Premonição: Espetáculo Negro escrita por PeehWill


Capítulo 9
O Jogo do Azar


Notas iniciais do capítulo

Galera, me desculpem pelo grande hiato em que coloquei a fic. Mas o que importa de verdade nesse momento é que eu voltei ( agora pra ficar ♫). Enfim, segue o penúltimo capítulo, que está transbordando de tensão e aflição.

Espero que gostem!

Aproveitem!



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Adam, Allison e Bruce estavam sentados em uma calçada, próximos do incêndio da festa de aniversário da filha de Ginger, Chelby. O garoto loiro passava as mãos insistentemente nas manchas causadas pela fumaça em seu rosto, enquanto a jovem de cabelos castanhos abraçava as pernas, como sinal de se proteger do frio. Bruce tirou a parte superior de sua vestimenta, uma capa preta, e colocou sobre o corpo inclinado de Allison.

— Obrigada. — Sorriu. — Pode me contar mais sobre você? — Só depois de perguntar, foi que ela conseguiu entender a indelicadeza que havia cometido. — Se quiser, é óbvio.

Houve um silêncio assustador, antes que ele pudesse começar a falar:

— Sabe... Muitas coisas aconteceram desde o desastre do Comet Circus. Muitas reviravoltas, tristezas, alegrias momentâneas... — Ele sabia que não era a resposta que ela queria, e que a conversa tomaria um rumo diferente, mas decidiu continuar. — Mas o mais incrível, foi o que eu aprendi com tudo isso. Todos têm um final. Por mais que você lute para impedir que seu fim chegue, você não consegue mudar os planos do destino. E quando muda, ele retorna pra consertar seu erro pra você, te dando o mesmo desígnio de uma forma diferente.

Allison e Adam permaneceram calados, apenas fitando a face triste do mágico. Seus cabelos negros, que antes estavam espetados, agora estavam completamente bagunçados e cobertos de poeira.

— Daí, quando você acorda e percebe realmente o que está acontecendo ao seu redor, você já perdeu metade de si. Metade da sua vida, do seu tempo restante. E junto com seus pedaços, foram seu amor, as pessoas próximas de você... — Disse aquilo pensando em Betty e em seu avô.

Lembranças simultâneas iam e vinham na cabeça de Allison. O mesmo acontecia com Adam. Ela, com recordações de Chase, seu grande amor, e em como perderam o contato repentinamente; Ele, o pequeno visionário, lembrava dos momentos felizes que passou ao lado da mãe e da irmã, ao mesmo tempo em que a imagem de seus túmulos ficava cada vez mais presente em sua memória.

Allison recordava-se bem da semana em que decidira que viajaria para a Pensilvânia e ficaria algum tempo por lá, até se estabilizar emocionalmente. Com todos os problemas que estava enfrentando com seus amigos e com a lista, talvez fosse difícil poder esquecer aquela bagunça em sua vida. Todo o medo e a aflição que guardava em si, algum dia poderia se esvair de vez de dentro de seus pensamentos. Era como uma abelha deixar de colher seu pólen, ou um leão deixar de ser o rei da selva. Era uma necessidade poder ser dona de seus pensamentos, e viajar para outro lugar poderia devolver para ela uma felicidade que há muito tempo já havia ido embora.

Despediu-se de Chase com um aperto no peito e um abraço que marcaria sua saudade. O beijo seguinte fora o mais delicado e singelo possível. Allison podia sentir-se presa de algum modo a ele, pois era uma sensação que só aumentava a cada batimento cardíaco. E desde o acidente na caverna no Colorado, os dois puderam perceber que se gostavam e que queriam viver juntos, felizes, sem medo de seguirem em frente. Mas apesar de todos os acontecimentos, deixar de ficarem próximos um do outro não foi uma tarefa nada fácil.

