Leah escrita por Jane Viesseli


Capítulo 7
Conversa a Sós




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A chuva aumentou rapidamente naquele dia, fazendo com que todos, exceto os lobos designados para a patrulha, fossem embora e não se encontrassem mais.

Na manhã seguinte, Leah disfarçadamente procura por Lucian, passando “ocasionalmente” pela hospedaria e por alguns lugares da reserva, mas não o encontrando em lugar algum. Chegou a ouvir alguns rumores, de que o visitante estava conhecendo o píer e pedindo um emprego temporário como pescador, mas quando se dirigiu ao local, Lucian já estava no mar e mais uma vez, ela não o encontrou…

Nos três dias que se seguiram, Leah persistiu, percorrendo sempre o mesmo caminho, mas não o encontrando. E, por causa disso, no quarto dia, a loba já estava bastante irritada e decidida a esperar seu retorno. Manhã e tarde se passaram lentamente, mas Leah se recusou a deixar o píer, aguardando que a qualquer momento o barco pesqueiro se aproximasse e atracasse.

Já estava escurecendo quando a chuva começou a cair novamente e algumas mulheres procuraram se refugiar nas cabanas ali perto, aguardando o retorno de seus maridos e esperançosas quanto aos frutos daquela pescaria. O mar começa a se revoltar, incitado pela chuva e ajudado pelo vento, deixando as mulheres cada vez mais em prantos e preocupadas, a cada minuto.

― Seu marido também está na pesca, querida? – pergunta uma senhora.

― Ah, marido? – gagueja Leah. – Não, é apenas um conhecido!

A loba sente suas bochechas queimarem e repreende-se mentalmente por deixar que uma frase tão idiota a afetasse, visto que era de um completo estranho que ela estava falando. Mas então, por que será que tudo sobre este estranho tinha que vir logo para ela?

As mulheres gritam, eufóricas e em uníssono, ao verem o barco se aproximar do píer e atracar com dificuldade. Alguns homens desceram do barco carregando caixotes com frutos do mar e o rapaz cherokee veio logo atrás, carregando a maior caixa sem nenhuma dificuldade, enquanto recebia elogios e agradecimentos pela ajuda, já que a maioria dos pescadores já não tinha o vigor de suas juventudes.

Outros dois homens descem do barco, amparando um terceiro homem, que Leah julgou ser o mais velho dentre todos, que não parecia nada bem.

― Oh, céus, o que aconteceu? – pergunta a esposa aflita, correndo em meio à chuva.

― O mar estava muito agitado, ele se desequilibrou ao puxar a rede e caiu na água. Ainda bem que Lucian estava lá, aquele garoto não temeu a revolta do oceano e pulou no mar para salvá-lo…

Mesmo sem ter intenção, o nome do cherokee já se espalhava entre os moradores da reserva, de uma forma bastante positiva, tornando-o ainda mais aceito no meio dos quileutes. Leah se impressiona com o feito, afinal, o que seria daquela mulher e de seus filhos se o marido morresse? Lucian realmente impediu que uma desgraça caísse naquela pobre família, uma desgraça semelhante a que recaiu sobre a dela própria…

― Oi, Leah, o que faz aqui? – pergunta Lucian, ainda debaixo de chuva.

Leah se assusta, já que, devido as suas próprias reflexões, não tinha visto sua aproximação. Ela abre a boca para dizer algo, mas desiste ao deparar-se com Lucian, ensopado, que não trajava nada mais que sua calça jeans. As gotas de chuva escorriam ousadamente pela sua pele exposta, os cabelos soltos caíam pelos ombros largos e seu rosto cansado denunciava o quanto tinha trabalhado.

― Estou só admirando a paisagem! – Olha para os lados, fingindo indiferença.

― Espero que goste do que vê. – Encara o oceano furioso. – Vou para a hospedaria, estou exausto.

“Até que gostei” confessa para si mesma e logo se repreende por deixar aquele estranho a afetar mais uma vez, porém, de que outra maneira poderia agir diante daquele tórax musculoso e sensualmente molhado? Ok, agora aquilo estava ficando realmente estranho, estava pensando demais no cherokee e, por causa disso, esqueceu-se completamente da conversa que queria ter com ele. Um uivo ressoa pela floresta no momento seguinte, a chamando para a patrulha, pois já estava bastante estava atrasada.

A noite foi longa, bem mais longa do que Leah esperava. Ao fim de seu turno de vigilância das fronteiras, a loba retorna para casa e se joga sobre a cama, deixando o cansaço embalar seu sono.

