Premonição: Espetáculo Negro escrita por PeehWill


Capítulo 8
Em Queda


Notas iniciais do capítulo

Demorou? Demorou, e quero me desculpar pelo atraso. Apesar dos pesares, capítulo novo saindo. E já estamos chegando na reta final, ein? Hahaha. O título do capítulo tá fraquinho, mas não deixa o capítulo sem qualidade.
Espero que gostem!

Aproveitem!



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Quando Allison passou pelo portão da fábrica de bebidas, sentiu a energia negativa que estava espalhada pelo local. Seria difícil não presumir o que já havia acontecido. Carros e mais carros estavam se amontoando no estacionamento e na entrada da fábrica. Estes, além da ambulância e do carro da perícia. Foi impossível resistir e segurar a sensação agourenta, que penetrou no íntimo de seu ser, naquele instante. Mexeu no cabelo, tentando afastar a tal sensação negativa, mas assim que virou a cabeça para o lado, na direção da ambulância, avistou na sua traseira, Paris.

A sua amiga estava arrasada, com um semblante praticamente destruído por uma casca entristecida. Um segundo passou, depois de Allison se aproximar correndo e tocar seus braços.

— Paris, o que houve? Onde está o Freddy?

A outra apenas meneou a cabeça negativamente. Depois disso, Allison desabou por dentro. Já havia sido o quarto, contando com Charlie. E a propósito, ela ainda não tinha contado para Paris. Porém, antes de dizer qualquer coisa, sua amiga se ergueu de onde sentava e encarou-lhe feio. Estava explicitamente abalada.

— Quando pretendia me contar?

— Han? Contar o quê?

— Não se faça de idiota, Allie! Você acha que eu não saquei o que ocorreu aqui?

Allison queria poder repetir que não sabia do que se tratava, mas ela já sabia sim.

— Quando você pretendia me contar que meu irmão está morto? Quando? — Lágrimas começaram a descer sobre seu rosto vermelho.

— Paris, eu...

— Cala a boca, Allie!

Allison tremeu.

— Você disse que ficaria de olho nele, você disse que cuidaria dele, que ele ficaria bem! Você mentiu! — As lágrimas continuavam a cair, insistentemente.

— Oh, não, Paris. Eu fiz de tudo, tudo mesmo!

— Não! Você não fez! Se tivesse feito algo, ele estaria vivo! — Então, Paris agarrou o braço de Allison e o sacudiu.

— Ma-mas, como? Como soube?

— Havia duas únicas explicações para que o Freddy fosse o próximo: Charlie estaria vivo ou estaria morto. Qual das duas você acha mais fácil de acreditar? — Era impossível para Allison acreditar nas palavras de Paris, por mais que ela estivesse certa.

A jovem assistente de veterinária custou a acreditar que Paris confiou na opção da morte de Charlie, mesmo que amasse demais seu irmão.

— Me desculpa! Eu tentei... Eu tentei salvá-lo! Tentei ajudá-lo! Mas quando cheguei lá e o vi naquele poço, eu já sabia que ele estava — Uma grande pausa e um silêncio perturbador invadiram aquele espaço — Morto.

— Poço? — Paris sentiu várias lágrimas descerem incansavelmente pelo seu rosto.

Depois disso, a jovem desabou sobre os braços de Allison, sem forças para discutir ou pensar. Nada estava bem. Nada ficaria bem a partir dali.


x-x-x

Shanon se ajoelhou no gramado, vendo a perícia levar seu filho. Ou pelo menos, sua carcaça. O corpo de Charlie estava embranquecido, muito pálido, quase que como neve. Seria menos doloroso se ela não tivesse olhado para o plástico preto, mas foi inevitável. O fim de seu filho havia chegado, e o dia mais temido por ela, se consolidado. Seu coração, partido em pedaços, já parecia não palpitar mais. Será que o vazio havia invadido seu coração? Será que sua alma, agora seca, não transpareceria mais a vivacidade, que antes habitava nela?

As perguntas de Shanon só seriam respondidas depois de algum tempo. Depois de se perceber sem o filho, o filho que tanto amava. O filho que, para ela, jamais conheceria seu fim.

Ao longe estava Adam sentado sobre o concreto. Com olhos inchados e um semblante transtornado, ele pensava na tragédia de seu amigo. Em sua morte, em seu fim. E se perguntou se tudo que estava acontecendo com sua mãe, Lucy, Ted e Charlie, era um castigo. Talvez não, mas era difícil para ele aceitar tudo. E ele não precisava aceitar. Seu pai poderia estar naquele exato momento amparando-o, mas seu trabalho era mais importante. Sempre foi! Adam gritou consigo mesmo por não ter aberto os olhos mais cedo, para o que estava diante dele. É uma maldição, só pode ser isso. Sabia também que alguma coisa malévola perpassava em sua vida e na vida das pessoas próximas dele. Se não fosse por essa “energia malévola”, sua mãe e sua irmã poderiam estar vivas; Ted e Charlie também. Ou até sua psicóloga não poderia estar sofrendo daquela maneira, mesmo que ele não fosse tão próximo dela.

Seus olhos inquietos fitaram todo o gramado e se fixaram na imagem triste da mulher ajoelhada sobre ele, com lágrima nos olhos e uma expressão de dor que não tinha fim. Seria aquele o momento adequado para ele se aproximar dela? Deixar que ela se sentisse melhor com sua presença? Era muita pergunta, para poucas oportunidades de pensar nas respostas. Então, resolveu continuar ali, estático, sentado na arquibancada, assistindo ao pior de seus pesadelos.


x-x-x

13 de Julho de 2012


Os cabelos castanhos de Shanon esvoaçaram ao se baterem contra a ventania que espalhava as folhas secas pelo lugar. Segurava em suas mãos flores que vinham em forma de buquê. Mas ela não estava se casando, muito menos comemorando algo. O túmulo de seu filho estava bem à sua frente, imortalizando-o. Olhar para o túmulo significava trazer mais dor ao seu coração, e sentir-se afastada de seu legado, era ainda mais atormentador. Seus tristes olhos claros encaravam a data da morte: dois dias antes; trazendo múltiplas e estranhas sensações de desordem.

