Skyfall escrita por Fitten


Capítulo 35
Capítulo 36 - Sob a névoa


Notas iniciais do capítulo

Meninas! Que saudades de vocês, como estão? Acho que devo-as algumas explicações, desculpem-me pelo sumiço, eu realmente tinha perdido a vontade de escrever depois que me haquearam (No capítulo anterior eu não respondi ninguém, pois o Nyah deu erro, por favor, não pense que eu estou ignorando-as) Não sei se vocês sabem, mas eu sou Taylover de raça, isso aí, não amo o Taylor só pelo Jacob amo ele por ser ele mesmo, por me instruir e me inspirar todos os dias da minha vida, meu bebê está fazendo 21 anos dia 11 de Fevereiro, algumas amigas do twitter fizeram uma homenagem para ele, se vocês pudessem ajudar a divulgar seria como se fosse tudo para a gente esse é o link: http://www.youtube.com/watch?v=m38jYqPQSLQ Obrigado e boa leitura.
xoxo Isa



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O ar estava tomado por uma densa névoa que não se dispersava, não se movia, apenas tornava-se cada vez mais pesada, mais irrespirável. O cheiro tóxico da cidade que era consumida até sua última casa, enchia meus pulmões, queimava meus olhos. Eu corria, cambaleante, pelas ruas cinzentas e desertas. Meus joelhos tremiam e a fraqueza amolecia cada parte que ainda resistia em mim. A sede era abrasadora, eu nem me lembrava da última vez que senti o sangue quente descer por minha garganta, e embora eu fosse metade humana, hoje, eu me sentia o menos humana possível. A única coisa que ainda me mantinha de pé era ele, aquela última imagem de seu rosto que ficara gravada em minha retina, queimando tanto quanto a sede em minha garganta ressecada.
Eu perdi muito sangue, perdi muito tempo, contudo, dentre todas essas coisas, o que eu mais temia perder era ele.
O fogo se alastrava depressa pelas ruas, consumindo as casas como um monstro faminto. Benjamin estava fazendo um bom trabalho. Por onde quer que eu passe, correndo cambaleante pelos escombros, eu podia sentir o cheiro dos corpos queimando e em alguns becos, ainda era possível vislumbrar um par de olhos vermelhos girando nas órbitas no meio das chamas. Eu corria, ignorando a dor crescente em meu corpo, a falta de ar em meus pulmões, e agradecia silenciosamente por não haver mais nenhum humano na cidade, Deus sabe o que eu faria com a sede latejante que eu estava sentindo. Eu ainda não sabia como minha família conseguiu evacuar a cidade sem que a guarda desse conta, sem que os humanos desconfiassem. Sinceramente, todas essas perguntas sem respostas enfraqueciam diante do meu temor maior. Jake, onde você está?
Eu não sabia ao certo onde estava, nem se meus pés iam na direção certa. Eu tentava farejar, seguir o rastro quente dele, mas era quase impossível com toda aquela fumaça sufocante. O desespero me espreitava em cada canto escuro, em cada curva incerta na qual eu chamava por ele sem obter nenhuma resposta. Segui na direção em que o vira pela última vez, se afastando de mim e da dor que eu causava nele. Aqueles olhos escuros me torturavam enquanto eu o procurava naquela cidade morta, eu revia seu rosto vazio, tão diferente do que era, como se a parte quebrada o tivesse modificado profundamente, e tinha medo de encontrar um estranho.
Eu sentia borbulhar dentro de mim, num lugar completamente desconhecido, uma sensação que me assustada. Eu via um abismo me dividir ao meio, tão profundo e desolador que me fazia desconhecer meus próprios sentimentos. Eu estava tão confusa, tão perdida dentro de mim mesma. Tudo que eu queria parecia ser errado, todas as minhas ações eram falhas e não importava para que lado eu corresse, eu sempre magoava alguém. Eu fiz tudo errado desde o começo. Eu nem deveria ter saído de casa primeiramente. Foi um erro mentir para minha família, foi um erro arrastar Jacob para o buraco comigo, agora nós dois estávamos machucados e perdidos dentro de nossos caminhos que nunca levavam a lugar algum. E então, como se a piada em minha vida não fosse suficientemente de mau gosto, eu fui parar bem no centro de uma guerra que deveria ter sido travada há séculos. Uma guerra com tantas ramificações, que parecia mais uma teia viva, prendendo qualquer um que se aproximasse, inclusive eu. Destino sempre foi uma mera palavra para mim, nada mais que uma analogia as coisas que não podemos controlar em nossas vidas, mas agora... Tudo parecia tão confuso. Quando eu olhava para trás e me deixava levar pelo retrocesso de minha vida, eu custava a acreditar que tudo tenha sido um mero acaso construído por acertos, erros, enganos e palavras ditas em horas oportunas.