Certo tempo depois, Leah abre os olhos devagar e ainda mais lentamente procura o relógio de parede, saltando da cama repentinamente ao constatar que já eram duas horas da tarde. Ela anda pela casa a procura da família, mas não os encontra, estava sozinha. Porém, antes que pudesse curtir a oportunidade de estar sozinha e de poder comer o que quisesse, Leah pôde ouvir um barulho estranho vindo dos fundos da casa.

Desconfiada, ela resolve verificar e não poderia ter ficado mais surpresa:

― O que pensa que está fazendo? – lança, revoltando-se ao ver Lucian remexendo a oficina de seu pai. – Quem lhe deu autorização para mexer nessas coisas?

― Sua mãe – responde tranquilamente –, ela me alugou a oficina por um tempo, relaxe, não vou quebrar nada.

Leah, furiosa, cruza os braços e observa, enquanto Lucian pacientemente guardava as ferramentas jogadas e arrumava a bancada. Ele analisa cada obra de madeira que Harry havia deixado por terminar, cogitando a possibilidade de finalizá-las para conseguir alguma renda, mas logo é interrompido:

― Onde estão minha mãe e Seth? – pergunta ao se acalmar.

― Foram para Seattle. Entreguei um pouco de dinheiro para a Sra. Clearwater e pedi para que ajudasse Hana a comprar roupas novas, Seth foi de xereta – confessa, tirando os olhos das peças de madeira e encarando a loba.

― Minha nossa. – Faz uma careta ao sentir um odor de peixe no local. – Que fedor é esse?

― É por isso que precisamos de roupas novas. – Sorri sem graça. – Não tínhamos nada quando chegamos aqui, temos que começar do zero. Este cheiro é da minha roupa, que por coincidência é a mesma que utilizei ontem para pescar e a mesma que estava usando ao chegar a La Push, lavadas de muito mau jeito e secadas no próprio corpo… Hana é uma garota e sei que gostaria de se sentir bonita para o Seth, por isso dei todo o dinheiro que consegui para sua mãe gastar com ela.

Reparando com atenção, Leah logo concluiu que aquela era realmente a mesma calça e a mesma blusa de sempre, e não pode evitar ficar desconcertada com seu questionamento grosseiro. Modéstia à parte, ele era um bom irmão. O silêncio predominou por alguns instantes, mas Lucian manteve o contato visual firme, pois sabia que a conversa não havia terminado ali.

― Preciso lhe perguntar uma coisa e não aceito mais nada, a não ser a verdade.

― Pergunte.

― Por que eu?

― Por que você o quê?

― O imprinting… Por que eu? – repete, demonstrando sua confusão.

― Por que não você? – rebate Lucian.

― Você ainda não respondeu minha pergunta! – Bate o pé, voltando a se irritar.

― Você não respondeu a minha naquele dia, na floresta. – Sorri fracamente. – Se quiser ter suas perguntas respondidas, terá que me dar algumas respostas também.

― Está bem, trato feito! – resmunga. – Agora me responda, por que eu?

― Para que eu possa responder a sua pergunta, você precisa responder a minha: Por que não você?

Leah ameaça responder várias vezes, mas desiste, achava estranho entrar naquele assunto com alguém que realmente estava disposto a ouvi-la, afinal, muitas vezes tentara conversar com os garotos do bando sobre isso, sobre o fardo de ser o “fim da linha genético”, mas eles nunca lhe deram ouvidos, nunca tentaram entender o seu lado.

― Eu sou uma aberração. – Lucian arregala os olhos com o comentário. – Você deve saber muito bem pra que serve o imprinting, não é? Pois bem, há algo errado comigo, aparentemente eu não tenho a habilidade para continuar o gene lupino. – Força uma risada. – Eu sou o fim de uma linha genética… Eu… Eu estou na menopausa. Tenho um corpo de vinte anos de idade e estou na menopausa – confessa subindo o tom de voz, frustrada –, quem em sã consciência me escolheria?

A loba estava visivelmente arrasada e, ao mesmo tempo, com raiva de demonstrar sua frustração tão facilmente a um completo desconhecido. Ela o encara, esperando uma reação, porém, Lucian somente sorria e ela não pode deixar de pensar que talvez ele estivesse tirando sarro de sua dolorosa situação.

― Só isso?

― Só isso? – repete magoada. – É por isso que eu odeio ser uma loba…

― Minha vez. – Caminha para mais perto de Leah, ainda sorrindo. – Eu sempre desejei um tipo de mulher em especial, mas sempre tive medo que meu imprinting me traísse. Quando tive meu imprinting por você, aceitei prontamente. – Aproxima-se do ouvido da quileute. – Porque você é o meu tipo de mulher: uma mulher forte, uma mulher bonita, uma mulher sexy, e uma loba. – Se afasta, admirando o rubor que tomou conta do rosto de Leah. – Sempre detestei a ideia de me juntar a uma humana, elas são frágeis e indefesas, não queria isso pra mim. Eu queria uma mulher que também fosse uma lupina e que, em vez de precisar da minha proteção, lutasse ao meu lado!