Já fazia algum tempo que a psicóloga vinha sentindo esta sensação. Era como se seu corpo e sua mente não pertencessem a ela, e sim, a uma pessoa desconhecida. Uma pessoa que jamais ela seria. A sensação de dupla identidade só significava uma coisa para ela: estava perdendo sua imagem aos poucos, se tornando irreconhecível a cada dia que passava.

Paris estava ao seu lado, com um buquê semelhante ao da mãe, mas as rosas não eram brancas, e sim, vermelhas. Ela abaixou-se lentamente, até encontrar-se de frente ao túmulo do irmão. Era de se esperar que ela choramingasse, e não pararia até sentir que não precisaria mais. Fitou a grama e as flores e se viu sem o irmão querido. Estava sendo difícil, pois a morte levara dois coelhos com uma cajadada só: Freddy e Charlie. E mais do que nunca, Paris teria de conversar com sua mãe, abrir o jogo para ela. Chegara até a se culpar por não ter contado tudo a ela antes, por ser tão insensível. Mas era muito doloroso ver sua mãe, além de se deparar com a morte do filho, ter de engolir tudo sobre a lista e sobre a morte.

Paris respirou fundo, sentindo o vento passar pelo seu rosto, então pegou no ombro da mãe.

— Precisamos conversar.

Shanon virou o rosto em sua direção. Uma lágrima ainda estava descendo sobre o mesmo.

— Mãe, há algo por trás de tudo isso. De todas as mortes, de toda esta ação sanguinária. — Comprimiu os lábios. — O que aconteceu com o mano, com o Freddy... Não foi um acidente.

— Do que está falando?

— Vamos. Eu lhe conto em outro lugar.

As duas saíram de mãos dadas sobre a grama.


x-x-x

Uma folha seca caiu sobre o ombro de Allison, e com uma brisa ela a viu ser levada dali. Ela observava Adam e seu pai, os dois parados de frente aos túmulos de Vivian e Lucy. De onde estava era perceptível ver as pequenas lágrimas de Adam e o abraço singelo que dera em seu pai segundos antes. Era algo belo de se ver, se não fosse pelo ambiente em que se encontravam. Era estranho pensar que aquele abraço pudesse ocorrer freqüentemente na relação dos dois, e que geralmente não era o que acontecia. A morte de metade da família poderia ter aumentado a chama do amor que Samuel sentia pelo filho. Entretanto, não necessitou terem acontecido estas tragédias para reaproximar os dois.

De repente Adam olhou por cima dos ombros, encarando Allison diretamente nos olhos. A jovem ficou consternada e olhou para outro lugar. Aquela lembrança de mortes e sangue lhe trouxe Chase de volta à mente. Tudo que passara ao seu lado, todas as mortes que presenciaram e todas as reuniões para discutirem como sair daquele imenso pesadelo, parecia ter sido em vão, diante do que ela estava vivenciando atualmente. Allison sentia-se mais inútil do que quando enfrentou a lista com Chase, mas aquele espírito de culpa só a estimulava ainda mais a vencer a nova lista. E, decidida a contar toda a verdade para o restante dos sobreviventes, olhou ao longo da grama esverdeada do cemitério e fechou os olhos bem devagar.

Agora, tudo que ela sentia, era o vento escorregar sobre seu rosto.


x-x-x

Mãe e filha caminharam um pouco, até notarem que estavam próximas da saída do cemitério. Deram mais alguns passos e finalmente saíram do lugar. Shanon olhou para trás e sentiu um arrepio. Paris segurou sua mão e as duas atravessaram a rua com rapidez, pois um carro passara velozmente próximo delas. Aliviada, Paris encontrou um pequeno quiosque ao lado de um imenso jardim. Então, pediu sua mãe que entrassem e tomassem algo. Sem dizer uma mínima palavra, sua mãe escolheu um lugar do lado de fora do estabelecimento. Logo depois, uma mulher de meia idade e cabelos grisalhos se aproximou.

— O que vão querer? — Perguntou ela, segurando uma bandeja.

— Um chá, por favor. — Disse-lhe Shanon, passando os indicadores nas têmporas.

— Pra mim, um suco. — Paris retrucou.

O clima do lado de fora do quiosque estava agradável, se não fosse perceptível o cemitério a alguns metros dali. Paris esticou o braço sobre a pequena mesa redonda e tocou a mão gélida de sua mãe.

— Primeiro, quero que escute com cautela tudo que eu disser. Só quero que se pronuncie quando eu finalmente tiver acabado de dizer tudo. — E continuou séria. — Entendeu?

Shanon assentiu sem protestar.

— Vou começar dizendo que nada é por acaso, e que todos temos um propósito de vida. Mas há acontecimentos que mudam a nossa rota e nosso propósito.

— Eu não estou entendendo aonde você quer chegar, filha...

— Primeiro só quero que escute. Eu sei que vai ficar confusa a princípio. Pode até chegar a contestar tudo que eu disser, porém, minha parte já vai estar feita, que é de alertar a todos sobre o perigo que corremos.

Shanon comprimiu os lábios, tentando organizar estas pequenas informações.

— Mãe, quando saímos do circo, no dia do acidente, nós desencadeamos uma lista mortal que quer nossas vidas de volta. Há sentido quando percebemos que nosso destino era morrer no acidente. Isso, se aquele garoto, o Adam, não tivesse tido uma premonição da tragédia.