São opções demais, inúmeras chances, uma margem muito grande de erros para se chamar de acaso, e contudo, aqui estava eu, com toda sujeira em minhas mãos e nenhuma idéia do que fazer. Eu tentava separar as coisas em pilhas, organizar as prioridades em minha mente, mesmo sendo incapaz de desviar meus pensamentos dele, mesmo lutando com o desespero, teimando com o destino que gargalhava na minha cara. Mesmo prestes a desmoronar, eu me esforçava para entender o que estava acontecendo comigo.
Eu amava Jacob de uma forma instintiva, como se tivesse nascido para isso, como se ele fosse tudo o que eu precisava, tudo sem o qual eu não poderia viver. Eu o amei desde o primeiro momento, de formas distintas, que se transformaram com o tempo, me transformando também, fazendo meu coração amá-lo como irmão e posteriormente como homem. Ele sempre esteve lá por mim, sempre...
Era estranho pensar que, em nossa primeira noite juntos, como dois adultos, como dois amantes, o mesmo Alec que agora confundia todas as minhas certezas, que balançava minhas sólidas estruturas, esteve lá, naquela sala pequena no meio do nada, de onde me roubou de minha família, de Jake e de mim mesma. O que Alec havia feito comigo? A coisa estranha que brotou e cresceu dentro de mim durante os dias em que estive com ele merecia ser chamada de amor? Eu não queria pensar nessa hipótese, e cada vez que, em meus pensamentos mais íntimos, eu confessava para mim mesma que o amava, eu sentia uma ferroada em meu peito, como se tal sentimento me fosse vetado, como se meu coração não aceitasse esse outro amor, que sem pedir licença a ninguém, se alojou dentro de mim de uma forma resoluta. Eu estava perdida...
– Jake! – Chamei, tendo como resposta o eco distante de minha própria voz. Parei por um instante no meio de uma rua estreita, onde o fogo formava um túnel sem saída. Eu não podia prosseguir. Minhas única opção era voltar e tomar outro caminho, mas eu sabia, pelo pouco que consegui rastrear, que Jacob não estava mais ali, não estava em parte alguma.
Caí de joelhos no asfalto coberto de cinzas, minhas mãos afundaram na fuligem negra. Nada... Apenas eu e meus enganos no meio do fogo, apenas minha fraqueza inerte, meus pensamentos turvos. O que eu faria se ele não voltasse? Se ele nunca mais quisesse me ver? O que eu faria sem a esperança que depositei nele, a única fonte da minha resistência.
Eu não conseguia imaginar como seria. Eu nem ao menos tinha uma explicação convincente para dar à ele. Jacob poderia voltar para La Push e me esquecer, por quê nada do que eu dissesse apagaria a cena que ele viu. Eu não me sentia digna do perdão dele.
Uma lágrima silenciosa escorreu por meu rosto e caiu sorrateira em minhas mãos sujas de cinzas. Eu não conseguia sentir meu corpo, era como se minha alma tivesse se desprendido e agora ela me observava de longe, de um lugar distante demais para ser encontrado. Só percebi que estava chorando quando meus soluços quebraram o silencio cadenciado da noite, juntando-se com o estalar furioso do fogo que ardia a minha volta. Enterrada no fundo de minha mente, havia a consciência pálida de que, se eu não me movesse e saísse logo daquele lugar, eu queimaria viva junto com Volterra,
– JAKE! – Gritei com toda força de minha dor. A sede rugiu como uma fera enjaulada dentro de mim. Eu estava trêmula, fria e quase já não sentia o ar entrar em meus pulmões.
Eu tinha coragem para morrer ali? Eu estava mentindo para mim mesma quando dizia que não poderia viver sem ele? E Alec...? E minha família...?