As circunstâncias levaram Allison a se mudar e deixar Chase. A dor da partida foi inevitável, mas ela queria seguir em frente, sem olhar para trás. Bom ou não, era preciso. Foi a partir daí que Allison começou a se julgar egoísta e mesquinha ao ponto de deixá-lo sozinho. Achava que a lista havia sido quebrada. Porém, a notícia da morte de Chase, perto de sua volta para a cidade, só lhe abateu mais. Àquela hora ela soube que a lista ainda a perseguia, e desde então ela vem fugindo de acidentes em que ela sempre era o alvo. Já tinha escapado de um massacre durante um festival, já havia saído de um shopping antes de haver um desabamento, até se livrou de ser atropelada por um trem. Eram ocasiões em que a morte se aproveitara para tentar levá-la. Agora, sendo o alvo novamente, Allison trouxe consigo um número razoável de pessoas para a lista. Ser um alvo era um pesadelo.

— Nós vamos conseguir, eu só tenho que lembrar quem são os próximos.

Allison despertou a voz de Adam.

— Você está disposto a voltar ao acidente? — Perguntou Bruce, se erguendo da calçada.

— Sim. — Respondeu o loirinho com o olhar confiante.

Adam olhou para as árvores de frente, sendo chacoalhadas pelo vento. Estava uma noite estrelada, mas as nuvens já começavam a vagar pelo céu. Por fim, todos se levantaram e se fitaram. Adam forçou a mente para relembrar do acidente. Com seus olhos em transe, sobre influência de suas lembranças, ele começou a falar:

— Gritos, fogo e muitas pessoas correndo para a saída. Foi ai que a madeira caiu em cima do Bruce e ele morreu. — O garoto parecia nem perceber que estava em transe, só olhava para o nada. — De repente ouve um enorme clarão e uma explosão... Aquelas duas mulheres foram jogadas nas barras pontudas e a passarela caiu em cima delas e... — As lágrimas começaram a cair pelo seu rosto, mas ele não se importava. — Elas morreram.

— Aquelas duas mulheres? — Bruce indagou.

— Se não sou eu, devem ser Shanon e Paris. Então, depois de você são elas! — Allison concluiu.

— Eu estava segurando a mão do meu pai. — Adam continuou. — Em seguida não estava mais, porque ele tinha sido esmagado pela estrutura da saída. — O loiro comprimia os lábios, sentindo o aperto no coração.

— E depois? — Perguntou Bruce.

Allison o olhou como se tivesse abominando sua atitude. Apenas colocou o dedo indicador em seus lábios e gesticulou negativamente. O mágico entendeu a mensagem de imediato e retrucou:

— Me desculpe.

Adam apenas sorriu de leve.

— Elas são as próximas. Devemos alertá-las. — Disse ele, se afastando dos dois.

— Você está sentindo algo de diferente? Alguma sensação estranha? — Allison se aproximou dele, caminhando lado a lado.

— Não. — Adam respondeu cabisbaixo.

— Eu não acho que a morte vá pega-los agora. — A voz de Bruce pegou-os de surpresa. Mesmo tendo a certeza de que Allison o repeliria de algum modo, ele resolveu arriscar.

Allison parou para pensar um pouco.

— Também acho. Adam, você não está sentindo nada. Isso pode significar uma parada. E já está tarde, não há como alertá-las agora, pois provavelmente já estão dormindo. — A jovem assistente de veterinária queria apaziguar a situação, colocar algum conforto em seus corações.

— Pode até ser... Mas quanto mais rápido fomos, mais tempo teremos para bolar alguma coisa e destruir isso.

Todos se entreolharam.

x-x-x

16 de julho de 2012

Quando Allison pôs o casaco, ela queria ter certeza de que não havia esquecido nada. Olhou-se no espelho uma última vez, analisando cada ponto de seu corpo. Não satisfeita fez uma careta e se dirigiu até a porta. Apagou a luz com cuidado e fitou o quarto escuro. Era gratificante ter que cuidar de Adam, ter de ficar na casa da família dele por algum tempo. Era satisfatório para ela poder ajudá-lo a seguir em frente, coisa que não fizera com Chase.

A casa estava dominada por um silêncio mortal. Caminhou com cuidado pelo corredor do andar de cima e passou pelo quarto de Samuel. Ele estava no trabalho e a curiosidade da garota falou mais alto. A porta entreaberta revelou por uma brecha uma pequena luz que clareava e formava um desenho na parede clara do quarto. Adam estava em seu quarto se arrumando, pois os dois iam até a casa de Paris. Já havia telefonado e a notícia de que suas ligações iriam para a caixa-postal a desmotivou. Então, percebeu que teria um tempo maior se fosse até lá para verificar.

