P.O.V Percy

     Essa noite não tive sonhos, graças aos deuses. Acordei com Katniss chegando à caverna com um esquilo recém-caçado. Minhas costas melhoraram graças à água, mas ainda doíam. Katniss preparou o esquilo e comemos em silêncio. Isso estava me incomodando, mas eu não sou muito bom para puxar assunto, ainda mais com garota, e se essa garota ainda for Katniss...

     –Suas costas melhoraram? –Ela pergunta

     –Sim, e sua perna?

     –Já estava melhor desde anteontem. Só da para ver uma cicatriz.

     –Hum. –Foi tudo que consegui falar. O silêncio tomou conta da caverna novamente, só se ouvia o barulho das arvores e o canto dos pássaros. –Agora só tem quatro tributos. –Comentei.

     –É. Cato deve estar se recuperando de ontem. Tresh parecia em ótimo estado ontem, e só sobra nós. Se você não ganhar, eu quero que Tresh ganhe.

     –Tresh?

     –É, ele é do Distrito 11. O de Rue. –A última parte ela falou quase num sussurro.

     –Katniss?

     –Que? –Ela levantou a cabeça para me olhar com seus olhos tristes.

     –Não ligue para o que Clove falou, não é sua culpa, você fez tudo o que podia, não pode salvar tudo e nem todos. Eu aprendi isso da maneira mais dolorosa possível. Rue não te culpa, eu não te culpo. Precisa da opinião de mais alguém?

     –Eu me culpo.

     –Não deveria.

     –Como não? Eu não a protegi. As pessoas sofrem por minha causa. Lembra-se daquela Avox do trem? Então, eu vi quando ela estava fugindo da Capital. Sabe o que eu fiz para ajudar? Nada! Eu deixei ela ser pega, eu me escondi para a Capital não me ver!

     –Se você tentasse ajuda-la, você também iria ser pega, você sabe disso. Nem tudo o que acontece é sua culpa. Você sabia que uma garota morreu para salvar a minha vida?

     –Não...

     –Então! E sabe o que ela me disse depois?

     –Depois de morrer?

     –É, depois de morrer, eu conversei com o espírito dela. –Na mesma hora arrependi-me do que disse o que será que eles vão pensar? A, que saber? Não estou nem aí, eles pensem o que quiser! –É, isso mesmo que você ouviu, eu conversei com o espírito dela. Ela me disse que não era minha culpa, que ela havia escolhido esse caminho e sabia as consequências. Ela disse que era para eu seguir em frente, porque se eu ficasse me culpando, aí sim alguém acabaria morrendo por minha culpa. Foi difícil, muito difícil, ainda mais com o irmão dela me culpando. Eu ainda não sei se ele me culpa, mas mesmo que eu tente, a culpa da morte dela ainda me persegue. Mas sabe o que eu fiz para honrar a morte dela? Eu terminei aquilo que começamos juntos, e jurei a mim mesmo, matar aquele que causou tudo isso. E eu estou tentando, estou aqui por ela, continuei em frente. E é isso que você tem que fazer, Não acho que Rue iria gostar se você ficasse se culpando, eu acho que ela gostaria de ver você vencendo isso aqui, de ver você feliz. –Não me pergunte de onde veio isso, mas ao lembrar-me de Bianca Di’ Ângelo, os gritos de Nico ficaram nítidos em minha mente. A conversa que tivemos no Rancho antes de eu voltar ao labirinto veio à tona novamente, e eu não sabia como estava nossa situação, se ele ainda me culpava.

     –Tudo bem, você está certo. E foi bom você inventar essa história. –Ela disse por fim.

     –Eu não inventei! –Ela me olhou, e percebi que ela acreditava na história, mas estava tentando arrumar o que eu estraguei.

     –Inventou sim!

     –Tudo bem, inventei. Mas funcionou não?

     –Funcionou.

     –ótimo! Me dê um pouco de água. Nós precisamos sair daqui. –Ela me passa a garrafa e eu derrubo um pouco mais no corte, que agora já se fechava e parava de doer.

     –Consegue andar? –Ela me pergunta preocupada.

     –Conseguiria enfrentar uma Hidra agora. –Disse pegando minha espada.

