O Resplandecer Da Luz escrita por Ninguém


Capítulo 34
Capítulo 31 Visitas em um quarto de hospital.


Notas iniciais do capítulo

Capitulo final. Espero poder agradar a todos que lerem.

Boa leitura.



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Visitas em um quarto de hospital.

POV Eros.

Abri os olhos bem devagar, sentindo o peso das pálpebras forçando minha vontade... era incrível que até um simples ato desses me custava um esforço tremendo.

Não consegui forçar minha visão e então voltei a fechá-los, caindo em um sono profundo.

Não sei quanto tempo depois eu os abri, agora havia ficado mais fácil, porém minha visão embaçada não ajudou muito, sinceramente eu não fazia ideia de onde estava e com certeza não conseguiria distinguir pelos olhos. Assim, meu cérebro tentou voltar a funcionar... quase pegando no tranco, como uma camionete velha  que já sofreu os efeitos do desgaste e do tempo.

Mesmo minha mente não trabalhava muito bem à aquela altura, mas as memórias forçaram uma imagem de Greco sorrindo mediante a força da luz a nossa volta, quando a cúpula já formava as lâminas que nos matariam.

Novamente, um simples esforço me fez voltar a fechar os olhos e adormecer.

Quando os abri da terceira vez, minha visão não estava mais embaçada, na realidade pude ver muito bem a figura feminina que estava de pé ao meu lado, checando alguma coisa.

- A...a... Alíris? – forcei minha voz o máximo que pude.

A mulher toda vestida de branco virou a cabeça na minha direção e arregalou os olhos. Era obvio pra mim que aquela não era Alíris.

- Rapaz, não se mova... eu vou chamar o médico.

Ela correu para uma porta enquanto eu ainda processava o que ela havia dito... médico? Eu estava... eu estava vivo? Ou aquilo era algum truque da minha alma que não quis aceitar que havia acabado? Não.. não, eu já havia aceitado morrer, eu tinha quase certeza de que a cúpula explodiu comigo e com Greco dentro dela. O que estava havendo?

Durante as horas que se seguiram, dois médicos e mais uma meia dúzia de enfermeiras vieram até meu quarto checando tudo, minhas pernas, meus braços, meu pescoço e até o meu... bem... o meu... meu “trem” foi constrangedor mas eu ainda não tinha muita força para movimentar nada.

Após uma conversa rápida com um homem de cabelos grisalhos e aparência esquelética com grossas olheiras que mais parecia uma mutação de zumbi com vampiro que havia cursado medicina. O tal médico mutante perguntou se eu sentia dor aqui, lá, acolá, aí eu disse não, não, e ahhhhhhh!!!! Aí dói! ( havia espetado minha bunda com um alfinete.)

Depois disso me transferiram para um quarto de hospital. Era espaçoso e elegante com uma grande janela e uma televisão e ar condicionado, além de que era somente meu. A questão é que até os quartos de hospitais me deixavam triste... faziam me lembrar de Helena...

Todos os meus membros formigavam, por isso não pude fazer nada além de ficar de molho e esperar que alguém viesse me ver e me explicasse o que estava havendo. Por que eu mesmo não continha respostas.

Ainda me custava a crer que estava vivo... como é possível?

- Isso não faz sentido. – falei olhando para minhas mãos.

- Nada no caos faz sentido. – ouvi uma voz rouca soar ao fundo do quarto, e reconheci de imediato.

- Morte.

Encarei o homem pálido de terno preto e bengala parado numa das extremidades encostado na parede  olhando para mim com um sorriso estranho para seu biotipo.

- Olá Eros. – disse ele de bom humor caminhando para mais perto da cama. – eu perguntaria como está... mas creio que seja obvio a resposta. E já respondendo uma pergunta obvia sua... sim, você está vivo e sim, estamos na Terra.

Morte puxou uma cadeira e a pôs bem ali já se sentando. Tudo bem que era insignificante o movimento, mas a Morte é um ser energético... não possuí matéria... ou um corpo vivo... então como ele puxou a cadeira?

- Como você... ah! Deixa pra lá. O que está acontecendo? Eu deveria estar morto... você e Alíris foram bem claros quanto a isto.