A jovem entrou no quarto, sentindo um arrepio. Atritou uma das mãos contra o braço e observou o quarto por completo. A porta rangeu e ela saltou, sendo intimidada pelo objeto sobre uma cômoda. Era um notebook e ele estava ligado. Deve ser seu notebook do Sr. Berry. Por um segundo Allison sentiu-se uma intrusa naquela casa. E era de certo modo, mas não da maneira comum de ser. Ela apenas estava com o pensamento de que poderia ajudar.

Seria muita petulância verificar o que havia no computador, mas não tinha como lutar contra sua curiosidade. Falava mais alto do que ela mesma. Então levou a mão delicadamente até o objeto e pousou a mesma sobre a cômoda. Virou lentamente o computador e clicou no primeiro atalho que viu na área de trabalho. Foram apenas três segundos para que ela quase gritasse.

Tapou a boca no último segundo, sentindo seu coração saltar pela boca. Pôs a mão no peito e respirou ofegante. Não estava acreditando no que via. Queria gritar por Adam e pedir que ele saísse daquela casa imediatamente, mas não poderia. Talvez Samuel fosse mesmo um monstro horrendo, piores do que os de filmes de terror. Allison se afastou do notebook, ainda encarando as imagens que estavam na pasta. Tropeçou no canto da cama e caiu sobre as cobertas, ainda incrédula. Mal sentia as pernas, mas sabia que se tivesse tempo, conseguiria sair daquele lugar.

Mas antes que ela pudesse chegar até a porta, ligeiramente, Samuel atravessou o final do corredor, se aproximando do quarto. Merda! Ele chegou mais cedo! Então a jovem se desesperou. Voltou para dentro e procurou algum lugar para se esconder. Merda, merda, merda! Era o que repetia para si, enquanto lançava-se dentro do closet do quarto, por entre as roupas nos cabides. De dentro, pelas frestas do pequeno closet, dava para se ver o notebook sobre a cômoda e quem entrasse no quarto. Estava muito escuro, mas a luz do notebook lhe dava suporte. Allison viu quando Samuel entrou e passou pelo computador sem dar a mínima importância, mesmo ele estando ligado.

Logo em seguida ela o perdeu de vista.

O suor descia sob seus cabelos, até o final de seu rosto. Seu coração palpitava freneticamente, com batimentos muito acelerados. Suas pernas tremiam e seus olhos seguiam pelas frestas, tentando avistar o homem. Depois disso, Allison voltou a vê-lo. Ele estava próximo à janela, parecia estar fechando-a. Foi ai que o empresário notou seu notebook. A jovem que estava escondida no closet se encolheu mais para a esquerda, para a escuridão do compartimento.

— Porra! — Samuel se exaltou ao perceber que haviam aberto sua pasta em seu notebook.

Estava visivelmente enfurecido. E tinha motivos. Alguém havia visto o que ele tinha naquela pasta, e ele descobriria quem teria feito o ato, por bem ou por mal.

Novamente Allison havia o perdido de vista. Sua cabeça começara a doer, por conta de uma enxaqueca que já havia sentido desde o início da manhã, mas tinha dado uma parada. A escuridão ainda era o que predominava no cômodo, fazendo-a sentir um desconforto imensurável. Outro arrepio lhe tirou do silêncio, causando um espasmo involuntário. Causada pelo tremor, sua mão bateu contra a porta do compartimento, acidentalmente.

Desta vez, ela encostou os olhos contra as frestas, temendo que Sam houvesse ouvido o barulho. Encolheu-se novamente no closet e esperou ouvi-lo, entretanto, nada era audível naquele momento. Pensou ter escutado o toque suave de uma música bem ao fundo, mas não passava de sua imaginação. De súbito um par de olhos assustadores surgiu do outro lado das frestas, no lado de fora do closet. Allison saltou e se jogou para o fundo do compartimento, caindo no chão e batendo os joelhos contra a parede lateral do mesmo.

