Fui para o meu quarto, que era em frente ao de Katniss. Assim como o dela, era exatamente igual ao de Haymitch, mas não sujo. Dentro de uma das gavetas da mesa, ao lado da cama, encontrei um pijama de seda branca.

                Era, com certeza, o tecido mais macio que eu já havia vestido. Sem nem me cobrir, me taquei de qualquer modo na cama e dormi, em posição fetal – constrangedor, admito.

                Quando acordei, fiquei em dúvida sobre que horas eram. A única janela que o quarto possuía estava fechada e eu não estava a fim de abrir. Fui até o banheiro do quarto e sorri ao ver o quão diferente era do meu, no Distrito 12.

                Naquele existiam torneiras, pias e até mesmo uma banheira de verdade. Liguei a água quente da banheira e entrei assim que ela encheu. A água tirou de mim todas as preocupações e todos os vestígios de sujeira. Além disso, me senti completamente revigorado.

                Assim que sai e me sequei, como no dia anterior, parte da vitalidade se foi. Ainda assim, me sentia disposto e despreocupado. Já não me importava mais com Hera, com os Jogos Vorazes, mas me importava com a fome absurda que eu estava sentindo.

                Sai do meu quarto e passei pelo corredor, mas dessa vez outra Avox estava lá, desta vez loira e um pouco bruta. Não olhei para a Avox, com medo de causar problemas para ela. Segui meu caminho até a sala onde ontem eu, Katniss, Haymitch e Effie estávamos.

                Effie já estava sentada na mesa, onde comidas para o desjejum estavam postas. Sem nem sinal de Katniss ou Haymitch.

- Bom dia. – cumprimentei Effie.

- Bom dia. – ela respondeu com um sorriso.

                A mesa era farta. Bolos, pães, doces, frutas e mil e outras coisas. Chegava a ser engraçado. Aquela mesa possuía mais cores que todo o Distrito 12. Effie não comia nada mais que um cacho de uvas e fazia uma careta todas as vezes que eu me servia novamente.

                Haymitch entrou na sala. Ele vestia roupas limpas, seu cabelo estava arrumado e ele não tinha mais a aparência de um mendigo, apesar do cheiro de álcool ainda existir, mas muito menos que anteriormente. Sentou-se ao meu lado, com um sorriso no rosto.

- Teve uma bela noite de sono, hein? – perguntei.

- Dormi como uma pedra. – ele concordou.

                Pegou uma torrada e passou bastante manteiga nela. Depois, serviu-se de café. Ao invés de beber o café puro, como pessoas normais, ele retirou do bolso uma garrafa de bebida e despejou no café.

- Isso não pode te fazer bem. – Effie observou.

- Como se os Jogos tivessem feito. – Haymitch retrucou. Depois, virou-se para mim: - O que quer saber, garoto?

- Como vou achar abrigo? – perguntei.

                Ele sorriu, aparentemente gostando da minha pergunta. Ele pegou mais uma torrada e repetiu o processo.

- Quando vocês entrarem na arena, a cornucópia vai ser a coisa mais tentadora que você vai ver. – ele falou.

- Então eu vou até lá?

- Pelo contrário. Você vai sair de perto dela, correr o mais longe que conseguir. Vai procurar água e depois que conseguir, se estabeleça lá. Suba em alguma árvore alta e grossa. Se esconda entre pedras, construa um buraco... Mas não fique visível.

                Me esconder, basicamente. Ele não era realmente um bêbado inútil. Bom, talvez só um bêbado.

- Se eu sentir frio ou fome? – uma voz conhecida perguntou atrás de nós.

                Eu me virei e me deparei com Katniss. Ela vestia roupas novas e o broche que Madge nos havia dado estava pendurado em seu peito. A garota sentou junto a nós. Haymitch sorriu:

- Me passa a manteiga.

- E se eu sentir frio ou fome? – ela repetiu.

- Calma, docinho. Me passa a manteiga. – ele pediu novamente.

                Como ela não respondeu, ele se inclinou para pegar, mas Katniss foi mais rápida. Ela pegou uma das facas que se encontrava na mesa e fincou perto da mão de Haymitch. Effie soltou um grito surpreso e eu arregalei os olhos. Haymitch sorriu e pegou a manteiga, passando a no pão.

- Me de tempo para acordar. – ele pediu.

- Eu perguntei... – ela começou, mas Haymitch a interrompeu:

- Você sobe em uma porcaria de árvore e torce para alguém te dar uma porcaria de dádiva. Quando você estiver com frio, fome ou doente, você vai ver o quanto um fósforo, um pão ou uma pomada podem salvar a sua vida.

- Por que não acendemos uma fogueira? – perguntei.

- Porque aí os outros tributos vão te achar e você, realmente, não vai querer que isso aconteça. – ele respondeu.      

                Katniss comeu um pão e algumas frutas. Eu já havia terminado o meu café da manhã quando vimos os contornos da maior cidade que eu já havia visto. Prédios se estendiam até uma altura quase infinita, fabricas, pessoas, uma digna cidade.

                Fui até uma das janelas do trem. Passamos por um túnel e quando saímos, nos deparamos com milhares de fotógrafos, “fãs” e cidadãos da capital. Sorri para eles e acenei, sabendo que era o certo. Haymitch falou:

- Aquele ali sabe o que está fazendo. A Capital ama os simpáticos. Deixe a brutalidade para a arena. – ele falou para Katniss.

- Venha. – chamei ela, sabendo que eles adorariam os dois tributos juntos.