     –Não fale isso. Não duvidaria se tivesse uma Hidra nos esperando lá fora. –Ela retruca me fazendo rir.

     Nós pegamos nossas coisas e saímos para uma longa caminhada silenciosa. Não há nuvens em cima de nós. Parece que a Capital quer dificultar só para os tributos do 12. Depois de um tempo caminhando já estamos suados e com sede. Dividimos a água restante e percebo que precisamos de mais. Canalizo a água mais próxima de mim, mas o mais próximo que encontro é um pequeno lago a uns três quilômetros de onde estamos. Nós andamos debaixo do sol sem descansar e finalmente chegamos lá, mas o que nos espera não é nada agradável. Se você disse uma Hidra, parabéns! Você ganhou o cartão premiado da morte.

     Olhei para o céu:

     –Vocês tão de brincadeira com a minha cara né? –O que recebi de volta vou o estalar de língua de duas das sete cabeças da Hidra. –Já que é assim, vamos logo matar essa Hidra. Katniss, não atire nas cabeças, atire no centro dela, no coração. Ela tem sete cabeças, mas um só coração.  Eu a distraio e você atira.

     –Você já enfrentou um desses antes? Eu só vejo em livros, não achei que existisse.

     –Já enfrentei, com Annabeth e meu meio-irmão. E como você pode ver, elas existem sim. –Katniss estava paralisada diante do monstro. A hidra devia ter uns 5 metros de altura, sua pele era grossa e seus dentes afiados. –Tome cuidado, ela solta fogo.

     –Sol... Solta fogo? –Ela me olhou espantada.

     –Vamos lá garota em Chamas, você não tem medo de fogo né?

     –Não, eu não tenho medo de fogo, eu tenho medo do que ele faz, você não faz ideia da dor que é ser queimado.

     –Você pode ter certeza que eu sei sim. –Disse lembrando-me dos Telquines. A Hidra interrompeu nosso diálogo irrompendo em chamas. Só deu tempo de eu e Katniss rolarmos para o lado. –Se esconda nas árvores e prepare uma flecha! –Gritei. –Eu vou para o lago! –Ela não disse nada, só fez o que eu disse. Eu me virei para a Hidra. –Esta na hora de brincar! –Disse já correndo em sua direção com a espada em punho. Ela deve ter achado que eu ia ser idiota o suficiente para ataca-la assim, então deixou eu me aproximar sem lançar chamas. Mas no último momento eu desviei para o lado e corri para a água. Ela ficou furiosa e lançou fogo com duas cabeças na mesma hora em que eu levantava uma onda para intercepta-la. A hidra não gostou nada da água. –Você precisa tomar banho de vez em quando sabia? –Provoquei. Podia até ouvir o riso das pessoas da Capital. Ela lançou mais chamas e dessa vez não deu tempo para levantar mais uma onda, e tudo o que consegui fazer foi afundar no lago. Eu nadei e sai do outro lado dela deixando-a ainda mais furiosa. –Você é bem devagar em! –Eu disse, mas ela provou o contrario: se virou para mim tão rápido que eu não tive tempo nem de gritar. Ela já se preparava para lançar mais chamas quando uma flecha passou zunindo ao meu lado e acertou seu coração. As sete cabeças paralisaram enquanto se desfaziam em pó de monstro, que caiu tudo em cima de mim. Katniss apareceu ao meu lado enquanto eu sacudia a roupa. Olhei paro o alto novamente. –Qual vai ser o próximo monstro? Eu não vou dar mais ideias não, vocês tem que ser criativos! –Gritei sem me importar com quem ouvisse. Katniss riu ao meu lado e eu a acompanhei.

     –Do que nós estamos rindo? –Katniss pergunta em meio ao riso.

     –Acho que de mim. –Respondi. Nós rimos mais um pouco, mas logo nos controlamos. –Vamos lá Garota em Chamas, nós precisamos de água.

     –Tudo bem, Destruidor de Calx e de Hidras.

     –Foi você que matou a hidra!

     –Verdade, se eu não a tivesse matado agora você seria um peixinho frito.

     –Também não precisa me lembrar, ok?

     –Cale a boca peixinho.

     –Tudo bem, Garota em Chamas que tem medo de fogo. Vamos para a água.