Ouve um silêncio, mas logo Paris continuou:

— Eu quero muito que possa acreditar no que eu disser. O Charlie... Ele morreu por conta desta lista. É. Não foi fácil acreditar, mas ser cético nessas horas não é o correto a se fazer. O mesmo houve com o Freddy.

Shanon tapou a boca, a lembrança de Charlie a fez derramar uma lágrima.

A dona do estabelecimento voltava com seu pedido. Os colocou sobre a mesa, percebendo a expressão das duas, mas resolveu não ser inconveniente e saiu em seguida.

— Há maneiras de lidar com isso, com a lista... Quebrá-la, sabe? É ai que precisamos da Allison. Ela já enfrentou a lista uma vez, saberá como nos conduzir.

Mais uma vez houve um silêncio. Entretanto, este foi diferente, pois um ruído era ouvido. Paris olhou diretamente para os ombros da mãe, que até então não tremiam, mas depois que notou o movimento percebeu que se tratava do choro dela. Shanon ergueu a cabeça e segurou a xícara de chá. Muitas lágrimas desciam pelo seu rosto.

— Eu... Eu acredito.

Paris ficou chocada com sua resposta.


x-x-x

Allison passou o braço em volta do ombro de Adam, e os dois caminharam juntos em direção à saída do cemitério. Samuel caminhava mais atrás, com o celular na orelha. Aparentava estar conversando com algum funcionário da empresa. Adam virou-se para Allison e disse:

— Estou com sede. — Fez uma careta.

A jovem sorriu para Samuel logo atrás que acenou com a cabeça, para seguirem em frente. Então, ela caminhou até a saída do cemitério vagarosamente, até Adam se afastar correndo. De relance ela pode ver outro homem se aproximar do garoto, indo ao seu encontro.

— Eu sei quem é você! — Disse ele empolgado.

— Também sei quem você é. — Retrucou o homem.

— Você é o mágico do Comet Circus! — Adam sorriu.

— Sim, ele mesmo. E você é Adam Berry, o pequeno visionário.

Adam assentiu.

— Eu precisava mesmo falar com você. — Foi assim que disse isso, que Bruce avistou uma adolescente se aproximar.

Um homem forte chegou logo em seguida.

— Olá. — Allison disse. — Você é o mágico, não é?

— Sim. — Respondeu.

— Era com você que eu queria falar. — Allison se aproximou ainda mais do homem.

— Então nós dois temos assuntos sérios a tratar.


x-x-x

Samuel, ainda falando no celular, ao passar pelo portão do cemitério, avistou Shanon e sua filha. As duas estavam sentadas à mesa de um quiosque, e o semblante triste da psicóloga era claramente visível. Ele e os outros três atravessaram a rua. Um carro buzinou bem próximo a eles, espantando-os. Samuel desligou o celular e sorriu para Shanon, mas a psicóloga não esboçou nenhuma reação. Ele estranhou e logo puxou uma cadeira para próximo dela.

— O que aconteceu? — Perguntou, sentindo-se a pessoa mais inconveniente no momento.

— Meu irmão faleceu. — Paris respondeu pela mãe e apertou sua mão.

Até o momento, Samuel não tinha conhecimento da tragédia. Além disso, passara tão pouco tempo com o filho que mal teve chances para o garoto se abrir com ela. Era comumente relevante para o garoto, ter que agüentar tudo sozinho, sem apoio e sem suporte. Seu pai assemelhava apenas um nome: Pai; Suas ações eram de um pai, mas um pai ausente. O loiro permaneceu calado, escutando tudo. O mesmo fazia Bruce, que até então, não havia conversado nada com a adolescente de cabelos castanhos que estava ao seu lado.

— Pessoal, quero aproveitar que estão todos aqui. — Allison saiu do silêncio. — Me escutem, por favor.

Paris sabia que Allison iria começar a falar sobre a lista. Sua mãe escutaria tudo novamente, e se sentiria mal mais uma vez. Ela se colocou mais próxima e da mãe e piscou o olho para ela, mostrando que estaria ali se precisasse.

— Não quero mais dar rodeios, já não temos muito tempo. Todos correm perigo! — Disse olhando para todo ali presentes.

— Do que você está falando, garota? — Samuel se pôs de pé.

— De todas as mortes que estão acontecendo. Há um propósito para que elas ocorram. Como não deveríamos ter mudado nosso destino inicial, que era morrer no circo, agora estamos pagando o preço da nossa sobrevivência. — Respirou fundo antes de continuar. — Pode parecer confuso e estranho, mas é o que está acontecendo conosco! A lista da morte já levou quatro pessoas, por isso não temos mais tempo!

— Isso só pode ser loucura. — Samuel murmurou.

— Mas não é. — Bruce se pronunciou.

— E o que te fazer achar que é verdade?

— Eu pesquisei. Eu sei da lista da morte e do que ela está guardando para nós, e não ache que é coisa boa.

Allison se surpreendeu ao escutar aquilo vindo do mágico. Para ela, era um alívio saber que ele já tinha conhecimento da morte e de sua lista. Mas era mais surpreendente ainda que ele tivesse tão confiante.

— Você está querendo dizer que minha mulher e filha foram levadas por conta dessa tal lista? — A voz parecia ter saído irônica, e poderia até estar sendo, mas aquela não era a intenção.

— Não necessariamente, pois elas não saíram do circo. — Allison explicou.

Samuel bufou a lembrar da morte das duas, e de todo o fogo consumindo o circo naquela noite.

— Não dá! — Shanon gritou e se ergueu da mesa em um rompante.

Paris a viu sair dali, e logo foi seguindo-a pela rua. Shanon estava muito abalada, até mesmo para uma pessoa que sabe lidar com seus sentimentos.

— É muita maluquice pra mim! — Samuel também foi caminhando em direção ao seu carro, que estava estacionado na esquina. — Quando acabarem estarei esperando no carro. Não demorem. — Disse seco.

