For Amelie - 1a Temporada escrita por MyKanon


Capítulo 3
III - Contato forçado




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/24674/chapter/3

Eu fui a última a entrar na sala, mas o professor ainda não tinha começado a aula. Graças a Deus! Não precisava atrair mais atenção ainda com um sermão sobre atrasos!

Dei uma olhada rápida pela sala, pra encontrar o ponto de maior isolação. Qual não foi a minha surpresa ao encontrar com o tal Aquiles acenando pra mim. Tava com mais cara de panaca ainda. Não sei se ele tava me indicando um lugar ou só acenando de feliz, pois tratei de ignorar novamente. Ele estava na segunda carteira na primeira fileira perto do professor. Na frente da namoradinha Bia. Nem por decreto me aproximaria da dupla novamente.Apertei o passo para o fundo da sala e encontrei uma carteira vaga na última fileira, bem em frente da janela. A aula de história também era no bloco 3, a sala era igual a da aula de Língua e Literatura, as janelas ficavam no fundo da sala.

Sentei atrás de um grupo de amigos que ainda conversavam sobre a partida de futebol da aula de educação física. Mas quando eu passei por eles, acabei por chamar a atenção. Eles se calaram e me acompanharam com o olhar.

Era apenas curiosidade. Eu estava beeem longe de ser bonita.

_ Você é a Amélia Carolina, não é?

_ Amélia Cristina! – quase gritei a correção.

Todos eles notaram minha irritação infundada, pois além do garoto que fez a pergunta, os outros três que participavam da conversa descontraída havia pouco, também me encararam surpresos.

_ Ahn tá. Desculpe.

O garoto virou-se para frente e não se falaram mais nem entre eles.Podia riscar mais três da minha lista. Estava progredindo relativamente bem. Com um pouco de sorte, talvez até o meio do ano eu ainda fosse motivo de apreensão e não de piada...

Anotei os avisos do professor para não pensar mais no ar tenso que pairava naquele fundão.Cerca de meia hora depois o professor dispensou.

Esperei que todos os garotos sentados à minha frente arrumassem logo seus materiais e saíssem na frente. Eu não gostava de andar na frente de ninguém. Falar pelas costas pra mim tinha um sentido bem literal.Não precisei esperar muito. Acho que eu realmente os assustei. Saíram mais rápido que qualquer um.

Esperei até a sala ficar mais vazia para então começar a arrumar minhas coisas. Depois de todos deixarem a sala, resolvi sair. Eu ainda dei um tempo razoável para que todos se afastassem o suficiente.Desci as escadas e cheguei à portaria do galpão. Ainda era possível ver a última pessoa da minha sala desaparecendo na escada perto do bloco 2, em direção à saída.

Cobrir a distância entre o bloco 3 e aquela escada daria tempo de afastá-los mais um pouco.Terminei o último lance de escada e já não via mais ninguém. Continuei a descer a rampa.Nunca tinha visto uma escola com acesso mais difícil...

_ Ei, Cris!

Congelei ao ouvir isso quando passei pela guarita dos guardas na portaria. Só podia ser uma pessoa. A mais chata das criaturas.Continuei andando como se não tivesse ouvido nada. Poderia ser para outra pessoa.

_ Amélia Cristina, tá indo pro tróleibus também?

O pavor de ter companhia até o ponto de tróleibus foi que me fez virar para encará-lo.Aquiles tava parado em frente à guarita com ninguém menos que a namoradinha Bia. Ela estava com cara de poucos amigos. Acho que tinha se cansado de simular alegria na minha frente.

_ Hããã... Acho que vou passar no shopping antes. – tentei pensar rápido.

_ Legal, vamos Bia?

“Oh shit!!!”

_ Não. Daqui a pouco meu pai passa pra me pegar. – disse sem olhar para nenhum de nós.

Definitivamente ela estava irritada.

_ Beleza. Então vamos lá Cris?

“Nunca”

_ Melhor outro dia. Tenho muita coisa pra resolver em casa.

Cinco minutos de companhia no ponto ainda eram melhores do que uma caminhada no shopping. A não ser que ele tomasse a mesma linha que eu... Oh, não!

_ Qual você toma? – ele perguntou enquanto descíamos em direção à avenida.

Eu queria ter feito a pergunta antes, assim poderia responder uma linha diferente caso fosse a mesma.

_ Qualquer uma...

Me arrependi dessa resposta. Depois do nosso ponto, cada um ia para uma direção diferente. Ele me olhou com cara de descrença.

_ Qualquer uma? Como? Onde você mora?

Era o que eu procurava evitar, um diálogo.

