e agachou para alcançar a zampakutou, mas não achou nada. Levantou o rosto então para o outro ali presente e lá estava Zangetsu na mão de Byakuya. --Podem ser fracos, mas são realmente rápidos!-- praguejou.

 

– Você tem que voltar a si, Ichigo! - exclamou Rukia, e durante todo o tempo mantinha a firmeza na voz.

 

--Ele tem é que ficar mais forte!--

 

– E vai ficar! Mas não graças a você! - ela retrucou alto.

 

Rukia.” - a mente de Ichigo clamou num apelo angustiado.

 

--Idiota... fique quieto aí... Eu sou sua melhor opção, posso acabar com aqueles hollows com as duas mãos amarradas! Posso fazer Aizen implorar por clemência! Eu vou te mostrar o que é ser realmente forte!--

 

– Chega! - gritou Rukia, furiosa. – Ichigo não tem que lutar sozinho! Não tem que fazer nada sozinho! Não tem! Esse seu poder não irá levá-lo a lugar algum! Deixe-o em paz!! - gritou e ainda disparou o hadou de quarto nível em seguida – Byakurai!

 

Ele o recebeu em cheio, mas ficou mais atordoado com aquelas palavras do que com o ataque. Depois disso não conseguiu mais permanecer no controle. O corpo espiritual tombou inerte. Os olhos pararam vidrados e o negror das córneas foi desaparecendo aos poucos.

 

– Ichigo! - chamou Rukia, correndo até ele.

 

Assustada com a imobilidade do corpo, ela percebeu quando o respirar dele cessou de repente.

 

Oe! Ichigo! Ichigo!! - naquele instante ela não pôde mais conter as lágrimas.

 

Ouvindo o choro dela, Ichigo abriu os olhos e reunindo tudo que lhe restava de forças, alcançou a mão dela e apertou-a levemente.

 

– Ichigo?!

 

Byakuya imaginou que era melhor o rapaz voltar a forma humana, então virou-se ao corpo estático dele e desfez o encantamento que o paralisara. A casca vazia tombou na mesma hora e, instantes depois, a forma espiritual de Ichigo desapareceu. Rukia arregalou os olhos, desconcertada, deduzindo o pior.

 

– Ichigo!! - gritou ela.

 

– Acalme-se, Rukia - falou brando o capitão. – Ele apenas retornou a seu corpo humano.

 

A jovem encarou o irmão, ainda sem entender, mas então ouviu um engasgar do jovem caído um pouco mais adiante de onde estava. Bem depressa, veio até ele e apoiou-lhe a cabeça em suas pernas.

 

– Ichigo... - falou aliviada, num tom ameno.

 

– ...não me deixa... - balbuciou ele num delírio.

 

Abraçando forte o corpo dele, Rukia suspirou fundo.

 

– Não vou te deixar nunca, nunca...

 

Byakuya os encarou e aquela cena acabou com qualquer resquício de zanga que ele ainda pudesse ter. E sem a menor ideia do que dizer ou fazer, sentiu-se totalmente deslocado ali.

 

Quando deixara sua residência, pela manhã, pensava naqueles dois como jovens travessos, os quais iria disciplinar, mas agora compreendia que a realidade era outra e bem mais complicada.

 

Desde o envolvimento emocional até seus papéis como shinigamis a serviço da Soul Society, Ichigo e Rukia fugiam totalmente ao padrão de subalternos que ele estava acostumado. Ao menos foi um alento constatar que, ao contrário do que vinha acreditando, longe de estar decaindo de nível sua irmã tinha, na verdade, progredido e muito, sobretudo, na habilidade de usar kidou.

 

Pensamento semelhante perpassou a mente do jovem Kurosaki, quando enfim, pôde corresponder ao carinhoso abraço de sua amada.

 

– ...eu aceito sua ajuda... - o adolescente assentiu num sussurro amuado, mas definitivamente convencido.

 

– Que bom... - retrucou ela baixinho, ainda derramando muitas lágrimas.

 

CONTINUA...

 

ooo ooo ooo ooo

 

Vocabulário:
Souren Soukatsui: Fogo azul das flores gêmeas
Rikujokoro: Prisão dos seis fachos de luz
Mae, Sode no Shirayuki: Dance, Luva de Neve
Enkosen: Escudo de arco
Byakurai: Relâmpago pálido

 

Notas:
- Bakudou são encantamentos (kidou) de defesa, enquanto hadou são de ataque.
- O bakudou 61, Rikujokoro, é o mesmo usado duas vezes por Byakuya, primeiro em sua luta contra Renji e posteriormente para conter Rukia na luta contra Zommari.
- O bakudou 39, Enkosen aparece no capítulo 322 do mangá e foi usado por Kira Izuru.

 

 

 


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Notas finais do capítulo

Eu fiquei com o coração apertado de escrever esse capítulo, nem sobrou brecha para piadas. Para quem queria o drama, valeu?

Agradeço pelos comentários, pessoal!
Vocês sempre me deixam feliz da vida quando comentam!
Um grande abraço pra todos que tem acompanhado!