Allison viu Adam assentir e pedir um milkshake, e então virou-se para o mágico.

— Eu preciso te dizer que você é o próximo. — Pensou que já deveria ter ido direto ao ponto.

— Eu?

— A ordem da lista. Acho que já sabe sobre ela. Adam lembrou que você é o próximo.

— Eu temia que minha vez chegasse logo. Então é isso... — Por alguns segundos, Bruce deixou seu olhar distante, mas logo voltou a sua atenção para ela. — Betty se foi e agora é minha vez.

— Não se preocupe, a morte dá sinais antes de isso acontecer. Ela mostra, de alguma forma, quando virá e como vai acontecer. Basta só reconhecer os sinais!

— E quando a morte alcançar todos da lista? Até o último? O que vai acontecer? — Bruce viu Adam tomar o refresco em silêncio.

— Irá recomeçar...

— Eu pesquisei, mas não encontrei maneiras de quebrar o ciclo.

— Algumas são muito absurdas e impossíveis, no nosso caso. Porém, vamos encontrar um jeito!

De repente, Allie foi até o balcão do quiosque e pediu um papel e uma caneta. A mulher grisalha lhe deu e ela voltou a ficar frente a frente com o mágico.

— Aqui está meu número. Liga se vir qualquer coisa suspeita, algum sinal! Eu vou correndo até onde você está.

— Ligo sim.

Fique bem, por favor.


x-x-x


O sol se pôs como um relâmpago. Há alguns minutos, Shanon estava de frente à janela, vendo o início do crepúsculo, e depois já estava fechando-a, para que não ficasse com frio com a ventania que passava do lado de fora. E entre tantos pensamentos ela pensou em como a casa ficava silenciosa sem as balbúrdias que Charlie fazia. Eram muitos finais de semana agitados com Adam lá, pois os dois gostavam de brincar muito. Entretanto, de agora em diante, seria uma casa sem vida, cheia de silêncio e com cheiro de morte.

A psicóloga ficaria afastada por algum tempo da clínica, para tentar se estabilizar emocionalmente. Consultas enquanto abalada, poderiam acarretar insatisfações dos pacientes, por não poder realizar seu trabalho com maestria, como sempre fazia. As despesas ficariam por conta de um dinheiro que ela tinha guardado. Aquela quantidade de dinheiro deveria dar suporte a ela e à Paris, enquanto as turbulências passavam.

Shanon olhou para trás e viu Paris passando na sala, em direção ao quarto. Já ia subindo o primeiro degrau da escada, quando a mulher cruzou os braços, simulando o frio e disse:

— Obrigada.

Paris nada disse, estava sem saber o que dizer, pois não estava entendendo. Shanon percebeu sua dúvida, então continuou sem hesitar:

— Obrigada pela conversa que tivemos. Ela abriu meus olhos, e eu entendi tudo que disse. Não somente pelo Charlie, mas por todos. Pelo Adam... Pelo Samuel. — Então se aproximou. — Por você.

Paris puxou a mãe para um abraço apertado. Ela não queria lhe largar mais. Seria arriscado soltá-la e não poder mais sentir o calor de seus braços. Na infância Paris fora uma garota rude e grosseira, diferentemente de Charlie. O garoto era doce e alegre, enquanto ela vivia pelos cantos resmungando, brigando com tudo e todos. Quando criança, Paris foi uma garota muito problemática e temperamental. Não que ela ainda não tenha este senso explosivo, mas seu ápice fora logo na infância.

Era duro para Shanon ser uma psicóloga e não poder impor rédeas à garota. Não só por ter poder sobre ela, mas pelo fato de ser sua mãe. A mulher de cabelo castanho-claro já até havia esquecido quantas vezes fora chamada pela diretora da escola onde ela estudava. Implicante e muito egoísta, Paris acumulava sermões por um longo período. Shanon, em momentos de raiva, já pensara em mandar a filha para um internato, de tão avessa que a pequena era.

Felizmente, a psicóloga soube colocá-la em seu lugar, e lhe acrescentar mais educação. Hoje, Paris era uma adolescente que entendia das coisas, que já saberia o que seria certo e o que seria errado, e que poderia fazer suas escolhas sem que sua mãe pudesse interrompê-la. Porém, era difícil para sua mãe ver que crescera e que se tornara uma linda jovem. Aquela pequena problemática não existia mais. Paris era uma nova garota, com novas chances de progredir.

E foi pensando na infância turbulenta da filha, que Shanon derramou várias lágrimas. Seu choro, escutado por Paris, era abafado por seus cabelos. Sua filha também derramava lágrimas e as duas, ainda no abraço apertado, disseram em coro:

— Eu não quero que você vá!

Depois de um tempo abraçadas, Paris foi se desvencilhando aos poucos dos braços da mãe e se afastando. Shanon se espantou quando a filha ergueu a mão e levou-a até seu rosto. Limpou as lágrimas da mãe antes de dizer que subiria para o quarto e deitaria um pouco. Shanon assentiu e viu a filha sumir na escada, vagarosamente, a medida que a luz ia sumindo.

Depois disso, ela virou-se de volta para a janela e olhou para o balanço do lado de fora. Foram tardes e tardes de outono, com brincadeiras e muita harmonia. De repente, um vulto sobre o brinquedo lhe assustou. Ela soltou um gritinho abafado e deu um passo para trás. Olhou novamente e o balanço começou a se movimentar, indo para frente e para trás, como se houvesse alguém nele. E havia, mas ela não conseguia distinguir quem era.