Era Samuel e ele estava prestes a abrir a porta. Chegou a deixá-la entreaberta por alguns segundos, e depois desistiu. Allie ouvira uma voz fina e acalentadora. Era Adam. Ele estava parado na porta, analisando a expressão de fúria estampada no rosto do pai.

— Algum problema, pai? — Perguntou-lhe diretamente.

— Nenhum. — Sam respondeu de imediato, passando a mão áspera sobre a testa suada de nervosismo.

Devagar, o empresário seguiu até a cômoda onde o notebook estava e o fechou. Tirou a gravata apertada e a blusa em seguida. Allison sentiu um nojo nascer dentro de si, acompanhado de um sentimento de repulsa. Samuel caminhou em círculos no quarto por três minutos, saindo do lugar antes que Allison se assustasse com uma aranha e desse um gritinho abafado.

Saindo do quarto do homem, a assistente de veterinária escutou uma breve conversa entre pai e filho no pé da escada.

— Você viu a Allie? — Adam se escorou no corrimão.

— Não. — Samuel respondeu de imediato pela segunda vez. Passou a mão no cabelo e olhou em volta. Parecia que seu único objetivo era encontrar a garota.

A jovem continuou escutando tudo lá de cima.

— Aonde você vai desse jeito? — Seu pai havia reparado na roupa.

— Eu e Allison iríamos até a casa da doutora.

O homem nem sequer se esforçou para lembrar-se dela.

— Sua psicóloga?

Adam meneou positivamente a cabeça.

— Uma hora dessas? — Desconfiando, Samuel caminhou até a pequena prateleira de vidro com algumas bebidas e de lá tirou uma garrafa de Uísque. — Achei que você e ela... — Desistiu de falar aquilo — Que bom que você e ela conseguiram se acertar. — E sorriu, carregando um copo de vidro e seu Uísque até o sofá.

Adam, cansado, sentou sobre o degrau da escada. Depois disso, uma mão pousou em seu ombro. Allie estava abaixada sobre um degrau mais acima.

— Estou aqui, Adam. — Mostrou um sorriso torto, enquanto se erguia e descia depressa. — Você está pronto? Então vamos!

A jovem estava fazendo de tudo para esconder o nervosismo evidente estampado sobre sua face. A cada olhar que lançava sobre Samuel, era como se uma dor lancinante penetrasse sua alma. Ela conhecera a família muito pouco, mas o bastante para reconhecer um verdadeiro psicopata. Então, em passos largos e ligeiros, ela pode levar Adam para fora, sem pensar em mais anda.

Suspeitando da garota, Samuel ergueu-se de sofá e espiou os dois saírem velozmente pela varanda, em direção à rua.

— Muito cuidado! — Gritou ele, da soleira da porta.

Allison nem sequer olhou para trás, apertou a mão do jovem visionário e os dois sumiram na neblina que se formava no final da rua. Sam não conseguiu remover seu olhar incomodado do rosto, mas fez de tudo para acalmar-se. Seu Uísque ainda o esperava.

x-x-x

Sem notar uma das grandes poças de lama em seu caminho, Paris acabou por enfiar seu tênis nela, gritando de raiva e fazendo uma careta. Limpou o bico do All Star vermelho, sentindo um arrepio tocar-lhe a nuca. Ergueu a cabeça novamente e avistou a rua deserta. Era provável que a maioria dos jovens da cidade estivesse na boate Neon Explosion àquela noite. E não seria diferente com ela, se não tivesse que enfrentar uma lista maldita que estava arrancando as partes de seu coração aos poucos, retirando os resquícios de vida que ainda habitava nela.

A sua toca verde preferida tapava o topo de sua cabeça, como de costume e escondia a maior parte da beleza de seus belos cabelos ondulados. A jovem arrumou a blusa com uma manga caída e passou a mão no tênis, vendo-o com uma mancha preta em sua ponta.