― Essa não é uma resposta plausível – rebate –, caso não tenha percebido, eu sou anormal. Não tenho condições normais para te dar uma família… Por quanto tempo você me aturaria até me largar para formar uma família com outra?

Lucian gargalha alto, deixando a garota confusa, por que ele tirava sarro de seu estado tão facilmente? Talvez tenha sido um erro contar-lhe sobre isso, talvez ele fosse só mais um lobisomem otário e insensível, que riria pelas suas costas…

― Você é realmente engraçada. – Aproxima-se novamente, ficando a centímetros de seu rosto. – Eu sou um Filho da Lua, quantas vezes terei que lembrá-la disso? Filhos da Lua não precisam de condições humanas para nascer… Isso quer dizer que você é perfeita para continuar os meus genes lupinos!

O coração de Leah dispara e mais uma onda de calor se aloja em seu rosto ao pescar o desejo implícito nas palavras de Lucian, ele queria mesmo ficar com ela? Com a anomalia genética? E mais, queria ter um filho com ela? A loba estava sem palavras, sem reação e fez a única coisa que sabia fazer, repeli-lo.

― Você está fedendo, não chegue tão perto! – fala de repente, espalmando as mãos sobre a camisa do cherokee e o empurrando.

Lucian cambaleia alguns passos para trás, sentindo a cabeça girar subitamente, como se também tivesse sido golpeado no rosto. Ele tenta se manter em pé, mas a paisagem rodopiando diante dos seus olhos o desequilibra, fazendo-o derrubar as ferramentas que havia guardado, ao tentar se apoiar sobre a bancada.

Leah franze a testa, estranhando seu comportamento, afinal, não o tinha empurrado tão forte assim. Ela se aproxima, perguntando se estava bem, no entanto, Lucian se limitou a sorrir fracamente e tentar ficar de pé novamente.

― Droga! – Dá alguns passos. – Hana vai me matar por isso…

A frase fica suspensa no ar, inacabada. O enorme corpo de Lucian amolece de repente e tomba ao chão, desacordado, fazendo Leah arregalar os olhos e se abaixar próximo ao seu corpo. Ela sacode seus ombros, sentindo um estranho formigamento subir por seu braço, vindos daquele simples toque… Ele estava respirando, isso já era um bom sinal, mas o que estava acontecendo?

A quileute queria pedir ajuda, mas não podia simplesmente sair correndo e largá-lo ali, e, por isso, rapidamente optou por levá-lo para dentro. Com dificuldade, Leah levanta o tronco de Lucian e coloca os braços do mesmo em volta de seu pescoço, tomando ciência de sua alta temperatura corporal, bem mais alta que se lembrava que fosse. Ela tenta se levantar, mas falha… Tenta uma segunda vez e falha novamente, somente na terceira tentativa a loba conseguiu se erguer, com o lobisomem em suas costas.

Como ele podia ser tão pesado? A loba esperava que tudo fosse mais leve e fácil, já que era uma loba; será que o fato dele também ser um ser mítico, tornava tudo diferente? Por sorte a casa não ficava tão distante da oficina e eles logo adentraram a cozinha. Leah observa o ambiente, ofegante, não sabendo onde colocá-lo já que o sofá parecia pequeno demais para um homem daquele tamanho. Suas pernas logo protestam sob todo aquele peso, consequentemente a induzindo a levá-lo para o primeiro lugar que lhe veio à mente, o seu próprio quarto.

Leah deixa o corpo de Lucian tombar na cama e enquanto o ajeitava para caber no colchão, xingava céus e terra por aquilo acontecer justamente com ela. Sentia-se ofegante e cansada, como nunca havia se sentido desde a sua transformação. Como, de uma mísera conversa a sós, as coisas chegaram tal esse ponto? O que sua mãe pensaria ao ver um homem em sua cama assim, tão de repente?

 


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Notas finais do capítulo

Uhuu, estou muito feliz por ter gabaritado a prova final da faculdade e por isso procurei caprichar no capítulo de hoje... Espero que gostem!.
Lucian está realmente mal e Leah logo descobre que o estado do lupino causa delírios e que, por causa disso, ele fica um pouco "lingua solta". Será que a loba teria coragem de se aproveitar de seu estado e arrancar-lhe mais algumas respostas?
Próximo capítulo: Verdades em meio ao Delírio