Morte deixou a bengala apoiada ao lado da cadeira e ajeitou o terno.

- Sim, você deveria mesmo estar morto. Mas não está. Os seres humanos vivem no presente e no atual presente, você respira e anda por este mundo, por que? Eu sinceramente não tenho a resposta para isto. Não faz sentido por que o ser humano pertence a ordem do caos... e como eu já disse, no caos não existe sentido. Agora, como você está vivo? Oras... creio que você possa se responder a isso.

- Como? – não entendia suas palavras.

- Apenas lembre-se nos últimos momentos que teve com Greco antes de a cúpula formar as lâminas e explodir.

Tentei forçar mais minha memória para aqueles últimos instantes... e então o som da voz de Greco ecoou por elas imagens trazidas por meu cérebro.

Meu pai dizia que o ato que defini um homem de verdade é o seu desejo de sempre melhorar a si mesmo. Torna-se melhor, estimulá-lo à ambição para que a coragem possa nascer em seu interior o privando assim, da covardia.” Ele havia dito isso poucos antes de me atacar... depois que perfurou meu peito, Greco ainda disse alguma coisa ao pé do meu ouvido...

Forcei mais minha mente tentando lembrar quando por fim as palavras vieram.

Eu estou te devendo uma, e não vou permitir ficar em dívida com um covarde, por isso farei com que viva. Você vai viver Eros, para ter a chance de me mostrar e mostrar a si mesmo que não é um covarde como eu acho que é. Viva sua vida do melhor modo que puder e... obrigado.”

Meu queixo caiu e meus olhos se arregalaram automaticamente lembrando daquelas palavras atormentadoras.

- Não pode ser... – foi tudo o que consegui dizer.

- Sim. – falou a Morte num sorriso quase feliz – vocês humanos são mesmo imprevisíveis, são bagunçados e dotados de escolhas estranhas e surpreendentes. Greco não gostava de você, desde o primeiro momento ele não foi com a sua cara, e mesmo assim, por questões de comprometimento e dever ele transferiu seu conversor de energia vital da alma, injetando-o diretamente em seu coração e o lançou para fora da cúpula segundos antes da explosão. O conversor manteve seu coração batendo mesmo depois de Alíris ir.

Puxei o pano da roupa que usava e vi novamente a cicatriz no meu peito... achei que fosse por causa de alguma cirurgia... mas não. Espere.

- Alíris! – encarei Morte. – minha nossa! Então... então... acabou?

- Relaxe menino. Está feito. – Morte parecia estranhamente satisfeito. – foi realmente uma jornada incrível... você merece um lugar em minha lista.

Havia terminado? Finalmente? Por mais que eu acreditasse... ainda não parecia verdade. Terminou!

Comecei a rir enquanto lágrimas saíam de meus olhos.

- Espere... – eu tentei controlar minha ansiedade e felicidade. – ainda não entendi... como Greco pôde subjugar o selo dele?

- Não foram pelas suas palavras, se é o que está pensando. Porém ter aquela pequena conversa com o militar ajudou, pois interrompeu o controle do selo por alguns minutos e isso foi vital para aquela virada monumental na luta.

- O que quer dizer?

Morte se ajeitou na cadeira e suspirou.

- Já ouviu falar do termo alma gêmeas? É claro que já, bem... tirando o romantismo de lado... ela é verídica.

- Ok, você só está me confundindo mais.

Morte bufou.

- Francamente, nem com a inteligência de Sorhe você consegue capitar os eventos de primeira? Tudo bem... as almas Eros, elas vagam pelo universo por que querem ver, ouvir e presenciar todo o esplendor do cosmos... elas podem ver estrelas se formando, podem ver todas as civilizações existentes em todos os mundos... e quando se cansam de apenas ver e ouvir e decidir sentir, elas encarnam. Tudo isso se deve ao fator experimento. Elas querem experimentar... a vida em forma carnal é um leque de infinitas escolhas podendo ser tomadas de infinitos modos, essa é mais uma das razões para que a alma quando encarne venha na forma de um homem ou de uma mulher, e a questão de ela esquecer da vida passada também é por mero divertimento.

- Divertimento?