Um som de batidas era ouvido de onde ela estava. Aquele era o barulho estridente da boate que não deixava a vizinhança dormir. Paris seguiu as batidas, atravessou a rua e se pôs próxima da calçada da boate. A parte de trás do local só era acessível através de um portão com grades de ferro localizado em um beco ao lado. Porém, a entrada era proibida, e uma placa avisava a todos, pendurada sobre a grade. Com o tênis sujo, Paris caminhou mais um pouco, até que seus olhos revelaram uma enorme fila do lado de fora. Pessoas seguravam ingressos e se agitavam antes de entrar na boate. Também era perceptível a roupa característica em cada um. Logo, com as muitas cores e os muitos trajes, a filha da psicóloga notou que estava diante de uma festa à fantasia.

Se infiltrar no meio daquela multidão para ter acesso ao portão e às grades não seria uma tarefa fácil, mas ela tentaria. De imediato passou por uma quantidade razoável de pessoas paradas e entrou na fila, bem diante do portão de ferro adjacente à boate. Rapidamente esticou o braço até o portão e começou a empurrá-lo com toda a sua força. Tudo deveria acontecer como ela planejava. Se tivesse alguém querendo mesmo falar com ela, já deveria estar lá. E mesmo com um grande receio no peito em ir, já estava ali e decidida a saber quem ligara sua secretária eletrônica há horas atrás.

Sua força não bastou para abrir o portão de ferro e, em meio a uma multidão calorosa, se viu sendo empurrada para frente. As pessoas fantasiadas que estavam atrás discutiam sobre a demora da fila, então começaram a empurrar as outras. Paris conseguia escutar uma briga de casal mais atrás, porém, não ligou. Já estava longe o bastante do portão, para não alcançá-lo, então começou a tentar voltar até onde estava segundos antes. De repente alguém bateu um ombro sobre seu peito e ela virou-se para olhar quem havia feito aquilo. Um homem vestido de caveira bêbado estava rindo descontroladamente, indo em direção à rua. Foi quando Paris o viu quase ser atropelado por um veículo de entregas. O homem caiu na calçada e continuou gargalhando.

— Que idiota! — A jovem murmurou antes de olhar por cima dos ombros e ver alguém passando pelo portão.

Havia muita gente e ela não pode enxergar se era um homem ou uma mulher, pois o indivíduo estava trajando um manto preto sobre a cabeça e as costas. Com um movimento ágil e tramado, Paris passou por duas garotas que falavam no celular e empurrou a porta, abrindo-a. Depois de passar por ela, fechou-a com cuidado, mas logo decidiu deixá-la entreaberta, pois poderia correr se fosse preciso.

Assim que se virou de volta para o beco parcialmente iluminado, observou alguém caminhando em direção aos fundos da boate. Poderia ser algum segurança fantasiado ou só alguém drogado e alcoolizado querendo curtir com a sua cara, mas ela o seguiu pelo lugar, ao pé da parede, como um espião. Uma barra de ferro que estava no chão, já estava sendo apalpada e segurada por ela. Se o engraçadinho quisesse algo a mais, ela não teria piedade.

— Vou logo avisando que não estou para brincadeiras! — Gritou, quebrando o mínimo silêncio que ainda havia ali.

Passou alguns segundos caminhando no beco até encontrar a porta dos fundos da boate. E não havia ninguém a vigiando. Será que o “alguém” entrou ali? Paris deu apenas mais três passos, antes de ver algo se mexendo no canto do muro do beco. Estava saindo das sombras, mas parecia continuar consumido pela escuridão. A jovem de toca verde cerrou os cílios, tentando enxergar bem o que vinha em sua direção. A coisa tinha olhos, mas não tinha membros. Tinha uma coisa sobre os ombros, semelhante a um manto negro, mas tinha, ao mesmo tempo, ossos ao redor do rosto.

Paris gritou, mas seu grito saiu abafado, pois sua mão fora direto à boca em questão de segundos. Deu um passo para trás, batendo suas costas contra o muro, ao lado da porta. Um latão cheio de lixo virou, espalhando os resíduos pelo chão cheio de poças. Assim que contorceu o corpo para a esquerda na intenção de sair dali, a jovem tropeçou sobre o latão de alumínio e caiu com o rosto na poça.

Logo em seguida, com o rosto coberto pela água suja, Paris olhou para frente e tudo o que via era apenas a sombra no pé da parede. Não havia mais nada ali.

Será que era ela? Será que era a morte? Será que é minha vez?

x-x-x

— Alô? — Foi o que Bruce disse ao atender o celular.

