Folhas De Outono escrita por Sheeranator Mafia


Capítulo 74
Primeiro de Janeiro




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Já estava de noite há algumas horas. Eles foram para Copacabana, onde eu deveria estar com Mary. Eu não estava sozinha, rebaixados de Cristina estavam pela casa, para tomarem conta de mim. Fiquei deitada no colchão por longas horas, passando fome e o clima quente me deixava mais doente. Fogos continuavam a iluminar e deviam faltar poucas horas para 2006. Com dificuldade, me levantei e fui até o buraco na parede, peguei meu celular e o liguei. Pensei em ligar para Mary, mas clicar no número de Teddy foi mais forte que eu.

“Yolanda!” –Ele atendeu entusiasmado.

“Teddy, como é bom ouvir sua voz.” –Eu disse.

“Você está bem?” –Ele perguntou.

Pensei em dizer tudo o que estava acontecendo comigo, mas eu ia acabar prejudicando ele. Não queria deixá-lo preocupado e atrapalhar sua vida em Framlingham, já bastava a minha arruinada.

“Digamos que vou passar mais uns dias aqui no Rio.” –Eu disse.

“Por que?” –Ele perguntou.

“Quando eu voltar para Framlingham, eu te digo.” –Eu disse. –“Liguei para te desejar feliz ano novo.” –Completei quase chorando.

“Feliz ano 2006, Landy.” –Disse Teddy.

O “Landy” fez com que as lágrimas acumuladas em meus olhos caíssem.

“Sinto sua falta.” –Ele disse.

Respirei fundo e no meio das lágrimas, abri um sorriso. O celular apitou dizendo que a bateria estava acabando.

“Teddy, tenho que desligar e não se zangue caso eu não atenda mais suas ligações. Um dia lhe explico tudo. Me perdoa.” –Eu disse.

Antes que eu pudesse dizer mais alguma coisa, o celular desligou. Tentei ligá-lo novamente, mas nenhuma reação do mesmo. O escondi novamente no buraco e voltei a me deitar no colchão. Me encolhi o máximo que pude. Fogos de artifício começaram a explodir no céu e o cachorro não parava de latir. Me levantei e tentei olhar os fogos pela janela. Subi no caixote e pude ver melhor. O céu se iluminava com as lindas cores e desenhos que se formavam. Eu poderia estar segurando a mão gelada de Mary enquanto os fogos explodiam no céu de Copacabana. Enquanto eu observava os fogos. Ouvi alguém bater na porta. Corri até ela e o barulho parou.

“Quem é?” –Perguntei.

Ninguém respondeu. Um homem abriu a porta e tinha um pacote de biscoito recheado na sua mão esquerda. Ele estendeu para mim e fiquei na dúvida se pegava ou não, mas eu estava sem comer desde ontem. Peguei o pacote e ele fechou a porta. Me sentei no degrau da escada e abri o pacote desesperadamente. Peguei o primeiro biscoito e o mordi. Ele caiu em meu estômago como uma bomba e foi a melhor coisa que havia acontecido comigo nesse lugar. Minutos depois, o homem voltou, dessa vez com uma garrafa d’água de 500 ml. Estava bastante gelada e coloquei o pacote de bicoito ao meu lado no chão e abri a garrafa e bebi, mas depois lembrei que talvez essa fosse a minha única garrafa e parei de tomar água. Me virei para o homem que ainda me observava da porta.

“Obri...” –Eu fui interrompida pelo fechar da porta.

Peguei as coisas e voltei para o colchão. Fogos ainda explodiam e eu cada vez mais me cansava deles. Não era justo eu estar vivendo isso depois de tudo o que eu já passei. Que eu lembre, não tenho pecado algum para estar pagando por ele agora. O que Luiz ganharia fazendo isso comigo? Nada me faria entender isso.

As primeiras horas do novo ano não foram como planejei nos meus devaneios, mas pelo menos eu tinha um biscoito recheado e água quente. Talvez, três horas já haviam passado desde as queima dos fogos. A água quente já estava querendo sair de meu corpo. Fui até a porta e gritei por um banheiro. Ninguém me ouviu. Parei de gritar, mas continuei a bater na porta. Eu estava me irritando.

“Pare de bater!” –Um homem gritou ao longe.

“Preciso ir ao banheiro!” –Gritei.

O homem ficou em silêncio e quando abri minha boca para gritá-lo novamente, ele abriu a porta. Ele era bastante alto e negro. Segurou meu braço direito e me conduziu até o banheiro, que ficava na tal porta fechada da sala. Ele a destrancou e entrou comigo.

“Acho que você não pode me ajudar agora, moço.” –Eu disse.