- Sim e por que as almas não poderiam se divertir? Imagine brincar no melhor e maior brinquedo do universo... só que, o que acontece quando você brinca sempre nele? Vai perdendo o gosto e por isso elas se esquecem... só para que possam explorar e experimentar de novo. Certo, não me deixe perder o fio da miada aqui. A alma acabou desenvolvendo outro meio para ampliar seu divertimento... ela se dividiu em duas. Tudo que há possuí dois polos... o alfa e o Ômega, branco e negro, luz e trevas, doce a amargo... a alma presenciando isso decidiu se dividir para ter o seu oposto que se completasse em vida física. Você já sabe que os selos são os opostos das almas... mas as mesmas gostariam de ter o seu outro lado em uma forma física, carnal.

- Está me dizendo que ela se divide em duas e que essas duas formam duas pessoas diferentes?

- Exato. Mas como são muitas almas... fica difícil elas se encontrarem em meio carnal, logo isso leva tempo... mais de uma vida no caso. A questão aqui é que quando se encontram... – morte abriu os braços. – temos a consciência da mais pura essência do que é o amor.

- E no caso de Greco...

- A mulher dele. Ele encontrou sua alma gêmea e depois a perdeu... só que não foi isso. Ao acha-la... não se perde mais. Porém em meio ao desespero e a culpa, Greco se esqueceu.

- Foi quando eu interrompi o controle do selo dele por alguns momentos... fazendo ele se lembrar?

- Quase isso. – Morte apoiou as duas mãos sobre o colo. – Ellen e Greco são um só... duas metades de um todo que se encontraram, mesmo com a morte dela, eles nunca se separaram pois ambos eram um. Quando Greco tomou ciência disso, sua determinação literalmente incendiou e sua alma tomou sua verdadeira forma. O selo nada pôde fazer por que a liberdade de uma alma é invencível, o que ela decidir fazer... fará.

- Então foi isso. – disse eu pensando nos últimos acontecimentos.

- Hum! Acho que eu já devia esperar por esses acontecimentos, o equilíbrio do universo é perfeito. As duas polaridades máximas nunca se afastam e sempre se completarão.

- Do que está falando agora?

- De algo que é tão obvio, mas que te passa desapercebido. Desde o momento da disseminação dos selos... todos esses acontecimentos estavam fadados a acontecer cruzando as dimensões antagônicas.

Cruzei os braços a frente do corpo.

- Continuo sem entender.

Morte aumentou o sorriso.

- Um reratiano atormentado pela monstruosidade decidi se arriscar numa empreitada insana para salvar um planeta inteiro. Um humano, tendo um selo preso em seu corpo só pensou em se afastar para proteger aqueles que amava, devido a uma situação... hã vejamos... insana. Optando em seguida por entrar na luta dos selos a fim de proteger o mundo onde vivem aqueles que lhe importam.

- Mas é claro que somos parecidos... de certo modo somos a mesma pessoa. – falei.

- Mesma alma, mas não são a mesma pessoa. A questão é que embora não sejam a mesma pessoa, não terem a mesma memória vocês tiveram o mesmo desejo... o desejo de sua alma. E se pensa que ela decidiu isso automaticamente por que lhe deu vontade... pense novamente.

- Pare de falar enrolado! E diga de uma vez o que quer falar.

Morte manteve o sorriso estranho na face.

- As dimensões da Terra e de Rerat se completam, como se fossem a mesma face de um espelho. Essa verdade é tão nítida que até os nomes provam isso. Veja:

T-E-R-RA, cinco letras com dois “r”, um “t” e duas vogais... um “e” e um “a”.

R-E-R-A-T, cinco letras com dois “r”, um “t” e duas vogais... um “e” e um “a”.

Fiquei sem ação por um momento.

- Está compreendendo não é? – Morte parecia cada vez mais satisfeita. – o seu próprio nome também é uma prova dessa ligação antagônica. Escreva SORHE e então leia-o de trás para frente EHROS.

- Não acredito... – estava em choque.

- Os multiversos são regidos por uma ordem perfeita. As almas podem ter o poder do caos para se livrar dessa ordem... no entanto no fim elas também seguem um instinto. Você, como Sorhe descobriu que tudo, absolutamente tudo nos multiversos está conectado... o que não reparou é que em alguns pontos a conexão é quase extrema... é quase tão perfeita que parece igualar os dois polos.

