Hediondo escrita por Dreamer


Capítulo 3
Queda




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––Sherlock, você não acha que deveríamos nos focar no incidente do metrô?

Ele olhou John com o canto dos olhos. Já eram vinte minutos de taxi, até que ele o havia deixado a sós com o seu pensamento por bastante tempo. Descruzou as pernas e acomodou-se melhor no taxi, já não mais olhando a janela do carro, mas sim John:

––Precisamos da lista com os nomes das vítimas antes de fazer qualquer coisa com relação ao metrô.

––... Ok––respondeu ele.

John fora veterano de guerra e vira muitas mortes e massacres, mas era evidente o seu desconserto com o caso.

––O que foi, John?

Ele se moveu no acento do carro, um pouco desconfortável:

––Isso pode ser um pouco prematuro, mas... Eu vi uma coisa, quando estava no Afeganistão. Nada com esse poder mas...

––Você acha que foi um ataque terrorista.

Ele meneou receoso. Surpreendeu-se quando percebeu que Sherlock considerara sua opinião o suficiente para discuti-la:

––Se fosse um ataque terrorista, no exato momento, ou até um pouco depois, isso seria deixado claro. Entretanto, quem colocou aquela bomba não deixou evidências de que irá se revelar.

––O lugar estava cheio de gás, poderíamos apenas não ter visto!

––Improvável... ––raciocinou, com um olhar concentrado. ––O objetivo de um ataque terrorista é promover terror. É uma amostra de poder sobre o outro. Uma amostra––repetiu, e fitou novamente a janela.

––No que está pensando?

––Ainda não cheguei a uma conclusão, mas você pode estar certo em determinada parte da história...

––Qual? ––surpreendeu-se.

––Isso pode estar ligado à guerra.

O taxi estacionou na frente do elegante portão negro de ferro. Sherlock desceu mais rápido do que John esperava, deixando para ele a tarefa de pagar apenas para se poupar de mais perguntas. Logo que ultrapassou o portão para o belo jardim, passou reto pelas belas portas de madeira do "Diogenes Club".

––Vamos nos encontrar com Mycroft? ––estranhou John. Em resposta, com um sorriso que só um irmão que está prestar a aprontar poderia dar, Sherlock mostrou para ele um cartão que acabara de tirar do casaco. ––Um cartão de acesso do departamento de defesa... Do Mycroft. Isso sim parece que vai terminar bem––ironizou, pessimista.

Sherlock se aproximou da porta lateral e passou o cartão na fechadura eletrônica. A escada que levava ao subsolo fez John lembrar-se novamente do metrô.

Desceram, sem acender as luzes. Sherlock iluminava o caminho com uma lanterna não muito potente. Por quantas portas, naquele imenso corredor, eles percorreram, John não saberia dizer. Demorou até que Sherlock apontasse para a placa que procurava. Abriu a sala deserta e eles viram os mainframes.

––Então é isso? Viemos pegar informações de computadores... É nessas horas que há de se lamentar não ter algum contato hacker, não?

As máquinas estavam ligadas, Sherlock ligou um monitor e passou o cartão para habilitar o acesso. Aproveitou a demora do sistema para responder:

––Eu tenho. Mas esses computadores não estão ligados em qualquer rede externa... Logo, seria impossível de acessá-los de outra maneira que não fosse vindo até aqui. Aliás, não precisa ficar procurando câmeras de segurança no teto. Esse lugar nem deveria existir, ele não é vigiado.

Ainda assim John não podia deixar de lado a sensação de que não deveriam estar naquele lugar.

"Cristian Spiegel", digitou Sherlock. A resposta obtida o fez dar um leve sorriso.

––CUIDADO! ––berrou John jogando-se no chão e puxando o amigo, após o soar do tiro. ––Esse lugar não é vigiado––rosnou em baixo tom de voz.

––John, fique perto dos mainframes! ––disse empurrando-o, enquanto fazia o mesmo.

John, encolhido no chão, não conseguia ver o atirador apenas com a iluminação da tela do computador. Sherlock se levantou, mantendo suas mãos próximas aos HDs externos alocados em uma alta estante, de costas para ela.

O atirador se aproximou. Um simples segurança, presumiu pelas roupas e postura.

––Mãos para o alto, e o seu amigo pode se levantar também!

