- Lucas! Onde estás? – perguntou a mulher, entrando na sala.

- Aqui, oka-san. – suspirou o garoto, saindo de debaixo da mesa… Quer dizer, já não poderia ser propriamente considerado um garoto. Tinha vinte e quatro anos, um emprego estável e bem remunerado, uma grande casa e, melhor que tudo, um marido…

- Sempre escondido filho. – disse sorrindo, abraçando o filho.

- Sempre? – perguntou Lucas, arqueando uma sobrancelha. Que soubesse não existia esse ‘sempre’ de que a mãe falava.

- Sim. – respondeu a mulher, rindo estridentemente, como se se lembrasse de uma coisa extremamente divertida. Coisa que logo tratou de ditar em voz alta – Me lembra aquela vez… Quando eu e o teu pai decidimos mudar de casa. Tu escondeste-te num armário e eu andava desesperada à tua procura, para te contar a notícia. Acho que tu já sabias…

- Ah! Já me lembro… Realmente, eu nunca gostei de mudanças. - comentou, olhando sugestivo para a mãe.

- Mas as mudanças por vezes trazem coisas boas meu filho. Tal como a nossa trouxe. – respondeu Elisa, esse era o nome da mãe do garoto.

- Hai… Tens razão. E isso me lembra…

- Espera! Eu vim aqui perguntar-te uma coisa. Era… Ah! O que aquela cadela queria, quando veio cá ontem?

- Não gosto de defendê-la, mas ela não é uma cadela, é minha editora.

- Não interessa! O que ela queria?

- Ela disse para eu escrever um livro sobre minha vida… - comentou pensativo – Eu vou negar a proposta, óbvio! – acrescentou rapidamente, perante o olhar de raiva da mulher – Mas e se… Eu escrever só para mim? E juntar os testemunhos das pessoas que sempre estiveram comigo.

- Ah… Isso é outra coisa. Assim aceito. – disse rindo, e abraçando o filho de novo – Isso significa que vais ligar para a Ayumi? Bom… Se quiseres eu faço isso por ti.

- Não. Eu aguento o escândalo dela, mãe… Ela ainda é a ~minha~ melhor amiga, que eu me lembre.

- Hai, é sim. Ainda bem que não é a minha. – comentou com um olhar horrorizado.

- Ka-san! Não insultes a Ayu-chan assim… Ela é legal. Mas não para ti. – disse a última parte muito baixo, sorrindo – Agora vai embora que eu quero começar logo a escrever…

- Está bem. Não precisas expulsar a tua velha mãe tão descaradamente. – disse com ar ofendido, mas rindo alto – Boa sorte Lucas…

Assim que a mãe deixou o escritório o garoto deixou-se cair na cadeira de couro. Ficou rodando nela até o telefone tocar. Estava sem paciência para aturar qualquer um, mas provavelmente seria importante. Quase ninguém conhecia o número de telefone do seu emprego… Apenas as pessoas que trabalhavam com ele. Os editores, ou os indivíduos que ajudavam a publicitar os seus livros.

Sim, ele era escritor. E tinha muito orgulho disso. Tinha passado por muitas dificuldades para chegar ali. Não ia desistir nunca… Era famoso e bem-sucedido, verdade. Mas não menosprezaria as pessoas que o ajudaram a chegar até onde tinha chegado.

Levantou-se do assento, mostrando, a quem quisesse olhar, o seu magnífico corpo. Era um pouco afeminado, mas nada demais. Os cabelos castanhos rasavam os ombros, e sempre se encontravam meio despenteados, mas de forma a aumentar o seu charme. Os olhos azuis, tão claros e límpidos como a água, sempre estavam atentos e, muitas vezes, cansados. Sempre adornados por um risco quase impercetivel. A pele era branca, macia, perfeita… Mas ele não gostava da perfeição. Preferia os erros das pessoas, como eles deviam ser. Mais à frente vão perceber porquê…

- Que bom que meus leitores já estão habituados à minha forma de escrita… Ainda me lembro, como foi difícil no início… - comentava para ele mesmo, sorrindo azedamente, com os de angústia que as memórias sempre lhe traziam…

Ele já tinha sofrido. Tinha passado mal para chegar ali… Mas no fim, todos tinham acabado bem.

Agarrou no telefone, desligando na cara de quem quer que lhe estivesse a ligar. No entanto, não abandonou o objeto… Ele ainda tinha que ligar para a Ayumi, bem como para todos os seus amigos…

Algo na mente de Lucas lhe indicava que, escrever aquele livro, seria uma nova aventura na sua vida…