- Não me venha com essa conversa que tudo aconteceu por um motivo. – falei de modo direto.

- É claro que não. O universo não trabalha com destino, mas com possibilidades... tudo o que aconteceu era uma das possibilidades... porém, essas possibilidade foram escritas e ditadas antes dos acontecimentos pela ordem do universo, pela ordem de toda a criação. O primeiro Sorhe... o soldado desertor que iniciou a revolução em Rerat compreendeu isso, é por essa razão que eu lhe dei o primeiro lugar na minha lista. Um humano sozinho chegar a verdade sobre o funcionamento do cosmos merece uma posição de prestigio.  

Fiquei mais um tempo sem dizer nada, apenas pensando em tudo. Ainda não entendia completamente, pouco do que a Morte disse fazia sentido, ainda sim eu percebo que o universo funciona como um dado... os seres humanos simplesmente jogam com as possibilidades desse dado... o que vai dar, o resultado final irá depender do desempenho e de um pouco de sorte também.

O senhor pálido se levantou pegando a bengala.

- Bom... já conversei tudo o que tinha para conversar com você. Meus parabéns novamente por ter obtido sucesso em sua empreitada Eros.

- Morte... eu tenho uma pergunta. – falei antes dele se despedir por completo.

- Faça e a veja respondida.

- Muitos suspeitavam que eu era... quero dizer, Sorhe era a reencarnação do soldado desertor... se ele era quer dizer que nós três partilhamos a mesma alma. O que eu gostaria de perguntar... é verdade? Sou a reencarnação dele?

Morte arqueou as sobrancelhas.

- Quer mesmo saber?

Acenei com a cabeça indicando que sim.

- Não. Não são a mesma alma por isso não são a reencarnação daquele Sorhe. Mas não se preocupe, cada alma tem a mesma proporção de grandeza, além do mais... você conheceu a alma dele, pois ela encarnou na Terra de qualquer maneira.

Fite-o com uma expressão surpresa.

- Eu conhecia a reencarnação daquele Sorhe? E quem é?

Morte sorriu.

- A certos segredos que devem permanecer ocultos e jamais revelados.  Bem... hora de ir. Adeus Eros... nos veremos daqui há algumas décadas.

E num piscar de olhos a Morte se foi.

Depois da visita da Morte, acabei recebendo mais um visitante naquele mesmo dia... felizmente este era feito de carne e osso.

- Imaginei que você viria me ver. – falei para o delegado da policia federal.

Adalbert Smith estava bem melhor do que eu me lembrava, parecia mais disposto e não possuía as grossas olheiras. Até a careca parecia mais polida e brilhante, como se refletisse o seu estado de espirito.

- Tomei o avião imediatamente para cá quando me informaram que havia acordado do coma.

- Coma???

O homem de camisa polo e calça jeans estranhou minha reação.

- Sim. Os médicos não lhe disseram? Você está em coma há um ano e dois meses Eros.

- O que... como? Hã? – droga! A morte vem aqui me fala um monte de coisas e nem menciona que fiquei mais um ano desacordado.

- Você foi achado numa praia na Guiana, quando descobrimos o transferimos para um hospital aqui no Brasil, é claro que foi estranho vê-lo novamente com o mesmo rosto. De qualquer maneira não houve nenhum incidente com selos desde o seu desaparecimento então de algum modo pressupomos que havia conseguido detê-los, juntamente com Greco... se bem que não achamos os corpos.

Por que estão jazendo no fundo do oceano Atlântico.

- Está terminado. Todos os selos foram purificados e ficarão estáveis por bilhões de anos.

- Menos mal. – o delegado sentou-se na mesma cadeira que Morte havia sentado horas atrás.

- Então... o que foi que houve nesse ultimo ano?

- Bom... muito muita confusão sobre os selos... da onde eles vieram e por que estavam aqui... depois veio a questão dos desastres e dos assassinatos dos membros das nações unidas... foi um estardalhaço por alguns meses até a poeira começar a baixar. Muitos danos são sentidos até hoje, porém creio que a situação já esteja estabilizada.