Caminhou até a cozinha, tentando tirar a imagem do balanço da cabeça. Foi até a geladeira e pôs um pouco de leite em um copo.  Tomou-o vagarosamente. Neste meio tempo, Shanon teve lembranças da viagem que fizera com o marido dois anos antes, para o Cairo. Havia ficado deslumbrada com a beleza que o lugar possuía: arquitetura, gastronomia, costumes e etc. Também se lembrou do pequeno hotel em que se hospedaram por duas semanas. Levara consigo seus filhos, e assim que chegaram, desejaram visitar as pirâmides. A família, proprietária da pensão, prometera levá-los no dia seguinte. E Shanon se recordava muito bem daquelas pessoas tão receptivas e carismáticas. O casal também tinha um filho, de nome Leon, que os guiou até as pirâmides no dia marcado.

Tinha sido o ano perfeito. Se o acidente com o navio Rainha Fohtaed não tivesse ocorrido, e ela escondido o que sabia do desastre. Por todo este tempo, a psicóloga havia omitido dos filhos que conhecia sobre premonições desde aquele dia. O dia em que descobriu que uma visionária havia salvado algumas pessoas antes da tragédia ter acontecido. Seu nome era Emily. Se ele pudesse ter esbarrado com ela.

Queria tirar o assunto da mente e apagou a luz.


x-x-x


Bruce tirou o casaco e o pôs no cabide ao lado da porta. De onde estava era possível ver quase todo o apartamento, com exceção do pequeno quarto do mesmo. Aquele lugar estava ficando empoeirado a cada dia e Bruce não queria limpá-lo. Mesmo assim não se considerava sujo, ele realmente era uma pessoa limpa. Porém, tinha algum resquício de solidão que o impedia de fazer qualquer atividade doméstica. Era por isso, que, duas vezes na semana, uma senhora sua amiga e vizinha, varria sua casa. Ela não era explorada por ele, até porque ele nunca pediu que ela limpasse. Sempre zelosa e muito organizada, Pen, a senhora do apartamento 178, tinha prazer em lhe fazer bem. Era como um filho pra ela.

Bruce sorriu imaginando o sorriso de Pen com sua dentadura torta. Era engraçado, mas ao mesmo tempo, reconfortante. Era como se ele tivesse uma mãe bem perto dele, e poderia contar com o seu afeto para qualquer coisa.

Ele deu mais alguns passos, sentindo o frio que entrava pela janela. Com o aquecedor quebrado, era impossível ter um lugar contra o frio, e quem mais sofreria na seria ele, e sim, o avô de Betty. Ele estava, inacreditavelmente, de frente à janela em uma poltrona. Não eram as das mais confortáveis, mas ele sentia-se bem fazendo aquilo. Ou pelo menos era o que Bruce achava.

— Você deve estar brincando comigo! — Disse o mágico abruptamente, fechando a janela com força.

— Ah! Nem vi você chegar. — O velho respondeu calmamente.

— Está congelando aqui dentro, e você ainda abre a janela. Como agüentou todo este frio? — Bruce fora atrás de um cobertor para o homem.

— Não me importo mais, já estou no fim de meus dias.

Bruce parou e olhou para trás. O velho permanecia imóvel sobre a poltrona, com o olhar vago. A janela mostrava a noite como nunca mostrou e a lua cheia estava parcialmente coberta por nuvens.

— Você poderia ser menos pessimista? — Achou o cobertor e voltou até ele, cobrindo-lhe.

— E você, menos inconveniente. Não era necessário fechar a janela, meu jovem.

— É perigoso. Poderia ocasionar algum acidente. — O mágico arfou se aproximando ainda mais da janela.

— Um acidente? Que tolice! — Mesmo com a grande preocupação de Bruce, cedeu e deixou que o avô de sua falecida namorada continuasse próximo da grande janela.

Perto dali, ele pode ver trabalhadores saindo de seu expediente. Eles estavam trabalhando a semana toda na construção do novo andar do hospital. O hospital era bonito e com o novo andar, ficaria ainda mais carregado de beleza. Bruce também não pode deixar de notar a grande grua que eles estavam usando. Deveria ser maior que seu apartamento, se duvidasse.

Observou novamente o rosto calmo do velho sentado na poltrona e caminhou na direção da pequena cozinha. Não deu nem cinco passos, quando os poodles barulhentos de Betty começaram a latir insistentemente. Bruce não conseguia nem escutar seu próprio pensamento, pois o som das latidas era agudo e estridente.

Continuou caminhando, notando que os cachorros ainda latiam bastante. Foi quando olhou por cima do ombro. Inevitável fora seu medo e sua agilidade. O mágico, assim que pôs os olhos de volta na janela, contorceu o corpo e correu na direção do velho sentado. Correu o mais rápido que pode, competindo com a velocidade da grua que se aproximava da janela.

Segurou o braço do idoso, antes que a grua pudesse atingir a janela. Puxou-o com força para trás. Com a outra mão, conseguiu tocar a base da mesinha redonda do telefone velho e puxá-la para si. Pôs a mesa na sua frente e na do homem. Logo em seguida, em questão de fração de segundos, a grua chocou-se contra a vidraça. Sua frente chegou a ultrapassar a mesa, apavorando o homem, que se protegia com os braços. Bruce escutou os estilhaços baterem contra a superfície da mesa colocada naquela direção. O velho gritava aterrorizado. Bruce pedia que ele se acalmasse, enquanto a grua parava de tremer. Depois disso, a grua cessou e já estava quase toda para fora da janela. Os estilhaços estavam pelo chão do apartamento. Um pequeno vaso que estava próximo da janela também estava despedaçado. Bruce olhou para a parede e viu que o quadro dele e de Betty estava torto e com uma grande rachadura separando-os.

Gotas de suor simbolizavam seu nervosismo. Ele ficou de pé e tirou a mesa de onde estava. O velho, que estava sentado no chão, agora estava estirado. O mágico se abaixou novamente. Olhou no fundo de seus olhos, quando suas órbitas pareceram chacoalhar, e ele deu espasmos frenéticos. Subitamente o homem gritou e levou a mão que tremia sobre o peito esquerdo. Não demorou muito para que Bruce percebesse o que estava acontecendo.