––Não se mova, John––alertou Sherlock, calmo, com os olhos grudados no atirador.

––Como é? ––perguntou o segurança, e elevando o tom de voz, repetiu: ––Mãos para cima!

––E largar a melhor arma de todas? Você está aqui unicamente para proteger as informações mantidas nos mainframes e nestes HDs. Informações sobre os cargos de confiança do alto escalão governamental e militar. Serviço secreto britânico. Seria terrível se a minha mão puxasse uma dessas pequenas gavetas e a deixasse cair no chão, não é?

––Mãos para o alto e dê um passo para frente! ––ordenou o homem se aproximando e encostando sua arma na testa de Sherlock.

––Pelo amor de Deus, Sherlock! ––pediu John. Mas, Sherlock ainda parecia calmo.

––Você não vai atirar e sabe disso. Qualquer tiro desta arma em uma distância menor que vinte metros atravessaria o meu crânio e danificaria pelo menos um dos HDs atrás de mim... Qual informação o serviço secreto estaria disposto a sacrificar para me ter morto? Além de nenhuma, o fato é que essa escolha não é sua. Você está aqui apenas com a função de proteger esses equipamentos. Então, eis o que você vai fazer: vai se afastar devagar e fechar a porta dessa sala. Depois, irá trancá-la e irá até o início do corredor. E você fará exatamente isso, porque senão será extremamente difícil de explicar como você falhou no seu trabalho.

O homem engoliu seco e pareceu raciocinar furiosamente. Aquele estranho homem queria ficar trancado naquele lugar? Ótimo! Assim teria tempo de buscar ajuda. Ainda com a mira em Sherlock, deu passos curtos até o corredor, fechou a porta e a trancou. Ouviram os seus passos se afastando.

Após respirar aliviado, John se levantou e seguiu o amigo que se meteu no meio dos mainframes. Quando terminou de se esgueirar pelo cabos, alcançou uma pequena porta escondida.

––Como diabos você poderia saber disso?

Sherlock sorriu e ambos saíram do subsolo do clube.

.o.

––Serviço secreto, Sherlock? ––murmurava John atrás dele, enquanto caminhava olhando em todas as direções.

––Não estamos sendo seguidos. Há essa hora aquele homem já foi neutralizado por Mycroft.

Fora uma jogada um tanto suja. Sherlock sabia que seu irmão o livraria se conseguisse sair do clube a tempo.

––Mas, mesmo assim... Em baixo do Diogenes Club, com apenas um segurança?

––Arquivo morto, John. Já não interessa mais ao serviço secreto, mas em compensação não pode ser exposto. E essas coisas sempre vão para algum lugar.

––Como cargos de confiança do governo podem ser considerados arquivo morto?

––Funcionários ou cargos inativos. O Sr. Spiegel é dado como aposentado desde antes do seu incidente.

John o encarou surpreso:

––O serviço secreto britânico queria ele fora? Mas, para quem os registros diziam que ele trabalhava?

Com um sorriso de 'eureka', Sherlock respondeu enquanto entravam pelo Hall do Hospital e se dirigiam aos elevadores:

––Para o serviço secreto britânico.

As portas do elevador se fecharam.

––Então, o que? Estão eliminando traidores na surdina? Ou, algum traidor os está eliminando e alterando os registros? Ou...

O elevador parou num tranco e, após o apagão, a luz tênue de emergência se acendeu. Talvez o que mais tivesse chamado a atenção de Sherlock foi o longo silêncio de menos de um segundo, após John interromper a sua frase. O tempo que para a memória seria quase que uma prévia eternidade vivida. Eles se entreolharam, e Sherlock soube que John percebia o que viria. O elevador despencou.

.o.

Mulder abriu os olhos e sentiu um gosto amargo no fundo da garganta. Percebeu a enfermeira e, ignorando-a, começou a se levantar. Tinha que encontrar Scully. Scully? Algo estava errado e ele não conseguia se lembrar. Sentiu uma forte vontade de telefonar para Skinner.

––Enfermeira? ––chamou ele, precisava de um telefone.

––O que foi? Deite-se agora, sim? Em poucas horas você deverá ser liberado.