- Nada das nações do mundo entrarem em guerra... não é?

Smith riu.

- Anda assistindo filmes demais menino. Relaxe... depois das destruições na Europa e no Brasil, a ultima coisa que todos querem é uma guerra. Além do mais todas as nações envolvidas foram atualizadas sobre a verdade.

Engoli seco.

- E no que isto refere-se a mim?

- Não precisa se preocupar. – ele deu de ombros. – há muitas perguntas que eu tenho que te fazer, a respeito de algumas dúvidas de segurança nacional e mundial... mas é só. Depois de comprovado o seu coma e todos os seus exames... eles acreditam que não há mais nada de perigoso num garoto musculoso de dezessete anos.

De certo modo fiquei mais aliviado. Era bom poder acreditar que iria talvez voltar a minha vida normal... isso seria estranho após todo esse tempo acreditando que ia morrer e que o mundo se transformaria num mar de cinzas.

- Ah sim... – disse Smith retirando um papel do bolso da calça e me entregou.

- O que é isso? – desdobrei e o abri.

- Lembra do Marcos? Ele ficou a par da situação durante todo esse tempo, também disse que viria visita-lo... mas enfim, ele propôs que você recebesse no mínimo uma recompensa por serviços prestados ao país e ao mundo. Alguns países da Europa e o governo brasileiro não se importaram em colaborar com seu ressarcimento financeiro, eu sei bem que não há preço pelo que você fez, mas de fato um pouco de dinheiro é sempre bom.

Eu quase não escutava o que Smith falava, apenas encarava o valor no pequeno papel branco dobrado.

- Este dinheiro foi depositado em duas contas, uma aqui no banco do Brasil e outro no banco de Zurique, te entregarei a senha e os números assim que responder todas as perguntas e conversar com alguns políticos e militares.

- Hã... hã...eh... Smith. – minhas mãos começaram a tremer – você poderia dizer o valor em voz alta... é que eu não consigo entender por causa do números de zeros.

Smith no entanto fez uma cara de estranho olhando para o monitor cardíaco que estava apitando.

- Sei que é uma quantia substancial... mas é merecida.

- Por favor... diga.

- Ok... creio que seja pouco mais de cem milhões de reais. Eros? Eros? Eros???? Enfermeira!!!!

Depois do meu principio de ataque do coração eu continuei na cama. Smith havia saído para resolver algumas coisas... parecia loucura, eu sobrevivi a tantos perigosos além de morrer uma vez e voltar a vida... e quase bato as botas por causa de míseros... míseros... ok. Meu senso de sanidade recusa-se a por a palavra “míseros” junto com tal valor.

Como já era de noite eu pensei em voltar a dormir, mas três batidas na porta impediram que eu voltasse ao sono acolhedor.

E meus sentidos ficaram ainda mais atentos quando a porta se abriu e um homem apareceu... um homem que eu conhecia melhor do que ninguém, embora nunca o tivesse visto na vida... de Eros.

- Haskir! – inclinei o corpo para frente.

Não era possível... não! Não era possível!!!

O senhor que aparentava ter sessenta anos, tinha cabelos grisalhos da cor da neve, rosto em formato de coração com um grande e grosso nariz por entre os olhos azuis afastados e coberto pelas grossas sobrancelhas brancas.

- Então é você mesmo... – disse Haskir se aproximando da cama com outros dois homens.

Ele pousou as duas mãos em meus ombros e olhou-me fundo nos olhos.

- Por favor... diga que é você...

- Haskir... – meus olhos começaram a lacrimejar.

Os dele também, então o senhor me deu um forte abraço com ambos de nós chorando sobre os ombros um do outro.

Após aquela sessão constrangedora, nos recuperamos e ele se sentou na mesma cadeira que a Morte e Smith, enquanto os outros dois homens permaneceram de pé próximos à cama.

- Como você chegou aqui? Espere... não me diga que veio pelo transporte de sentinelas?

- Era o único meio. – disse Haskir. – depois do assassinato de Sailas e o do departamento de pesquisa, nós direcionamos todos os satélites para a Terra, a fim de acompanhar o desfecho daquele movimento com os selos... recrutamos cinco mil agentes e os enviamos a  cá a fim de montar um posto de informação avançada.