— Agora não, por favor!

Verificou seu pulso. Nada.

Colocou a cabeça sobre seu peito. Escutou o coração dele parando aos poucos.

Ataque cardíaco! Merda!

Parou.


x-x-x


Com o dedo indicador, Paris acompanhava o ritmo da música que tocava em seu Iphone. O indicador fazia um efeito pendulo, ia e voltava. Ela estava deitada sobre a cama totalmente bagunçada. Seu cabelo se espalhava pelo lençol, como um rio marrom. Seus olhos, fixados no ventilador de teto, estavam distantes. A música ecoava dentro de sua mente, como se quisesse passar alguma mensagem.

Caídos neste lugar, apenas dando a você este gostinho

De sua pós-vida aqui, então fique

você vai estar de volta aqui de qualquer maneira


Eu vejo uma luz distante

Mas garota, isso não pode estar certo

Um lugar tão surreal para se ver

Então como isso veio acontecer

Chegou muito cedo

(Afterlife – Avenged Sevenfold)

Paris foi tirando os fones de ouvido calmamente, até sentir que uma lágrima queria descer sobre seu rosto. Com a força que tinha não a deixou descer. Seria ruim demais, lembrar com aquela música, que Freddy estava morto e não poderia vê-lo novamente. Poderia, mas na outra vida. E morrer era a última coisa que ela queria naquele momento.

Subitamente a secretária eletrônica de seu quarto apitou. Havia uma mensagem. Paris deixou o Iphone sobre a cama e se encaminhou até a cômoda branca. Ainda não tinha entendido o motivo para que sua mãe colocasse aquilo em seu quarto. Era confuso, mas ao mesmo tempo, aceitável. Apertou em um dos botões e esperou a mensagem aparecer.

“Sexta. Dez. Noite. Atrás. Neon Explosion. D.”

Paris ficou sem entender nada. Era uma combinação de seis palavras, que aparentemente não faziam sentido. A voz era rouca e abafada, parecia que falava de dentro de alguma caixa ou semelhantes. Foi estranho. Mas se Paris fosse parar para pensar, tudo fazia sentido. Alguém estava pedindo para se encontrar com ela.

— Na sexta, às dez da noite, atrás da boate Neon Explosion. — Correu para anotar.

Agora só restava saber de quem era a mensagem. Um “D” era a chave para descobrir o remetente da voz estranha. Decidiu ir até a boate, sem se importar se era trote ou não.

— Nos vemos na sexta, então... — Falou para si mesma.

Jogou-se na cama, pôs os fones e voltou a olhar para as lâminas do ventilador de teto.


x-x-x


Adam estudou até se cansar. Comumente ele não fazia aquilo sem que sua mãe estivesse ali para colocar pressão. Entretanto, sua falta estava fazendo com que ele se importasse, e muito. E como a sentia ali, mandando-o terminar logo com as lições, acabou por terminá-las mais rápido. Era bom ouvir sua voz novamente, nem que fosse apenas parte de seu consciente.

Foi nesta onda de pensamentos múltiplos que ele escutou as risadas irritantes de Lucy. Irritantes, mas ao mesmo tempo, meigas. Ele amava sua irmã, não importa o quanto implicante ela fosse. Já era grandinho o bastante para saber que ela era apenas uma criança. E ele também era, mas estava em uma fase de dúvidas, e conseguintemente, parcelas de algumas respostas. Poderia procurá-las e ter êxito em encontrar as respostas, ou poderia se perguntar ainda mais e continuar confuso. Foi naquele exato instante, segurando o caderno e caneta, que ele soube o quanto era importante responder a todas suas perguntas. Um insight o fez acordar. Ele já se lembrara do que falara com Allie. O mágico seria o próximo a morrer no circo, logo depois de Charlie. Percebera tarde demais, já restavam poucos sobreviventes. Todas as mortes só significavam uma coisa: a morte quer revanche.

Allison estava na cozinha, preparando algo para os dois comerem. Macarrão era sua especialidade. E enquanto preparava, deixou o micro system ligado. Ela mudou a faixa da rádio e o locutor apresentou a próxima música, que começara a tocar:

Você sabe que há

Uma chance pra você

Pois você tem um brilho

Você tem que


Acender a luz

e deixá-la brilhar

Seja o dono da noite

como o dia da independência

Pois, baby, você é como fogos de artifício

Venha e mostre do que você é capaz

Deixe todos boquiabertos falando “oh, oh, oh”

Enquanto você cruza o céu

(Firework – Katy Perry)


Allison balançou o cabelo no ritmo da música, então parou. Terminou o macarrão e foi levá-lo para Adam, que estava no sofá, assistindo. Ela se aproximou com seu prato e estranhou. O loiro estava com o controle remoto em mãos, apontando para a TV, estóico. O aparelho televisivo estava em um canal em estática.

— O que está fazendo, exatamente? — Trouxe o prato para mais próximo dele.

— A TV não quer ir pra outro canal. — Respondeu seco, ainda com olhar vidrado na televisão.

— Me deixa ver. — Allie pediu o controle remoto.

O garoto assim o fez e lhe entregou. Allison apertou todos os botões do controle. Em vão. Adam foi até a televisão e tentou desligá-la no botão. A TV não desligou. Allison temeu ser um sinal, então se aproximou da tomada e puxou o conector do aparelho. A televisão continuou ligada e na estática, mesmo sem estar conectada à tomada.

— Droga! Está acontecendo! — Saiu da sala correndo.

— Isso é estranho demais. — Adam continuou de frente ao aparelho, analisando-o.

Allison voltou com seu celular, discando um número.

— Alô, Bruce?

— Sim?

— Aqui é a Allison. Onde você está nesse momento?