Bruce, é a Allison. Onde você está?

— Estou comprando algumas coisas. — Neste momento, o mágico olhou para seu relógio de pulso. — Por quê?

É a Dra. Robynson. — A voz de preocupação de Allie era evidente.

— O que há com ela? Espera! Você não quer dizer que a morte...

Não. Não é isso. Ela acabou de sair de casa. Eu iria avisá-la de que era sua vez e a vi saindo no carro. — Allison engoliu em seco. — Eu não faço a mínima idéia para onde ela foi.

— É melhor se acalmar. — Disse ele. — Onde você está?

Estou pegando um táxi. Eu e Adam vamos segui-la.

Bruce pensou por alguns segundos, olhando a vidraça que ficava de frente a ala do supermercado em que ele estava. De longe ele via uma multidão aglomerada em uma calçada, e a música alta era audível de onde ele se encontrava. Ocorria mais uma das festas barulhentas da Boate Neon Explosion.

— Ok. Fique bem, Allie. — Falou ele, sentindo-se mais próximo da jovem assistente de veterinária.

Desligaram.

x-x-x

Samuel, somente com a calça do trabalho, andou pela casa, inquieto. O dedo no queixo subentendia que estava tentando decifrar algo. E o “algo” poderia ser quem tiver a coragem de mexer em seu computador. Não deveria tê-lo deixado ali, era claro, mas a presunção de verificar suas pastas e arquivos era mesmo surpreendente.

Não soube contar quantas vezes passara pela porta do quarto, encarando o notebook aberto sobre a mesa. Do outro lado do quarto, a janela mostrava o alto da casa do vizinho. Alguém entrara no quarto, mas quem seria? Adam passou pela sua cabeça, fazendo-o se questionar da obediência do filho. Ele nunca fora capaz de mexer nas coisas do pai. Nunca tivera uma mínima curiosidade de querer sabe o que tanto ele tinha naquele computador.

O homem caminhou devagar até encontrar o closet entreaberto. Um perfume estranho para ele invadia o lugar. Um cheiro feminino agradável. Logo, supôs que uma mulher havia entrado em seu quarto há algum tempo atrás. Mulher esta que poderia ser apenas uma pessoa, Allison. Com raiva, o empresário esmurrou a parede, sentindo um incômodo na ponta dos dedos. Estava visivelmente furioso com o que acabara de descobrir. Se Allison tivesse realmente entrado em seu quarto e visto seu notebook, com certeza ela teria que sumir do mapa.

x-x-x

Paris corria por entre a multidão, perturbada. Não sabia para quem olhava. Com a roupa completamente suja, a jovem se evacuou dali, sentindo as pernas doerem. O portão de ferro ficara entreaberto, mostrando a rapidez que fora ter que sair dali. Se realmente ela tivera o azar de tombar com a morte, só poderia ser uma coisa: ela era a próxima. Na secretária eletrônica... O chamado... Era o da morte! “D”! Um estalo mental fizera Paris atravessar a rua correndo, ainda olhando para trás, observando as últimas pessoas entrarem na boate.

Com um piscar de olhos, uma neblina espessa começou a invadir toda a rua. Quando a jovem notou, só havia ela naquela noite. Ela era a única pessoa a vagar ali durante aquele horário. A parte comercial da rua já estava de portas fechadas e a Neon Explosion havia posto todos os jovens fantasiados para dentro. Paris estava sozinha e completamente assustada. Um vento arrepiante soprou, trazendo um panfleto qualquer. O papel bateu em seu ombro, e quando resolvera pegá-lo, observou ele estava rabiscado com caneta vermelha sobre uma palavra: Death. E a jovem conseguiu entender tudo. Todos os sinais daquela noite. A chamada na seretária eletrônica. Tudo.

O “D” da chamada era de Death. O homem com fantasia de caveira ser quase atropelado e a imagem no fundo do beco. É isso! Todo este tempo ela quis me avisar de que eu era a próxima.