O sotaque britânico soou como um choque. "Londres, ok...", lembrou-se. A mulher vinha na direção dele para fazê-lo deitar quando o forte estrondo soou. Algumas pessoas gritaram do corredor. Logo murmúrios sobre algum problema nos elevadores começou a correr pelo hospital. A enfermeira saiu correndo, ansiosa por saber o que estava acontecendo.

Aproveitando o momento, Mulder saiu da cama e viu suas roupas num balcão próximo. Apanhou-as e saiu para o corredor. Meteu-se dentro da primeira porta que encontrou – uma pequena dispensa – e se trocou, largando lá mesmo o avental de paciente.

Passou firme pelo corredor e percebeu a grande agitação de funcionários, desceu as escadas. No térreo, homens tentavam abrir as portas do elevador. Saiu do hospital e enfiou as mãos nos bolsos. Ótimo, pelo menos ainda tinha a sua carteira. Pegou o primeiro taxi que conseguiu parar. Após dizer o seu endereço:

––Que dia é hoje? ––perguntou ao taxista.

––Perdão?

––Em que dia estamos?

––Vinte e cinco, quarta-feira––respondeu o homem. ––Americanos...

Repassava em sua mente... Tinha a lembrança de arrumar suas coisas no novo apartamento na segunda-feira e de ver Scully saindo para o seu trabalho. Recebera a estranha visita dos detetives da Scotland Yard no fim da tarde. Na manhã seguinte, depois de vê-la sair, correu pelas ruas de Londres e presenciou um incidente no metrô. Lembrou-se de Sherlock. Percebeu que estivera longe de casa desde aquela manhã de terça-feira. Ela não procurara por ele.

Pagou rapidamente o taxista e entrou em sua casa. Tudo parecia quieto, mas percebeu que havia um baixo som na cozinha. Caminhou com calma e passou a mão no seu cinto. Estranho costume aquele que ainda não perdera: sempre se sentia armado.

Parou na porta da cozinha. Scully, com seu notebook aberto, interrompeu a sua digitação para dar-lhe um sorriso. Ele retribuiu sorrindo de volta e entrou indo para a pia, abriu a geladeira e pegou uma cerveja:

––Longo dia, Scully?

––Um pouco. Novos lugares. Nunca é muito fácil.

Ele foi para trás dela, apanhar qualquer coisa na fruteira...

Estilhaçou com força a garrafa na cabeça dela.

Ao invés da mulher cair atordoada, levantou-se numa postura altamente atlética e avançou contra ele. Mulder investiu em um soco bem dado no nariz, mas o pouco que pareceu ter entortado dele, voltou ao lugar normal. Scully apanhou-o pelo pescoço e o elevou, sem deixar que os pés dele tocasse o chão. Baixinha? Crescendo de tamanho, sua feição foi-se alterando, e a imagem da ruiva que tão bem conhecia transformou-se num homem rude de traços fortes.

––Onde está Scully?––rosnou ele, entre engasgos, tendo o seu pescoço apertado.

Ele não respondeu, apenas apertou mais o pescoço dele.

––Você fez uma cópia péssima dela. Se não tivesse me drogado...

––Foi interessante vê-lo agir como um idiota, agente Mulder. Considere como uma retribuição pelo nosso último encontro. Devo admitir que, o que faço, faço pela missão, mas tive certo prazer pessoal dessa vez.

De fato, se aquele homem pudesse ser morto, Mulder o teria feito da última vez.

Obvio que, pensando com calma, Mulder agradeceria sua intuição por ter imaginado que Scully estaria com uma terrível TPM nos últimos dias, e não tentou se aproximar significativamente dela. Senão, a frase daquele transmorfo teria soado pior ainda...

Já quase inconsciente, o ex-agente foi lançado pelo ar e atingiu a parede oposta, caindo sobre a pia para o chão. Tossiu, zonzo pela falta de ar.

O homem deu as costas para Mulder saindo da cozinha.

––Espere! Scully! Onde está Scully? ––perguntou entre engasgos.

Mas, o homem não respondeu. Como se estivesse esperando a insistência do seu inimigo, retornou com vontade, apanhou o ex-agente pelos cabelos e bateu com a sua cabeça na parede. Mulder, inconsciente, não viu a única pessoa que sabia onde estava Scully saindo daquela casa para nunca mais voltar.


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