— Estou trabalhando em uma festa infantil. Por quê? Alguma pista de como eu vou morrer? — A voz embargada do homem era evidente.

— Por favor, me escute! Fique longe de qualquer coisa de brilhe, ou tenha um clarão forte que seja capaz de cegá-lo! Nada de luz!

O homem tremeu e a ligação caiu.

Allison colocou o celular no bolso da calça e virou-se. Adam continuava ao seu lado. A sala havia se transformado em um forte clarão, causado pelo brilho forte da televisão. Só então, Allie se lembrou da música.

Fogos de artifício.

— Vem comigo, Adam!


x-x-x


Com a mão suando, Bruce empurrou a cortina com cuidado. Olhou para fora e viu muitas crianças sentadas de frente ao pequeno palco, onde ele faria seu show de mágica. Chelby, a aniversariante filha de sua amiga Ginger, estava entre as crianças, com um conjunto rosa e sapatos recheados de lantejoulas. Ela sorria e aplaudia, enquanto ele entrava e acenava para todas as pessoas presentes. O mágico estava vestido com o tal, com uma vestimenta negra e uma cartola. Esperava conseguir entreter todos com o seu número, mas seria muito difícil, sabendo que poderia morrer a qualquer instante, de qualquer forma.

Foi então que olhou em volta, poucos segundos antes de anunciar o início da mágica, e notou que muitas coisas ali poderiam lhe afetar. Isso, pelo que Allison falara no telefone. Havia um carrinho de Pretzels, um grande letreiro brilhante, postes de luz, refletores e, infelizmente, os objetos que fizeram o mágico tremer ainda mais: Fogos de artifício prontos para serem lançados no céu. Tudo naquela festa poderia matá-lo. Péssima hora para conseguir um trabalho. Tentando despistar o desconforto e a tensão, ele iniciara os truques de mágica. Ainda sim, muito atento ao que viesse a acontecer.


x-x-x

Allison bufava, enquanto tentava lembrar o endereço dito por ele, há algumas horas atrás, quando conversaram pela manhã. E, ciente de que sabia o mesmo, não o perguntou novamente. Agora, estava em uma esquina da cidade, com Adam ao lado. O garoto tremia e balançava os braços, na intenção de encontrar o lugar, por meio da lembrança vaga da conversa.

De repente escutaram uma música. A música começou baixa e logo seu volume foi aumentando. Aguçou os ouvidos e percebeu que a música fazia parte de uma sinfonia característica para shows de mágica. O estalo lhe fez correr naquela direção. Adam correu logo em seguida, chamando por ela. Ela queria correr ainda mais rápido, mesmo sabendo que poderia deixar o loiro para trás. E ela tinha certeza de que ele corria mais rápido que ela. Allison se julgava muito enferrujada, lenta e devagar. Até já havia se martirizado por se julgar imprestável. Isso, antes de ter certeza de que estava novamente enfrentando a lista da morte. Estava sendo difícil, mas se ela não se esforçasse pra detê-la, salvar a si e salvar a todos, ela não poderia extinguir todo aquele pesadelo crescente. Tudo estava em suas mãos, ela e os demais dependiam de seus atos. Precisava tomar a dianteira e guiar os demais para a quebra da lista.

Quando se deu conta, estava de frente a um grande portão de ferro. Lá de fora, dava para se ver luzes coloridas e contrastes também de múltiplas cores. Poderia gritar por alguém, mas estavam todos longe o bastante para que não pudessem ouvi-la. Ela bateu no portão com força, todo esforço em vão. Ninguém a escutaria na distância que se encontravam. Além da distância desfavorável, a música de mágica estava muito alta.

— E agora? — Olhou para Adam. — É perigoso ele ficar lá sozinho.

A jovem já bateria no portão novamente quando viu um homem alto, forte e moreno se aproximando. Ele estava vestido formalmente e em seu peito esquerdo havia um emblema de uma empresa de vigilância. Deve ser o segurança da festa. Pensou Allison. Aquela poderia ser a oportunidade perfeita. Ela estava com uma criança consigo. Talvez pudesse ser fácil passar por ele. Só precisava pensar um pouco na desculpa perfeita para enganar o homem. Sabia que nunca fora boa de lábia, mas não custaria nada tentar.

— Com licença, senhor. — Começou, ainda tremendo.

— Posso ajudá-la? — O homem disse em uma voz assustadora.

— Eu tive que sair da festa por um minuto. É que meu irmão teve uma pequena crise de asma e eu tive de pegar seu broncodilatador em casa. Mas agora já está tudo bem, não é maninho? — Ela sorriu para o garoto, que estava ficando vermelho. Deu uma leve tapinha no topo da cabeça e bagunçou levemente seus fios loiros.

Adam sorriu corado.

O homem olhou-os da cabeça aos pés, e então abriu o portão para que eles pudessem entrar. Allison agradeceu e entrou junta do pequeno visionário, que já estava em seu tom de pele normal. A face dela ainda tremia, enquanto seus membros, pouco trêmulos e desajeitados, apressavam-se na direção da festa.

— Essa foi mais fácil do que eu pensei. — Passou a mão na testa, que já estava parcialmente suada. — Não sei até agora como eu consegui aquela desculpa. — E riu interiormente.

Os dois pararam de frente a vários convidados. Todos estavam conversando, rindo e se divertindo. Mas na frente dava-se para ver as várias crianças de frente para um pequeno palco montado ao lado de luminárias e refletores. Era a armadilha perfeita para a morte pegar o mágico. Foi ai que Allison ouviu duas mulheres conversando. Eram uma loira e uma oriental. As duas pareciam reclamar de algo.

— Você sabe onde está o Stephen? — Disse a loira.

— O vi agora a pouco indo na direção da garagem. — A oriental meneou a cabeça na direção na festa.