De repente Paris pode escutar um estouro. E mais outro, e outro. Da esquina de onde estava podia ver um casal. O homem acabara de cair no chão, completamente ensangüentando. Todo o seu corpo travou diante da cena. Junto do casal, um indivíduo com um capacete de motociclista e uma arma empunhada na direção da mulher.

x-x-x

Antes de Shanon entrar no amplo lugar, ouviu três tiros. Rapidamente apressou-se e viu a porta automática fechar atrás de si. Um leve arrepio levantou os pelos de seus braços. Ajeitou a bolsa no ombro e sentiu o ar-condicionado do lugar dominar. Olhou no seu relógio de pulso e seguiu com os olhos até o grande relógio digital de parede e luzes de Led que estava sob uma grande prateleira vermelha. As luzes de Led piscaram e em seguida apagaram, deixando o relógio com uma figura mais simples.

Em seguida, Shanon seguiu para uma das dez sessões do Supermercado, sem se importar com que acabara de ver logo na entrada. Assim que entrou na sessão três viu um homem no alto de uma escada, dando ajustes em uma lâmpada. O homem quase deixou cair a caixa de ferramentas que estava colocada com desatenção na ponta da prateleira de cosméticos. A psicóloga sorriu constrangida e passou pelo homem. Um segundo depois de sair daquela sessão ouviu um barulho estridente. As ferramentas haviam acabado de cair e se espalharem pelo chão do corredor.

Deu um riso antes de seguir até a sessão de congelados.

Por entre as prateleiras alguém lhe observava.

Rapidamente mexia no teclado do celular, digitando o número de Allison. E quando o nome apareceu, pôs o celular na orelha, esperando que a garota atendesse o mais rápido possível.

— Alô? — A voz de Allie tirou o mágico da concentração.

— Shanon Robynson está aqui, no supermercado.

— Você está com ela?

— Não, mas estou vigiando-a. — Respondeu. — A propósito... Você tem certeza de que ela morre em primeiro? — Sua mão tocou na cesta.

— Não acredito nisso! — Resmungou ela. — Não sabemos qual das duas morre primeiro, se é ela ou Paris. Na visão do Adam as duas são arremessadas por uma explosão e empaladas por metais pontiagudos.

— E onde está a outra garota?

A pergunta pegou Allie de surpresa. A adolescente parou de frente ao estacionamento do grande supermercado e respirou fundo. O celular ainda estava ao pé de sua orelha, quando ouviu um estouro seguido de um grito. Virou-se até a rua e avistou uma silhueta negra atrás da cerca de metal do estacionamento. A forma negra assustadora se dissipou no vento, quase que como pó.

— Ela está aqui!

Por poucos segundos, ao correr, Allison lembrou-se do perigo que o pequeno visionário corria, então gritou para que ele entrasse no supermercado. O viu fazer o que ela disse, então passou por todos os carros do estacionamento com velocidade. Chegando à calçada viu uma pessoa desesperada encostada na parede de um prédio residencial. Do outro lado da rua uma pessoa com um capacete na cabeça corria naquela mesma direção.

Foram milésimos de segundos para seu coração palpitar velozmente. Quase saltou pela boca. E em sua mente a palavra “morte” era a única que se cravava. A jovem recostada na parede virou o rosto, com uma quantidade de cabelo sobre o rosto. Mas mesmo assim, Allison pode reconhecê-la.

— Paris!

O grito assustou o indivíduo “mascarado”, que outrora apontava uma arma para Paris. Allison conseguiu desviar do primeiro tiro disparado por ele, em sua direção, e se escondeu atrás de um poste. Já a filha da psicóloga não teve a mesma sorte ao correr do provável assaltante.

Paris apenas sentiu sua nuca e costa arderem muito. Depois daí sua vista embaçou e desapareceu. Seus membros adormeceram com uma rapidez incrível. Bastaram alguns breves segundos para seu corpo bater com um baque surdo contra o asfalto, tingindo-o de rubro. O sangue escorreu até um bueiro. Allison gritou, vendo os buracos na nuca e nas costas de sua amiga despejarem sangue. O sujeito acabou fugindo.

x-x-x

Quando olhou para as mãos e as viu manchadas de sangue, Allie só pensou em como não estava se esforçando para destruir a lista. Salvar os que restavam dela era seu único objetivo, mas não estava movendo um dedo para que isso acontecesse. E se continuasse assim, teriam o mesmo destino de Chase e os outros. Não era isso que ela queria. Era exatamente o contrário.