Talvez eu estivesse mentindo, esticando a mentira até que ela se parecesse com uma verdade. De fato eu nunca havia pensado na possibilidade de uma vida sem Jacob. Nunca, antes de toda minha vida ser bagunçada dessa forma, eu havia tentado imaginar esse quadro. Contudo, aqui estava eu... desesperada, lívida frente ao fantasma da ausência dele, perdida sem o calor daquele amor que sempre fora meu – indivisível e inquebrável.
Eu via os rostos familiares se alternarem frente a meus olhos, se acendendo e se apagando como uma lanterna distante, um farol que tentava me guiar de volta pra casa. Mas eu não conseguia, mais que isso... Talvez eu não quisesse voltar para um lugar onde não houvesse ele, o som cálido de sua risada rouca, o cheiro quente que me envolvia e me embalava por completo. Eu queria pensar em meus pais, em Alec, em todos que vieram até aqui por mim, parecia injusto retribuí-los dessa maneira, mas o egoísmo de querer ceder à dor, de não querer mais sentir o que eu estava sentindo, era maior que qualquer anseio altruísta. Existe um momento, quando se está mergulhado em intensa dor física e mental, que sua mente começar a buscar saídas, você só pensa em maneiras de aliviar a dor, de livrar seu corpo daquele tormento que se espalha e se mistura até não se poder ver nada além da morte, até não se desejar nada além da inércia profunda e definitiva. Sim, eu estava sendo terrivelmente egoísta e covarde, eu podia conviver com isso desde que essa dor aliviasse, desde que eu me visse livre do peso esmagador sobre meus ombros.
Jacob não ia voltar, não do mesmo jeito. Eu o veria de novo, ele ia terminar o que começou aqui esta noite, ia lutar até o último Volturi cair, eu o conhecia bem, certamente ele ficaria. O que eu temia mais, era ver nos olhos dele o sentimento quebrado, a decepção, a acusação muda que refletia minha própria culpa. Eu não suportaria vê-lo me odiar, embora eu não pudesse pedir nada além disso.
Cada pensamento se alternava em minha mente como ecos reverberando num cômodo vazio, chocando-se contra as paredes do meu cérebro, misturando-se ao som fraco do meu coração. Meu corpo tremia, eu tossia, sufocando com a fumaça cinzenta que agora cobria tudo, como um manto de nuvens maciças. Imersos na cortina de fumaça, os sons ritmados das casas desmoronando e do fogo crepitando sobre as árvores enchiam o ar com uma melodia funesta. Tudo desabava a meu redor, tudo cedia ao fogo que em poucos minutos também me alcançaria. Tudo que eu era seria consumido, todos os sentimentos que guardei dentro de mim seriam reduzidos à cinzas, queimando como uma pilha de papel sem importância.
Eu não queria morrer sob essas condições, não queria esquecer o rosto dele, os momentos felizes com minha família, o cheiro da floresta após a chuva, a cor do céu de Volterra – sim, até esse pequeno detalhe eu queria guardar comigo – mesmo dentro de um pesadelo, aquele era o céu mais bonito que já vira. Todas essas coisas encobertas pela minha agonia vinham à tona agora, e eu só conseguia pensar que elas não poderiam deixar de existir, se eu morresse, eu sei que as perderia para sempre. Memórias que se apagariam junto com a luz de meus olhos. Justo eu, que nasci para ver todas as coisas...
Mas o que eu poderia fazer? O que? Ficar aqui, ajoelhada em meio ao fogo era tudo que eu conseguia fazer. A morte parecia mais assustadora que nunca. Todo meu corpo doía, vazio e gelado. Quase não havia sangue em mim, meus olhos ardiam com a luz alaranjada, o fogo parecia cozinhá-los nas órbitas. Eu queria chorar, lavar minha alma, mas minhas lágrimas subitamente secaram, como se eu mesma estivesse vazia, seca como as folhas de outono.
A noite estava iluminada, a cidade se acendia como uma estrela na escuridão, o céu mais lindo do mundo estava fechado num rubro negro sombrio, pronto para descer cobre Volterra e engoli-la em sua imensidão intransponível.
Eu observei meu corpo tombar, inerte como um brinquedo sem pilhas, e novamente eu senti que minha alma me encarava de longe. Então é isso, eu pensei... essa é a face de minha morte. Obriguei-me a encará-la sem medo e me entreguei aos braços frios que me rodearam num torpor silencioso.