Allison continuava escutando com atenção.

— Merda! — Reclamou a loira.

— O que foi?

— É lá que estão os fogos de artifício! — Rapidamente a loira correu na direção da festa.

A oriental seguiu-a com ligeireza. Allison e Adam fizeram o mesmo, ao perceberem que a morte se aproximava.

Chegaram até as crianças, de frente ao palco. A mulher loira e a jovem oriental, sem causarem alvoroço, passaram por entre as pessoas. Allison e Adam continuavam de olho nelas, seguindo-as por entre a multidão. Os dois viram Bruce apresentando seu show. A adolescente não conseguira avisar-lhe do perigo. Então, continuaram a correr na direção da garagem, para onde as duas mulheres de outrora foram.

Quando chegaram ao local, as duas mulheres estavam abraçadas de uma criança de aproximadamente nove anos. O garoto de cabelos negros sobre os olhos estava segurando um objeto. E Allison pode ver nitidamente o que era.

— É uma caixa de fósforos! Ele está com uma caixa de fósforos!

Adam olhou-a assustado.

As mulheres se agitaram em retirar a caixa de fósforos das mãos do garoto e não notaram o que estava havendo bem atrás delas. Os fogos de artifício estavam acesos. Nem dera tempo de Allison falar nada, pois Adam já estava puxando as duas mulheres. Sem entender o que estava acontecendo as duas correram na direção da jovem. Allison gritou e em seguida virou-se, correndo na direção contrária. A garagem explodiu segundos depois, jogando-os para frente. As duas mulheres e a criança foram arremessadas para o jardim, enquanto Allison e Adam foram lançados em direção ao chão, com força. Os dois protegeram o rosto.

Allison, ainda caída, olhou para trás e viu a garagem em chamas, enquanto outra explosão consumia o local. Em questão de segundos a bola de fogo atingiu a fiação elétrica. Allison conseguiu prever o que iria acontecer, então saiu correndo na direção do palco, onde o show acontecia. Assim que chegou, todos já estavam agitados, pois ouviram o clarão e o barulho dos fogos de artifício.

— Todos saiam daqui! Agora! Vão! — Empurrou as pessoas que conseguia.

Adam ajudava do outro lado, gritando:

— Saiam!

Bruce continuava no centro do palco, sem saber para onde ir. O mágico viu quando um objeto em chamas caiu sobre a estrutura de madeira e sobre as cortinas, queimando-as velozmente. Estava encurralado e vendo as chamas crescerem diante de si. Olhou para baixo e viu Adam gritando para que ele descesse.

— Não dá! — Nem notara que Allison não estava ali.

Seu instinto o fez mover a cabeça para cima, olhando a fumaça subir para o céu estrelado. Subitamente ele foi levado ao chão, com uma grande pressão em seu ombro. Seu corpo bateu na madeira do piso do palco. Arregalou os olhos e viu Allison deitada ao seu lado. Ela estava suja e com uma queimadura no braço, dera para notar. A grande fumaça se espalhou pelo local, com as cortinas ainda em chamas.

— É ela... É a desgraçada! — Exclamou Bruce, erguendo-se do piso.

— Nós vamos sair daqui bem, Bruce! — Allison encontrou sua mão e apertou. — E juntos! — A completou confiante.

Os dois estavam se levantando com cautela do palco, pois boa parte do piso já havia sido destruído pelo fogo. Adam apontou para o lado esquerdo dos dois e gritou:

— Se abaixem!

Bruce estava do lado esquerdo. Logo ele. Fios energizados ricochetearam contra a estrutura que ainda restava ser consumida pelo mar de fogo. Bateram e voltaram contra o mágico e a assistente de veterinária. Eles se abaixaram no último instante e nenhum dos fios os acertou.

— Aqui! — Allie desviou das chamas e pulou para um pequeno canteiro de rosas que ali havia.

Bruce preparou para pular. Então ganhou impulso, depois de quase ter o corpo consumido pelo fogo, e pulou para o canteiro. Caiu de pé e olhou em volta. Tudo estava queimando. Poderia ser uma representação do inferno, se eles não tivessem tido a sorte de sobreviverem. Ainda disperso pelos pensamentos de medo e insegurança, Bruce não reparou que Allison chamava pelo seu nome.

E novamente foi ao chão. Desta vez, Allison caiu em cima dele, olhando-o nos olhos. Por trás da jovem, a centímetros de distância, um refletor decolou, se chocando contra uma pilastra próxima, enfeitada de balões.

— Allie, você conseguiu! — Adam comemorou, se aproximando e se ajoelhando ao lado dos dois.

— Errado. Nós conseguimos. — A adolescente saiu de cima do mágico e os três sorriram.

Sorrisos de alívio. Porém, falsos sorrisos, que escondiam a pior das incertezas. A morte.


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Notas finais do capítulo

Não leia as notas antes de ler o capítulo. Contém SPOILERS!

Alguns, com certeza irão perguntar o porquê na morte do avô de Betty. E se chegarem a me perguntar, mesmo tendo lido esta nota, eu irei respondê-los da mesma forma.
Depois de um pequeno incidente em capítulos anteriores, o avô de Betty acabou quase morrendo. Ele morreria por traumatismo craniano, depois de cair na cozinha do apartamento da jovem. Isso, se Betty não viesse a intervir, como aconteceu.
Sendo assim, o velho entrou para uma lista própria e separada da lista principal. Uma pequena ramificação. Foi uma das maiores dúvidas de leitores... Pois bem, o capítulo respondeu-os da melhor maneira possível. Além de enriquecer o plot de Bruce.

PS: Como puderam perceber, ou não, no decorrer no capítulo há algumas pequenas homenagens à hexalogia de fanfics do Lerdog. Meu amigão!

Não esqueçam de comentar. Até o penúltimo cap., pessoal! ;DD



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