De repente seus pensamentos foram interrompidos pela voz nervosa de Adam. Allison virou-se e se deparou com a face do garoto completamente vermelha.

— Encontramos a mãe do Charlie. Ela está na sessão de congelados com o Bruce. — Disse ele, puxando-lhe o braço.

Allie tentou esconder as palmas das mãos, do garoto. Ele não poderia ver aquele sangue. Mas antes dos dois chegarem até a sessão de prateleiras em que estavam Shanon e o mágico, Adam despencou no chão. A adolescente que o acompanhava lhe viu ficar de uma forma completamente grotesca. Adam se contorceu no meio do supermercado, gritando e urrando. Para ele, era um dor quase que infindável. Para ela, era uma agonia extrema.

Logo, o fato chamou a atenção de alguns funcionários. Shanon e Bruce vieram correndo, seguindo os gritos. Allison permaneceu estática, sem saber o que fazer. Sanon foi rápida e levou-lhe até seus braços, envolvendo-o como uma mãe. O mágico discou um número, mas seu celular estava com a bateria descarregada, o desligou e o guardou.

— Chamem uma ambulância! — Foi o que a psicóloga escutou ao longe.

De súbito, Adam começou a arranhar a si próprio. Primeiro foram os braços e em seguida, seu rosto. Seus lábios sangraram com a força das unhas sobre a pele. Bruce logo se abaixou e tentou segurar-lhe os braços, mas Adam parecia resistir. Era surpreendente a força com que a ponta da sua unha entrava em cada centímetro de pele de seu rosto alvo.

Por um segundo a assistente de veterinária quis avisar a mãe de Paris do acontecido. Era o correto, mas não teve a coragem necessária.

— Adam, pare! — Gritou Shanon, desesperada.

Depois disso, Bruce ergueu-lhe do chão e o segurou com as duas mãos. Shanon deu passos para trás, colocando sobre o rosto seu braço, limpando uma lágrima que saltava de seus olhos, com seu casaco. Mas aqueles poucos minutos foram o bastante para Allison perceber que a morte estava agindo.

Shanon. O nome da psicóloga ecoou na mente da jovem.

Então, viu Shanon com um olhar ameaçado. Seu corpo estava escorado sobre uma bancada. Era a bancada do açougue do supermercado. Ela não notou que seu cabelo estava bem próximo ao moedor de carne.

Adam se desvencilhou dos braços do mágico e, em passos rápidos, correu na direção da psicóloga, que arregalou os olhos, amedrontada. Adam bateu seu tronco contra o corpo da mulher, fazendo seu cotovelo se chocar contra o moedor de carne, ligando-o acidentalmente.  Shanon até tentou sair do balcão, mas o peso de Adam não deixou. Então seus cabelos castanhos foram engolidos bruscamente pela máquina. Ela fez um barulhinho irritante, enquanto moía os fios. Shanon gritou desesperada, se debatendo sobre o lugar.

Adam foi para trás com um impulso, caindo desacordado. Bruce se apressou para tirar a psicóloga de lá, mas a máquina já estava moendo parte de seu crânio. Shanon se esperneou, batendo os braços e as pernas.

— Tragam ajuda! — A voz de Allison saiu trêmula e embargada.

Em seguida, ela correu na direção de Bruce e o ajudou a salvar a psicóloga.

Entre lágrimas de dor, Shanon pode sentir sua carne rasgar. Seu rosto já fazia parte da massa moída e espremida sobre o balcão. A face do mágico estava revestida com seu sangue e o casaco de Allison também. A jovem não agüentou e vomitou. O que sobrou do rosto de Shanon fora apenas uma pequena massa retorcida sobre o vidro do balcão. Um pouco de sua massa cerebral estava espalhada por ali e resquícios de pele se misturavam ao sangue escuro.


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Notas finais do capítulo

Pode ter ocorrido de deixar pequenos errinhos passarem despercebidos na revisão. Por isso, peço encarecidamente a vocês, leitores, que me avisem destes errinhos. Okay? E não deixem de comentar! Até as reviews! o/



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