Num segundo suspenso no limite da consciência, eu ainda pude ouvir o uivo melancólico de um lobo subir ao céu escuro.
Fechei os olhos.


***


– Faça pressão Edward, não pare.
– A pulsação está muito fraca Carlisle, ela não tem sangue para bombear.
– Meu Deus Edward, meu Deus...
– Calma Bella, nós não vamos perdê-la. Agora, ajude Edward a controlar a pulsação. Verifique a respiração, ela tem que respirar...
– Nós não devíamos tê-la deixado sozinha com aquele Alec, Edward...
Um túnel. Distante e escuro. Breu e vozes soando longe.
Um frio desorientador. Era isso o que eu via, era isso que eu sentia. Meu corpo era um nada, eu não o sentia em lugar algum, e minha mente apenas vagava confusa por um espaço atemporal.
Eu não podia entender aquelas palavras, mas as vozes que murmuravam sobre mim, eram tão suaves, aveludadas... Eu gostei de ouvi-las. Tentei encontrá-las no turbilhão indistinto daquele silêncio incômodo. Eu queria ouvir o som das palavras embalando meus sonhos turvos, borrados...
– Ela precisa de sangue Edward, e nesse ponto... No estado dela creio que sangue animal não vai ajudar em nada. – A voz serena murmurava rapidamente, sem perdera constancia aveludada de suas palavras. Soava como cordas de nylon vibrando no espaço, cada nota subindo em espirais perfeitas.
– O quê está sugerindo Carlisle? Que eu terei que escolher entre a vida de minha filha e a de um inocente? – Essa era a voz que eu mais gostava. Tão linda, ao forte e vibrante. Parecia-se com cristais. Se pudesse ser tocada seria como seda.
– Eu não sei o que fazer Edward, ela não reage a nada... – Eu sentia tanto frio. E contudo eu não podia tremer, estava inerte, presa num corpo gelado e imóvel. Eu sabia que, em algum lugar, havia um coração, eu podia ouvi-lo ao fundo, um murmúrio lento e fraco que se misturava com as vozes perfeitas que conversavam entre si.
– Edward, nós não temos escolha. – Disse a voz feminina, um sino de vento soando na escuridão que me envolvia. Eu gostava dessa também... Era tão familiar que por um momento eu pensei estar vendo-a sob minhas pálpebras fechadas. – Eu não posso suportar isso Edward, não posso ficar aqui vendo minha filha morrer. Eu daria meu sangue se ainda tivesse algum em minhas veias, mas nem isso eu posso fazer por ela. Então não me olhe assim. Se alguém tem que morrer para que minha filha viva, eu aceito. Vou agora mesmo buscar alguém na cidade vizinha. – A voz radiante brilhava como uma estrela na imensidão obscura onde eu me encontrava. Era como olhar para o céu noturno e ver lá longe um lusco fusco incandescente.
– Não vai precisar ir tão longe Bella. – Um novo clarão, uma nova voz surgindo no tapete negro. O céu se abriu em uma rajada de fogo, desfazendo-se sob a luz quente que aquela nova voz trazia. Era uma ressonância macia, mas tão forte que alcançou o plano real, e subitamente eu senti aquele coração distante que falava tão baixo, bater com mais força. Era como um choque elétrico passando por meu corpo entorpecido.
– Jake, vice não vai fazer isso.
– E por quê não?
– Jacob, ela vai precisar de muito sangue. – A voz suave e calma quase sussurrava.
– Nós já fizemos isso antes. – Disse a voz rouca, soando mais perto. Eu senti a luminosidade vertiginosa daquela voz, clareando minha mente turva como se mil vela tivesse, sido acessas diante de meus olhos.
– É diferente Jacob. Naquela vez ela sugou só o sangue sujo das suas veias, uma quantidade insignificante para alguém como você. Agora ela precisa de muito, mesmo para você é muito sangue, você pode não sobreviver...
– Eu não me importo. Vamos logo com isso.
– Jake, não! Pare. Você não vai se matar.
– Bella, nós não temos escolha. Não há humanos por aqui,e mesmo se houvesse, eu não vou ficar aqui olhando você drenar um inocente. Se precisa ser feito, sou eu quem deve fazer. Além disso, pode ser que eu sobreviva, o doutor mesmo disse que eu sou forte. – Um silêncio pesado caiu sobre meus ouvidos. Por um momento pensei que havia perdido de vez as vozes brilhantes que me distraiam do frio. Tive medo do silencio, eu queria ouvi-los, queria sentir as notas formando cores em minha mente vazia.