Os Reatianos mantém postos de sentinelas em todos os mundos onde há a raça humana, a fim de poder estudar os recursos do planeta e a própria civilização, para medir seu nível de evolução... tudo isso sempre escondidos é claro.

Haskir ajeitou a gola da camisa vermelha, ele não estava habituado a aquelas roupas.

- Quando as informações começaram a chegar... sobre dois indivíduos que controlavam seus selos, o conselho dos anciãos decidiu que devíamos nos preparar para a guerra... caso tenhamos que ajudar a Terra, embora não pudéssemos fazer nada.

- Contraditório após aceitarem enviar os selos para cá. – falei.  

- São todos hipócritas Sorhe, eles queriam era fazer o possível para manter a briga na Terra e evitar a todo custo que um dos selos chegasse a Rerat novamente. No entanto... quando havia terminado, nosso satélites pegaram o foco exato onde você foi lançado depois que aquela cúpula explodiu. Nosso agentes deveriam ter chegado em você primeiro, tirado do alcance dos humanos e levado de volta a Rerat... é claro que na época ainda não sabíamos que era você Sorhe... no entanto, os selos são nossa responsabilidade... precisávamos de toda a informação possível. Os terráqueos não estão prontos para saber tanto.

- Então... como descobriram?

- Assinatura energética. Constaplus conseguiu detectar a energia de sua alma no sobrevivente dos selos que estava desacordado... e na hora eu sabia que não era coincidência... você era o melhor do mundo na pesquisa sobre reencarnação e energia da alma, assim como foi o que ficou mais perturbado com a decisão de enviá-los para cá. Então juntei isso ao seu suicídio inexplicável... e de algum modo meu coração sabia que era você. Cheguei na Terra a seis meses e disse que não partiria até você acordar, desde então nos mantivemos aqui. 

Por mais que eu tenha ficado feliz em rever Haskir... eu não podia deixar de notar uma sensação que me perturbava quando ele me chamava de Sorhe... era como se não estivesse certo.

- Ah... eu sei que temos muito o que conversar. – disse Haskir – mas não aqui. Vou providenciar nosso retorno imediato a Rerat onde poderá nos contar tudo tranquilamente, além de rever seus amigos e seu lar...

- Vou providenciar o transporte imediatamente senhor. – disse o cara ao pé da cama.

- Haskir pare. – disse eu, interrompendo-o.

Obtive os olhares dos três homens.

- Eu não vou para Rerat. – falei de modo manso, olhando diretamente para Haskir.

Os três continuaram encarando-me sem expressão, estavam evidentemente confusos, e isso os deixava sem saber como proceder.

- Deixo-nos a sós. – disse meu mentor aos homens.

Quando ficamos sozinhos no quarto, Haskir apoiou o queixo sobre as duas mãos. Sempre fazia essa pose quando necessitava de mais atenção para entender alguma coisa.

- Aqui não é seu lar Sorhe. – disse ele.

- Mas eu não sou mais Sorhe, Haskir. – respirei fundo. – escute... eu tenho todas as memórias de quando eu era... apenas por isso sei quem você é, sei como tudo isso começou e também pude por um fim... mas meu nome é Eros, eu nasci neste mundo... Sorhe não mais existe.

- Está falando besteiras. – Haskir se apoiou no descanso da cadeira. – você pode ter um novo corpo, um novo rosto, mas se lembra de quem é. E isso é o suficiente.

- Me lembro de quem eu era. Quem eu sou agora é o que importa. Este é meu lar... por isso eu o defendi com unhas e dentes. Faria mesmo por Rerat... mas eu não sou mais de lá. Preciso ficar onde é meu lar.

Ambos ficamos nos encarando por alguns momentos em silêncio, tentando ver na postura corporal ou nos pensamentos algo que nos levasse novamente as palavras.

- Pede-me para que deixe meu afilhado novamente? – falou ele. – está dizendo para não fazer nada e deixa-lo ir mais uma vez?

- Você nunca me deixou Haskir... todas as minhas decisões compreendiam apenas a mim mesmo e meu objetivo... eu via isso antes como vejo agora. Eu é que devo pedir desculpas por não me despedir de você antes.