Ele permaneceu parado na porta me olhando. O banheiro era pequeno, com azulejos brancos e muitos deles faltando. Uma pia branca descascando e um Box apenas separado por uma cortina de plástico cinza. Fiquei olhando para o quilômetro, decidi chamá-lo assim, até saber seu nome, mas ele não saia do mesmo lugar.

“Poderia sair?” –Perguntei.

Ele demorou um pouco, estava com seus braços cruzados e lentamente, foi andando para trás e fechou a porta. O vaso me dava nojo. Era azul e tinha manchas pretas. Me recusei a sentar nele e fiz como aprendi a fazer em banheiros públicos. Na parede do Box, havia um basculante com três aberturas. Removendo uma, eu passaria.

“Já pode sair!” –O homem disse batendo na porta.

Terminei de lavar minhas mãos e as sequei na calça. Abri a porta e imediatamente, Quilômetro segurou meu braço esquerdo e me levou para o porão novamente. Eu me sentia leve. Me sentei na escada e fiquei olhando para as pequenas janelas. Estava quase próximo de amanhecer e sono era a última coisa que eu sentia. Só estava cansada. Cansada de ter que aprender a lidar com coisas difíceis.

Eu tinha tanta coisa para passar para o papel e meu caderno não estava comigo. Queria gritar. Minha garganta suportava muita coisa entalada. Eu queria que me ouvissem, queria que vissem que não sou a garota forte que finjo ser. Meu coração é artificial, porque o que eu tinha, já morreu há muito tempo. Queria que olhassem para mim sem pena, como em Framlingham. Uma vida nova. Não aguentava mais ter que cair para aprender a me levantar novamente. A vida poderia ser entediante se eu permanecesse de pé para sempre, mas eu queria essa vida monótona a ter que viver assim como estou hoje.

Decidi conhecer o porão. Talvez eu tivesse que ficar por ali por mais tempo do que imaginei. Era bem limpo, para o lugar que era. Caixotes de madeira era o que mais tinha ali. Era maior do que meu quarto. As paredes não estavam pintadas, eram só cimento. Parecia que era uma construção antiga. O chão também era de cimento, mais irregular que as paredes. Não tinha uma luz no teto. O porão era iluminado pelas luzes que vinham de fora, que eram bem poucas.

O céu começou a ficar claro, devia ser quase seis horas da manhã. O silêncio fora quebrado pelo barulho de um galo, não muito próximo da casa, mas dava para ouvi-lo. Portas lá em cima começaram a abrir e fechar. Murmurinhos aumentavam. Talvez Luiz tivesse chegado de Copacabana. Corri para o colchão, me virei para a parede. Ouvi a porta do porão se abrir lentamente e fechei meus olhos. Passos se aproximavam devagar e minha vontade para abrir os olhos, aumentava.

“Parece estar dormindo.” –Sussurrou Luiz.

Ele parecia estar acompanhado, mas não consegui identificar os outros passos. A porta do porão se fechou e contei até sessenta para poder me virar. Tinha medo de alguém ter ficado lá. Me virei, como se ainda estivesse dormindo e abri pouco o olho esquerdo e ninguém estava lá. Respirei aliviada e permaneci deitada. Eu tava começando a sentir falta de tudo, até mesmo das constantes brigas com April e Susan. Eu não poderia ficar ali simplesmente sem esperança. Alguma coisa eu tinha que fazer para voltar a ter uma vida normal.

Eu já estava acostumada a viver trancada assim, por isso pareço calma o tempo inteiro. Sempre vi o ano novo da minha janela, ou da pequena TV de quatorze polegadas que havia em meu quarto. Meus pais nunca me deram presente no natal, quem dirá no meu aniversário. Eles nem se lembravam mais qual era o dia. Natal e aniversário era a mesma coisa. Eu os ouvia do meu quarto, cantando, bebendo, comemorando o natal e eu trancada em minha pequena suíte. Não, suíte não era luxo. Só me fizeram uma para eu ter que ficar trancada em um lugar já com o banheiro e não ter que sair para isso. Eu odiava férias.

Não fui criada em nenhuma religião. Apesar de meus pais dizerem ser católicos, acho que eles nem em Deus acreditam. Dizem que esse Deus existe e eu gosto de acreditar nele. Mas o que me faz acreditar nele, são os anjos. Tenho certeza que essas crianças com asas existem, mesmo não tendo provas para isso.

O silêncio me dava oportunidade para pensar em inúmeras coisas as quais minha mente perturbada não conseguia lidar, como por exemplo, como escapar de lá.


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Notas finais do capítulo

Desculpem a demora pra postar. Mas minha vida social decidiu existir agora kkkkkkk enfim, espero que tenham gostado. *_*
Obrigada por lerem!
eddictedhoran



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