Quando o desespero começava a me alcançar, a voz melodiosa da mulher sussurrou:
– Como isso foi acontecer? – Aquele lamento sufocado atravessou minha mente como um punhal. Uma melodia triste demais para eu suportar. Eu queria chorar, mas eu não encontrava meus olhos em lugar algum.
– Não temos tempo para isso agora, Bella. Deixe-me dar o sangue a ela. Depois conversamos. – Outro minuto de silencio, outro minuto de medo e escuridão. E então algo aconteceu...
Eu não sei bem como. Eu senti uma dor aguda em alguma parte do corpo que até então eu não sentia. Era como se eu tivesse sido puxada de volta a meu próprio corpo, como se por um momento, minha alma estivesse solta, flutuando num espaço inexistente. Eu senti meu coração. Ele estava quase desistindo. Lute – eu gritei para ele – mas não houve resposta. Meus coração se esforçava em suas últimas batidas oscilantes.
– Eu estou aqui. Você me encontrou. Eu nunca iria embora sem você. – O frio cedeu gradativamente, eu ainda não sabia como, mas a escuridão invencível que parecia prestes a me tragar, dissolveu-se no calor daquelas palavras sussurradas tão carinhosamente para mim. Elas me afagavam como luvas de plumas. Eu sentia o hálito quente em meus ouvidos, apenas um segundo antes de reencontrá-los. E assim, em cada parte entorpecida do meu corpo, eu pude sentir o peso da vida que estava me deixando aos poucos.
– Preciso que faça algo por mim. – Disse a voz rouca, e no mesmo instante eu soube que ele não estava falando comigo, o brilho tremeluzia.
– Qualquer coisa Jake. – Respondeu a voz clara e melodiosa da mulher.
– Se eu não der conta... – Um pausa. Um suspiro pesado. – Levem meu corpo para meu pai.
– Eu tinha uma vaga consciência despertando em mim. Eu sabia quem eu era, mas não sabia dizer onde estava ou como havia parado ali. Eu via escuridão. Eu ouvia cores... Elas cantavam para mim, amenizavam o pavor daquela semi morte, e quando fazia-se silencio, era como apagar as luzes.
– Será feito. – Disse a voz cristalina, as palavras deslizando como água.
– Muito bem então.
– Jake. – Chamou a mulher.
– Sim.
– Quando for o suficiente, eu vou pará-la.
– Não se preocupe com isso. O importante é que ela fique bem. Concentre-se nisso.
Eu queria entender aquelas palavras, mas minha mente estava adormecida. Ela apenas sonhava com cores e sons, influenciada por aquelas vozes magníficas, feliz por tê-las por perto. Eu sabia que eu estava morrendo... Mas desde que eu não ficasse sozinha, no silencio e na escuridão, então tudo estava bem.
– Ela sabe que está morrendo. Mas ela não está com medo, está sonhando... Está em paz.
Sim, sim... Paz. Alguém dizia algo assim, a voz de seda desenhava meus pensamentos, e eu adorava ouvi-la sempre adorei...
– Ela não vai morrer. – Ah, aquela outra voz... O oposto das vozes melodiosas que sempre murmuravam tão baixo e cadenciadamente. Era como fogo e gelo, e essa me queimava.
Eu sonhava com o campo, com a grama salpicada com o orvalho da manhã. Sonhava com o crepúsculo, o céu tingido de vermelho. Quadros que se misturavam, e logo vinha outro, e mais outro... Todos tão evanescentes. Eu podia sentir a grama sob meus pés, e o vento em meu rosto. Eu queria correr até minhas pernas cansarem.
– Eu preferia que vocês não vissem isso. – Murmurou a voz rouca, esquentando meu corpo recém descoberto. Eu senti o calor contra minha pele, e outra onda de choque correu por minhas pernas e braços gelados.
Tudo emudeceu. Todas as vozes brilhantes se calaram, haviam partido.
Exceto uma, mas essa não dizia muita coisa, apenas me reconfortava. Eu sentia pele quente sob meu corpo, envolvendo-me um abraço intransponível.
O quê era isso? O que era esse fogo me queimando de dentro para fora? Esse cheiro. Esse gosto terrivelmente bom escorregando por minha língua?