O ancião balançou a cabeça tentando encontrar um meio de me convencer, mas ele no fundo sabia que eu tinha razão, sabia que essa era minha resposta final... não havia meios de me fazer voltar atrás.

Haskir se levantou da cadeira e mais lágrimas voltaram aos seus olhos.

- Então... isso é um adeus?

- Espero que não. – falei. – agradeceria se puder vir me visitar de vez em quando... sei que a viagem é tortuosa e demorada, mas não tem como eu ir.

Ele levantou uma das grossas sobrancelhas e sua expressão passou de tristeza para desconfiança.

- Entendo que você deva ter uma nova família aqui... mas o que realmente o está prendendo? O que há neste mundo que o faça dizer que ele é seu lar?

Sorri tendo em mente uma única pessoa.

POV Helena.

Definitivamente eu não me sentia bem. Talvez fosse o tempo úmido e frio por causa dessa temporada incessante de chuvas que alagam as ruas e atrasam o trafego, talvez fosse por que o trabalho se tornava cada vez mais torturante a medida que o conselho do hospital me pressionava para arrumar um novo investidor para suprir um fundo financeiro. Poderia ser também por que eu tenha mais cafeína no meu corpo que viciados tem drogas nos deles.

Ou, de acordo com Amanda... eu ainda sofro por nunca mais ver Aquiles.

Mais de um ano havia se passado e como ele apareceu, se foi. Se não fosse por todas as testemunhas eu não acreditaria que Aquiles fosse real, pareceu um sonho prolongado... como daquele que temos em mais de uma noite, mas que de repente acaba só nos deixando com pesadelos.

Sinceramente... prefiro acreditar que meu mal estar seja pelo excesso de trabalho, por que pelo menos assim eu poderia dar um jeito de resolver.

- Dra Gomez. – disse Aline já com uma pasta em mãos.

- Sim Aline... já são sete da noite... o que está fazendo aqui ainda? Ah... deixa pra lá, vamos eu te dou uma carona até em casa.

- Não dra! – minha assistente quase deu um pulo – apareceu um empresário querendo entrar como investidor do hospital... ele está na sua sala a aguardando desde as quatro horas.

Ela me entregou a pasta e eu quis chorar. Nos últimos meses havia tentado atrair um investidor para o fundo... o problema é que nenhum deles aceitou os termos do contrato... e não os culpo. O valor de investimento requer um capital inicial de dez milhões para então haver uma injeção de mais quinze nos próximos três anos... são vinte e cinco milhões para investir em quatro anos com a taxa de associação de quarenta e cinco por cento do fundo... e todos me dizem que para haver um investimento dessas proporções é necessário dar a eles a parte majoritária ( algo que eu não farei, pois me recuso perder o controle deste hospital para um figurão com muito dinheiro e pouco respeito por este estabelecimento)

- Aline... mande-o embora. Peça para que ele venha amanhã.

- Não dra! Ele está te esperando há três horas... e eu sei que o hospital precisa do dinheiro.

Ela tinha razão. Suspirei pegando a pasta e me dirigi a minha sala.

Quando entrei, olhei para a cadeira em frente minha mesa, mas não havia ninguém lá. Presumi que ele havia cansado de esperar e foi embora, mas rapidamente percebi o vulto na janela olhando a chuva bater contra o vidro formando pequenos caminhos de água, como mini rios.

- Hã... boa noite sr.. – abri a pasta para olhar o nome e então parei por um momento. – Eros?

Encarei novamente o homem que se virava para me olhar. Ele deveria ainda estar na faixa dos vinte e poucos anos, tinha um rosto quadrados, cabelos castanhos cortados curtos e olhos escuros, estava usando uma jaqueta de couro por cima de uma camiseta branca, calça jeans e botinas pretas... mais parecia um motoqueiro do que um empresário.

- Boa noite Helena. – disse ele num largo sorriso.

Fiquei encarando o rapaz... havia alguma coisa nele que me era familiar... além do nome é claro. Eros... eu já ouvi esse nome antes... onde?

- Hã... bem, desculpe a demora. – caminhei dando a volta em minha mesa e sentei-me na minha confortável cadeira. – sente-se por favor.