_ Qual a linha que você toma? – perguntei sem responder.

_ Eu vou pra Santo André.

_ Na verdade eu pego o 288... Estava fazendo confusão com as linhas que usava na outra ETE. – perfeito, destinos totalmente diferentes, não precisava mais esconder meu itinerário.

Ele não pareceu muito convencido, mas eu também não me preocupei. Não era pra ele que eu daria satisfações.

De repente o caminho me pareceu tão longo...

Quando cheguei na esquina, vi que ele se precipitou pro lado da passarela.

_ Melhor não atravessarmos pela avenida... Ano passado atropelaram um aluno.

Droga. Tá certo, eu era muito desajeitada e lenta para atravessar uma avenida tão grande e movimentada... Mas a passarela só tornaria nosso caminho ainda mais longo.Olhei mais uma vez para o trânsito, esperançosa. Mas os carros vinham em alta velocidade, em intervalos irregulares. Mas que tipo de prefeitura não coloca um farol em frente a uma escola?!

Aquiles assoviou para chamar a minha atenção. Suspirei derrotada e não tive escolha. Não tinha coordenação motora para desviar daqueles carros. Nem coragem.

_ Mas e aí, o rosto tá doendo ainda?

_ Não. – menti.

Mas não queria dar mais motivos para conversa.

_ Ow, foi mal, mas não foi eu mesmo, juro...

Quem tava acusando-o?

_ A gente tá treinando pro campeonato interclasses... Sabia que tá falando com o artilheiro do ano passado?

Tecnicamente eu não estava falando... Era ele quem não parava de falar.Continuei inexpressiva enquanto ele discorria sobre o campeonato interclasses do ano anterior. Eu devia estar mesmo com cara de interessada porque não parou de falar mesmo diante da minha apatia.

_ Acho que esse ano minha namorada vem assistir a final... Ano passado eu não deixei porque ela tava em semana de provas, mas nesse, ela diz que vai vir de qualquer jeito... – fez uma careta impaciente.

Eu só olhei pra ele porque me chamou atenção o fato da namorada não estudar com a gente. Ou seja, não era a Bia.Mas eu também não ia perguntar, não podia mostrar nada de interesse ou curiosidade para ninguém. Era mais seguro manter distância de qualquer um. Seria mais difícil me magoarem.

_ Quando começamos a namorar, não imaginava que fosse durar tanto... – e gargalhou.

Já que eu não perguntava, acho que ele decidiu sozinho me contar mais detalhes.

_ Completamos um ano e três meses semana passada.

Ele gesticulou mostrando a aliança. Devia mesmo ter orgulho da namorada...

_ Nós trocamos quando completamos um ano. Paguei uma nota...

Mas que papo mais chato. Eu forcei um bocejo pra ver se ele notava.Não funcionou não...

_ Ela tem um ciúme violento da Bia...

“Com razão...” Pensei tentando evitar o riso.

_ O quê? Você acha que ela tem razão?

Ele notou minha expressão irônica.

_ Não disse nada.

_ Ahh, conheço essa expressão. A Daphne sempre faz essa cara quando desminto as acusações dela.

_ Hum.

Retornei ao meu estado de indiferença enquanto ele descrevia a namorada perfeita, mas ciumenta.Minha cabeça já estava doendo de tanto ouvir abobrinhas do Aquiles quando chegamos ao ponto de tróleibus.

O dele chegou primeiro.

_ Quer que eu espere o seu com você? – ele se ofereceu antes de fazer sinal.

_ Não! Não precisa... Até amanhã.

Ele deve ter notado que a presença dele realmente incomodava. Na verdade, eu havia deixado isso bem claro em todas as vezes que conversamos. Mas ele ou se fazia de estúpido, ou era estúpido de fato.Estava muito difícil afugentá-lo, e no caminho de casa eu arquitetei algumas estratégias para conseguir isso.

Minha mãe estava no serviço quando cheguei. Me servi da comida que havia sobrado da janta e coloquei no microondas. Depois lavei a louça e dei uma varrida na casa. Enrolei por algum tempo na internet e na TV até que minha mãe chegou.

_ E então Mel? Como foi?

Notei a ansiedade nos olhos dela. Eu a havia preocupado demais com o meu comportamento depressivo no ano anterior e as ligações das pessoas que me odiavam não ajudavam muito.

_ Foi legal mãe. O pessoal lá é bacana. – “E eu pretendo não fazer amigos.”

_ Que bom querida! E então, amanhã você vai sozinha?

_ Claro.

Minha mãe sorriu contente. Era tão fácil deixá-la feliz. Bom, estar de pé na frente dela era o suficiente.

Continua


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!