Era mais do que eu podia suporta, senti-me tonta de desejo, embriagada por aquele cheiro doce, aquela textura magnífica. Eu o queria tanto que chegava a doer. Meu corpo todo queria aquilo, implorava por mais...
– Tome Ness. Não precisa chorar, está tudo bem. – Sim, eu não tinha me dado conta do que estava chorando, mas agora eu percebia. Eu estava sofrendo em cada gole quente que tomava para mim, ávida e incapaz de me deter. Me doía sentir aquele desejo febril. Era esmagador, incontrolável.
Minha mente se acendia com tanto calor. Meu coração martelava, frenético em meu peito. Eu podia ouvir o vento passando sobre a superfície escarpada da rocha, levantando as cinzas numa espiral constante. Eu podia ouvir o coração dele, batendo forte sob minhas mãos semi aquecidas. Eu gemia com a intensidade da sede, que tornava-se mais voraz a cada nova gota preciosa. Eu sentia que estava emergindo de uma grande profundidade, era como se meus ouvidos se livrassem da pressão incômoda que me ensurdecia.
Aos poucos, como o amanhecer, como se o sol estivesse inundando o céu de luz e calor, minha visão obscurecida empalideceu, clareando a cada batida estridente do meu coração.
Eu vi o céu - de verdade - pairando majestosamente sobre mim, com sua imensidão silenciosa se estendendo até onde meus olhos o perdiam de vista. Um tapete negro salpicado por nuvens cinzentas que escondiam as estrelas de mim.
Ah, como era divino aquele sabor. Um bálsamo para todos os meus temores. Era como fogo líquido. Todos os sons despertavam ao meu redor, eu queria sorver tudo, tornar meu cada ruído da noite, cada farfalhar das folhas das árvores.
Meu coração acelerava, o dele desvanecia...
Eu estava bebendo sua vida.
Horrorizada, trêmula e confusa, eu me afastei do pulso ensangüentado que repousava sobre meus lábios. Meus dedos fechavam-se feito barras de ferro ao redor da ferida aberta que jorrava o sangue quente em minha boca aberta. Como era difícil me afastar daquele pulsar forte, vívido e desesperado...
– Jake. – Gemi, tentando com todas as forças combater aquele impulso sedento. Ele me olhou, sorrindo, sereno como uma brisa de primavera, e nada disse.
Ele estava pálido, recostado em uma das grandes árvores que cobriam aquela clareira. Eu nunca estive ali. Tentei me levantar, e logo descobri que eu podia fazer isso perfeitamente.
Contudo, me sentei ao lado dele, de modo que pudesse ver seu rosto. Ele me olhava tranqüilo, como se nada mais importasse ou merecesse atenção maior.
– Por quê fez isso? – Perguntei, sentindo as lágrimas turvarem minha visão.
– Que escolha eu tenho? Não posso viver sem você... – Engoli a bola quente que se formava em minha garganta, o gosto dele ainda incitando minha sede. Fechei minhas mãos em punho, tentando conter a raiva que eu estava sentindo de mim mesma. Percebi algo macio sob minha mão esquerda, quando olhei, me lembrei de algo que ele me dissera há muito tempo...
– Finja que é meu coração. – Estendi a flor amassada para ele. Ele sorriu. – Eu estraguei tudo não é?
– Não. Você fez o que tinha que fazer. Se não tivesse feito não seria você, isso faz parte de quem você é. – Ficamos em silêncio por algum tempo, escutando o vento e observando a aurora alaranjada que pairava sobre Volterra. Estávamos a mais ou menos dois quilômetros da cidade, numa clareira pequena que se elevava sobre os montes de Montepulciano.
– Acabou Ness. Vamos para casa agora. – Sussurrou Jacob em meu ouvido. Segurei sua mão quente entre meus dedos e sorri para ele, feliz por ver que eu não tinha o sugado até quase a morte.
Ajudei ele a se levantar, percebendo a fraqueza momentânea devido a falta de sangue, e eu estava me sentindo bem. Estava esperançosa pela primeira vez em meses...
– Ah, mas nós estamos apenas começando meu caro.
Arfei, e quando me virei em direção da voz eu quase gritei. Aro, Caius, Jane, Demetri...
Aquele pesadelo não terminava nunca?


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Notas finais do capítulo

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