Ele pareceu sem graça, ainda que mantinha o estranho sorriso na face, estava achando alguma coisa engraçada... será que me cabelos havia despenteado?

Disfarçadamente passei a mão sobre eles enquanto fingia ler alguma coisa na pasta. Eros manteve-se de pé olhando-me ainda com um sorriso.

Aquilo já havia me irritado.

- Pode se sentar senhor.

- Prefiro ficar de pé. – seu sorriso aumentou ainda mais e eu me cansei.

Já estava cansada, estressada e ainda por cima minha TPM parece estar chegando, por isso fechei a pasta e a bati na mesa.

- Escute Eros... serei bem clara para poupar seu tempo e o meu, além de nos poupar uma discussão econômica fora de hora... você já leu os termos de investimento, já sabe o que precisa... não vou mudar em nada, então se não quiser aceitar, pode se retirar.

- Ah, tudo bem. Eu já fui informado e já me mobilizei para transferir o dinheiro. Só vim aqui para assinar o contrato.

Agora eu estava vermelha, não de raiva... mas de vergonha. Havia sido rude, se não, mal educada.

- Hã... ok. – engoli seco. – tem certeza de que não há nenhum ponto em que queira abordar ou... mudar? Aceita do jeito que está? – era bom demais para ser verdade.

- Sim. Está tudo em ordem. – ele cruzou os braços. – olhe esta chuva... estamos no meio da temporada dela... sabemos que vai cair, por que é a ordem certa para que ela caía... se está tudo em ordem com o universo... quem sou para ir contra a ordem de assinar um simples papel? Não que eu subestime o caos das pessoas e do mercado financeiro... mas prefiro me manter na simplicidade.

Fiquei encarando Eros sem me mover. Não que eu tenha entendido a explicação maluca... mas eu já havia ouvido sobre essa história de ordem do universo.

- Hã... eu... eu... – eu não sabia o que dizer.

- Na verdade... – disse ele. – se importaria em levar a documentação para outro lugar? Eu sou novo aqui em São Paulo, não conheço muito bem a cidade... na verdade acabei de montar uma empresa de placas fotovoltaicas para abastecimento por energia solar e descobri uma cafeteria aqui perto com umas guloseimas incríveis... hã... se importaria de ir comigo? Nós vemos todo esse troço do contrato lá mesmo enquanto saboreamos uns pães de mel, tortas e leite batido com caramelo... é magnifico!

Meu queixo caiu de forma automática.

Rapidamente ele descruzou os braços já se apoiando na cadeira, evidentemente nervoso.

- É por minha conta! Não se preocupe... e... também não é um encontro... não que eu tenha pensado nas ultimas três horas que fiquei aqui como te chamar para um encontro... quero dizer... eu nem pensei nisso... seriam... só negócios. Bom! Não só negócios... estaremos desfrutando de uma boa refeição carregada de açúcar... depois talvez podemos  ir a um restaurante da sua preferência caso queira comer algo salgado... novamente... não precisa parecer um encontro... eu.... eu. – ele coçou a cabeça corando. – eu falei demais agora.

- Eu adoraria ir. – acabei falando automaticamente.

Eu não sabia por que... talvez eu estivesse me iludindo, querendo acreditar nessas pequenas coincidência que me faziam lembrar de Aquiles... mas e se não fosse? E qual seria o problema?

Por mais que minha mente fique perdendo tempo com essas perguntas, meu coração só quer sair com ele, por que de algum modo... ele conhece este homem. 

FIM.


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Notas finais do capítulo

A fic está terminada. Foi a minha primeira história que postei e agradeço de coração aos que acompanharam. É ter pessoas que leiam o que escrevemos que fazem o ato de escrever valer a pena =D

Também queria deixar um agradecimento especial a Lovely Ghost Writer, Sarah Colins e Luna por terem comentado em todos os capítulos. Eles foram a motivação a mais que me deu impulso para terminar.

Sei que a fic contém alguns erros, na verdade já esperava por isso... por que acredito que o que nos torna melhores escritores é o simples ato de escrever... vamos nos aperfeiçoando a cada novo capítulo e a cada nova história.
Obrigado :D



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